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A Terceira Via

Tenho pensado em algumas questões sobre a dinâmica da terapia e a relação que se estabelece dentro do consultório entre terapeuta e cliente. A maioria dos clientes que recebo, chega ao consultório com muitas expectativas, ansiosos por respostas; soluções. Por isso, o início da terapia é muito importante e precisa de uma atenção especial. É preciso buscar a sintonia com as necessidades do cliente, ouvi-lo em sua dor, ajudá-lo a colocá-la em palavras para que se possa ter acesso ao seu afeto, sabendo que muitas vezes nem mesmo assim isso é possível. Dessa forma, as primeiras sessões são muitas vezes catárticas, trazem para o cliente uma sensação de alivio e bem-estar fazendo com que ele acredite que a mudança que tanto busca já está acontecendo. Iniciar algo novo para muitos já funciona como um motivador para a vida. Não seria diferente com a terapia.

Muitas pessoas relatam ter a sensação de que estão enfim “fazendo a coisa certa”, “cuidando de si mesmas” e esse sentimento quase mágico faz parecer que tudo está caminhando bem. E aí o cliente “empaca”, trava, bloqueia, não avança, começa a achar que não tem mais nada a dizer após as sessões iniciais que acabam sendo muito descritivas, quase um relato-sintese da sua vida, um “passar a limpo” que é claro traz um bem-estar. Afinal de contas “falar é terapêutico” e mais ainda quando se tem está falando com um profissional. Por tudo isso, é preciso desde o inicio da terapia questionar o cliente sobre suas expectativas com relação ao atendimento, o que ele espera encontrar com esses encontros, o que busca, o que o incomoda, o que esta difícil. Ouvir o cliente é um exercício, dificílimo. Implica em colocar de lado as suas crenças e pré-conceitos para ouvi-lo sem julgamentos. Diria que é impossível. Somos, como terapeuta, profissionais cheios de crenças e opiniões sobre tudo e, ao ouvir aquele sujeito, automaticamente vamos construindo um mural com as informações que nos são dadas, até montarmos uma idéia de quem é aquela pessoa a nossa frente. Precisamos disso para nos sentir confortáveis. E é um exercício para a vida aprender a ouvir nossos clientes, afinar a escuta e sermos menos donos da verdade e do saber. Ao meu ver, ao partir da crença de que é impossível não ser você ao ouvir o outro,ficamos mais livres para criar. De que forma? Criar o que? Através de uma proposta genuína, verdadeira, de se experimentar uma outra forma, um outro sentido para aquilo que está sendo vivenciado e dito, ou seja, não se fechar em sua convicção e diagnóstico, não aceitar de pronto as convicções do cliente e sim, propor um terceiro caminho, uma terceira via, um novo sentido. Para que isso seja feito,é preciso que o terapeuta esteja disposto a ele próprio abrir mão de suas certezas e convicções e experimentar o lugar da dúvida. Ao fazer isso, ele se empresta ao cliente, demonstrando que estar nesse lugar faz parte da condição humana e cabe a nós decidir como sair dele.

O cliente pode ficar confuso ao se deparar com essa proposta, quando esperava por uma resposta mais rápida. É papel do psicólogo fazê-lo refletir sobre a importância de se estar implicado em suas escolhas. Experimentar a terceira via é estar aberto a um novo sentido para a vida.O terapeuta se empresta ao cliente naquele momento. Não aponta caminhos, nem dá respostas, mas convida a reflexão, está junto, sendo solidário, empático e firme quando necessário.O terapeuta precisa respeitar e estimular o cliente a ele mesmo encontrar respostas e o sentido do trabalho que está sendo feito, do contrário, não há motivação que sustente a relação terapêutica. Ao perceber que o cliente está passando por esse momento na terapia, é necessário que o terapeuta possa usar de sua habilidade e sensibilidade para esperar o movimento do cliente ou ele mesmo propor a reflexão sobre esse impasse; o que pode fazer uma grande diferença na dinâmica da terapia. Chamar à reflexão significa muitas vezes conversar sobre o sentido da própria terapia na vida daquelas pessoas. Falar sobre a necessidade de se ampliar o que está sendo visto, falado, experimentado dentro do consultório para a vida fora dele, onde o cliente passa a maior parte da sua vida, e que isso só pode ser feito a partir de uma busca pelo sentido daquela experiência. Esse sentido passa muitas vezes em uma tomada de consciência de que a terapia de nada serve se não tiver conexão com a sua própria vida, ter sintonia com as suas necessidades, estar aberto a mudanças, ser flexível, reflexivo.

Dizer ao cliente o que ele precisa ou deve fazer é emprestar o nosso sentido de vida para ele, sem fazê-lo refletir sobre seu próprio sentido. Ou seja, não faz sentido, não serve para nada
.O cliente é convidado a encontrar novos sentidos para as situações da vida – de dor, de dificuldade, de crises existenciais, de mudança de fase de vida no ciclo vital, de escolhas a serem feitas, de obstáculos a serem superados. Ao se encontrar esse sentido para a terapia e também para a vida, é possível entrar em uma nova etapa de ambas, rica e produtiva, porque cheia de sentidos. Outras questões ainda estão sendo refletidas e serão desenvolvidas no próximo artigo. Quando mudar de fase na terapia? É o psicólogo que sinaliza essa mudança? Como trabalhar a linguagem e a comunicação no setting terapêutico? Quando esgotamos tudo o que poderia ser feito ou visto de um determinado assunto? Isso é mesmo necessário? Quando encerrar uma terapia? Gostaria de ouvi-los aqui no nosso espaço na coluna ou enviem comentários e reflexões para o meu e-mail [email protected]

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