Você levanta-se pela manhã. Dá de cara com um lindo dia de sol. Lembra-se que na noite anterior, conheceu um cara que é o máximo. É o cara de seus sonhos e o que é melhor, está muito interessado em você. Mas em vez de ficar feliz, sente um mal estar que não sabe explicar. Acha que não é bonita o bastante para ele. Nem faz planos porque acha que ele não vai mais ligar.
A caminho do trabalho enfrenta as mesmas angustias de todos os dias. Medo de que os negócios não andem bem o bastante e sua independência esteja ameaçada. Não importa que sua empresa está com a bola toda e você seja uma profissional bem cotada na praça. É vitimada por essas angústias todos os dias. Às vezes fica tonta com tanto pessimismo justamente porque não há razão concreta para isso.
Surge uma espinha no rosto e você já fica em pânico. Vêem-lhe à cabeça a fantasia de ficar doente. Você morre de medo de adoecer. Não sabe porque esse medo surge, mas não consegue livrar-se dele. O gatão liga. Você fica atônita. Ligou! Responde o telefonema sem graça, insegura. Marcam um encontro. Fica desconfiada com o entusiasmo do cara.
Chega o dia de encontrar o gato. Você devia estar excitada, mas está tomada por uma angustia intensa. Passa pelo saguão do hotel e acha que alguma coisa está errada porque todos olham para você. Para diante do primeiro espelho e examina-se cuidadosamente procurando os defeitos. Não encontra nada. Está super produzida, mas ainda assim, fica insegura: por que todos olhavam? Nem lhe ocorre pensar que está linda.
Chega ao American Bar. O gatão abre aquele sorriso lindo. Você desmancha. “Ele é demais”, pensa consigo mesma. Jantam, andam e conversam. Resolvem terminar a noite juntos. Ele sugere a suíte do hotel em que estavam bebendo. Você baba de alegria. Mas, em vez de curtir a idéia, você começa a preocupar-se com seu corpo. Lembra que tem um calo feio no pé. Parece uma condenação à morte. – Será que ele vai se importar? Lembra-se de uma gordurinha aqui, de um defeito ali. Lamenta não ter pensado nessa possibilidade antes, pois assim, teria colocado uma roupa intima especial. Fica cada vez mais inibida. Perde a espontaneidade. Acha que o cara só está a fim de divertir-se com você. Conclui que só pode ser isso afinal, o que é que um cara como aquele, poderia querer com alguém como você? Será que ele enxerga bem? Talvez seja meio desequilibrado.
Na hora da transa o cara insiste na camisinha. Você entra em pânico. – Será que ele tem alguma coisa? O cara goza sozinho porque o medo deixou você de fora. Quando o cara deixa você em casa, respira aliviada. Era insuportável a tensão. Joga o telefone dele fora. Não tem mais a intenção de ligar para ele só porque acha que ele não vai mais lembrar de você. Surpreende-se e assusta-se quando no dia seguinte ele liga romântico, dizendo que têm saudades e quer vê-la de novo. A DEPRESSÃO AO ALCANCE DE TODOS
Viver ferido pela vida é uma realidade de milhões de pessoas no mundo atual. Muitas pessoas vão reconhecer como familiar, a situação descrita acima. Trata-se da depressão, uma doença conhecida há muito tempo, mas é provável que nunca tenha atingido tantas pessoas como agora. No Brasil não temos estatísticas sobre a depressão, mas nos Estados Unidos estima-se que 30 a 40 milhões de americanos sofram de depressão. Calcula-se que no futuro, um em cada quatro americanos vão sofrer um episódio grave de depressão. Somente um quarto dessas pessoas terão conhecimento da depressão e assim, poderão tratar-se.
A depressão é uma patologia (doença) que tem muitas formas de apresentação e atinge pessoas, independente de sexo, idade, raça e condição social. Muitas vezes as pessoas pensam que a depressão é um estado de tristeza profunda. Não deixa de ser uma afirmação verdadeira, entretanto, como eu disse antes, a depressão tem muitas formas de apresentação.
Na grande maioria das vezes, a depressão está mascarada por sintomas somáticos ou outros problemas psicológicos não tendo, portanto a tristeza como sinal mais evidente. Lembro-me de um paciente brincalhão e sorridente que me procurou por causa de um quadro de impotência sexual. No final, era o que chamamos de depressão mascarada. Levou um bom tempo até que eu me desse conta do estado depressivo em que ele se encontrava. Isso foi feito através de uma cuidadosa observação de sua estrutura de pensamento. Um neurologista amigo meu, durante um congresso de psicanálise, me dizia que muitas vezes, os quadros de pressão alta e gastrite desaparecem quando você trata a depressão.
É um tipo de informação que é corroborada por nossa rotina clinica. Na medida em que a depressão cede e o paciente vai retomando o prazer pela vida, desaparecem muitos sintomas físicos. Hoje em dia é quase impossível para alguém fazer clinica em psiquiatria e psicologia sem se deparar com a depressão.
O índice de suicídio entre pacientes com depressão é alto. Nota-se que entre pacientes viciados em drogas, também encontramos a depressão como sintoma importante e subjacente, quase sempre mascarada por comportamentos agressivos.
O QUE É A DEPRESSÃO
Na verdade depressão é um termo geral para um quadro sintomático que vai de um mero sentimento de abatimento até uma perda real da motivação para viver ou mesmo a apatia absoluta.
É comum encontrarmos na depressão um grande número de sintomas físicos como o cansaço, distúrbios do sono, falta de apetite, prisão de ventre, dores de cabeça, taquicardia, dores na coluna, descontrole menstrual nas mulheres, e queda do nível de energia corporal.
