Vaginismo Quando o medo torna impossível o prazer. Por Mário Quilici
Redepsi deste mês vai tratar do Vaginismo, uma disfunção sexual que atinge muitas mulheres e é comum em muitos casamentos não consumados e às vezes desfeitos.
O vaginismo ocorre devido a um espasmo involuntário dos músculos que circundam a entrada vaginal e dos músculos constritores do ânus que ocorre sempre que é feita uma tentativa de penetração ou quando se vai tentar introduzir um objeto no orifício vaginal.
Normalmente o fator emocional é, de longe, o mais comum no vaginismo. Entretanto existem fatores que podem induzir à dor. Vejamos alguns: Hímem rígido · Endometrite · Doenças inflamatórias pélvicas · Atrofia senil da vagina · Afrouxamento dos ligamentos suspensores do útero · Tumores pélvicos · Patologias do parto · Estenose da vagina · Hemorróidas
Dessa forma, é importante que o paciente tenha um diagnóstico cuidadoso, feito pelo seu ginecologista, para afastar qualquer problema de ordem física.
Antigamente o método utilizado para a correção dos casos mais sérios de vaginismo era o alargamento cirúrgico do intróito vaginal ( Perineotomia). Os resultados, do ponto de vista anatômico, eram satisfatórios porque permitiam a penetração sem dor. Entretanto o trauma sofrido pela mulher, podia colocar tudo a perder porque interferia em sua responsividade sexual. Algumas mulheres que passaram por esta cirurgia, perderam a capacidade de ter orgasmos e outras, perderam completamente o interesse pelas atividades sexuais inclusive aquelas que não envolviam o coito e pelas quais se interessavam antes da cirurgia.
Hoje os métodos de tratamento excluem a cirurgia e são bastante simples e eficientes em termos de resultados. Habitualmente utilizamos as sessões terapêuticas e tarefas sexuais para se conseguir reduzir a ansiedade da paciente e assim introduzir as experiências de dilatação. Muitos métodos sabidamente eficientes são utilizados com resultados muito bons.
Uma grande variedade de fatores pode desempenhar um papel na etiologia desta síndrome. Tais fatores causam, dor ou medo e acabam por associar-se ao coito. Uma paciente que tratei há muitos anos, relata que casou-se ainda virgem. Havia namorado quatro anos com seu marido e nunca cedera a qualquer dos apelos dele para ter uma relação antes do casamento.
Na noite de núpcias, o marido não utilizou técnicas sexuais eficientes. Penetrou a paciente de forma grosseira e isto lhe causou dores. A partir daí, a paciente não conseguia mais ter uma relação sem dor. O que eu chamo de técnica sexual eficiente é uma correta estimulação para que a mulher alcance um nível adequado de excitação sexual a fim de que seu organismo faça as alterações fisiológicas necessárias e ela esteja devidamente preparada para o ato sexual. Quando isso é feito, a vagina vai ficar adequadamente lubrificada para permitir a penetração fácil e prazerosa do pênis. A estimulação manual da vagina só deve ser feita quando esta estiver adequadamente lubrificada para não causar desconforto.
O clitóris é outra fonte potencial de dor. Trata-se de um órgão extremamente sensível que não conta com lubrificação própria. Assim sendo, a estimulação manual de sua superfície ressecada pode trazer desconforto à mulher. Vejamos que a adequada estimulação sexual da mulher é de extrema importância pois, a estimulação do clitóris só pode ser feita quando a mulher estiver bem lubrificada de forma que, a lubrificação da vagina vai ser transportada manualmente para o clitóris e assim, dará prazer e evitará a irritação.
Temos que considerar que a completa excitação feminina é um fator importante para produzir um estado adequado para a penetração. Na medida em que a mulher se excita, a parte posterior da vagina se infla e a cervix e o útero se elevam, produzindo o efeito de uma tenda que permite mais espaço para aninhar o pênis. A penetração, antes da formação dessa "tenda" pode provocar dor na mulher.
Minha paciente ficou mais de cinco anos sem conseguir ter relações sexuais com o marido. Tal situação fez com que ele arrumasse amantes e então a coisa chegou a um ponto insustentável e veio a separação. Muitas vezes o uso de técnicas inadequadas pode impedir, como já disse, a completa excitação da mulher e então causar dor ou desconforto.
Outros fatores que podem estar na etiologia do vaginismo são a doença pélvica ou exames pélvicos traumáticos. Tais fatores podem ser tão desagradáveis que a mulher torna-se receosa de permitir qualquer penetração, inclusive a do pênis.
