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Ato médico será alvo de protesto em dez capitais

No próximo dia 9, dez capitais do país vão ser palco de um movimento intitulado “Dia Nacional de Luta contra o PL do Ato Médico”, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia, que pede a rejeição dos congressistas ao Projeto de Lei 25/2002 (número de origem protocolado no Senado – leia mais), em tramitação há mais de sete anos no Congresso.

No próximo dia 9, dez capitais do país vão ser palco de um movimento intitulado “Dia Nacional de Luta contra o PL do Ato Médico”, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia, que pede a rejeição dos congressistas ao Projeto de Lei 25/2002 (número de origem protocolado no Senado – leia mais), em tramitação há mais de sete anos no Congresso.

Apresentado em 27 de fevereiro daquele ano pelo então senador Geraldo Althoff (PFL-SC), o PL define ato médico como “todo procedimento técnico-profissional praticado por médico habilitado e dirigido para promoção primária (promoção da saúde e prevenção de enfermidades), prevenção secundária (contra evolução de enfermidades e execução de procedimentos diagnósticos e terapêuticos) e prevenção terciária (invalidez ou reabilitação de enfermos)”.

Em síntese, o projeto estabelece que todos os procedimentos com fins terapêuticos “são atos privativos do profissional médico”, excluindo a possibilidade de que profissionais das chamadas terapias alternativas possam também executar legalmente tais procedimentos. A proposição ainda confere ao Conselho Federal de Medicina as tarefas de “normatizador e fiscalizador” do exercício da medicina no Brasil.

Argumento histórico

Na justificativa do PL, o autor alega que a Medicina é a mais antiga profissão e, até o Renascimento, apenas Medicina e Farmácia eram atividades relacionadas ao setor da saúde. Depois, alega o ex-senador Geraldo Althoff, vieram a Odontologia, a Enfermagem e, já no século XX, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Biomedicina etc, que passaram a realizar atividades “exclusivamente médicas”.

O autor argumenta então que a proliferação destas profissões análogas à medicina criou a “necessidade das instâncias responsáveis” de regulamentar o exercício da medicina por meio do conceito e aplicação “ato médico”, de maneira a dar caráter legal à atuação deste profissional.

Sociedade em risco

O presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Humberto Verona, disse ao Congresso em Foco que, caso aprovado pelo Parlamento e avalizado por sanção presidencial, o projeto colocaria a sociedade sob “riscos”. “Queremos chamar a atenção da sociedade para os grandes riscos que a saúde corre com a aprovação deste PL. Toda a saúde ficaria nas mãos de um único profissional”, disse Humberto, referindo-se à concentração de diagnósticos e prescrição de tratamentos nas mãos dos médicos profissionais.

Pós-graduado em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo e especialista em Psicologia do Trabalho, Humberto diz que o projeto significa um rompimento com o modelo de saúde implementado no país e praticado mundo afora, em que médicos e demais profissionais da área lançam seus “olhares” em casos de enfermidade.

“O PL é totalmente contrário à política implementada pelo Sistema Único de Saúde no Brasil. O problema de saúde não tem uma única causa. Ele é multideterminado, e é mais bem compreendido se for observado de vários ângulos, submetido aos olhares dos vários profissionais de saúde em atividade atualmente”, acrescentou, lembrando que a “troca de informações” entre médicos e os demais profissionais da área propicia mais eficácia nos diagnósticos e tratamentos.

Segundo Humberto, o projeto cria uma “animosidade, uma separação drástica” entre médicos e outros profissionais, impedindo “o encontro saudável entre as profissões”. “O médico não vai ficar nem um pouco interessado na opinião de outros profissionais”, emendou, lembrando que o Conselho Nacional de Saúde reconhece, além do médico, outras 13 profissões do setor. Humberto disse ainda que, caso o projeto seja aprovado pelo Congresso, recorreria ao presidente Lula e pediria o veto à matéria. “O presidente tem manifestado publicamente preocupação com o projeto da maneira como ele está.”    

