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Por uma Psicologia com Filosofia

Quando fui convidado a escrever essa coluna, ocorreu-me que só poderia falar, honestamente, daquilo que venho me dedicando em minha formação. Achei, então, que o mais indicado para uma primeira coluna, seria uma apresentação geral do assunto de meu interesse nos últimos anos, bem como uma breve justificativa de sua relevância.
Esse assunto, de modo geral, consiste na interface entre filosofia e psicologia, o que tenho feito, desde a graduação, até o doutorado, em behaviorismo radical e, ultimamente, na psicologia da Gestalt. Também por conta dessa interface, tenho grande interesse em história da psicologia de modo geral. Considerando que dentre os leitores dessa coluna deve haver pessoas com um espírito mais científico (em sua vertente positivista) – e que, por esse motivo, pode julgar esse interesse pela filosofia, uma espécie de capricho pessoal –, sinto-me obrigado a redigir uma breve justificativa. Eu poderia citar aqui um conjunto de motivos, quase que infindável, para tentar convencê-los de que o psicólogo precisa de uma formação filosófica mínima. No entanto, preferi escolher apenas dois, que considero, pessoalmente, os principais.

O primeiro motivo diz respeito à consistência da obra psicológica. Um projeto psicológico tem maior chance de possuir coerência interna, quando há uma preocupação filosófica subjacente. Acho que isso ocorre em dois níveis: quando se escreve, e quando se interpreta uma obra. Quando se faz psicologia, ou seja, quando se registra e transmite um conhecimento considerado psicológico, possuindo uma preocupação filosófica subjacente, as chances de se cometer confusões conceituais são menores. Isso porque a filosofia funciona, nesse caso, como uma espécie de fio condutor que delimita um campo de estudo, bem como os caminhos a serem percorridos dentro desse campo. A mesma coisa pode ser dita em relação à interpretação de uma obra psicológica qualquer. Com o auxílio de um conhecimento filosófico mínimo, não apenas compreendemos melhor certos conceitos – pois esses, geralmente, possuem uma grande herança filosófica –, como também estamos mais habilitados a identificar as confusões conceituais cometidas pelo autor.

O segundo motivo que deve ser considerado como justificativa para a promoção da interface entre psicologia e filosofia, diz respeito à formação do caráter do psicólogo. Isso porque ao estudarmos filosofia, perceberemos que o conhecimento psicológico tem uma herança, ou história, inegável e, portanto, tudo aquilo que um psicólogo escreve atualmente não é, de modo algum, totalmente original. Não há uma geração espontânea do conhecimento em psicologia (como muitos parecem acreditar).

Por melhor que seja o autor ou a linha teórica que nos interessemos, sempre encontraremos um diálogo fértil com a filosofia. Nesse sentido, poderíamos dizer (parafraseando Kant), que a filosofia pode ajudar-nos a “despertar de nosso sono dogmático”, ou ainda, que uma formação filosófica mínima pode tornar os psicólogos mais humildes. Para finalizar, quero me defender antecipadamente. Em momento algum estou afirmando, aqui, que a psicologia deve ser subjugada à filosofia. Pelo contrário, o que defendo é que deveria existir uma parceria, e porque não dizer cumplicidade, entre as duas disciplinas. Para exemplificar esse ponto de vista, posso citar, aqui, um grande professor meu, que (inspirado na relação kantiana entre sensibilidade e entendimento) sempre me dizia que “a psicologia sem a filosofia é cega, assim como a filosofia sem a psicologia é vazia”.

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