(continuação)
Adjuvantes analgésicos
Foi verificado que uma gama de agentes tem propriedades analgésicas. Pensa-se que a maioria destes agentes potencializam a analgesia conseguida pelos analgésicos opiáceos e não-opiáceos. Embora os dados que apóiem o uso destes compostos sejam escassos, um pequeno número destas drogas parece ter utilidade clínica no manejo da dor no câncer.
Os corticosteróides são o primeiro grupo de drogas a serem consideradas como coadjuvantes analgésicos. Essas drogas têm sido utilizadas com êxito no manejo da dor neuropática devido à compressão direta dos nervos e da dor devida ao aumento da pressão intracraniana. Pensa-se que os corticosteróides sistêmicos reduzem o edema perineural e linfático que pode estar contribuindo para a dor na compressão de nervos individuais. Este tratamento parece ser especialmente útil em casos de compressão da medula espinhal. O tratamento dessa compressão de nervos envolve doses relativamente altas de dexametasona (Decadron) (cerca de 30mg/ dia). Os corticosteróides são empregados melhor com base em tentativas. Uma dose única pela manhã ou duas vezes ao dia de 2-4mg/dia pode ser utilizada por um período de 10 a 14 dias.
Os anticonvulsivos são muitas vezes defendidos como coadjuvantes analgésicos. Eles suprimem os disparos (descargas) dos neurônios e têm sido empregados com êxito no tratamento de estados de dor neuropática, incluindo a nevralgia do trigêmeo e neuropatias periféricas. As drogas anticonvulsivas, provavelmente, exercem seus efeitos bloqueando os canais de sódio dependentes de voltagem, interferindo assim na transdução e talvez na despolarização espontânea observada nos neurônios danificados. Essas drogas devem ser iniciadas lentamente e aumentadas gradualmente, com atenção particular ao desenvolvimento de possíveis efeitos colaterais. Efeitos colaterais comuns incluem tontura, ataxia, sonolência, visão turva e irritação gastrointestinal. Além disso, a carbamazepina (Tegretol) associa-se à toxicidade da medula óssea, enquanto o valproato de sódio produz toxicidade hepática.
O uso de lidocaína e 2-cloroprocaina no tratamento de certas neuropatias periféricas refratárias a outros medicamentos analgésicos levou à investigação de outro grupo de drogas, que pode ser vagamente classificado como estabilizadores de membranas. Além da infusão intravenosa intermitente destes dois anestésicos locais, relatou-se que a administração oral dos congêneres da lidocaína – mexiletina e tocainida, foi útil em certos pacientes.
Verificou-se, há longo tempo, que os antipsicóticos potencializam o efeito analgésico dos opiáceos. Contudo, a maioria dos estudos utilizando essas drogas não são controlados, e o entusiasmo por seu uso continuado contrasta com a literatura disponível. As fenotiazinas são os antipsicóticos mais empregados para analgesia. Publicaram-se dados relativos à potência de 14 fenotiazinas diferentes em um ensaio não-controlado de dor experimental. Os resultados desses estudos sugeriram que a ação de poucas fenotiazinas potencialmente analgésicas, inicialmente, foi antianalgésica e apenas levemente analgésica após 2-3 horas.
A revisão das fenotiazinas, tanto na dor experimental como na clínica, revela que só a levomepromazina (metotrimeprazina) [Neozine] tem propriedades analgésicas estabelecidas. A levomepromazina parece ter cerca da metade da potência analgésica da morfina em pacientes com dor do câncer.
As benzodiazepinas muitas vezes são discutidas como coadjuvantes analgésicos. Essas drogas não têm nenhum efeito analgésico demonstrado. O diazepam foi extensamente estudado com relação à atividade analgésica, e não altera a sensibilidade à dor ou potencializa a atividade analgésica dos opiáceos. Contudo, essas drogas diminuem a resposta afetiva à dor aguda, e podem produzir alívio prolongado na dor crônica devido a transtornos músculo-esqueléticos, talvez por suas propriedades relaxantes musculares.
A hidroxizina é um agente anti-histamínico. Provou ter propriedades analgésicas em altas doses. Não aumenta consistentemente a analgesia conseguida com os opiáceos, mas potencializa o efeito dos opiáceos no componente afetivo da dor.