O depressivo tem uma constante sensação de culpa e vive se auto-repreendendo. É comum a rigidez de pensamento, a irritabilidade com tudo à sua volta e o desejo de estar só. O pensamento ansioso, aquele pensamento que volta à mente toda hora com mensagens negativas é constante. Muitos deprimidos vivem enfiados dentro de casa e usam desculpas legitimas para justificar seu confinamento. Mencionam a violência das ruas, os altos preços dos teatros e cinemas enfim, existem sempre bons motivos para ficar em casa. Os deprimidos são pessoas sempre prontos a evitar responsabilidades, mesmo que sempre se achem responsáveis por tudo que ocorre à sua volta. Não vivem, vegetam.
Como já dissemos, a depressão é hoje, um dos problemas de saúde mais comuns do mundo. É uma doença que pode ser definida como “a desordem dos superlativos”. Para começar, atinge um grande número de pessoas e pode ser letal porque é durante os períodos de depressão que as pessoas escolhem soluções definitivas para problemas transitórios: o suicídio.
Também é a mais debilitante das doenças porque a pessoa deprimida apresenta problemas em todas as áreas de sua vida. O custo emocional da depressão é o mais óbvio. O pesar e o desânimo empobrecem a qualidade de vida.
O custo financeiro também é significante, pois, numerosas doenças, desconforto físico e freqüentes consultas aos médicos, criam um pandemônio na vida financeira da pessoa. Como mostram muitas pesquisas, pacientes deprimidos têm maior probabilidade de sofrer de câncer e de terem ataques cardíacos.
Os custos sociais da depressão também merecem uma menção. Conflitos familiares, divórcios, relacionamentos familiares ruins, perda de amigos e comportamento anti-social, são problemas que devem ser levados em conta.
Os custos financeiros para o estado e para as empresas são absolutamente relevantes. Em 1995, um estudo feito nos EUA, mostrou que a depressão custava ao país, uma média de 63 bilhões de dólares ao ano. Esse valor pode ser traduzido por faltas ao trabalho, diminuição da produção, acidentes e afastamentos por doenças.
Como podemos observar, a depressão é uma doença com tentáculos de destruição que atingem níveis que estão além do individual.
O que causa a depressão? A depressão não é uma doença que pode ser atribuída a uma única causa. Tem inúmeras facetas e assim, inúmeras causas. Mesmo que ela seja desencadeada por um único fator, podemos dizer, ainda assim, que existem inúmeras causas e que o fator em questão, foi a “gota d’água”, nesse desencadeamento.
COMO TRATAR A DEPRESSÃO
Existe uma grande controvérsia entre os estudiosos no que diz respeito à etiologia da depressão. Uns argumentam que ela tem origem puramente biológica e outros, argumentam que é puramente psicológica. Nesses dois extremos, estão, a meu ver os radicais de uma e outra abordagem. Não creio que mereçam algum crédito na medida em que o homem é uma integração psicofísica e as doenças resultam dessa integração.
Minha experiência corrobora os dados de pesquisas importantes feitas no mundo, sobre a depressão. Episódios mais sérios de depressão devem ser tratados com medicação e psicoterapia. Esses dois procedimentos são complementares e eficientes. A medicação ajuda a tirar o paciente daquele estado de apatia e melhora a auto-estima na medida em que regulariza os níveis de serotonina. Com a medicação, as intervenções terapêuticas tornam-se mais eficientes porque o paciente está em condições de se comunicar e elaborar adequadamente. A psicoterapia é importante para que a pessoa possa conhecer e lidar com as situações que causam a depressão.
A questão sobre a origem biológica ou psicológica da depressão, só tem uma resposta: Nós somos criaturas biológicas e como tal, os aspectos químicos e genéticos tem um papel considerável em nossa experiência. Mas quando consideramos o quanto nossa família e nossa cultura nos influencia, poderemos então responder que somos biologicamente predispostos a sermos sensíveis ao nosso ambiente.
A DEPRESSÃO E SUAS HISTÓRIAS
De acordo com nossas observações, somente um pequeno número de pessoas deprimidas busca tratamento. Porque será que isso acontece? Será que as pessoas não sabem que estão deprimidas? Muitas vezes isso acontece. As vezes a situação de vida é tão complicada e tão difícil de resolver que o estado depressivo fica justificado. Mas na maioria das vezes o paciente deprimido não busca ajuda porque tem um profundo sentimento de desesperança que não permite acreditar que possa procurar ajuda e encontrar.
Um amigo me dizia: “Ir ao psicólogo! Para quê? Só vou me aborrecer. Ninguém pode me ajudar a sair dessa situação. Será que vocês são Deus para me colocarem “lá dentro”de volta”?
O indivíduo deprimido geralmente sente um pânico pessoal e situacional que, aparentemente, não pode ser solucionado por nenhuma ação direta sua ou de qualquer outra pessoa. Fica passivo diante das adversidades, apático diante da desesperança e confuso diante das decisões. Para uma pessoa que não está acostumada com a depressão é bastante difícil compreender a passividade do depressivo. Geralmente acham que o indivíduo é preguiçoso, tem má vontade e não quer nada com a vida.
A depressão é uma doença que ocorre em múltiplas dimensões. Nossa experiência com o mundo ocorre em múltiplos níveis ou dimensões. Temos a dimensão física, cognitiva, comportamental, afetiva, relacional, simbólica, contextual e histórica. A depressão interfere em todos os níveis de nossa experiência.