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Casa de apoio social: uma entrevista com visão da psicanálise institucional

Resumo

Tendo como ponto central da argumentação os conhecimentos da teoria psicanalítica aplicada em instituições, o presente artigo justifica a necessidade de repensar a clínica psicanalítica, especialmente quando ela se faz em instituições, ou seja, outras instituições que não seja o consultório, que nos leva a pensar como sendo relevante uma percepção mais aguçada diante dos significados institucionais, considerando-se o contexto desse atendimento, que inclui, mas, não prioriza as particularidades de sua clientela, permitindo assim uma percepção mais ampla no sentido institucional, onde se aplicou todo o embasamento psicanalítico em uma Casa de Apoio Social situada na cidade de Manaus, que é também utilizado como abrigo provisório para crianças e adolescentes em situação de risco social. O artigo enfatiza a importância da intervenção da psicologia nas instituições, auxiliando as mesmas através de um trabalho de assessoria no enfrentamento dos preconceitos, dificuldades e conflitos que caracterizam seu funcionamento. 

Palavras Chave:  Abrigo – Psicanálise – Psicologia Institucional – Análise das entrevistas

Introdução

A Análise Institucional é um campo de conhecimento, formado a partir da psicanálise, ciências sociais, e filosofia. Articula um instrumental de análise e intervenção em instituições, com objetivo de potencializar grupos e comunidades para processos de mudança. Essa abordagem das organizações teve origem, com Kurt Lewin, nos EUA; com a contribuição de seus seguidores, constituiu-se uma Teoria e Prática em Psicologia  Organizacional.No presente artigo pretende-se explicitar os pressupostos da psicanálise institucional, sendo aplicada em uma Casa de Apoio Social que também funciona como abrigo provisório em Manaus, onde buscamos orientação na abordagem psicanalítica, direcionando todo esse conhecimento para a possível aplicabilidade na psicologia institucional. Para alcançarmos esse objetivo, buscamos desenvolver entrevistas com funcionários da Casa de Apoio Social, onde essas entrevistas contribuíram significativamente para podermos desenvolver uma analise da instituição como um todo. José Bleger (1990) seu livro vem contribuindo de forma fundamental para o desenvolvimento de uma metodologia de trabalho a nível institucional. Ele retoma e amplia os estudos sobre grupos, entendendo que a instituição é um grupo que resulta dos vários acordos que se estabelecem entre a organização e as pessoas a quem a organização delega as atribuições, contidas nas suas funções.Esse texto didático visa estabelecer um delineamento teórico-conceitual para o embasamento de ações concretas de diagnóstico e intervenção psicológicas, a fim de direcionar o trabalho com grupos, no contexto institucional da casa de apoio social, espaços em que o processo de aprendizagem se desenvolve em atendimento a um público extremamente dificultoso de se trabalhar. Ao voltar o nosso olhar para a psicologia Institucional, estamos nos voltando para o trabalho de assessoria a essa instituição como um todo, que têm como objetivo trabalhar as questões pertinentes às relações vinculares entre sujeitos em situação de crescimento pessoal e os caminhos de construção desse processo através dos colaboradores da Casa de Apoio Social, considerando os diferentes níveis de  implicações que decorrem da dinâmica dessa interação.

Casa de apoio social e suas características

Caracterização do local            

A Casa de Apoio Social – CAS esta localizada numa área residencial do Bairro de São Geraldo sito Av. Kako Kaminha nº 275. É uma instituição ligada a SEMDIH (Secretaria Municipal dos Direitos Humanos) que abriga crianças e/ou adolescentes moradores de rua sendo que, a maioria deles são usuários de substância química, porém em alguns casos o individuo não faz uso de substância química, mas, ainda assim pode ser beneficiado, diante de suas necessidades, pela casa de apoio social.            

A Casa de Apoio Social – CAS acolhe somente crianças e adolescentes do sexo masculino na faixa etária de sete a dezoito anos incompletos, porém também é feito atendimento psicossocial e encaminhamento ao sexo feminino. A equipe técnica é composta por um Assistente Social, duas estagiárias de serviço social, três psicólogos, três estagiários de psicologia. Também duas estagiárias de direito, três técnicas de enfermagem, dois auxiliares administrativo, uma coordenadora técnica interina e uma coordenadora administrativa, vinte e um monitores e um de serviços gerais.            

