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A Clínica do Bullying

Como abordar um caso de bullyng na clínica?

Para Hirigoyen (2006), os psicoterapeutas devem flexibilizar e inventar novas formas de trabalhar com as vítimas que sofreram algum tipo de assédio moral. A autora pensa que a neutralidade dos psicanalistas pode assumir uma certa frieza para os pacientes que outrora foram feridos em seu narcisismo. Ferenczi (1933), ex-discípulo de Freud, rompeu com seu mestre devido à divergências do pensamento acerca do trauma e da técnica analítica. Para o psicanalista, a situação analítica, a hipocrisia profissional e a antipatia em relação ao paciente que ocorria por trás da análise, proporcionaria o mesmo sentimento que fez o paciente adoecer em outra época de sua vida,ou seja, na sua infância. Damiani (1997), completando este pensamento, diz que a técnica analítica aplicada às vítimas deveria ser redefinida levando em conta a realidade circunstancial e não só a psíquica. Hirigoyen (op.cit) mostra que um tratamento psicanalítico típico não seria adequado a vítima que esteja sob efeito da violência uma vez que a psicanálise se interessa essencialmente pelo intrapsíquico ao invés das patologias induzidas em relação ao outro. 

A autora acredita que a vítima só poderá começar um trabalho psicanalítico de rememoração e elaboração quando estiver suficientemente refeita. A autora propõe um tipo de tratamento psicoterápico à vítimas de assédio moral que poderíamos usá-lo à assistência de vítimas de maus tratos na escola. Nas linhas que se seguem, como podemos ver, procurei adaptar sua proposta ao Bullying. Para Hirigoyen, o Bullying deve ser reconhecido pelo psicoterapeuta e pelo paciente como condição prévia do tratamento. Muitas vezes as vítimas do Bullying encontram dificuldades para evocar o evento traumático, uma vez que tentaram esquecê-lo ou negaram sua existência, podendo assim, levar tempo para evocá-lo. Diante disso, o psicoterapeuta pode oferecer sua ajuda. O paciente deve expressar a agressão sofrida pela Bullying, durante a sessão terapêutica. Isso permite o sujeito sair da negação e culpa em relação ao fato. Para a autora, o terapeuta deve sentir-se livre para comunicar a liberdade que o paciente tem de sair da situação de dominação pelo outro.

O profissional deve ajudar o seu paciente a identificar as estratégias perversas do agressor e permitir-lhe descobrir o que vem dele e de sua vulnerabilidade e o que é produto de agressão externa. A conscientização dos mecanismos do Bullying pela vitíma deve vir junto à conscientização de como ela foi dominada pelos agressores. O terapeuta pode mostrar para o paciente os meios de perceber as estratégias perversas do seu agressor . Isto permite que a vítima passe a recusar o papel que lhe é proposto na cena do Bullying. Esta conscientização leva ao amadurecimento para enfrentar o agressor e tomar outros tipos de atitudes frente ao Bullying. Para a autora, de forma alguma, a psicoterapia deve reforçar a responsabilidade da vítima pelos maus tratos sofridos. Ela deve entender que não é culpada por isso, porém apenas não vê outra maneira senão aceitar a situação. Spiegel (op.cit) diz que neste tipo de psicoterapia é preciso ajudar a vítima a assumir a menor responsabilidade possível pelo trauma, diferente da psicoterapia tradicional onde é estimulado ao paciente assumir a responsabilidade sobre seus problemas.

Desculpabilizando-se, o paciente passa a se adequar de outra maneira a seu sofrimento e , somente depois, no processo de cura, ele poderá voltar à sua história pessoal e compreender porque tornou-se vítima do Bullying. Finalmente, para curar-se, a vítima deve conscientizar-se que não se resume a posição de vítima. Ela dispõe de muitas outras formas de estar no mundo. As vítimas aprendem com a experiência dolorosa do Bullying, seja para protegerem sua autonomia, recusarem-se a tomar um papel de bode expiatório, ou até mesmo, fugirem da violência verbal. O trauma pode deixar uma marca que jamais de apagará, mas sobre a qual é possível reconstruir. A vítima pode buscar uma remobilização pessoal tornando-se mais forte psicologicamente para enfrentar os próximos desafios e obstáculos da vida.

Bibliografia:

DAMIANI C. "Les victimes", Paris, Bayard Édition, 1997. FERENCZI, S. (1933) "Confusion de langue entre les adultes et l'enfant", In Psychanalyse, Tome IV, Paris, PAYOT, 1982.

HIRIGOYEN, M. F., "Assédio Moral- A violência Perversa no Cotidiano" trad: Maria Helena Kunner- oitava edição – Rio de Janeiro; Bertrand Brasil, 2006.

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