RedePsi - Psicologia

Artigos

Devemos ou não considerar redes sociais como parte do processo seletivo?

 

*O presente artigo é uma reprodução acerca da opinião da equipe de atração e seleção de pessoal da HumanitáRH apoiado na ciência do comportamento de B.F. Skinner(1989) e alguns pontos de vista embasado na obra de Forisha, E. Milhollan (1978) dialogando a abordagem humanista de Rogers com a abordagem comportamental de Skinner. Os pontos de vista expostos pelos autores serão enriquecidos ainda pela realidade do seu dia – a – dia, experiência acumulada, suas rotinas atuais em RH, sua opinião pessoal e apoio de sua formação teórica e acadêmica. Já a HumanitáRH por sua vez (WWW.humanitarh.com.br) é uma consultoria de recursos humanos que atua junto a prestação de serviços em seleção, treinamento, BPO, KPO e gestão estratégica de pessoas, sendo assim, disponibiliza ao leitor um artigo de cunho polêmico e recente em nossa sociedade e comunidade acadêmica.

INTRODUÇÃO

Com a chegada da “era” das redes sociais, podemos dizer que nossa rotina nunca mais será a mesma de antes, em especial, diante das relações sociais e interpessoais que migraram em peso de ambientes físicos para ambientes on-line. No Brasil, em especial em alguns grupos de RH, está ocorrendo diálogos se o profissional da área deve ou não incluir as redes sociais como etapa do processo seletivo e como isso deve ser feito uma vez que a graduação destes (psicologia, gestão de RH, pedagogia, administração, pedagogia e outros) não os preparou para estas analises. Preocupados com este fenômeno, a equipe de recrutamento e seleção da HumanitáRH elaborou este artigo onde trará ao leitor algumas considerações importantes antes de tomar o partido “se deve ou não” considerar uma rede social como parte de um processo seletivo.

Para Eduardo Alencar, Psicólogo, analista do comportamento e Diretor de Operações e Recursos Humanos da WWW.humanitarh.com.br o primeiro passo a ser levantado nesta discussão são os pontos favoráveis e desfavoráveis de considerar as redes sociais parte da avaliação, em um segundo momento contextualizar e discutir a metodologia e peso que seria empregado nestas avaliações, bem como a contextualização dos fatos observados nestas redes e como estabelecer relação com a conduta profissional do avaliado para evitarmos psicologismo, interpretações infundadas, errôneas, reducionistas e / ou inferências pessoais que prejudiquem o candidato.

Em outras palavras, para evitarmos equívocos analíticos sobre a avaliação de repertórios comportamentais observados nestes ambientes e sua relação os mesmos fora dali, nas empresas, por exemplo, podemos dizer que seria no mínimo necessário darmos uma atenção multidisciplinar a tal fenômeno. Não podemos nos distanciar de analisá-las em termos científico, ético e profissional, e dentro destas considerações, as abordagens escolhidas pelos autores para escrever este artigo, parece atender estes quesitos. Eduardo inicia o assunto defendendo que:

“Para psicologia, em especial para abordagem analítico – comportamental, o comportamento é a relação entre ações do sujeito para com o ambiente a sua volta, de forma que esta relação retroage sobre o próprio sujeito alterando e influenciando a sua forma de agir no futuro. Trata-se de um fenômeno complexo e multideterminado (filogeneticamente, ontogeneticamente e culturalmente), portanto, complicado e inviável de ser analisado isoladamente, como por exemplo, a luz de um simples recorte de um post, recado ou foto postada em uma rede social”.

 

Nesta mesma linha de raciocínio, os analistas de recursos humanos Felipe Romão e Rodolfo Mascarenhas (HumanitáRH) que embora não sejam psicólogos, mas iniciaram os estudos do behaviorismo radical (filosofia que dá embasamento a abordagem analítico – comportamental) há cerca de 9 e 5 meses ao ingressarem no quadro de colaboradores da HumanitáRH (nesta ordem respectivamente até a data de confecção deste artigo), complementam que o comportamento, enquanto se relaciona com o meio e retroage sobre o próprio sujeito alterando, fortalecendo ou extinguindo classes de ações de atitudes, bem como a topografia destas, quando reforçadas (seguidas de consequências), nos permitem através de probabilidade, fazer previsões de futuro, em outras palavras, permitiria ao profissional de RH prever se determinadas ações em determinados contextos e seguidas de determinadas consequências, poderiam ou não em termos probabilísticos acontecerem no futuro em mesmas condições, ou seja, do facebook para a empresa, do facebook para um relacionamento amoroso e assim por diante.