Na área externa, logo na entrada existe um espaço médio destinados aos transportes da Casa, esta é murada tanto na parte da frente como parte dos fundos. No fundo da Casa existe um pátio com espaço maior, porém sem cobertura, nele os abrigados desenvolvem atividades esportivas como futebol, vôlei, ping-pong, etc.            

Segundo (FONSECA 1987), a instituição de abrigo está muito presente no cotidiano dos menores adolescentes, fato comprovado quando dizem que foram nas instituições que se sentiram protegidos da violência em que viviam de modo que mesmo não sendo desejada, quando entra em suas vidas a instituição não tem forças negativas e destrutivas que marca as instituições mais tradicionais.            

O prédio que funciona a Casa de Apoio Social é formada por dois andares, sendo que, na parte técnica existe uma entrada que dá acesso a um espaço pequeno destinado a recepção. É onde a criança entra em contato com os monitores que acolhem, estes comunicam todos os procedimentos de rotinas da Casa.            

Golffman (1974) fala que são estas, instituições são mais abertas, com uma clientela mais definida, menores, com espaço para respeitar e manter a individualidade, que tem caráter temporário e, portanto não objetivam a permanência por um período muito longo, ficando dentro das determinações do abrigamento referidas no Estatuto da Criança e do Adolescente (1999).            

Após este espaço existe uma sala outrora pertencente à pedagogia atualmente ocioso que serve para os internos participarem das atividades lúdicas, trabalhos, atendimento de enfermagem, confecções de trabalhos manuais, cartazes, pinturas, jogos, palestras.            

Golffman (1974) na verdade relata que a instituição muitas vezes se apresenta (mesmo temporariamente) como a melhor alternativa para um grande grupo de crianças e adolescentes, o que determina a necessidade de um comprometimento ainda maior em suas ações, pois este é o único caminho para superação dos trágicos estereotipas de sua história.            

Também existe um refeitório destinado às refeições diárias, a mesma serve como sala de TV, neste mesmo espaço as crianças ou adolescentes passam a metade do dia junto monitoria recebendo as informações quanto às atividades propostas para o dia. Há um banheiro destinado a higienização dos usuários abrigados. Existe outro cômodo com espaço pequeno, onde permanece o bebedouro e a pia para lavar as louças. Também existe uma cozinha, um espaço para monitoria nele há um banheiro de uso coletivo dos monitores e armários. Na parte superior localiza-se salas, uma destinada ao setor administrativo, uma para psicologia, uma coordenação, uma sala o Serviço Social e Jurídico, dois dormitórios com banheiros para as crianças e adolescentes que permanecem abrigadas temporariamente.           

Marim (1998) fala que se acreditarmos que as relações são resultados das construções afetivas, onde ser compreendido, ser respeitado, ser amado, e a base necessária para o percurso satisfatório, então podemos pensar a instituição de uma forma diferente, tornando-a uma alternativa viável para a construção de sujeitos.

A psicanálise e a psicologia institucional

Os grupos estão presentes nas instituições, e estas recebem uma ampla variedade de definições na literatura especializada: (GOFFMANN 1961) descreve as instituições como sendo locais, tais como salas, conjuntos de salas, edifícios ou fábricas em que ocorre atividade de determinado tipo; (LAPASSADE 1983) define como instituições tanto os grupos sociais oficiais (empresas, escolas, sindicatos) como os sistemas de regras que determinam à vida desses grupos; sendo assim contribui (ALBUQUERQUE 1982) pensa a instituição, dando-lhe o nome de instituição concreta, como um conjunto de práticas sociais que se reproduzem e se legitimam, num exercício incessante de poder e (BLEGER 1984) vê a instituição como um conjunto de organismos de existência física concreta que tem certo grau de permanência em algum campo ou setor específico da atividade ou vida humana.

