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Música, algumas potencialidades na formação da Identidade

O poder da música como influenciador e conquistador é indiscutível, vide sua constante presença nos mitos e contos que preenchem nossa psique, onde desde de Orfeu até Rock stars a música esta sempre presente no contexto social e suas marcas são arrebatadoras.
O presente texto tentará explorar como a música pode afetar, em particular na juventude, seu processo de formatação de identidade, uma vez que com base na teoria de Erickson é na adolescência que começamos a estruturar e sedimentar algo extremamente complexo denominado identidade.

“A formação da identidade emprega um processo de reflexão e observação simultâneas, um processo que ocorre em todos os níveis do funcionamento mental, pelo qual o individuo se julga a si próprio à luz daquilo que percebe ser a maneira como os outros o julgam, em comparação com eles próprios e com uma tipologia que é significativa para eles ; enquanto que ele julga a maneira como eles o julgam, à luz do modo como se percebe a si próprio em comparação com os demais e com os tipo que se tornam importantes para ele.” (ERIKSON, 1976)

Vale ressaltar que a identidade não é algo concreto, no qual uma vez estruturada não se modifica. A existência humana está imersa em constantes tensões que provocam inúmeras mudanças e transformações, portanto a identidade permanece por toda vida se reajustando, consideraremos que a adolescência é uma fase crítica desse processo.

A experiência da adolescência proporciona aspectos típicos que podem desencadear as perturbações necessárias para a construção da identidade. Como expôs Winnicot a adolescência faz emergir um sentimento de assassinato, uma vez que o afastamento da dependência e a formação de um auto conceito permitem que o jovem se distancie (assassine) o ambiente familiar para expandir sua subjetividade mergulhada na dinâmica da malha social, uma unidade muito mais ampla e repleta de novos símbolos e expectativas para com os jovens que apenas têm em mão a flor da imaturidade.

Nesta fase é preciso então incorporar novos elementos socialmente relevantes e modular comportamentos até então obscuros, nesse contexto a música pode oferecer múltiplas ferramentas que amparam e organizam essa turbulência psíquica.

Como bem mostram diversos estudos antropológicos, a adolescência é um fenômeno histórica e culturalmente construído e culmina em um momento especifico da conjuntura sócio econômica que vivia a sociedade ocidental, e justamente na adolescência aparece a fase em que mais nos aproximamos da atualidade histórica.

A música como outros elementos artísticos muitas vezes produzem movimentos que parecem retratar a realidade presente na dinâmica social o contato com esses elementos possibilitam o adolescente vivenciar e se inserir no campo de transformações e ilustrações do presente.

O adolescente então anseia por papeis bem determinados em que ele possa se identificar e montar sua identidade o que o deixa suscetível a influencias, afinal inserido em um novo universo semiótico o jovem precisa defender seu ego, se projetando de maneira excepcionalmente fiel a grupos e elementos bem estereotipados como forma de identificação e preservação da vida. Portanto a identificação grupal faz com que os indivíduos encontrem aportes para se ancorar e dar vazão a continuidade de si. O gosto pelo mesmo estilo de música é um fator que sustenta o sentimento de comunidade.

Nesse sentido a música possibilita ações sociais, construindo ideologias e miragens de sociedades ideais que movimentam uma massa de jovens em busca de uma aproximação com o que acreditam fazer parte deles e uma luta violenta com o que se diferencia de seu grupo de iguais, no Brasil esse processo foi vislumbrado pela tropicália, e movimentos outros movimentos considerados subversivos pelo Estado.

A música então oferece recursos para criação de fronteiras e referências simbólicas formatando posturas adequadas para sociedade, essas proposições são então incorporadas à estrutura identitária do jovem.

Eles precisam no entanto de uma moratória (Erikson), um espaço livre de pressões e vigília dos familiares, para consolidação desses materiais. Nesse aspecto a música pode oferecer as festas, que são reunião de iguais em torno da música dando esse tempo para zoar, curtir e formular e fortalecer seus comportamentos.

Ao longo do tempo podemos notar outra potência que a música, através de sua poesia.

A medida em que o tempo passa, a identidade da pessoa encontra formas de expressão que extrapolam o grupo e constituem sua singularidade, ao mesmo tempo em que a música oferece um universo simbólico, que da luz a uma gama de identificações sócio afetivas, homogeneíza e da coesão ao grupo, ela também ativa questões emergentes e individuais que se atualizam na existência singular de cada um, perturba e sedimenta a urgência de cada um, delineando um caráter auto poético criando autonomia e individualidade.

A música portanto pode servir como um objeto transitório alvo das várias referências de identificação que o adolescente busca. Ela possibilita que ele se misture no grupo, bem como cartografa uma certa membrana que estrutura seu ser, assim o adolescente passa a perceber os outros como diferentes, quebrando a onipotência do grupo. Caracterizando a música como um objeto transicional na consolidação de um ego suficientemente saudável.

Referência:

WINNICOTT , D.W. O Brincar e a Realidade.Rio de Janeiro: Editora IMAGO, 1975. ERIKSON, Erik. H. Identidade Juventude e Crise. Rio de Janeiro. Editora ZAHAR, 1976.

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