Para ficar mais didático ao leitor, recorreremos a Sidman (2003), um teórico de renome e sólidos experimentos científicos dentro da abordagem comportamental, que segundo seus pensamentos e pesquisas, descobriu-se que podemos recorrer a frequência das ações (conceito de resposta dentro da abordagem comportamental) para estudarmos os ‘comportamentos’ (relação entre ações e ambiente) e portanto, inferirmos previsões baseadas em probabilidade.

Em especial, diante dos fenômenos comportamentais nas organizações, principalmente para ilustrar aos leitores que talvez não tenham afinidade com esta vertente teórica, nas palavras de Eduardo Alencar, Felipe Romão e Rodolfo Mascarenhas, psicólogo comportamental ou não, o pensamento de Sidman (2003) é coerente quando defende que olhamos as ações do sujeito em relação ao seu meio e registramos a frequência destas, com isso, empiricamente atribuímos topografias ditas pela sociedade como ‘comportamentos’, ou seja, dizemos que alguém é inteligente, pois olhamos suas atitudes, dizemos que alguém está triste, olhando suas atitudes, dizemos que alguém é líder, olhando suas atitudes, dizemos que alguém é chato olhando suas atitudes, dizemos que alguém não tem caráter olhando suas atitudes e assim por diante.

Embora vivamos em uma sociedade que comumente está habituada a termos metalistas (comportamentos determinados por instâncias psíquicas), não há como inferir comportamentos (Topografias) sem recorrermos a frequência das atitudes e sua contextualização com o meio. Eduardo Alencar, defende ainda que análogo ao conceito de seleção por competência (mais familiarizado com o público de RH) onde o comportamento é avaliado por: A)Contexto; B) Ação; C) Resultado, a abordagem analítico – comportamental também buscará entender as ações e suas topografias através destes 3 conceitos, além de considera-los como “multideterminados”, como foi mencionado no inicio deste artigo.

Partindo destes conceitos, olhar o comportamento de um candidato em uma rede social, como o facebook, por exemplo, demandaria, na visão dos autores, embasar-se em uma olhar científico direcionado, apoiado em método, coleta de dados, forma de observação e portanto, forma de realizar analises, previsões e correlações do repertório comportamental ali observado para com a possibilidade de repertório comportamental a ser emitido ou evocado em outro ambiente diferente daquele.

Suelen Perez, pedagoga, psicóloga adepta da abordagem humanista da psicologia, analista de recursos humanos e também compõe o quadro profissional de atração e seleção de pessoal da HumanitáRH, utilizando Forisha e Milhollan (1978)  defende:

“Sabe-se em psicologia que todo sujeito é multideterminado e que as pessoas desenvolvem personalidades conforme se relacionam com os ambientes a sua volta. Desenvolvem assim uma forma única, uma identidade peculiar e diferente até mesmo de irmãos gêmeos. A Psicologia, assim como a área de Rh não tem direito ou propriedade suficiente para realizar julgamentos. Na área clinica, o psicólogo aceita o sujeito como ele é e tenta analisar junto com o seu cliente as queixas que surgem. No âmbito organizacional, em especial diante do processo de recrutamento e seleção cuja premissa já é a exclusão (alguém tem o perfil de uma vaga e outro não) o que fazemos é avaliar se determinadas competências e comportamentos estão coerentes com o ambiente ou vaga que a pessoa irá ocupar, diante disso, nós descrevemos as atitudes passadas e presentes destas pessoas, respeitando sua individualidade, mas contextualizando-as com as necessidades da empresa, desta forma, buscando prever como se daria esta relação. ”

Em outras palavras, Suelen afirma ainda que o profissional de RH (sendo psicólogo ou não e independente de abordagem) não está em sua função para realizar julgamentos (até porque, seria vetado pelo seu código de ética, salvo os cursos de direito que respondem por intermediação de interesses em determinada sociedade, mas que não está em discussão neste artigo), desta forma, o seu trabalho de descrição comportamental pautado em uma método cientifico específico visa (ou deveria visar) atender as demandas organizacionais sem que estas passassem por cima da integridade do avaliado. Eduardo Alencar complementa:

“Assim como tivemos todo o cuidado do mundo dentro da psicologia para gerar as ferramentas de testagem psicológica, temos que olhar cientificamente como vamos dar conta desta demanda social emergente a nossa geração: ‘olhar ou não olhar o facebook em processos seletivos, como olhar e que peso atribuir?’, são questões que podem parecer simples, mas na verdade dão panos a manga para discussões dentro e fora do meio acadêmico.”

Sabe-se que a constituição brasileira veta ao RH e aos empresários brasileiros descriminalização por idade, sexo, raça, opção sexual, religião e outros, desta forma uma parcela significativa destes grupos que discutem o uso das redes sociais defendem que seria uma invasão de privacidade e que não há necessidade de trazer isso para o âmbito empresarial pois incentivaria o preconceito por busca de aparência, cor, gênero e outras características de personalidade.

