Resumo
Metanfetamina, introduzida, em 1930, como descongestionante nasal, tornou-se uma droga de abuso largamente utilizada provocando várias "epidemias" de consumo devido ás suas propriedades euforizantes, assim como suas ações em diminuir o apetite e o sono e aumentar o desempenho físico e intelectual. Foi banida em vários países devido aos efeitos danosos que causa ao coração e sistema nervoso central (SNC), porém, no início dos anos 90, ela retornou aos USA na sua forma mais poderosa de uso.
Passou a ser fumada, sendo denominada, assim, de ice, proporcionando aos seus usuários efeitos psicoativos muito mais duradouros que os do crack/cocaína. E no Brasil? Como tudo o que é bom para os USA é, por princípio, bom para nós, na década de 60, era vendido na forma de um medicamento, o Pervitin, que era muito apreciado por jovens que dele faziam uso para aumentar sua capacidade produtiva. Em pouco tempo, o Pervitin passou a sofrer abuso, originando vários casos de dependência descritos na literatura científica brasileira.
Devido aos problemas causados, a metanfetamina, a exemplo de outros países, também foi banida no Brasil. Agindo pelo bloqueio da recaptação e promoção da liberação das monoaminas (dopamina, noradrenalina e serotonina) das vesículas armazenadoras e, ainda, inibição da MAO, a metanfetamina permite u'a maior quantidade desses neurotransmissores na fenda sináptica, aumentando, assim, a neurotransmissão monoaminérgica. É um análogo da anfetamina, apresentando efeitos muito similares a essa última, portanto é um poderoso estimulante do SNC. Assemelha-se também em efeitos à cocaína, sendo utilizada pelas mesmas vias que essa, ou seja, oral, aspirada, injetada ou inalada (fumada). Logo após o seu uso, há um aumento do estado de alerta, da auto-estima, da euforia, da sexualidade, da energia e uma diminuição da fome, do cansaço e da necessidade de dormir.
O ice (forma fumada) e a forma injetada produzem um efeito extremamente prazeroso (flash, rush) não alcançado pelas outras vias. A longo prazo surgem dependência, tolerância aos efeitos euforizantes, além de problemas cardiovasculares, como taquicardia, aumento da pressão arterial, podendo ocasionar acidente vascular encefálico e infarto do miocárdio. Comportamento violento é observado, usualmente em resposta aos delírios persecutórios provocados pelo estado psicótico que se desenvolve. Nesses casos, é nítida a alteração de personalidade com irritabilidade e desconfiança de tudo e todos.
Introdução
"Ice", "chalk", "speed", "meth", "glass", "crystal" etc. são os nomes pelos quais a metanfetamina, um derivado da anfetamina, é conhecida nos USA15, 20, 23, 25.
Introduzida na terapêutica em 1930, foi comercializada inicialmente como descongestionante nasal, mas suas propriedades euforizantes, assim como suas ações em diminuir o apetite e o sono e aumentar as performances física e intelectual, em pouco tempo, suplantaram seu uso terapêutico7,15,22, 32,35.
Histórico e Desenvolvimento
Historicamente, tem-se conhecimento da ocorrência de várias "epidemias" de abuso de metanfetamina. Um exemplo deu-se na Segunda Guerra Mundial, quando a metanfetamina foi utilizada largamente para combater a fadiga de militares de vários países. Soldados alemães, ingleses e americanos consumiam-na para eliminar o cansaço e manter o vigor físico e a vigília7,32,35.
No Japão, tanto soldados como operários de fábricas de material bélico foram consumidores de metanfetamina em grande escala, sendo que os pilotos Kamicaze utilizavam-na em níveis tóxicos7, 24, 32, 33, 35.