O grupo final dos coadjuvantes analgésicos a ser considerado são os estimulantes. Este grupo inclui as anfetaminas, cocaína e cafeína. A dor crônica do câncer foi tratada por quase um século com combinações de opiáceos e estimulantes no Coquetel de Brompton. Esta mistura contém morfina, cocaína e fenotiazina. A despeito de anos de experiência com essa mistura, nenhum estudo controlado demonstrou analgesia desta combinação superior a opiáceos isolados. A potencialização da analgesia pelos simpaticomiméticos já foi bem descrita. Sabe-se que a cafeína aumenta os efeitos analgésicos da aspirina e do acetoaminofen, e um estudo sugere que a dextroanfetamina dobrou a potência analgésica da morfina. O uso a longo prazo destes estimulantes na dor não foi avaliado sistematicamente. O uso dessas drogas provavelmente deveria ser limitado ao período de tentativa terapêutica de vários dias para determinar sua eficiência em pacientes individuais.
Opióides
Nos últimos anos, os pesquisadores identificaram várias substâncias químicas opióides endógenas com efeitos analgésicos. Entre essas estão as encefalinas e a beta-endorfina. Pelo menos quatro tipos diferentes de receptores para opióides foram localizados no cérebro e medula espinhal. Embora se saiba há séculos que o ópio tem propriedades analgésicas, a localização dos sítios ativos para o ópio não era conhecida. Técnicas de microinjeção utilizadas nos anos 60 identificaram a substância cinzenta periaquedutal do mesencéfalo e os núcleos da linha média do bulbo como os locais mais sensíveis.
Demonstraram-se receptores de opióides no cérebro e no tronco cerebral. Pouco depois, relatou-se analgesia duradoura subseqüente à introdução de opióides intratecais. A descoberta de que os opióides administrados pela espinha produziam analgesia estereo-específica, dose-dependente e reversível pelo naloxone levou ao desenvolvimento de uma importante ferramenta para se combater a dor.
Os opióides administrados sistemicamente produzem inibição dos reflexos nociceptivos em animais com a medula seccionada. Além disso, a administração de opióides ao corno dorsal da medula espinhal inibe a descarga de neurônios nociceptivos. Várias populações distintas de receptores para opióides foram identificadas. A estimulação dos sistemas mu e K (kappe), presentes na medula espinhal, deprimem a resposta aos estímulos nocivos.
Os sistemas opióides parecem ser ativos na modulação dos impulsos nociceptivos apresentados à substância gelatinosa, tanto através de ação direta como indireta da inibição descendente através dos sistemas serotoninérgico e noradrenérgico. Além disso, outros sistemas não-opióides parecem funcionar nesse nível, produzindo efeitos analgésicos. O baclofen e a clonidina também dependem dos efeitos ascendentes e descendentes para a antinocicepção. Os mediadores químicos que têm sido mostrados associados à analgesia nesse nível incluem a serotonina, norepinefrina, ácido gama-aminobutírio (GABA), neurotensina e acetilcolina.
Muitas concepções errôneas envolvem a utilização das drogas opiáceas, o que leva a uma marcada tendência para doses inadequadas e intervalos inapropriadamente longos na administração. Uma vez que a decisão tenha sido tomada de se utilizar os medicamentos opióides, é lógico e essencial utilizar um regime de doses eficientes. Além do planejamento, um tratamento com analgésicos opióides eficiente e individualizado para um paciente em particular, muitas vezes envolve o manejo dos efeitos colaterais. Os principais efeitos colaterais que limitam a eficiência do tratamento com os opióides são náuseas, vômitos, sedação e depressão respiratória. A incidência e severidade dos efeitos colaterais observados com diferentes antagonistas são, provavelmente, semelhantes em doses equianalgésicas. Mais do que restringir a dose dos opióides ao ponto em que o paciente fica livre dos efeitos colaterais, mas experimentando dor, deve-se considerar a administração de outro medicamento para tratar desses efeitos colaterais.
4. Sistemas de administração de Drogas
Os relatos continuados de alívio inadequado da dor, apesar do grande número de opióides desenvolvidos, indicam os problemas associados com a administração dos opióides, mais do que qualquer defeito das drogas individuais em si. Existem muitos sistemas de administração e regimes de dosagem diferentes, que podem oferecer um bom alívio da dor, quando usados adequadamente. A associação entre níveis sangüíneos estáveis de opióides e analgesia contínua deve ser lembrada ao planejar qualquer terapia opióide sistêmica. A dose efetiva das medicações opióides é a dose mínima que fornece alívio aceitável da dor, com uma baixa incidência de efeitos colaterais.