Por outro lado, os grupos que defendem o uso das redes sociais como fonte de avaliação defendem que assim como um candidato pode escolher o seu emprego pelos atributos da empresa (salário, local, marca, benefícios, conduta, etc) a empresa tem o direito de saber previamente se o seu futuro funcionário tem alguma atitude desabonadora ou que comprometa a produtividade, imagem da empresa, clima organizacional e outros.

Skinner (2003) aborda muito bem a influencia de agencias controladoras (estado, religião, empresas, governo, família e outros) sobre o comportamento individual de cada pessoa, resumidamente, podemos dizer que o sujeito em sua totalidade (seus desejos, anseios, cognição, pensamento e demais comportamentos) tem o seu “livre – arbítrio” restrito pela determinante cultural do pais, estado, cidade e costumes de origem.

No Brasil, casar-se com diversas mulheres ao mesmo tempo não é permitido por lei e é repudiado pela maioria da população, em especial pelo público feminino. Por outro lado, na Índia, isso é permitido, aceito e incentivado. A mesma coisa ocorre com temas polêmicos como casamento homossexual, uso de drogas lícitas e ilícitas, crimes e afins.

Mesmo que o candidato ou a empresa ache certo ou errado consultar ou não o facebook ou outra rede social, antes de manter-se em opiniões alheias e pessoais, devemos entender como isso se dá dentro destas instâncias propostas por Skinner (2003) e Sidman (2003): filogênese, ontogênese e cultura.

Ao se cadastrar em uma rede social, o candidato está dando aceite que a sua vida está exposta ao mundo. Algumas de forma um pouco mais reservada (facebook que limita a visualização de determinados usuários) e outras de forma mais abrangentes como o twitter. Pessoas que não querem que sua vida seja exposta, certamente tomará um cuidado redobrado com a exposição. A Internet é um espaço livre e uma vez que a sua vida for colocada neste canal, ela estará disponível para diversas finalidades. Parte do cuidado com a vida pessoal está diretamente ligada aos cuidados que cada um toma em publicar dados pessoas nestes tipos de canal.

Algumas empresas voltadas ao processo de e-recrutament (recrutamento on line) acharam como opção deixar links optativos ao candidato nos formulários de currículos dando a ele a liberdade de escolher se quer ou não deixar a empresa acessar suas redes sociais.  Desta forma, somente os candidatos que autorizam tal pesquisa, seriam submetido a analises de perfis pessoais em sua avaliação profissional.

Já outra gama de empresas sinaliza abertamente em grupos de RH, como no Yahoo Grupos “João Honório” (grupo público com mais de 10.000 contatos de profissionais de RH) que já chegaram a consultar o facebook do candidato sem o seu consentimento. Até o presente momento não há nada na legislação que trate especificamente deste tema, exceto em caráter de descriminalização.

Os profissionais que consultam redes sociais como o facebook para incluir analises de perfis em um processo seletivo, como Suelen Perez, por exemplo, alegam:

“Não nos cabe invadir a vida pessoal do candidato, todavia, sabemos que quando o candidato está procurando emprego, por natureza do ser humano, ele tende a falar o que tem de bom e a omitir o que tem de socialmente não aceito, desta forma, empresas e profissionais de recrutamento e seleção acabam se decepcionando, pois aquela pessoa que fora contratada, somente mostra certos comportamentos socialmente não aceitos quando já está na segurança de contratada. Mesmo diante o incansável esforço de ferramentas psicológicas como testes projetivos, testes de personalidades, inventários estatísticos, seleção por competência, dinâmicas de grupos e outros, os profissionais de RH, em especial aqueles que atuam com recrutamento e seleção estão carentes de novas ferramentas de analise. Vejamos a internet, por exemplo, se digitarmos no google roteiro de entrevistas ou dinâmicas de grupo, veremos que isso já foi banalizado, caiu no conhecimento comum, ou seja, o candidato já se prepara para vir ao processo seletivo treinado a dar respostas que os empresários querem ouvir. A era da internet chegou e é irretroativa, desta forma, nós devemos fazer um olhar crítico a nossa própria atuação afim de evoluir as ferramentas de pesquisa e analise do comportamento humano  em cenários de recrutamento e seleção de pessoal. Mesmo que isso desagrade algumas pessoas, o que não podemos perder de vista é o respeito, a ética e o comprometimento científico com um método aceitável pela comunidade da área. Não vejo mau algum em observar o comportamento de um sujeito em sua rede de relacionamentos e coletar informações que podem dizer algo sobre ele, volto a dizer, o que deve prevalecer é o respeito e ética pelo ‘fazer’. Diferente do amigo ou vizinha bisbilhoteira, o que nós vamos olhar nas redes sociais é muito diferente do que os usuários das próprias redes já executam.”

