Pesquisas conduzidas com todo o rigor científico mostram que é possível ensinar leitura com compreensão partindo-se de palavras inteiras. As crianças aprendem a ler não só palavras ensinadas diretamente, mas também generalizam essa aprendizagem para a leitura de palavras novas, isto é, compostas a partir da recombinação de sílabas de palavras aprendidas na situação de treino. Por exemplo, uma criança a quem se ensinou ler LOBO e BOCA pode ler corretamente e com compreensão a palavra BOLO, mesmo sem ensino direto. No entanto, o que se nota nessas pesquisas é uma grande variabilidade nos dados de generalização, isto é, algumas crianças generalizam mais do que outras, havendo algumas que simplesmente não generalizam. Se tal variabilidade ocorre quando se ensina a partir de palavras em situação de pesquisa, em que cada criança é ensinada individualmente, o que ocorreria ao se ensinar a partir de textos completos em situação de sala de aula, com dezenas de alunos? Parece que os dados do SAEB e do PISA apontam para a resposta.
Outras pesquisas mostram que quando se lê livros regularmente para as crianças desde tenra idade, o resultado é que elas aprendem a ler com mais facilidade e em menor tempo do que aquelas que não foram expostas a tal procedimento. Famílias de baixa renda têm pouco acesso a livros. É de se imaginar que nessa parcela da população a leitura de livros para crianças por adultos seja mais exceção do que regra. O ensino da leitura a partir de textos integrais pode estar beneficiando crianças que já têm um histórico favorável, mantendo à margem aquelas provenientes de contextos menos privilegiados.
É hora, portanto, de revermos algumas posições que vinculam métodos de ensino e tendências político-ideológicas. Se a idéia era transformar crianças em leitoras de mundo, críticas e reflexivas, capazes de operar transformações na sociedade, o que temos visto é exatamente o oposto. Ademais, a divisão entre processos psicológicos superiores e inferiores, que deveria ser meramente didática, acabou sendo tomada de maneira equivocada e quis-se construir a partir do telhado. Decodificar é uma habilidade necessária, fundamental para o desenvolvimento do bom leitor. Não é um fim, mas o primeiro passo na direção do cidadão que a sociedade está a exigir.