Opióides Orais
A depuração rápida da maioria dos opióides, combinada à extensa metabolização hepática, possui importantes implicações na dosagem oral. As drogas são absorvidas pelo trato gastrointestinal diretamente na circulação porta, onde seguem até o fígado. Assim, com a dose oral, uma porção significativa da mesma é metabolizada a produtos inativos antes que os opióides atinjam a circulação sistêmica. Esse fenômeno é descrito como efeito de "primeira passagem hepática", o qual, com a baixa biodisponibilidade observada com certos opióides, leva a percepções de que a administração oral dos opióides é inefetiva. Porém, uma analgesia satisfatória com dosagem oral pode ser obtida, se a atenção for dirigida à farmacocinética do opióide em particular a ser administrado, à biodisponibilidade oral da droga e à titulação da mesma para obter analgesia adequada em cada paciente.
Administração sublingual
O interesse crescente no melhor manejo da dor dos pacientes com neoplasias malignas terminais levou à investigação da administração sublingual. A via sublingual é particularmente útil em pacientes que não toleram medicação oral, pois ela causa náuseas, vômitos ou disfagia. Este método de administração possui vantagens teóricas, pois a cavidade oral é bem-perfundida, fornecendo um início rápido de ação; a absorção subseqüente resulta em administração sistêmica, em vez de portal. A absorção sublingual das drogas lipossolúveis (metadona, fentanil e buprenorfina) em solução alcalina mostrou fornecer concentrações analgésicas muito rapidamente. A utilidade dessa técnica, em comparação a outros métodos de administração, ainda necessita ser avaliada.
Administração retal
A administração retal de opióides tem sido defendida para pacientes que não podem deglutir ou aqueles com alta incidência de náuseas e vômitos com a administração oral. Os estudos da administração retal de meperidina indicaram uma biodisponibilidade similar à observada após dose oral: 50%.
Administração intramuscular
A abordagem mais comumente usada no manejo da dor pós-operatória é a administração intramuscular de morfina ou meperidina. A prescrição típica seria: Morfina, 10mg (ou meperidina, 100mg) IM a cada 3-4 horas se necessário para dor. Essa abordagem mostrou fornecer analgesia inadequada por muitas razões. O paciente pode não solicitar medicação, apesar de sentir dor severa. A enfermeira pode não administrar a medicação. A dose pode não ser adequada para as necessidades do paciente. Mesmo controlando todos estes problemas potenciais, os níveis sangüíneos variáveis, após a dose intramuscular, usualmente resultam em períodos de dor, alternados com períodos de toxicidade.
Administração subcutânea
A administração subcutânea de opióides tem sido usada durante décadas para fornecer analgesia. Recentemente, foi dada mais atenção a essa técnica, com a disponibilidade de pequenas bombas de infusão para administração contínua de opióides a pacientes ambulatoriais. As aplicações recentes incluem a infusão subcutânea para a dor do câncer e analgesia subcutânea controlada pelo paciente (APC). A infusão subcutânea parece atuar clinicamente como uma infusão contínua, mas estudos controlados com mais cuidado devem ser realizados para determinar se essa semelhança é verdadeira para todos os opióides.
Administração intravenosa
O uso de opióides intravenosos, por injeção intermitente e por infusão contínua, é conhecido há muitos anos como fornecedor da analgesia mais rápida e efetiva. A utilidade clínica desta técnica no manejo da dor no câncer foi recentemente revisada pelo Sloan Kettering Group. O suporte farmacocinético para esta observação clínica foi desenvolvido nos últimos anos.
Analgesia controlada pelo paciente
A ampla variabilidade interpacientes dos parâmetros farmacocinéticos discutidos aqui é uma razão primária para que a titulação da dose de opióides seja requerida para obter analgesia adequada. Embora o clínico possa fazer isso avaliando os pacientes em um tempo determinado após o início da terapia, a opção da analgesia controlada pelo paciente (APC) pode acomodar melhor as diferenças entre a teoria e a prática do alívio da dor. Com a APC, o clínico decide a droga a ser usada e a dose a ser administrada. O paciente pode decidir quando a dose deve ser administrada e o intervalo entre as doses.
