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Neurociência e Psicanálise integradas por Kandel

"Com este artigo Kandel inaugura um dos movimentos científicos mais promissores de nossos tempos."

Adalberto Tripicchio, Ph D

"A biologia e o futuro da psicanálise: um novo referencial intelectual [para o Campo Psi]"

Eric R. Kandel, MD

 
"We must recollect that all of our provisional ideas in psychology will presuma­bly one day be based on an organic substructure".

Sigmund Freud, "On Narcisism"

 

"The deficiencies in our description would probably vanish if we were already in a position to replace the psychological terms with physiological or chemical ones." We may expect (physiology an chemistry) to give most surprising information and we cannot guess what answers it will return in a few dozen years of questions we have put to it. They may be of a kind that will blow away the whole of our artificial structure of hypothesis".

Sigmund Freud, "Beyond the Pleasure Principle"

Durante a primeira metade do século XX, a psicanálise revolucionou nossa compreensão da vida mental. Ela proporcionou um conjunto surpreendente de novos insights sobre os processos inconscientes, o determinismo psíquico, a sexualidade infantil e, talvez, o tema mais relevante de todos, a irracionalidade da motivação humana. Em contraste com esses avanços, as conquistas da psicanálise durante a segunda metade do século foram menos impressionantes. Embora o pensamento psicanalítico continue a progredir, ultimamente tem havido relativamente poucos novos insights relevantes, com a possível exceção de alguns avanços na área do desenvolvimento infantil (para uma revisão dos progressos recentes, ver4/7). Extremamente relevante e frustrante é o fato da psicanálise não haver evoluído cientificamente. Mais especificamente, ela não desenvolveu métodos objetivos de experimentação das idéias brilhantes que formulou. Como resultado, a psicanálise entrou no século XXI com sua influência em declínio.

Este declínio é lamentável, já que ela continua a representar a visão mais coerente e intelectualmente satisfatória da mente humana. Caso a psicanálise queira recuperar seu poder e influência intelectual, precisará fazer mais do que responder às criticas hostis. Precisará também do envolvimento construtivo por parte daqueles que a valorizam e que privilegiam uma teoria sofisticada e realista da motivação humana. Tenho como propósito neste artigo sugerir uma forma de revigoramento da teoria psicanalítica que se dá através do desenvolvimento de uma relação próxima com a biologia em geral e com a neurociência cognitiva em particular.

Uma relação de maior proximidade com a psicanálise e a neurociência cognitiva pode proporcionar à psicanálise o alcance de dois objetivos: um conceitual e outro experimental. Do ponto de vista conceitual, a neurociência cognitiva pode prover a psicanálise de novos fundamentos para seu crescimento futuro, fundamentos talvez mais satisfatórios do que os provindos da metapsicologia. David Olds referiu-se a esta potencial contribuição da biologia como "reescrever a metapsicologia embasada numa fundamentação científica". Do ponto de vista expe­rimental, os princípios biológicos poderiam servir como estímulo para a pesquisa, a fim de testar idéias específicas sobre o funcionamento mental.

Outros argumentaram que a psicanálise deveria se satisfazer com objetivos mais mo­destos, como esforçar-se por aproximar sua interação com a psicologia cognitiva, uma disci­plina que tem uma relevância clínica mais dire­ta e está mais intimamente relacionada com a psicanálise. Mesmo não pondo em dúvida essa posição, parece-me, entretanto, que o que é estimulante na psicologia cognitiva dos dias de hoje, e será ainda mais no futuro, é a fusão desta com a neurociência em uma única disci­plina, chamada neurociência cognitiva. É minha esperança que, unindo-se à neu­rociência cognitiva no desenvolvimento de uma nova e instigante perspectiva da mente e de seus transtornos, a psicanálise poderá recupe­rar sua energia intelectual.

Uma interação significativa, do tipo que descrevo aqui, entre a psicanálise e a neuroci­ência cognitiva exigirá um novo direcionamento da psicanálise e novas estruturas institucionais que a encampem. Portanto, o propósito desse artigo é descrever prováveis pontos de inter­secção entre a psicanálise e a biologia e deline­ar como estas interações podem ser produtiva­mente investigadas.