A violência sexual infantil é um outro aspecto relacionado ao vaginismo primário. Lembro-me de uma paciente, que chamaremos ficticiamente de Inês, que se casou com um delegado de São Paulo, após seis anos de namoro. Fizera o casamento de seus sonhos. Mas desde a primeira noite, nunca conseguiu ficar relaxada para ter uma relação sexual com o marido. Sentia fortes dores durante a penetração e era obrigada a desistir. Tal situação durou dois anos.
Quando Inês me procurou, encaminhei a paciente a um ginecologista amigo para eliminarmos qualquer possibilidade de uma patologia física. Nada foi encontrado. Iniciamos o tratamento. A grande angústia da paciente era perder o marido a quem amava muito. Com o decorrer da terapia a paciente pode falar de um fato que havia ocorrido em sua vida, quando tinha seis anos de idade. Fora violentada por seu padrasto que aproveitou uma ocasião em que a mãe estava fora e imobilizou a paciente e penetrou-a.
Inês nunca havia comentado isso com ninguém até aquele dia em sua sessão comigo. A análise foi o espaço que ela encontrou para rever os fatos, chorar sua dor e repensar as coisas de sua infância. Aos poucos, Inês começou a sentir-se mais à vontade e pode ter relações com seu marido.
Muitas pacientes que apresentam este tipo de Disfunção Sexual vêm de lares onde as atitudes rígidas e restritas evocavam sentimentos de culpa e ansiedade a respeito do sexo. Muitas vezes uma educação religiosa severa pode causar muitos problemas para a mulher que na adolescência, vai se deparar com seus hormônios turbulentos e a conseqüente vida sexual.
Um outro fator que pode estar na base do vaginismo é a hostilidade da mulher em relação aos homens. Isso pode se dar por decepções amorosas, relacionamentos com mães que frustraram-se no casamento e impedem suas filhas de viverem sua própria experiência, tornando-as confidentes e cúmplices na sua desgraça particular.
Muitos outros fatores podem estar ligados ao vaginismo. Acredito que uma anamnese (investigação da história de vida da pessoa) muito bem feita, deve ajudar bastante a esclarecer as causas da disfunção sexual. Uma paciente jovem, 23 anos, casada e com formação universitária, com essa disfunção sexual, me procurou para tratamento. Após uma anamnese cuidadosa pude perceber que a paciente tinha horror à gravidez e ao parto. Isto fazia com que temesse o ato sexual e assim, o vaginismo acabou sendo usado como uma forma de evitação. Isto ocorreu porque uma contingência negativa da vida da paciente associou-se ao parto e este obviamente estava associado ao coito.
Minha experiência pessoal com essas pacientes revelam um quadro fóbico e isso, pode, ainda que não seja regra, representar um impedimento na obtenção dos resultados satisfatórios do tratamento. O terapeuta deve observar cuidadosamente este aspecto durante o tratamento e uma vez identificado, deve ter habilidade de lidar com o elemento fóbico. Assim deve dirigir o tratamento no sentido de utilizar técnicas que permitam eliminar a atitude fóbica para que as técnicas adequadas possam ser utilizadas e a paciente possa ter vida sexual satisfatória.
Creio que naqueles casos em que a terapia é focada no tratamento da disfunção, ou seja, não se trata de um trabalho de análise, o companheiro da paciente deve ser convocado. Deve-se fazer um cuidadoso levantamento de atitudes no que diz respeito às técnicas sexuais e se for necessário, deve-se orientá-lo sobre as formas corretas.
Tornar a mulher conhecedora do funcionamento de seus genitais é de extrema importância. Tenho em meu consultório várias ilustrações que mostram o aparelho reprodutor feminino. Essa ilustrações sempre são muito úteis na hora das explicações. Creio que é importante a mulher saber que tipo de coisas podem incomodá-la, para poder dizer isso ao parceiro. O homem gosta de proporcionar prazer à mulher e se ele sabe onde e como fazê-lo, ficará mais seguro e criativo.
Quero lembrar que procurei material sobre o Vaginismo em lésbicas. Mas não consegui encontrar. Vou ficar devendo esse detalhe às nossas leitoras lésbicas. É objetivo de Redepsi discutir o Vaginismo com todas as mulheres que sofrem desse mal. Da mesma forma que nos preocupamos em incluir os homossexuais masculinos na questão da Ejaculação Precoce, desejaríamos fazer o mesmo com o Vaginismo. Mas infelizmente, nos deparamos com a falta de material sobre o assunto. Estamos providenciando e tão logo tenhamos esse material em mãos, faremos a publicação. Lamentamos que em nosso país o preconceito impeça publicações de tamanha importância. Mas como a gente sabe ler inglês, estamos providenciando material de uma associação de Lésbicas Americanas.