Fora do contexto da guerra, o uso de metanfetamina como estimulante espalhou-se por vários locais, sendo que, nos USA, por exemplo, a "epidemia" de abuso de metanfetamina ocorreu em dois momentos – em 1930-1940 -, quando essa droga podia ser adquirida como descongestionante nasal, sem prescrição médica, e uma segunda em 1960, quando a metanfetamina tornou-se uma das drogas utilizadas por subculturas, como os hippies. Nas décadas de 50, na Suécia, e 80, no Japão e na Coréia, também constataram-se "epidemias" de consumo. Na Suécia, por exemplo, a metanfetamina era vendida com o seguinte slogan: "Dois comprimidos valem por dois meses de férias"7,15, 24,32,35.
No inicio dos anos 90, a forma mais poderosa de uso da metanfetamina foi introduzida nos USA. Os consumidores dessa droga passaram a fumá-Ia, conseguindo efeitos psicoativos muito mais duradouros que os do crack/cocaína. Essa forma de uso (fumada) foi denominada ice15.
Barata, com processo de produção simples, podendo ser feito em casa, precursores em abundância no mercado, administração fácil (utiliza-se um cachimbo caseiro para fumá-Ia), via de introdução no organismo (via pulmonar) aparentemente "segura", quando comparada à via injetável, e, ainda, com efeitos mais duradouros que o crack/cocaína, fizeram do ice uma das drogas mais consumidas nos USA. De acordo com o National Household Survey on Drug Abuse, de 2005, cerca de 4,9 milhões de pessoas (2,3% da população americana) já tinham feito uso de metanfetamina alguma vez na vida, sendo o ice a forma predominante de consumo22,23,25,29.
E no Brasil? Na década de 50, era aqui comercializado um medicamento à base de metanfetamina com o nome comercial de Pervitin, que era muito consumido entre jovens. Relatos de abuso desse medicamento são encontrados na nossa literatura médica. Cavalcanti5, em pesquisa realizada no estado de Pernambuco, entrevistou 159 estudantes, distribuídos pelos cursos de medicina, filosofia e engenharia, e encontrou que 61,1% dos entrevistados faziam uso de Pervitin. Assim o autor descreve o fenômeno:
"Todos, sem exceção, começaram a usar estimulantes, com a finalidade de combater o sono e, assim, poderem estudar até altas horas da noite, e o fizeram a conselho dos colegas… Desenvolveram problemas desagradáveis, como: irritação, hiperexcitabilidade, depressão, tonturas, astenia, tremores das extremidades, distúrbios neurovegetativos, dificuldade de evocar o que aprendeu na véspera, anorexia, cefaléia e distúrbios gástricos… a maioria dos nossos entrevistados queixou-se de que eram obrigados a aumentar a dose para conseguirem os mesmos efeitos que obtinham no princípio com dose menor. Além disso, referem emagrecimento, e uma cada vez maior exacerbação dos sintomas referidos…".
Wolffenbuttell34 descreve um caso típico de dependência de Pervitin: "Fui procurado, em consulta, por um moço de 26 anos, que, pela primeira vez na vida, recebeu do pai, médico, 2 comprimidos de Pervitin para tomar na véspera dos seus exames. Gostou da sensação de euforia que o Pervitin lhe deu, e da sintonização mais fácil com o meio que nele provocou (pois tratava-se de um caráter fechado) dificuldade de estabelecer pontes para com outras pessoas. Sem que o pai soubesse, continuou a usar, diariamente, o Pervitin tendo chegado ao incrível consumo de 5 tubos por dia. O pai resolveu interná-Io. Uma vez fora do Instituto Paulista, tendo de trabalhar e estudar, sentiu a necessidade do chicote, que é o Pervitin, e voltou, logo, a tomá-Io… A situação atual: o rapaz consome três tubos de Pervitin por dia…".