Administração espinhal
O uso de opióides espinhais para o manejo agudo da dor data das duas últimas décadas. Comparado aos demais sistemas de administração discutidos acima, que usam a administração indireta de opióides ao sítio receptor através da circulação sistêmica, a administração espinhal é um sistema pelo qual os opióides são entregues diretamente aos receptores na medula, através de mecanismos locais. Relatos clínicos de analgesia de longa duração, obtida com os opióides espinhais, indicam efeitos colaterais freqüentes, incluindo náuseas, vômitos, sedação, prurido, retenção urinária e depressão respiratória. O termo opióide espinhal é usado para descrever a administração intratecal, epidural e intracerebroventricular de opióides; o restante desta discussão enfoca os opióides epidurais.
Grande parte da preocupação sobre a utilização de opióides espinhais enfoca a depressão respiratória. Essa pode ser precoce (associada ao pico sérico, após a administração epidural), ou tardia (talvez devido à migração rostral da morfina aos centros respiratórios sensitivos). Estudos de seguimento gerados por grandes grupos de pacientes suecos que receberam opióides espinhais indicam que a incidência de depressão respiratória tardia severa após morfina epidural é de, aproximadamente, 1 em 1000 pacientes.
Embora certas características demográficas de populações em risco tenham sido identificadas, a incapacidade de prever a ocorrência de depressão respiratória tardia em pacientes saudáveis indica a necessidade de maiores pesquisas em todos os pacientes que estão recebendo analgesia com opióides.
A administração espinhal de opióides é apropriada para a dor em, virtualmente, todas as regiões do corpo. A morfina administrada via espinhal demonstrou migrar ao longo de todo o comprimento da medula, mesmo quando injetada no espaço epidural-lombar. O alívio da dor por estes sistemas opióides espinhais foi demonstrado para a dor em dermátomos cervicais e mesmo no sistema trigêmeo.
Esforços continuados para refinar e avaliar os opióides espinhais devem ajudar a determinar a utilização apropriada dessa terapia. A alta qualidade da analgesia e os relatos de satisfação intensa dos pacientes, após a analgesia com morfina epidural, oferecem amplo suporte para a pesquisa neste campo.
5. Procedimentos Neurodestrutivos
O progresso continuado no manejo da dor com terapias multidisciplinares reduziu a utilização dos procedimentos neurodestrutivos. Apesar do sucesso continuado das técnicas menos invasivas e não-destrutivas, o bloqueio neurolítico ainda oferece tratamento adjuvante valioso da dor nociceptiva e neuropática no câncer terminal. Freqüentemente, um procedimento neurodestrutivo, adequadamente realizado, pode reduzir marcadamente o uso de medicação e controlar os efeitos colaterais indesejados, associados a altas doses de analgésicos. Virtualmente, todas as técnicas neurodestrutivas devem ser confinadas ao tratamento da dor nociceptiva. As alterações periféricas e centrais associadas à dor neuropática nunca são aliviadas por técnicas neurodestrutivas e, freqüentemente, são agravadas por esses procedimentos. Os bloqueios neurolíticos estão principalmente indicados para a dor unilateral localizada, exceto pela ablação da hipófise, que é aceitável para áreas difusas de dor.
6. Hipnose
As abordagens psicológicas centrais ao controle da dor também podem ser efetivas e são pouco utilizadas. Sabe-se, desde a metade do século XX, que a hipnose é efetiva até mesmo para controlar a dor cirúrgica severa. A hipnose e técnicas similares funcionam através de dois mecanismos primários: o relaxamento muscular e uma combinação de alteração perceptual e distração cognitiva. A dor não raro se acompanha de tensão muscular reativa. Os pacientes freqüentemente destacam a parte do corpo que dói. Entretanto, uma vez que a tensão muscular pode causar dor por si só em tecidos normais, e a tração de uma parte dolorosa do corpo pode produzir mais dor, as técnicas que induzem maior relaxamento físico podem reduzir a dor periférica. Assim, fazer com que os pacientes entrem em um estado de hipnose, de modo que se concentrem em uma imagem que sugere relaxamento físico como a flutuação ou leveza, freqüentemente produz relaxamento e reduz a dor.
O segundo maior componente da analgesia hipnótica é a alteração perceptual. Os pacientes podem ser ensinados a imaginar que a parte afetada do corpo está insensível. Isto é especialmente útil em indivíduos extremamente hipnotizáveis que podem, por exemplo, reviver uma experiência de anestesia dentária e reproduzir as sensações de dormência induzida pela droga em sua mandíbula, as quais podem então se transferir para a parte dolorosa de seu corpo. Metáforas de temperatura são especialmente úteis, o que não surpreende, dado o fato de que as sensações de dor e temperatura são partes do mesmo sistema sensorial, como notado acima.
