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O Tratamento Psicanalítico das Depressões – parte II

Dando continuidade aos nossos trabalhos enfocando as depressões, procuramos desenvolver, nesta parte II, um pouco mais os meandros teóricos pelos quais entendemos que passam os estados afetivos que precedem um quadro depressivo. Numa parte III, desenvolveremos o tocante à perda do objeto, e a conceituação central em psicanálise, que é a questão do desejo.
Pretendemos, com a continuação desse trabalho sobre as depressões, conceituá-la e esmiuçá-la ao máximo possível dentro do âmbito que procuramos estabelecer desde a primeira apresentação, na parte I.

Depressão: designa-se habitualmente tanto o quadro clínico, caracterizado pela presença de diversos elementos como: tristeza, inibição psicomotora, auto-acusação, visão pessimista da vida, etc., quanto a presença do estado afetivo de tristeza.

Costuma-se dizer que alguém está deprimido, quando este se encontra triste, mesmo quando faltem todos os outros elementos citados acima, os quais seriam constituintes do quadro. Notamos uma equiparação entre um dos sintomas com a síndrome como um todo, contudo queremos observar que se entende que é a tristeza que põe em marcha os outros sintomas. Dessa forma, as depressões formam parte da categoria nosológica dos transtornos de humor ou da afetividade.

Observe-se, contudo que existem quadros depressivos onde pode estar presente a tristeza e, não haver inibição, muito pelo contrário, o que está presente é a excitação psicomotriz. Esse é o caso da depressão ansiosa ou agitada.

O que queremos salientar aqui, é que existem quadros depressivos, onde nem toda a sintomatologia está presente de forma plena e completa. Então, a relação entre a tristeza, inibição e auto-acusações é uma relação muito complexa. Na verdade, cada um desses elementos possui a sua gênese, com as suas condições de produção próprias , que teremos que detectar.

Repetimos que não se pode falar de depressão no singular, uma vez que isso não corresponde aos quadros que tomamos contato na clínica. Por exemplo, falamos de depressão do luto normal, psicose melancólica, depressão neurótica, depresão anaclítica, etc. Observamos também que a tristeza sendo um afeto, segundo Freud , não pode ser inconsciente, além de constituir-se em processo de descarga. Freud , em seu trabalho "O Inconsciente", fez salientar que as idéias se reprimem(recalcam) e os afetos se suprimem, não permanecendo no inconsciente, produzindo seus efeitos. Estaríamos aqui então, falando de uma estrutura cognitivo-afetiva.

Qual seria , enfim a classe de idéias que fazem parte da depressão?

"Em todas essas condições se sente como inalcançável algo desejado, pretendido". Um desejo ao qual se está fixado é vivido como irrealizável. Por exemplo, no caso do indivíduo neurótico, notamos que este sente como inalcançável seu desejo de ser o ego ideal ante os próprios olhos e os dos demais; assim se sente não amado por seu superego e pelos personagens externos. Freud já nos dizia que a depressão é a reação frente à perda do objeto. Notemos que a perda do objeto é a condição de produção de um fenômeno, mas isso não explica o fenômeno em si.

Sugerimos que se retorne a Freud, naquilo que se refere ao caráter peculiar à depressão. Podemos notar que no anexo "C" do apêndice à "Inibição , Sintoma e Angústia", consigna que o fato de que a superação do luto seja penosa deve-se à "insaciável carga de anseio" que aquele que sofre concentra na pessoa morta. Esse afeto se refere a uma meta que não se alcança, a um desejo de algo; portanto, não se trata, simplesmente de um afeto senão que está presente no psiquismo, na qualidade de representações ideativas e daí a expressão formada por dois termos: carga de anseio, a qual Freud caracterizou como impossível de satisfazer.

Em que ponto estamos?

Convertemos a perda do objeto na condição da depressão e a impossibilidade de realização de um desejo em sua essência, no eixo por onde giram os quadros depressivos, agora teremos que definir, como se constitui um objeto libidinal e que relação este guarda com o desejo, bem como o que se deve entender como a perda do objeto e, principalmente, qual é a razão pela qual a perda produz a depressão, em suas diversas variantes.

Avançaremos nesse trabalho até a constituição do objeto libidinal, deixando as considerações sobre à sua perda e suas consequências, para um desenvolvimento posterior sobre o tema.

Constituição do Objeto Libidinal:

É sabido que o primeiro objeto capaz de provocar uma ativação prazerosa do lactente é o seio. No Cap. VII da "Interpretação dos Sonhos", quando fala sobre a realização de desejos, Freud fala sobre a experiência de satisfação, para dar conta desse encontro entre o bebê e o seio. Em poucas palavras, entendendo que não estaremos caindo no perigo de um reducionismo, poderemos dizer que, logo após o nascimento, ante uma necessidade de ordem biológica, por exemplo, a fome, esta é vivenciada pelo lactente como um desprazer, acarretando em um incremento de tensão, a qual Freud denomina de "tensão de necessidade". Pela existência de um objeto externo adequado, o seio que provê o alimento, a necessidade se satisfaz, permanecendo esta experiência inscrita no psiquismo, como "experiência de satisfação". Então, a evocação da "experiência de satisfação", vai ser o que Freud denominará de desejo, definindo-o como o movimento === processo, tendência para= que vai do polo do desprazer ao do prazer ou, mais especificamente, como a carga mnêmica da "experiência de satisfação". Assim, diríamos que: o objeto da experiência de satisfação será o objeto do desejo. Dessa forma , na "experiência de satisfação", não se resolve só um processo de ordem biológica, mas sim, obtém-se, simultaneamente, um "gozo erógeno".

Queremos fazer constar que na obesidade compulsiva, no âmbito da psicopatologia, poderemos notar essa separação entre a necessidade biológica e o gozo erógeno.

Aquí, estamos envolvidos com o conceito de "APOIO", ou seja: primeiramente estaremos diante apenas de uma tensão de necessidade (biológica), mas sabemos que ao mamar, a criança também tem estimulada sua zona buco-labial, língua, etc, sendo que mais tarde poderemos então falar de pulsão de auto-conservação, de início, e da pulsão sexual que nasceria apoiada nesta primeira:

pulsão sexual

pulsão de auto-conservação

Na "experiência de satisfação" há um duplo componente: a necessidade orgânica é saciável, uma vez tendo sido alcançado o equilíbrio físico-químico. Pelo contrário, na existência de algo que está além da necessidade, é que reside precisamente a possibilidade de que o desejo adquira o caráter de inesgotável.

Concluo por aqui, parcialmente, este trabalho, ficando para uma outra oportunidade o estudo referente à perda do objeto libidinal, bem como uma melhor caracterização do conceito central em psicanálise, que é o conceito de "desejo".

Bibliografia:

Freud, Sigmund – Obras Completas.
"O Inconsciente"; cap. VII "Interpretação dos Sonhos"; "Inibição,
Sintoma e Angústia"

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