Ribas27, de forma mais alarmista, assim descreve o abuso de metanfetamina na década de 70: "Ao influxo de desastrosa propaganda sensacionalista, através de todos os meios de comunicação de massa, as multidões lançaram-se, em proporções epidêmicas, livremente nas farmácias e drogarias nos excessos de Pervitin e outras anfetaminas, cognominadas de "pílulas da felicidade, bolinhas" e outros matizes… De início, o público abusou das anfetaminas por via oral, em comprimidos. Recentemente, recorreu à via endovenosa… Acusa estados mentais mórbidos, não raro já de caráter psicótico (psicoses anfetamínicas)… um quadro do tipo maníaco… quadros de tipo esquizofrenia paranóide…".
Esse quadro de abuso de Pervitin levou ao banimento da metanfetamina do Brasil, a exemplo do que ocorria em outros países. Nos dias de hoje, os levantamentos sobre consumo de drogas psicotrópicas no país não têm acusado consumo de metanfetamina em nosso meio13,14, apesar de ter sido detectada sua presença em comprimidos vendidos como ecstasy. Apesar de um perfil psicofarmacológico de ação muito diferente da metanfetamina, o ecstasy tem uma semelhança química com ela. A colocação de um grupo metilenodióxido nas posições 3 e 4 do anel fenil da metanfetamina obtém-se o MDMA (metilenodioximetanfetamina) ou ecstasy7,32, 35.
Porém, a metanfetamina não é considerada precursor químico do MDMA, ou seja, a síntese do ecstasy não parte da metanfetamina17. Por outro lado, a mídia tem insistido em divulgar o uso da metanfetamina por internautas. Essas pessoas estariam fazendo este uso com o propósito de ficarem despertas, mais dispostas e, dessa forma, estarem aptas a permanecer por longos períodos em frente a uma tela de computador. Ainda segundo essas notícias, esses jovens teriam problemas com a retina. Esse problema está associado ao fato de que a metanfetamina causa midríase, ou seja, há uma dilatação da pupila, a qual perde a capacidade de entrar em miose diante de uma grande luminosidade, provocando, dessa forma, o dano da retina2,7,35, Até o momento, não se constatou esse uso através dos instrumentos disponíveis para medir o consumo de drogas entre a população jovem brasileira, o que não quer dizer que seja inexistente. Mas, com certeza, caso ele já seja um fato, trata-se ainda de um consumo feito por uma pequena parte da população.
Formas de uso e produção
Metanfetamina é um poderoso estimulante do sistema nervoso central, mesmo em pequenas doses, podendo ser administrada por via oral em comprimidos, por via nasal sendo aspirada sob a forma de pó, por via pulmonar através da qual é inalada (fumada) e via intravenosa, onde o pó diluído em água é injetado na veia com auxílio de seringa e agulha22.
À metanfetamina fumada é atribuído o nome de Ice e constitui-se na forma mais utilizada nos USA. A fácil sublimação do sal cloridrato de metanfetamina, a grande disponibilidade desse sal com um bom grau de pureza6, o início rápido dos efeitos euforizantes, devido à absorção veloz da droga pelos pulmões, segurança diante do risco de transmissão de HIV e outras doenças infecciosas, que são associadas à via intravenosa, fazem a popularidade da metanfetamina fumada23,29. Acrescenta-se a essas propriedades a sua fácil obtenção: a partir da efedrina ou pseudoefedrina (presentes em vários medicamentos broncodilatadores) e ácido clorídrico, os usuários, de maneira artesanal, conseguem o cloridrato de metanfetamina17.
Numa temperatura de 200-400°C, a metanfetamina é prontamente sublimada com mais de 90% da droga intata8. A alta eficiência da sua sublimação sob aquecimento é indubitavelmente um requisito para a seleção desse modo de administração entre os usuários de metanfetamina. Voluntários humanos, inalando 30mg de cloridrato de metanfetamina em um cachimbo aquecido à 300°C, relataram efeitos (high) intensos de prazer comparáveis àqueles produzidos pela administração intravenosa de 15mg de metanfetamina22,26.
