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Alzheimer por Laura Botelho

Introdução

Doença descoberta pelo psiquiatra alemão Dr. Alois Alzheimer, no início do século XX (1907), as células cerebrais começam a morrer e formam cicatrizes em forma de estruturas microscópicas que se designam de Placas Senis. Com o acúmulo dessas placas, aliadas à morte dos neurônios, o cérebro é impedido de funcionar convenientemente.

A escritora niteroiense Laura Botelho em seu livro "Alzheimer – a doença da alma", publicação da Russell Editores, narra sua experiência pessoal com esses portadores durante mais de 15 anos.

O texto tem linguagem simples e direta que ajuda o leitor a identificar alguns pequenos sinais, alguns sintomas iniciais da doença de Alzheimer objetivando antecipar problemas futuros, minimizando o impacto do mal no seio familiar, tomando assim estratégias simples e maneiras de melhor cuidar desse ente querido doente. É uma doença custosa que já atinge mais de 25 milhões de pessoas no mundo todo. Um novo caso surge a cada sete segundos. Laura Botelho teve em sua família dois casos de Alzheimer – uma tia paterna (já falecida) e sua mãe (ainda presente) e nos relata um pouco da sua história, que ainda não terminou.

LIG – Por que escrever um livro sobre Alzheimer?

Laura Botelho – Passamos sérios problemas de ordem pessoal em relação a doença de minha mãe que sofre desse mal há mais de 10 anos. No início foi difícil ajudá-la. Não tínhamos muita informação sobre a doença. Fiz muita pesquisa, falei com muita gente, médicos especialistas, li muitos livros, recortei notícias de jornais, enfim, montei um banco de dados sobre todos os recursos, que nós deveríamos ter para ajudar a amenizar os desconfortos que ela estava passando, já que os remédios não conseguem controlar todos os problemas. É uma doença sem cura e sem muitas respostas também. Há três anos, passados os momentos críticos de uma disputa judicial referente à Interdição de nossa mãe (que durou uma eternidade e com resultados devastadores para a família), me vi diante daqueles papéis, anotações e pesquisas. O que fazer com isso? Jogar no lixo?

Seria muito desperdício de energia. Pensei então em organizar tudo e montar um livro, um guia simples de forma a ajudar as pessoas que ignoram totalmente a doença, assim como a minha família, naquela época. Por várias vezes presenciei cenas horríveis de pessoas sem tato, sem informação, agredindo de forma verbal esses pacientes. Essa foi a idéia do livro. Alertar para a atenção aos nossos pequenos movimentos ao lidar com eles diariamente para fazer a coisa certa.

LIG – O que você quis dizer com: Alzheimer é "a doença da alma"?

LB – ‘Psique' – conceito grego de "si-mesmo", abrangendo idéias modernas de alma, ego e mente. A expressão ‘psique' era usada como sinônimo de VIDA, tendo como sinônimo "ALMA". Essa "alma" abrange todos os pensamentos, tantos os conscientes como os inconscientes. A doença de Alzheimer descaracteriza a pessoa. Despersonifica o ser humano. Tira-lhe todo o conjunto de normas e conceitos éticos adquiridos ao longo de sua existência. Mudam a personalidade de forma assustadora. Essa alma fica muito doente.

LIG – O que observar como sintoma inicial da doença?

LB – O que quero alertar é para um "conjunto de atitudes" do comportamento, sinais que passam despercebidos diariamente. As pessoas se detêm apenas ao fato da perda da memória quando alguém não consegue lembrar uma data, o nome do sobrinho ou seu próprio telefone.
E enquanto ele, o doente, puder lhe enganar usando de estratégias para que você não perceba essa falha na memória, muita coisa já aconteceu.

Dá desculpas que não fez algo ou não foi ao trabalho ou não pagou o que devia porque não teve tempo. Vestiu a mesma roupa suja há três dias seguidos, às vezes descosturada ou rasgada e diz que não encontrou outra melhor, estava com pressa.Tem sempre desculpas. E você não percebe essa negligência da parte dele com as tarefas do dia-a-dia. Só quando realmente ele fizer coisas que chamem muita atenção! E esses "sinais" podem levar anos…

LIG – Quais os mitos criados em relação ao Alzheimer?