Lourau (1993) faz uma apresentação geral da Análise Institucional, apresentando um aspecto importante que ele chama de Novo Campo de Coerência e enfoca as relações e inter-relações existentes e encontradas. O campo de coerência surgiu em contradição com a Sociologia e em contradição com o saber eminentemente teórico da Sociologia. Lembremo-nos que os primeiros sociólogos fizeram escândalo e foram acusados das piores intenções contra a ordem moral. Mas eles destronaram a Religião e a Filosofia.

As novas explicações para o social que, hoje, formam um novo campo de coerência, não foram aceitas pelo instituído de então. Durkheim, por exemplo, teve inúmeras dificuldades para impor seu trabalho. Durkheim foi instituíste. Seu campo de coerência aparecia à época como loucura. O mesmo aconteceu com Freud quando propôs a Psicanálise: seu campo de coerência foi percebido, qual o de Durkheim, como incoerente. Já foi loucura pretender, como Freud, que a sexualidade tivesse um papel essencial em toda e qualquer atividade humana". (Lourau, 1993, p. 9).José Bleger (1990) vem nos trazendo contribuições fundamentais para o processo de desenvolvimento de uma metodologia de trabalho a nível institucional, Ele retoma e amplia os estudos sobre grupos, entendendo que a instituição é um grupo que resulta dos vários acordos que se estabelecem entra a organização e as pessoas a quem a organização delega as atribuições, contidas nas suas funções, ou seja, é a partir do seu entendimento da dinâmica institucional, que passa a enfatiza a importância de discriminarmos os objetivos do psicólogo e os objetivos da Instituição.

Propondo que a psicologia institucional se constitua num processo de investigação e ação, onde o método clínico de indagação operativa é o instrumento básico de pesquisa possa questionar também o papel social do psicólogo, chamando atenção sobre a melhor administração dos recursos deste profissional, propondo uma abordagem preferencial preventiva e de promoção de saúde.A psicologia institucional não é um ramo da psicologia aplicada, mas sim um campo da psicologia, que pode significar em si mesmo um avanço extraordinário tanto na investigação como no desenvolvimento da psicologia como profissão. Não se pode ser psicólogo se não é, ao mesmo tempo, um investigador dos fenômenos que se querem modificar e não se pode ser investigador se não de extraem os problemas da própria prática e da realidade social que se está vivendo em um dado momento, diante de uma instituição, o psicólogo centra sua atenção na atividade humana em que ela tem lugar e no efeito da mesma, para aqueles que nela desenvolvem dita atividade.

Objetivos da instituição e objetivos do psicólogo

Em Bleger (1990) encontramos esclarecimentos acerca de que toda instituição tem objetivos explícitos tanto como objetivos implícitos ou, em outros termos, conteúdos manifestos e conteúdos latentes, sendo assim o objetivo do psicólogo no campo institucional é um objetivo de psico-higiene: conseguir a melhor organização e as condições que tendem a promover saúde e bem-estar dos integrantes da instituição, ou seja, o psicólogo institucional pode se definir; neste sentido, como um técnico da relação interpessoal ou como um técnico dos vínculos humanos e, pode se dizer também que é o técnico da explicitação do implícito, ajudando a compreender os problemas e todas as variáveis possíveis dos mesmos, mas ele próprio não decide, não resolve nem executa. Lourau (1993) irá dizer que o escândalo da Análise Institucional talvez seja, justamente, o de propor a noção de implicação. Além disso, sua política traz como motriz o conceito de autogestão, que acontece em uma contradição total, já que a vida cotidiana se organiza no terreno da heterogestão, onde as relações de poder são demarcadas, ou como diz Lourau, nós funcionamos, em todos os lugares sob a heterogestão, ou seja, geridos por outrem, e a vivemos, geralmente, como coisa natural.Bleger (1990) nos trás significativas compreensões acerca do papel do psicólogo como assessor ou consultor deve ser rigorosamente mantido, deixando a solução e execução em mãos dos organismos próprios da instituição: o psicólogo não deve ser em nenhum caso nem um administrador nem um diretor nem um executivo, nem deve sobrepor-se na instituição como um novo organismo.