Mecanismo de ação
A metanfetamina exerce seus efeitos indiretamente por elevar agudamente as quantidades de dopamina, noradrenalina e serotonina na fenda sináptica, aumentando a neurotransmissão monoaminérgica. O aumento da dopamina no sistema mesolímbico possivelmente é a origem das bases farmacológicas das propriedades reforçadoras da droga20,22,25,28.
Esse aumento das monoaminas na fenda sináptica, provocado pela metanfetamina, dá-se por três mecanismos principais:
1. Bloqueia a recaptação das monoaminas (dopamina, noradrenalina e serotonina) ligando-se ás proteínas transportadoras desses neurotransmissores1, 25, 28, 35.
2. Promove a liberação desses neurotransmissores das vesículas armazenadoras localizadas nos terminais axônicos 1,25,28,35.
3. Inibe a MAO (monoaminoxidase), enzima que metaboliza as monoaminas, permitindo u'a maior quantidade das mesmas na fenda sináptica, aumentando, assim, a neurotransmissão monoaminérgica1,35.
Estudos recentes em animais têm sugerido que a metanfetamina pode degenerar tanto neurônios dopaminérgicos como serotoninérgicos. Permanece ainda para ser determinado se humanos expostos à metanfetamina também apresentam essa neurotoxicidade cerebral e quais as conseqüências funcionais dessa toxicidade10, 12,35.
A metanfetamina também pode afetar as estruturas termorreguladoras do sistema nervoso central, podendo predispor os usuários à hipertermia10,12,28,35.
Comparando-se os mecanismos de ação da metanfetamina e da cocaína, sabe-se que ambas bloqueiam a recaptação das monoaminas. Entretanto, o mecanismo íntimo desse bloqueio difere entre as duas drogas. De fato, a metanfetamina é capaz de ocupar o mesmo sítio que a dopamina na proteína transportadora localizada na membrana pré-sináptica. Já a cocaína age em outro sítio da proteína transportadora e, ao ocupá-Io, produz uma deformação alostérica do sitio da monoamina, impedindo, assim, a recaptação da dopamina4.
Efeitos
Como dito anteriormente, a metanfetamina é um análogo da anfetamina, apresentando efeitos muito similares a esta última. Apesar de mecanismos de ação um pouco diferentes, a metanfetamina exibe efeitos também semelhantes à cocaína, sendo ambas, ice e crack, fumadas através de cachimbos de produção caseira 15,20,22,23,25.
Conforme a via de administração, os efeitos podem ser mais ou menos intensos, sendo as vias mais "poderosas" a intravenosa e a pulmonar (metanfetamina fumada). Imediatamente após fumada ou injetada intravenosamente, a metanfetamina produz um efeito extremamente prazeroso (flash, rush)3,25. Quando cheirada ou utilizada por via oral, esse efeito não é alcançado, apenas uma euforia mais duradoura é produzida, mas não tão intensa como ocorre com as vias anteriores25.
Os efeitos imediatos, que ocorrem após utilização de metanfetamina, são um aumento do estado de alerta, da auto-estima, da euforia, da sexualidade, da energia e uma diminuição da fome, do cansaço e da necessidade de dormir. Esses efeitos, em um primeiro momento, parecem ser desejáveis e controláveis, mas a droga tem um enorme potencial de dependência e a "fissura" (desejo incontrolável pela droga) instala-se rapidamente. Em geral, os usuários são despreocupados com essa possibilidade e, somente muito tardiamente, percebem que estão consumindo quantidades cada vez maiores de metanfetamina11,15,20,25.
A metanfetamina a longo prazo de uso pode causar problemas sérios de saúde, incluindo má nutrição, exaustão, rabdomiólise e problemas de infecção, no caso de metanfetamina por via injetáveI28,31.