“Modelo falido”

O levante contra o PL 268/2002 tem o apoio de 61 entidades do setor, capitaneadas pelos conselhos Federal e Regional de Psicologia (veja a relação de entidades envolvidas no movimento). Atos, marchas e atividades culturais, além de serviços de atendimento ao público, estão previstas para esta terça-feira (9), nas seguintes cidades: Belo Horizonte (MG), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Natal (RN), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), São Paulo (SP) e Vitória (ES), além de três municípios de Santa Catarina (Florianópolis, Lages e Chapecó).

Em defesa de outras profissões do setor de saúde, as entidades voltam a carga contra o Conselho Federal de Medicina, a quem atribuem a tentativa de controle do setor da saúde por meio do projeto. No site, as entidades alegam que o projeto sofreu alterações em sua tramitação no Congresso, “mas ainda condiciona à autorização do médico o acesso aos serviços de saúde e estabelece uma hierarquia entre a medicina e as demais profissões da área”.

A rejeição à matéria, com direito a site que reúne um variado arsenal de textos, notícias, vídeos e imagens contra o ato médico, fundamenta-se no argumento de que “o texto atual do PL propõe o retorno a um modelo falido de atenção à saúde, centrado no atendimento clínico, individual, medicamentoso e hospitalocêntrico, o qual não encontra respaldo nem nos organismos internacionais de saúde nem na legislação brasileira”, em detrimento do “conceito ampliado de saúde” que orienta a comunidade mundial do setor.

A matéria já foi analisada pelas comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Assuntos Sociais (CAS) tanto do Senado quanto da Câmara, tendo passado pela relatoria de diversos parlamentares. Depois de ter recebido alterações pelos deputados, a matéria retornou à Casa de origem e espera nova apreciação na CCJ antes de seguir para a CAS. “A Câmara piorou ainda mais a versão que veio do Senado, porque torna mais corporativo o projeto”, disse o presidente do CFP.

Já o presidente da CCJ, senador Demóstenes Torres (DEM-GO), prefere a cautela ao comentar o projeto, que ainda não está pautado para votação no colegiado – aguarda parecer do relator Antônio Carlos Valadares (PSB-SE). “Vamos esperar para ver o relatório, para que ele possa contemplar todas as profissões”, disse o senador ao Congresso em Foco, acrescentando que, desde que outros profissionais se orientem pela eficiência técnica e pelos ditames legais, as atribuições podem ser compartilhadas.

O relator do PL na CCJ, Antônio Carlos Valadares, disse à reportagem que formou um grupo de trabalho com consultores do Senado e, em breve, apresentará um relatório “o mais consensual possível”. “É um assunto muito delicado. Vamos estabelecer um trabalho visando o consenso e fazer um projeto que atenda a todas as categorias”, disse o senador, para quem as alterações feitas na matéria pelos deputados deixaram “muito contrariadas” as outras 13 profissões de saúde.

Valadares disse já ter debatido o assunto com representantes das 13 profissões e, nos próximos dias, ouvirá médicos profissionais. Ele acredita que, por meio de um “diálogo objetivo”, é possível que haja possibilidade de elaborar um projeto conjunto a partir de pontos consensuais na CCJ e na CAS.   

Veríssimo

A burocracia que seria causada pelo PL do Ato Médico, atacada pelos opositores do projeto, é o mote de um texto atribuído no site ao escritor Luiz Fernando Veríssimo. Intitulado “A mulher que morreu de topada – Tragédia em um ato” e escrito em forma de roteiro de peça teatral, o texto ironiza a fragilidade do sistema de saúde brasileiro ao colocar como protagonista a Dona Saúde, cujo calvário começa com um dedo machucado – e culmina em morte, graças à precariedade do sistema.

“Há anos ela não vinha bem. E culminou com a topada”, diz o marido da Dona Saúde. “Ela morreu de topada?!”, diz a “1º mulher”, umas das personagens. “Bem, a topada foi só o começo. Ela morreu por falta de atendimento médico”, explica o marido.

No texto, que tem uma pitada de humor irônico, o marido da Dona Saúde recusa o atendimento de um fisioterapeuta, de um psicólogo, de uma enfermeira e, exigindo que um médico profissional cuidasse da topada, vê a própria mulher morrer. Para ele, os demais profissionais de saúde eram “amadores” ou “charlatães”.

Fonte: Congresso em foco

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