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Revista PSYU Nº7 – Coluna NEO – Maio/2001

Orientação psicológica via e-mail: possibilidades e desafios
Orientação psicológica via e-mail: possibilidades e desafios
Toda vez que comento sobre meu trabalho no NPPI (Núcleo de Pesquisa em Psicologia e Informática), atuando na interface entre psicologia e informática, vejo o espanto nas pessoas, psicólogos ou não. A primeira pergunta que surge é: existe essa relação entre esses dois campos do conhecimento? É claro que vou dizer que sim. Mais do que isso, apresentarei aqui o trabalho de orientação dos e-mails que a Clínica (da PUC-SP) recebe via Home Page, produto e produtor de tal interface.

A Clínica recebe em média de 5 a 10 e-mails por dia. Dividirei-os aqui em e-mails informativos (informes institucionais, divulgação de eventos na área, entre outros) e e-mails solicitadores. É destes últimos que vou falar. Com freqüência recebemos mensagens de pessoas do Brasil e do exterior, contendo pedidos dramáticos de ajuda ou de situações de vida. Os e-mails surgiram espontaneamente da comunidade, uma vez que a Clínica não planejou nem divulgou esse tipo de serviço que hoje é prestado aos que tem acesso à internet.

No começo, era como ter um abacaxi para descascar sem faca. Estávamos sendo solicitados… solicitados a quê? Algumas questões surgiram e derrubaram muitos modos comuns de agirmos frente a um pedido de ajuda: como lidar com um pedido que chega somente via texto e que está sujeito às possibilidades e aos viéses da linguagem escrita? Como interpretar ou como não interpretar o texto da mensagem que chega? Aliás, cabe a interpretação ou ela põe em risco o processamento da tarefa, uma vez que só um texto é pouco para poder fazer afirmações sobre alguém? Ainda, se o modo que a pessoa escolhe para se mostrar é via e-mail, até que ponto nós, psicólogos, podemos olhar para dentro do mundo dela? Qual é o nosso alcance real? Neste caso, qual seria o ponto certo entre a superficialidade e a densidade no contato com a comunidade que nos contacta? Em outras palavras, qual é o limite entre a orientação e a psicoterapia?

Na prática, ficamos alvoroçados e por que não dizer atrapalhados (somos gente antes de tudo!) com algumas situações que nos foram colocadas. Como poesias, os e-mails sucitaram em nós medo, angústia, aflição… Afinal, o que fazer com aquele rapaz do interior do Pará que necessita de tratamento multidisciplinar… ou com a moça do bairro próximo que não consegue mais sair de casa… Iniciamos um trabalho de supervisão dos e-mails, coordenado pelo bem humorado Prof. Lorival de Campos Novo, que foi documentado durante o ano de 2000.

Acredito que nas discussões teóricas e práticas que ocorreram durante o ano, perguntamos mais do que respondemos. Felizmente, é assim que se faz ciência. Fazer esse tipo de orientação tira-nos do lugar costumeiro e provoca incômodo, impelindo-nos a pensar. As situações são difíceis de avaliar à distância e complicadas de direcionar, uma vez que estamos desprovidos das coisas que nos são mais familiares na nossa profissão: o contato cara-a-caea, o gesto, o cheiro, o tom, o clima. Nessa nova prática, há ainda muita margem para erro. Não podemos transpôr nossos modelos tradicionais para o campo da internet. Certo é que esse e-mails devem ser acolhidos dentro de nós, não só nas palavras que contém, mas também nas sensações e sentimentos ali latentes.

Esta é a forma mais segura que encontramos de encaminhar situações pessoais difíceis às quais provavelmente nunca teremos acesso de outra forma que não via internet. Acolher o externo e sentir o interno é uma das ferramentas mais poderosas que o psicólogo tem em suas mãos.
PAULO ANNUNZIATA LOPES, MEMBRO DO NPPI

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