Assim, imaginar que uma parte afetada do corpo está mais fria ou mais quente, utilizando uma imagem de mergulho em água gelada ou aquecimento ao sol, freqüentemente pode auxiliar os pacientes a transformar os sinais de dor. Alguns pacientes preferem imaginar que a dor é uma substância com dimensões que podem ser movidas ou que pode fluir para fora do corpo para, por exemplo, visitar outra sala na casa. Os indivíduos menos hipnotizáveis, freqüentemente saem-se melhor com técnicas de distração que os auxiliam a focalizar sensações concomitantes em outra parte do corpo.
Embora nem todos os pacientes sejam suficientemente hipnotizáveis para se beneficiar dessas técnicas, dois em cada três adultos são hipnotizáveis pelo menos parcialmente, e foi estimado que a capacidade hipnótica se correlaciona em um nível de 0,5 com a efetividade na redução da dor clínica.
7. Ganho secundário
O ganho secundário é um problema importante na dor crônica. O termo refere-se ao reforço secundário que acompanha uma perda primária, envolvendo a função física, capacidade de trabalhar, capacidade de engajar-se na atividade sexual ou outros fatores concomitantes à lesão e doença. Uma síndrome dolorosa pode ativar uma espiral social na qual um paciente perde o reforço comum proveniente do contato com os colegas de trabalho e da auto-estima que provém de ser produtivo. A depressão crescente pode resultar em uma perda de energia e incapacidade de interagir de modo compensador com os outros, levando à reclusão social. O contato social torna-se cada vez mais organizado, centrando-se nas queixas de dor. Os pacientes que parecem perder sua capacidade de despertar interações sociais agradáveis e recompensadoras exigem cada vez mais atenção dos profissionais da saúde, família e amigos em relação a suas incapacidades, o que contribui em parte ao ganho secundário. Um ganho secundário adicional pode vir na forma de evitação de responsabilidades indesejadas, como as pressões do trabalho ou aspectos conturbados da interação social, como a atividade sexual.
Outra forma importante de ganho secundário é o reforço financeiro. Os sistemas de incapacidade das seguradoras, freqüentemente, intensificam esta forma de ganho secundário, criando uma situação em que qualquer evidência da capacidade do paciente em retornar à função normal ameaça o suporte financeiro, o que, em essência, requer uma incapacidade completa. Nesse sistema, os esforços de reabilitação são usados como evidência de que nunca houve qualquer incapacidade séria inicial. E mais, atingir a classificação de incapacidade, freqüentemente, é um processo desagradável e demorado. Durante uma fase de consolidação após uma lesão aguda, quando os pacientes poderiam ser capazes de retomar a algum nível de funcionamento, apesar da continuação dos sintomas, estão, pelo contrário, empenhados em provar a extensão de sua incapacidade. Qualquer melhora resulta na redução ou eliminação do caso para algum pagamento de seguro.
Muitos pacientes são vítimas desse sistema. Outros o manipulam, exagerando sua incapacidade para obter benefícios financeiros, reforçando ainda mais a natureza do sistema. Por outro lado, muito mais pacientes são acusados desse exagero do que os que realmente o cometem.
Os fatores de ganho secundário, tanto social quanto financeiro, complicam substancialmente o tratamento; é melhor fazer todo o possível para minimizá-Ios. Estratégias sociais úteis incluem o princípio da terapia comportamental de solicitar aos membros da equipe de saúde e da família que forneçam atenção e reforço positivo para comportamentos não-relacionados à dor, enquanto reduzem o reforço para interações relacionadas à dor.
Conclusões
À medida que a Psiconeurobiologia continua a enriquecer a base de conhecimentos pela qual compreendemos as causas, transmissão e processamento da dor, pode-se tornar o tratamento da dor mais compreensivo, humano e efetivo. Existem múltiplos níveis nos quais o problema da dor pode ser abordado, incluindo a remoção de sua causa periférica, redução da tensão muscular que exacerba os estímulos dolorosos, o bloqueio da transmissão da dor através do estímulo elétrico competitivo, infusões no sistema nervoso central e drogas que bloqueiam a transmissão ou percepção dolorosa. Também existem importantes intervenções cognitivas que podem ajudar a reduzir o foco do paciente na dor e melhorar sua reação à mesma.