É comum o usuário, que faz uso compulsivo de metanfetamina, apresentar comportamento estereotipado, caracterizado por uma hiperatividade com desenvolvimento repetitivo, por horas, de certas atividades sem significado, às vezes acompanhada de ranger dos dentes. Esse comportamento é reversível. Pode apresentar, ainda, a síndrome coreica, com movimentos involuntáríos convulsivos, principalmente dos membros superiores, combinados com movimentos faciais assimétricos. Essa condição é reversíveI 2,7,24,35.
Confusão e delírios também podem ser observados mediante o uso crônico da metanfetamina e um progressivo estado psicótico, sintomaticamente indistinguível de esquizofrenia, desenvolve-se15,36. Esses sintomas psicóticos podem persistir por meses ou anos, após o uso da droga ter cessado. Comportamento violento, usualmente em resposta aos delírios persecutórios, freqüentemente ocorre, expondo o usuário à situação de risco de morte. Nesses casos, é nítida a alteração da personalidade com irritabilidade e desconfiança de tudo e de todos20, 24, 25, 36.
Ainda, com o uso mais freqüente e prolongado da droga, desenvolve-se a tolerância à sua ação euforizante (necessidade de aumentar a dose para sentir os efeitos prazerosos iniciais). A administração diária de metanfetamina, em doses crescentes, produz um aumento progressivo em seus efeitos comportamentais, como atividade locomotora, e também um aumento da ansiedade e paranóia. Esse fenômeno é chamado de sensibilização e pode persistir por muito tempo, mesmo após a interrupção da droga2, 6, 24, 35.
O usuário de ice caracteriza-se por fazer uso da droga por horas seguidas ou mesmo dias, seguido por um período de parada, durante o qual sente uma extrema fadiga, exaustão, desorganização de idéias, hipersonolência, depressão e fissura9, 19. O usuário, que faz uso pesado da droga, mostra uma progressiva deterioração social e ocupacional15.
Problemas cardiovasculares são observados em usuários de metanfetamina, tais como taquicardia, aumento da pressão arterial, podendo causar acidente vascular encefálico e infarto do miocárdio, ambos com risco de morte7,16, 20, 22, 25, 35.
Nos casos de overdose de metanfetamina, um quadro mais grave ainda desenvolve-se, caracterizado por hipertermia, taquicardia, seguidas por colapso circulatório e convulsões, as quais, se não tratadas prontamente, podem ser fatais; podem ocorrer também hemorragia encefálica e infarto do miocárdio, como já foi dito. E, ainda, usuários podem entrar em coma seguido de choque cardiovascular, podendo ser fatal 7,16,20,22,35.
Os efeitos da abstinência da droga são prolongados, iniciando, numa primeira fase que pode durar de 2-6 horas, com uma marcada depressão, isolamento, hiperfagia, agitação, ansiedade e um desejo imenso de dormir. Quando finalmente o usuário consegue dormir, assim permanece por 24-36 horas ininterruptas. O desaparecimento desses sintomas pode levar dias ou semanas com freqüentes períodos de depressão, sonhos vívidos e "fissura" pela droga. A abstinência raramente é uma ameaça à vida, mas pode necessitar hospitalização. Nos casos de depressão severa, esses pacientes devem ser vigiados, já que existe a possibilidade de tentarem suicídio7, 20, 22, 35.
Problemas fetais também podem ocorrer quando mulheres usam metanfetamina durante a gravidez. O crescimento intra-uterino pode ser retardado, e o nascimento prematuro é observado nesses casos. Durante o primeiro ano de vida, a criança pode ser letárgica com falta de apetite, apresentando vômitos e tremores18,21.
A metanfetamina, quando comparada à cocaína, exibe diferenças em várias áreas que incluem duração de efeito, freqüência do consumo e duração do efeito compulsivo de repetir a droga. Por exemplo, o efeito da metanfetamina, dependendo da via de administração varia de 4-8 horas, enquanto o efeito da cocaína é somente de 10-30 minutos. O crack (cocaína fumada) necessita ser consumido a cada 10-15 minutos, mas para a metanfetamina, devido aos seus efeitos mais duradouros, uma nova dose só é necessária após horas. A duração média de um uso ininterrupto do crack é de 12 horas, porém, para o usuário de metanfetamina, é o dobro, isto é, 24 horas. O padrão de uso de ice é de 100-250mg, a cada 4-6 horas, por um período de 24-48 horas15,18,25.