O que Suelen Perez, quis dizer complementa Eduardo Alencar, vai de encontro com o que Chiavenato (1983) defendeu como o recrutamento e seleção sendo a escolha da pessoa certa para o cargo certo, ou seja, que considerar dados do comportamento do sujeito em suas redes sociais com intuito de achar uma posição de trabalho compatível com seus interesses e os da empresa não seria desfavorável a nenhum deles, por outro lado, isentar-se a estas redes e deixar a sua analise mais vulnerável a erro, ou mesmo mais sensível apenas ao discurso de minutos de entrevista, poderia acarretar a contratação que inicialmente é positiva, mas ao longo do tempo pode ser ruim ao próprio candidato.

Vide aqueles casos de pessoas que conseguem emprego, mas antes dos 3 meses de experiência já se sentem motivados a procurar outro emprego, nestes casos, geralmente diz-se que ocorreu um erro de seleção, pois não foi alinhado os interesses do candidato para com a empresa e vice – versa.  O mesmo ocorre quando a empresa desliga a pessoa antes deste período. Acerto em recrutamento e seleção é visivelmente observado quando pessoas ingressam em suas áreas de interesse, sentem-se felizes e produzem dentro do que é esperado pela empresa, deixando-a igualmente satisfeita.

Por mais que benefícios sejam inicialmente relevantes para as empresas, alguns analistas de RH acreditam que consultar as redes sociais seja uma total invasão de privacidade, neste sentido, para desmistificar isso, é importante trazer a tona o conceito de “privacidade”. O dicionário http://www.priberam.pt/dlpo/ prevê privacidade como “Intimidade de pessoal ou de grupo definido de pessoas”, sendo assim, será que podemos considerar uma rede “social” aberta como o facebook algo “Privado”?

Os brasileiros foram preparados para a era digital? Foram preparados para o uso, etiqueta e regras do comportamento social digital? Há no campo de “finanças pessoais / educação financeira” uma teoria de que o brasileiro hoje tem dificuldade em administrar suas finanças em função de não ter sido preparado nem para lhe dar com ele e nem para enfrentar os avanços tecnológicos do setor (chegada do cartão de crédito, chegada do crédito, etc). É uma teoria muito interessante e para Eduardo Alencar e sua equipe, faz todo o sentido com as discussões que estão emergentes e as que estão por vir sobre as redes sociais:

“Não é a primeira e nem a ultima. As discussões que envolvem as redes sociais e o avanço do comportamento humano para internet apenas começaram: psicoterapia on line, treinamento on line, recrutamento on line, contas on line, e-mail (correio on line), álbum de fotos on line, cobrança on line, marketing on line, namoro e bate papo on line, briga on line, e-book, e-tutores, jogos on line, música, filmes e entretenimento on line, previsão do tempo on line, jornal on line, outros. O ser humano está se robotizando avassaladoramente, porém, o seu preparo comportamental para este contexto é lento e não acompanha tais mudanças, fator que resulta em demanda clinica, sofrimento, frustração, estresse e afins. Lembrando que não estou me referindo aos benefícios ou malefícios da internet, mas sim, ao desleal avanço da mesma em relação a quem vai utilizá-la”, diz Eduardo.

Diante destes pensamentos tão divergentes que estão longe de se harmonizarem, fica o convite aos pesquisadores de outras ciências a elaborarem seu discurso para agregarem pesquisas dentro deste fenômeno. Ciência e democracia se fazem com diálogos e a equipe da HumanitáRH  deu o primeiro passo em sintetizar um artigo acadêmico oriundo de discussões internas do dia – a – dia de um profissional de recrutamento e seleção. Há pontos de vista bem antagônicos entre os grupos que defendem o uso do facebook e redes sociais em processos seletivos x aqueles grupos que repudiam esta possibilidade. Mais importante do que a repudia, é emergencial a busca pelo preparo ao uso destas redes, seja como usuário, seja como empresário ou profissional de RH.

 

Bibliografia

Chiavenato, I (1983). Recursos Humanos. São Paulo: Editora Atlas, 1983, p. 139-162.

Dicionário on line: http://www.priberam.pt/dlpo/ . Consulta o termo “privacidade” em 27 de Agosto de 2012 as 16:50.

Forisha, E. Milhollan, F. Skinner X Rogers: Maneiras contrastantes de encarar a educação. 8 ed. São Paulo: Summus, 1978.

Sidman, M. (2003). Coerção e suas implicações. Campinas / SP: Editora Livro Pleno.

Skinner, B.F. (1989). Ciência e Comportamento Humano. 7ª edição. São Paulo: Martins Fontes.

Acesso à Plataforma

Assine a nossa newsletter