LB – O melhor deles é, Alzheimer = a perda de memória. Amigos me ligam preocupados dizendo que não conseguem lembrar de coisas banais. "Eu estou com Alzheimer, Laura?". Eu tenho que rir. Para a confirmação da doença é necessário muita pesquisa, uma rigorosa avaliação do paciente, que deve ser feita por um especialista no assunto. E somente a exclusão de determinadas doenças que apresentem os mesmos sintomas – falta de memória, agressividade, depressão, agitação -, que podem ser facilmente confundidas com esquizofrenia, deficiências vitamínicas, câncer, diabetes, tiróide, infecções urinárias, sífilis crônica, meningite etc., poderá fornecer um "provável" diagnóstico positivo.
Mas, repito! Preste atenção no conjunto de atitudes. Não se apegue somente a falta de memória. Perda de memória rápida é comum em casos de estresse diário. Nada que uma boa noite de sono não cure.

LIG – Foi difícil internar sua mãe numa casa de repouso após todos os problemas narrados no livro?

LB – Foi muito difícil. Nós, irmãos, nos desentendemos por várias vezes por conta dessa idéia: internação. O primeiro pensamento que vem à cabeça das pessoas é o "abandono". "Vocês vão abandonar sua mãe num asilo?" Era essa a frase que ouvíamos. Nós nunca abandonamos nossa mãe! Muito pelo contrário, nos empenhamos ao máximo em dar o melhor para sua condição de vida naquele momento. A doença de Alzheimer é uma doença que requer dedicação integral. As pessoas não sabem é que doentes de Alzheimer ficam totalmente instáveis com mudanças. Mudar o horário da alimentação já causa um grande transtorno. O lugar onde ele vai viver, seja na sua própria casa ou numa casa de repouso (asilo) terá que respeitar – impreterivelmente – uma regra, uma religiosa adaptação ao doente, e não o contrário.


LIG – Como as famílias, que não têm condições financeiras para cuidar de um doente de Alzheimer, podem encontrar ajuda para diagnósticos e acompanhamentos, aconselhamento sobre a doença sem precisar pagar?

LB – A Secretaria de Assistência à Saúde criou, em abril de 2002, mecanismos para a organização e implantação de Redes Estaduais de Assistência à Saúde do Idoso. E isso muita gente não sabe. Não há divulgação pela mídia. O que também me deixa muito triste. Os "Centros de Referência" no Brasil são responsáveis pelo diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes; orientação aos familiares e cuidadores e o que mais for necessário aos Portadores da Doença de Alzheimer. Imagine quanta gente poderia ser beneficiada se soubesse que há um lugar onde buscar ajuda. A família pode receber ajuda com relação a remédios, fisioterapia, enfermagem, terapia ocupacional, fonoaudiologia, ter acesso a psicólogos e nutricionistas.

Quem deseja conhecer os endereços dos Centros de Referência (para se cadastrar) é só entrar no site da Associação Brasileira de Alzheimer do Rio de Janeiro (www.abrazrj.com.br*). Ou procurar informações no Hospital Universitário Antonio Pedro, em Niterói.

LIG – O que é preciso para o Brasil melhorar a qualidade de vida dos portadores do mal de Alzheimer?

LB – Primeiramente, é fundamental que a família entenda a doença. Há uma ignorância generalizada no país sobre o assunto. Não falo somente da ignorância familiar. Falo do despreparo de profissionais nas áreas de saúde, política, justiça, para o tema "idoso".
Tivemos muitos problemas com especialistas de diversas áreas da saúde que não conduziram, adequadamente, tratamentos para os problemas de nossa mãe por ignorarem os sintomas da doença. Não faziam a menor idéia de como lidar com ela, como conduzir uma entrevista, como manipulá-la, como entender o que ela sentia e como nos reportar o que deveríamos fazer. Não sabiam. Simplesmente não sabem.

Na justiça, também tivemos problemas sérios por desconhecimento total e tamanha alienação do Juiz da Vara de Família sobre a doença. Fazendo de um processo de interdição uma eterna e desgastante ‘via crucis' para nossa mãe que já padecia dos primeiros sintomas e necessitava urgente de cuidados especiais. Não desejo o que passamos para o pior inimigo. Esse é o meu objetivo. Evitar que outros passem pelo que passei.

* Entrevista para o Ligjornal

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