Ice, a forma fumada da metanfetamina, que tem trazido sérios problemas aos USA devido ao seu abuso, ainda não foi detectada (oficialmente) no Brasil. Porém, a metanfetamina no Brasil já teve um papel importante nas décadas de 50 e 60 como droga de abuso, a tal ponto que foi banida. A sua detecção em comprimidos de ecstasy, comercializados no Brasil, demonstra que essa droga está presente entre nós, sugerindo que uma nova "epidemia" de consumo não está descartada. Porém, fica uma pergunta ainda sem resposta: Por que o ice ainda não interessou ao consumidor brasileiro de drogas? Considerando todas as suas propriedades e seus efeitos de estimulante do sistema nervoso central, seria um forte concorrente do crack. Portanto, as autoridades brasileiras de saúde pública deveriam estar abertas para esta possibilidade.
Referências bibliográficas
1. Amara, SG & Sonders, MS – Neurotransmitter transporters as molecular targets for addictive drugs. Drug Alcohol Depend., 57: 87-96,1998.
2. Asghar, K – Pharmacology and toxicology of Amphetamine and related designer drugs. USA: National Institute on Drug Abuse, 1989.
3. Beebe, K & Walley, E – Smokeable methamphetamine ("Ice"): An old drug in a different form. Am. Farm. Physician., 51: 449-53, 1995.
4. Bannon, MJ; Granneman, JG & Kapatos, G – The Dopamine transporter. Em: Bloom, FE & Kupfer, DJ – Psychopharmacology. The fourth generation of progress, Nova Iorque: Raven Press, 1994, pp.179-188.
5. Cavalcanti, CT – Notas sobre o abuso das anfetaminas – Seus perigos e prevenção. Neurobiologia, 27: 85-91,1958,
6. Cho, KA – Ice: A new dosage form of an old drug. Science, 249: 631-34, 1990.
7, Cho, KA & SegaI, DS – Amphetamines and its analogs. USA: Academic Press, 1994.
8. Cook, EC & cols. – Pharmacokinetics of Methamphetamine HCI self-administered to human subjects by smoking s-(+)-methamphetamine-HCI. Drug Met. Disp., 27: 717-23, 1993.
9. Ellinwood, EH & Nikaido, AM – Stimulant induced impairment: a perspective across dose and duration of use. Alcohol, Drugs and Driving, 3: 19-24, 1987.
10. Fasciano, J; Hatzidimitriou, G; Yuan, J; Katz, JL & Ricaurte, G – N-Methylation dissociates methamphetamine's neurotoxic and behavioral pharmacologic effects. Brain Res., 777: 115-20, 1997.
11. Frawley, PJ & Smith, JW – One-year follow-up after multimodal inpatient treatment for cocaine and methamphetamine dependencies. 1. Substance Abuse, 9: 271-86, 1992.
12. Frey, K; Kilbourn, M & Robinson, T – Reduced striatal vesicular monoamine transporters after neurotoxic but not after behaviorally-sensitizing doses of methamphetamine. Eur. J. Pharmacol., 334 273-79,1997.
13. Galduróz, JCF; Noto, AR; Nappo, AS & Carlini, EA – I Levantamento Domiciliar Nacional sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas. São Paulo: Cebrid, 1999.
14. Galduróz, JCF; Noto, AR & Carlini, EA – IV Levantamento sobre o Uso de Drogas entre Estudantes de 1º e 2º Graus em 10 Capitais Brasileiras. São Paulo: Cebrid, 1997.