Chiattone (2000) ressalta, contudo, que, muitas vezes, o próprio psicólogo não tem consciência de quais sejam suas tarefas e papel dentro da instituição, e em muitas vezes habilidades suficientes para lidar com os diversos contextos que surgem diante do ambiente institucional como a casa de apoio social, daí então que, pode-se dizer que essa problemática é principalmente por que as universidades pouco enfatizam essa área, priorizando principalmente a formação clinica tradicional, ao mesmo tempo em que as instituições como um todo também tem dúvidas quanto ao que esperar desse profissional. Se o psicólogo simplesmente transpõe o modelo clínico tradicional para a instituição e verifica que este não funciona como o esperado, onde nos parece que essa situação bastante freqüente, isso pode gerar dúvidas quanto à cientificidade e efetividade de seu papel. Duran (1994) discute as diversas propostas relacionadas à formação dos psicólogos, apresentando uma síntese de recomendações. O crescente assalariamento do psicólogo requer uma revisão da formação baseada no modelo de profissional liberal, que discrimina o trabalho em situação institucional. A formação deve voltar-se para a realidade da maioria da população brasileira e enfatizar as competências genéricas do psicólogo. O contato com diversas áreas deve possibilitar a generalização do conhecimento e não a aquisição de aptidões especifica. A formação deve desenvolver a capacidade de problematizar e buscar soluções. Teoria e prática, assim como formação científica e profissional são indissociáveis. A formação ética deve situar-se como figura, em uma disciplina, mas principalmente como fundo das várias atividades do curso. Devem estar presentes as visões de conhecimentos que estão relacionados à Psicologia, como a Antropologia e Filosofia.

Resumo das entrevistas 

As entrevistas feitas no dia 27 de Abril do corrente ano na Casa de Apoio Social nos permite visualizar o clima das relações sociais em que se encontra a instituição.Nossa primeira entrevistada se chama D.M.N. de 39 anos sua formação é Técnica de Enfermagem está cursando Serviço Social na UNINORTE, sua experiência anterior foi no Distrito Industrial de Manaus na Fabrica SANIO.Ao deixar o distrito industrial entrou para a secretaria de Direitos Humanos nesta instituição foi remanejada para Casa de Apoio Social. Porem em seu discurso deixa expresso que tinha três opções de escolha, porém escolheu a Casa de Apoio Social pelo fácil acesso de transporte.Em sua função na Casa de Apoio Social diz sentir-se bem no que faz. Bem espiritualmente, pois tem gente que faz só para receber no trabalho. Quanto a ela se realiza em todos os sentidos.Em sua fala D.M.N. vê os abrigados como vítimas e não como “bandido”, discorre sobre seu trabalho na organização onde se volta para cuidar dos que encontra-se abrigados, desenvolvendo marcação de exame, avaliação física, palestra e visitas. No que diz respeito a sua equipe de trabalho. Deixa claro que a comunicação entre seus membros é através do livro de ocorrência de enfermagem ou por telefone. Ao perguntarmos do que D.M.N. gosta na organização, que todos os cadastrados fizessem o exame laboratorial, tivessem acompanhamento do Técnico (os cadastrados no Programa Criança Urgente). O Serviço Social falou que não é possível, pois estaria tirando a responsabilidade da mãe.Nossa segunda entrevista foi realizada com I. C. V de 24 anos e desenvolve função na instituição como estagiaria estando no 8º período de psicologia na UFAM. Antes de entrar na organização desenvolvia um estagio na secretaria dos direitos humanos – SEMDIH, porém estava descontente, pois não era um estagio voltado para sua função acadêmica era mais administrativa.

