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Entrevista com Melany Copit, psicóloga



ENTREVISTA – Melanie Kopitz

Entrevista
com Melany Copit, psicóloga

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Psi: Melanie conte-nos um pouco de seu percurso na carreira.


Fiz o curso de psicologia e fiquei na cadeira
universitária. Fiz mestrado e doutorado. Meu doutorado foi sobre
ESTILOS COGNITIVOS NUMA RELAÇÃO ENTRE SOLUÇÃO DE PROBLEMAS
E QUESTÕES DE PERSONALIDADE
. Depois do doutorado fui para
Departamento da Aprendizagem e Desenvolvimento da Personalidade da USP
e também no Pós Graduação da Psicologia Escolar, onde fiquei durante
20 anos. Nesse período dei aulas na graduação e pós graduação. Fiz parte
de muitas bancas e orientei teses. Já no final de minha permanênciana
USP eu comecei a lecionar Erikson e em seguida entrei na psicanálise
mesmo. Foi nesse período, eu comecei a achar que a vida acadêmica em
psicologia, sem uma praxis, ficava muito empobrecida. Então resolvi
começar uma formação. Passei
peloSedes, onde fiquei três anos, e terminei minha formação na
Sociedade Brasileira de Psicanálise (SBP). Virei membro associado e
depois membro efetivo. Participei de muitas atividades na SBP como a
seleção de candidatos , participei de várias comissões de qualificação
e até mesmo, de qualificação de didatas. Cheguei a dar cursos na SBP
e até o ano retrasado eu dei um curso de Winnicott . Comecei a estudar
Winnicott há 15 anos e esse autor abriu uma outra perspectiva para mim.
Era uma outra maneira de ver o ser humano, de ver o adoecimento humano
e uma nova maneira de estar com ele. Isso culminou com minha saída da
Sociedade Brasileira de Psicanálise.

Estou
me dedicando ao estudo de Winnicott. Fiquei três anos na PUC estudando
com o Loparic que é um filósofo e conhece muito o Heidegger e está fazendo
uma leitura epistemológica de Winnicott. Até hoje, faço parte de um
grupo de estudos com ele.

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Psi: E atualmente, como caminham as coisas?

Hoje em dia, me denomino terapeuta. Uso o que eu aprendi na psicanálise
mas o meu referencial clínico está muito mais livre, muito mais fundamentado
no Winnicott e eu estou mais presente como pessoa na clínica, com uma
postura bem diferente daquela estabelecida pela psicanálise. Não
foi fácil essa transição porque essa soltura da gente é uma coisa difícil
e precisa mesmo de uma fundamentação. É como diz o Fédida “A gente pode
fazer qualquer coisa desde que a gente saiba o que está fazendo”.
O Winnicott dizia: “Se eu puder eu faço psicanálise se não der, eu faço
o que o paciente precisa”.

Hoje
eu vejo o que o paciente precisa dentro do referencial de Winnicott.
Atualmente estou no consultório e tenho tido muita procura de supervisão.
Tem muita gente, muita gente mesmo, procurando essas formas alternativas
de trabalho. Dentro de um referencial de Psicodinâmica mesmo, mas que
não seja aquela psicanálise ortodoxa que eu acho, não dá conta da clínica
atual. Eu acho que os pacientes que nos procuram,
são os falsos selves, os borderlines, os anti-sociais e, para trabalhar
com eles, é necessário um outro referencial, outra forma de estar. Eu
tenho trabalhado bem uma vez por semana. Um trabalho profundo e intenso
e onde eu me coloco mais. Tem sido um trabalho muito rico. Eu estou
muito satisfeita com essa minha virada. Não foi uma coisa fácil, foi
conflitiva. Tenho participado muito de bancas, mais na PUC do que na
USP. Atualmente é isso. Eu estudo Winnicott e estou dando aulas, trabalhando
no consultório.

Rede
Psi : E o futuro, como você o imagina?