15. Glittenberg, J & Anderson, C – Methamphetamines: Use and trafficking in the Tucson-Nogales area. Sub Use Mis., 34: 1977-1989, 1999.
16. Hong, R; Matsuyama, E & Nur, K – Cardiomyopathy associated with the smoking of crystal methamphetamine. Jama, 265: 1152-154, 1991.
17. International Narcotics Control Board. Precursors and chemicals frequently used in the illicit manufacture of narcotic drugs and psychotropic substances. Vienna: United Nations Publications, 1998.
18. Kanof, P – Methamphetamine: drug action and consequences. Unpublished presentation at the Summit Meeting on Methamphetamine. Phoenix: AZ, May 17, 1996.
19. Kramer, JE; Fishman, VS & Littlefield, DC – Amphetamine abuse. Jama, 201: 89-93, 1967.
20. Logan, BK; Fligner, CL & Haddix, T – Cause and manner of death in fatalities involving methamphetamine. J. Forensic Sci., 43: 28-34, 1991.
21. Marwick, C – NIDA seeking data on effect of fetal exposure to Methamphetamine. Jama, 283: 2225-226, 2000.
22. Meng, Y; Margozata, D; Bridgen, DT; Martin, BR & Lichtman, AH – Pharmacological effects of Methamphetamine and other stimulants via inhalation exposure. Drug Alcohol Depend., 53: 11-120,1999.
23. Molitor, F; Truax, SR; Ruiz, JD & Sun, RK – Association of Methamphetamine use during sex with risky sexual behaviors and HIV infection among non-injection drug users. West J. Med., 168: 93-97, 1998.
24. Nakatani, Y & Hara, T – Disturbance of consciousness due to Methamphetamine abuse. Psychopathology, 31:131-37,1997.
25. National lnstitute on Drug Abuse. Methamphetamine Abuse and addiction. Em Research Report Series.
(http://165.112.78.61/ResearchReports/ methamph/methamph2.html), 2000.
26. Perez-Reyes, M & cols. – Clinical effects of Methamphetamine-HCI vapor inhalation. Life Sci, 49: 953-59,1991.
27. Ribas, JC – Aspectos clínicos e sociais do anfetaminismo. Folha Médica, 64: 491-94,1972.
28. Richards, JR; Johnson, EB; Stark, RW & Derlet, RW – Methamphetamine abuse and rhabdomyolisis in the ED: A 5-year study. Am. J. Emerg. Med., 17(7) 681-85 1999.
29. Scaros, LP; Westra, S & Barone, JA – Illegal use of drugs: a current review. US Pharmacist, 15: 17-39, 1990.
30. Silva, OA; Yonamine, M & Reinhardt, VED – Identificação de 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA) e compostos relacionados por cromatografia em fase gasosa e espectrometria de massas em comprimido de ecstasy apreendidos em São Paulo. Rev. Farm. Bioquim. Univ. São Paulo, 34: 33-37, 1998.
31. Smith, DE & Fischer, CM – An analysis of 310 cases of acute high dose Methamphetamine toxicity in Haight-Ashbury. Clin. Toxicol., 3(1): 117-24, 1970.
32. Spotts, JV & Spotts, CA – Use and abuse of Amphetamines and its substitutes. USA National lnstitute on Drug Abuse, 1990.
33. Tamura, M – Japan stimulant epidemics past and present. Bull. Narc., 41: 83-93, 1989.
34. Wolffenbuttel, E – Uso e abuso de Pervitin. Rev. Bras. Med., 20 166, 1963.
35. World Health Organization (programme on Substance Abuse). Amphetamine-type stimulants. Genebra: WHO, 1997.
36. Yui, K; Goto, K; Shigenori, I & Ishiguro, T – Methamphetamine psychosis: Spontaneous recurrence of paranoid-hallucinatory states and monoamine neurotransmitter function. J. Clin. Psychopharmacol., 17: 34-43, 1997.
////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////