Ao entrar para organização da Casa de Apoio Social diz passou a ter oportunidade de estagiar na área de psicologia. Depois que entrou na organização diz sentir-se bem, pois tem contato direto com os profissionais de psicologia.Quanto as suas funções na organização falou de algo provisório e que os profissionais tentam criar um vínculo familiar.  Ela percebe que os profissionais são interessados sendo importante para o desenvolvimento do aprendizado. Quanto a equipe de trabalho a mesma acha ótima, pois desenvolve uma boa interação entre o grupo de psicologia e serviço Social. Quanto ao gosto de I.C.V. na organização em sua fala coloca que gosta de interação e traz no seu discurso a pressão, a competitividade que tinha no trabalho anterior e que neste não existia. Pois todos priorizam a união mesmo com as dificuldades. Quanto às mudanças se pudesse fazer acha que o trabalho funciona bem, gostaria que a prefeitura apoiasse mais e melhorasse na infra-estrutura além de melhorar na remuneração dos profissionais.Nosso terceiro entrevistado foi A. J. B. de 34 anos e desenvolve na instituição a função de estagiário do 9º período de Psicologia da ULBRA. Segundo A.J. B. entrou na organização via oficio da SENDIH. Não chegou a ficar nem uma semana em outro programa chamado Agente Jovem quando recebeu um convite para se apresentar na casa de Apoio Social.
Este se sente bem, desenvolvendo atividades na Casa de Apoio Social, esse bem relacionado à responsabilidade social, do que pelos ganhos.

Suas atividades desenvolvidas nesta organização são os atendimentos aos meninos moradores de rua da cidade de Manaus e suas famílias. Realizando juntamente com a equipe multiprofissional os atendimentos domiciliares e individuais.Segundo A. J. B. a equipe que ele trabalha é multiprofissional e atualmente perde a pedagogia, que foi remanejada para o CIACA (Centro Integrado a Criança e ao Adolescente). Fala que a equipe está reduzida, porem de certa forma procura interagir com que tem. Diz que a equipe tem compromisso, porém entre as limitações do poder público oferece. Quanto ao que gosta na organização. Diz gostar faz o que é possível, porém, entre as limitações que o poder público oferece do trabalho em si, o que se faz de modo geral, gosta dos atendimentos, das visitas nas residências dos adolescentes. Ao perguntar-lhe se pudesse fazer mudanças na organização, este não respondeu e nem fez comentário algum.

Análise das entrevistas         

As entrevistas foram realizadas na Casa de Apoio Social – CAS com uma técnica de enfermagem e dois estagiários de psicologia que atuam juntamente com a equipe técnica, esta é composta por um Assistente Social e três psicólogos. Antes de iniciar a entrevista com os entrevistados, foi feito o enquadre explicando o objetivo da mesma, os mesmos não se mostraram resistentes quanto à entrevista. 
           

A primeira entrevista foi realiza com D.M.N. de 39 anos. Possui formação Técnica de Enfermagem onde a mesma realizou no Centro Literatus, também fez um curso na área  de enfermagem do Trabalho ( realizado no Senac). Hoje esta cursando faculdade na área de Serviço Social na UNINORTE.
 
Referente a primeira pergunta D.M.N. foi remanejada para esta organização, vindo transferida de outra secretaria. “Quero ficar num lugar onde fique o acesso aos ônibus”. Podemos analisar a preocupação da distância de seu trabalho, pensando em seu próprio bem e em si mesma e não no grupo como um todo. Disse querer ficar num lugar onde ela pudesse ter o melhor acesso ao transporte coletivo. Diante disto, pode-se afirmar que D.M.N. mostrava uma preocupação significativa acerca da distância do local de seu trabalho.
 
Quando a mesma afirma estar bem espiritualmente, mas que lhe preocupe a questão de outras pessoas que trabalham visando ganhos financeiros. A mesma projeta para os outros o que neste momento lhe está incomodando, porém são seus próprios conteúdos que estão emergindo.
Segundo (ANZIEU 1993) o inconsciente produz em todo lugar e sempre efeitos contra os quais os homens não param de se defender, ou que interpretam falsamente ou ainda que procuram manipular por vias obscuras para um suposto benefício. A condição para que esses efeitos se tornem cientificamente tratáveis reside na instauração de uma situação regida por regras precisas, onde a produção seja transferida e sua interpretação exata assegurada.
 
Em sua fala D.M.N diz ver os adolescentes como vítimas e não como “bandidos”, porém percebe-se uma negação de sua real visão acerca dos adolescentes aos quais ele convive.
 
