É necessário averiguar se Jung está se referindo à homossexualidade como uma orientação sexual externa que conduz a uma atividade genital, ou a uma versão latente deste aspecto, ou a uma tendência do mundo interno. Há pouca dúvida de que ele via a prática homossexual como anormal, embora reconhecesse a necessidade psicológica de algumas pessoas de passar por um período homossexual. Por outro lado, a homossexualidade, como tal, é reconhecida como um componente da sexualidade. Jung comentava que não necessitaríamos de uma concepção dinâmica tal como libido ou energia psíquica se a sexualidade consistisse simplesmente em um quantum fixo de heterossexualidade. A homossexualidade pode ser um resíduo de sexualidade infantil polimorfa, porém, como um fator de mundo interior, é inevitável e, em potencial, psicologicamente valiosa.
Considerando as causas da homossexualidade, Jung parecia adotar perspectivas estruturais e de desenvolvimento, embora estas se superponham. Do ponto de vista da estrutura psíquica, a homossexualidade pode ser julgada como uma identificação com os componentes contrassexuais; anima e animus nos homens e mulheres, respectivamente. A opinião de Jung era de que o componente contrassexual amplamente inconsciente reflete o oposto do sexo anatômico de uma pessoa. A personalidade de um homem identificado com a anima assume um matiz feminino, a de uma mulher identificada com o animus, um matiz masculino. Em tais circunstâncias, o homem feminilizado irá procurar um parceiro masculino e a mulher masculinizada, um parceiro feminino. Presumivelmente, os parceiros são atraídos pela mesma psicologia. O homem pode ser considerado como tendo projetado sua masculinidade sobre um outro homem; a mulher, sua feminilidade sobre uma outra mulher. (A formulação é também aplicável ao casamento heterossexual.) Essa abordagem estrutural de Jung é ilustrada na situação clínica. Alguns homossexuais masculinos idealizam ou supervalorizam o pênis; este, na análise, redunda em representar sua própria masculinidade. Tais homens são propensos a formar transferências paternas com relação a homens mais velhos e mais estabelecidos socialmente. Algumas homossexuais idealizam a relação entre irmãs que percebem haver conseguido no relacionamento; uma supervalorização da feminilidade que projetaram.
Do ponto de vista do desenvolvimento, Jung via a homossexualidade como uma expressão de determinado tipo de relacionamento com o genitor do sexo oposto. Estava se referindo a um superenvolvimento, um forte laço, mais que o normal, um complexo superdesenvolvido de mãe ou de pai. O tabu do incesto impede a realização de impulsos heterossexuais e a homossexualidade seria o único modo de descarregar a energia sexual, deixando toda vitalidade emocional dentro do relacionamento da criança com o genitor do mesmo sexo.
Além do mais, a identidade da criança como não-heterossexual abre o caminho e torna seguro um tipo de casamento espiritual entre ela e o genitor do sexo oposto. Uma admiração recíproca é estimulada. Essa imagem do casamento assexuado de filho-genitor era, de acordo com Jung, um motivo amplamente difundido, que sugeria um tipo de totalidade e, daí possuía seu próprio poder atrativo.
A mãe, em particular, pode obter uma satisfação inconsciente da homossexualidade de seu filho homem. A opinião de Jung era de que isso a preenche espiritualmente, apesar de sua ansiedade e pesar consciente pela situação.
Jung também comentou o papel do genitor do mesmo sexo. É a imagem ameaçadora deste que fica entre a criança e o genitor do sexo oposto e força um desvio para um padrão não-heterossexual.
A idéia estrutural (projeção de elementos masculinos do homem e de elementos femininos da mulher) aqui também pode ser examinada. A imagem paterna pode ser a portadora dessa projeção e, daí, o pai se torna o objeto de desejo para o menino.
Mais tarde isso leva à homossexualidade. E um fenômeno semelhante verifica-se entre a menina e sua mãe. Além disso, a busca de uma mulher pela mãe boa que ela pode não haver experimentado também a conduz na direção homossexual.
Voltando à homossexualidade como uma tendência interior, Jung é explícito quanto a seu valor, particularmente quando vista como parte de um complexo positivo. Escreve o trecho abaixo sob o ponto de vista de um homem, porém, no considerável trecho dedicado à homossexualidade feminina, não há sugestão de que uma possibilidade correspondente esteja fora de questão. Um homem com um complexo materno positivo e tendências homossexuais também pode ter
"uma grande capacidade para a amizade, que muitas vezes cria laços de espantosa ternura entre os homens e pode, até mesmo, resgatar uma amizade entre os sexos do limbo do impossível. Ele pode ter bom gosto e um senso estético, fomentados pela presença de uma veia feminina. Então pode ser extremamente eficaz como professor por causa de seu discernimento e tato quase femininos. Provavelmente terá inclinação para a história e será conservador no melhor dos sentidos e apreciará o valor do passado. Com freqüência é dotado de uma riqueza de sentimentos religiosos e de receptividade espiritual."
Pode-se fazer uma distinção entre (a) a homossexualidade "narcísica", com raízes muito precoces e parte de um distúrbio narcísico da personalidade. Reflete uma busca compulsiva por controle e um medo do "outro" (daí, homossexual), mas o elemento sexual é secundário; e (b) a homossexualidade "edipiana", uma versão da identidade sexual legítima e sujeita ao mesmo tipo de dinâmica do Complexo de Édipo heterossexual. A categoria (a) pode ser considerada mais problemática psicologicamente do que a (b). Muitas das dificuldades encontradas pelo paciente edipianamente homossexual são de natureza cultural ou familiar.