Para
o futuro? Eu tenho pensado muito nisso. Acho que o trabalho de
consultório é um trabalho muito rico, mas como o Winnicott
vê o ser humano, a constituição do self na cultura, eu acho muito
importante a gente ampliar esse setting clínico para além das
paredes do consultório. Penso que o Brasil está vivendo uma coisa dificílima,
a crise e, em termos de instituições, não há praticamente
atendimento de saúde mental oficial, o que há é muito sofrível. Mas
a gente está vendo ai as ONGs, os movimentos que dão abertura para a
gente como clínicos , como psicoafins e principalmente pelo trabalho
interdisciplinar. Eu me interesso muito para no futuro enveredar por
coisas assim. Onde a gente pode estender o setting clínico para além
do consultório com trabalhos na comunidade, de facilitação,
de encontros da pessoa com o mundo e com seus grupos sociais.
Eu quero muito estudar e entrar por ai. Por enquanto meu trabalho de
consultório está me absorvendo muito mas eu estou muito antenada.
O Winnicott fala uma coisa bonita também: que a psicanálise ou o psicanalista
pergunta: Quanto é preciso se fazer com o cliente? E ele dizia: “A
gente não deve se perguntar o quanto é necessário, mas que se
faça”. Essa é a questão que implica na visão do cliente. Aquele artigo
do Winnicott , “O olhar da mãe como espelho”, “eu olho,
sou visto, logo existo
”. Esse estar presente, é quando ele diz,
é um ego corporal, é estar inteiro com o paciente, é realmente captá-lo
nas suas necessidades, é a questão do holding, do poder
segurar e do handling, que é o manuseio.

Enquanto
você está trabalhando o presente aqui, você está puxando as questões
lá de trás. Nessa medida a gente trabalha no consultório, trabalha com
uma pessoa mas procura ver a inserção dela no mundo. Eu acho que essa
é a grande abertura mesmo para um trabalho clínico. Creio que isso pode
ser levado para um trabalho em várias condições do ser humano. Por exemplo,
nos hospitais. Mesmo na psicossomática que é o que tem levado os pacientes
a nos procurar, vemos queixas que vão desde síndrome de pânico, às úlceras
e os cânceres o que tem a ver também, com uma proposta do Winnicott
. Foi ele que abriu na psicanálise a questão da integração psique soma
, a psique habitando um corpo. Acho interessante uma frase dele:
“doença é um pedido de socorro para a integração psique soma”.
Com
relação a isso, tenho visto muita coisa interessante no consultório.
Por exemplo: A síndrome do pânico, que não passa das agonias primitivas
descritas por Winnicott. Esse enfoque mais psicodinâmico, complementa
esse trabalho medicamentoso que se usa hoje em dia já que o remédio
ajuda no tratamento. Alguns psicanalistas estão criando obstáculos ai.
Alegam que a parte
medicamentosa está atrapalhando a visão da psicodinâmica. Eu acho, entretanto,
que os avanços da farmacologia e da psicobiologia estão ai e vieram
para ficar. Não se pode deixar de reconhecer que podem ser aliados importantes.
Acredito que hoje, o que tem sentido é um trabalho interdisciplinar.

Mesmo
por que, como diz o Boaventura de Souza Santos, num estudo
da pós modernidade, no modelo do paradigma das ciências pós modernas,
hoje em dia não existem mais os ramos do conhecimento com
seus objetos. Boaventura mostra que os grandes modelos,
as metapsicologias a as metafísicas estão sendo criticadas e estão
caindo. O que existem são micromodelos. O que a gente tem
são questões onde os vários saberes vêm contribuir. Ele fala em
galerias e sistemas e eu creio que a gente aqui no Brasil, ainda não
chegou ao trabalho interdisciplinar, mas eu acho que estamos caminhando
para isso. Eu acho que essa crise econômica vai trazer muitas
mudanças na prática dos profissionais. Acho que vem muitas coisas novas
por ai que talvez sejam um jeito de quebrar alguns estereótipos.
Às vezes, fico impressionada em observar que em nosso meio,
há um apego religioso (acho que tem a ver com as transferências e as
análises pessoais), principalmente com as instituições psicanalíticas
onde você pode falar o que for, desde que não arranhe nenhum de
seus mitos. Na minha opinião, isso traz um atraso muito grande
no crescimento e no desenvolvimento das próprias idéias. Acho que essa
crise vai trazer um impedimento para a continuação do status quo e criar
uma abertura para as coisas novas.

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