Em se tratando da equipe de trabalho a mesma fala gosto do trabalho e das pessoas que fazem parte da equipe. Daí percebe-se então que ela fez uso de mecanismo de defesa caracterizado como sublimação, pois a mesma faz uma reparação e restauração do bom objeto despedaçado pelas pulsões de destruição, que é o ambiente de trabalho e as pessoas.
 
Quando se pergunta, caso ela pudesse fazer mudança na instituição o que faria. A mesma traz em seu discurso a grande mãe existente em si. Em outro dado momento D.M.N. coloca que faz o curso de serviço social. Em seu discurso mostra um descontentamento social com a atual projeção. Enquanto ao curso de Serviço Social que esta cursando. Uma mudança diante dos dois cursos. Percebe-se motivo pelo qual do curso perpassa pelo desejo de esta atuando uma figura matriarcal, cuidadora, minimizando seu sofrimento por estar atuando no serviço técnico de enfermagem.
 
A segunda entrevista foi realizada com I. C. V. de 24 anos estagiária de psicologia do 8º período da UFAM.
 
Antes de entrar na organização desenvolvia um estagio na secretaria dos direitos humanos – SEMDIH, porém estava descontente, pois não era um estagio voltado para sua função acadêmica era mais administrativa. De acordo com (DEJOURS 1992) num trabalho rigidamente organizado, mesmo se ele não for muito dividido, parcelado, nenhuma adaptação do trabalho à personalidade é possível. As frustrações resultantes de um conteúdo significativo inadequado às potencialidades às necessidades da personalidade podem ser uma fonte de grandes esforços de adaptação. Mesmo as más condições de trabalho são, no conjunto, menos temíveis do que uma organização de trabalho rígida e imutável.  

Em sua entrevista estagiária demonstra uma insegurança. Dúvidas com respeito ao curso que faz. Destacamos também quando diz o que faz na organização é algo provisório, onde a mesma não se vê inserida na equipe. Diante disso, existe na equipe uma instabilidade entre o próprio grupo, a falta de interação, competição, a busca de pertencimento ao grupo, de ser acolhida.
 
Jean (2005) aborda sobre a conflitualidade grupal que desperta formações conflituais do inconsciente. Reativados, conflitos internos podem ser fontes de sofrimento e de mal estar, de repetição e de reprodução de elementos traumatizantes da história de cada um. 

Há uma necessidade de ser aceita, de ser apoiada pela equipe, mesmo estando provisoriamente, sendo assim quando se pergunta se pudesse fazer mudança o que faria? A mesma traz em seu discurso melhora na infra-estrutura da organização, ela fala da sua identidade enquanto acadêmica de psicologia. 

A terceira entrevista foi realizada com A. J. B. de 34 anos estagiário de psicologia do 9º período da ULBRA. Em seu discurso A. J. B. diz sentir bem na função que exerce até pela responsabilidade social do que pelos ganhos. Diante desse discurso, percebe-se o significado do valor financeiro que se encontra implícito. Dado em outras falas suas dificuldades enfrentadas em custear seus estudos e outras dívidas.

Quanto as suas atividades desenvolvidas na organização, o mesmo se coloca numa posição de igualdade técnica existe uma necessidade de querer ser aceito pela equipe de profissionais principalmente do grupo “intelectual”. BLEGER (1971) enfatiza três tipos de indivíduos ou grupos, um desses grupos é formados por indivíduos dependentes ou simbióticos, que vão utilizar imediatamente os grupos como grupo de dependência ou de pertencimento; tentaram estabelecer sua identidade através da identidade grupal com a identidade mais completa atingida durante seu desenvolvimento.

Ao falar da equipe multiprofissional este coloca a perda e a redução do quadro técnico, porém de certa forma procura. Por procurar afirma-se que esta perdido e, portanto, procura interagir como o que “tem”. Esse tem é mais conhecimento, mais poder para se aproximar fato que este compensa na necessidade de ser aprovado ou aceito pelo grupo.

Quando A. J. B. fala do que gosta na organização, o mesmo não do trabalho em equipe. Percebe-se resistência em falar da organização logo, ele não se vê inserido na equipe.
Quanto pergunta-se se pudesse fazer mudança o que faria?  A J. B. ficou em silêncio não respondendo, implica numa fuga de si mesmo, de expor conteúdos seus apresentando claramente em suas respostas curtas em suas entrevistas.
 

Análise do conjunto das entrevistas
 
Com as intervenções feitas com objetivo de analisar a dinâmica interna da instituição percebemos que tanto nos grupos de enfermagem e de estagiários de psicologia não existe interação, comunicação apresentando conflitos latentes em seus discursos, defesas coletivas, insegurança, competição, medo, resistência as mudanças. Uma vez que o sistema institucional não é visto pelo poder público e pela sociedade, acerca deste assunto, buscamos contribuições no que concerne o significado de uma sociedade “normal e anormal”, em (BLEGER. 1998 p. 96).

“A sociedade tende a instalar uma clivagem entre o que se considera sadio e doente, entre o que considera norma e anormal. Assim estabelece uma clivagem muito profunda entre ela ( sociedade “sadia” ) e todos aqueles que, como os loucos, os deliquentes e as prostitutas, são desvios, doenças, que – supõe-se – nada tem haver com a estrutura social. A sociedade se autodefende, não dos loucos, dos deliquentes e das prostitutas, mas de sua própria loucura, de sua própria delinqüência e de sua própria prostituição, e desta maneira aliena, desconhece e trata como se fossem alheias e não lhe corresponde”. 

Tendo em vista em se tratando de crianças e adolescentes em situação de rua soma-se a isso o medo inconsciente do risco de vida, pois vez por outra, ocorrem situações de perigo dentro da instituição. Para controlar esse medo os monitores, estagiários e equipe técnica elaboram defesas específicas onde não se fala desses riscos.

Conclusão

De acordo com a análise realizada nesta instituição avaliamos que a mesma trata-se de uma estrutura burocrática, ou seja essas estruturas burocráticas dentro de uma organização ou instituição funcionam de forma mecanicista. Pois trata de regras e normas de funcionamento e deixam claramente definidos as funções de modo impessoal. Sabemos que todos os membros que fazem parte de uma organização são destinados a se conformar com as regras que são determinadas pelo superior que possui toda a autoridade sobre a organização, esse fato é comprovado no dia a dia da Casa de Apoio Social, pois a equipe de trabalho não pode tomar decisões sem que esta equipe responda a gerencia que está acima dela. Diante dessa autoridade existente, a mesma caracteriza-se como sendo hierárquica tendo uma estrutura de forma piramidal. (BLEGER 1984) fala sobre as estruturas que são descritas através de organograma, onde estão situadas as relações hierárquicas ocasionando divisão estrita do trabalho. Ressaltamos que o organograma é uma representação de estrutura e não uma “estrutura” da organização, representando uma organização hierárquica desejada.
 
Bion (1961) enfatiza sobre as reuniões existentes na organização. Segundo o autor as reuniões quando são realizadas apresenta a função de informação ou de coleta de dados, em vez de ser um grupo de trabalho, onde se reúne para realizar uma tarefa específica existente, um lugar de elaboração e de transformação das informações como os profissionais de campo podem fazê-lo, dando importância à função e não a pessoa que preenche a função, como podemos exemplificar a respeito da contratação, ocorrendo somente a função é atribuída pelo título ou por concurso.
 
Na Casa de Apoio Social o psicólogo que pretende atuar no campo institucional, tem como objetivo de trabalho realizar a psico-hiegiene, melhorar a organização promovendo saúde e bem-estar dos membros que fazem parte da instituição, reintegrar a equipe que encontra-se fragilizada devido as situações que ocorrem no cotidiano. Segundo (BLEGER 1984) o trabalho de psicologia institucional requer uma investigação mais ampla e profunda o que nos permite utilizar técnicas e critérios a empregar tanto o caráter do problema que temos que enfrentar. Toda tarefa de investigação só podem ser entendidas com a utilização do método clínico. Dentro do método clínico guiamo-nos pelo enquadramento introduzido pela técnica psicanalítica adaptando as necessidades e aos problemas que deveram ser enfrentados, pelos membros da casa de apoio social.

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