O método psicanalítico e a concepção psicanalítica da mente

Antes de destacar os pontos concordantes entre a psicanálise e a biologia, é útil revisar­mos alguns fatores que levaram à presente cri­se do pensamento psicanalítico, crise esta que resultou em boa parte da restrição de sua meto­dologia. Nesse sentido, três pontos são rele­vantes:

Em primeiro lugar, no início do século XX, a psicanálise introduziu um novo método de investigação psicológica baseado na associa­ção livre e na interpretação. Freud nos ensinou a escutar cuidadosamente os pacientes de uma nova maneira nunca antes experimentada. Freud também criou um sistema provisório de interpretações para dar sentido a algo que, de outra maneira, apareceria como associações desconexas e incoerentes dos pacientes. Esta abordagem era tão singular e poderosa que por muitos anos, não apenas Freud, como tam­bém outros psicanalistas não menos inteligen­tes e criativos, poderiam argumentar que os encontros psicoterapêuticos entre pacientes e analistas proveriam um melhor contexto para a investigação. Na verdade, nos seus primórdios, a psicanálise fez muitas contribuições úteis ao nosso entendimento da mente, através da sim­ples escuta dos pacientes, ou através da testa­gem das idéias provindas do setting analítico em estudos observacionais, um método que provou ser particularmente útil no estudo do desenvolvimento infantil. Esta abordagem pode ainda ser útil na clínica porque, como Anton Kris enfatizou, ouve-se diferentemente agora. Todavia, está claro que, como instrumento de pesquisa, este método particular perdeu muito de seu poder investigatório. Cem anos depois de sua introdução, há poucas novidades no campo da teoria que possam ser aprendidas apenas através de uma mera escuta atenta dos pacientes. Nós devemos, finalmente, reconhe­cer que neste ponto do moderno estudo da mente, a observação clínica de pacientes em um contexto psicanalítico está sujeita à parcia­lidade do investigador, e isso não é uma base suficiente para uma ciência da mente.

Essa perspectiva é compartilhada mesmo por profissionais experientes da comunidade psicanalítica. Assim, Kurt Eissler escreveu:

"O decréscimo do impulso da pesquisa psi­canalítica não é devido a fatores subjetivos presentes entre os psicanalistas, mas a fatos históricos de significado mais amplo: a situação psicanalítica já deu tudo o que continha. Está esgotada quanto a possibili­dades de pesquisa, ao menos até que pos­samos conceber novos paradigmas."

Em segundo lugar, como estes argumentos deixam claro, embora a psicanálise tenha sido historicamente científica em seus objetivos, ra­ramente foi científica em seus métodos, ou seja, falhou durante anos em submeter suas suposi­ções à testagem experimental. De fato, a psica­nálise tem se saído tradicionalmente bem me­lhor em gerar idéias do que em testá-Ias. Como resultado desta falha, não foi capaz de progre­dir como o fizeram outras áreas da psicologia e da medicina.

As preocupações da moderna ciência com­portamental em controlar a influência das par­ticularidades do investigador através de expe­rimentos "cegos" têm escapado ao largo das preocupações dos psicanalistas. Com raras exceções, os dados obtidos nas sessões psicanalíticas são privados: os co­mentários dos pacientes, associações; silên­cios, posturas, movimentos e outros comporta­mentos são privilegiados. De fato, a privacidade da comunicação é ponto central para a confiança produzida pela situação psi­canalítica. Aqui está o obstáculo. Na maior par­te dos casos, nós temos somente a narrativa subjetiva do psicanalista sobre o que ele acre­dita haver acontecido. Como o pesquisador psi­canalítico Hartvig Dah tem argumentado rei­teradamente, evidências remotas como estas não são aceitas como dados na maior parte dos contextos científicos. Os psicanalistas, en­tretanto, raramente preocupam-se com o fato de que suas narrativas das sessões analíticas estejam fadadas a ser subjetivas e parciais.

Como resultado, o que Boring escreveu, aproximadamente há 50 anos, continua válido:

"Podemos dizer, sem faltar com a consideração com o que foi produzido, que a psicanálise tem sido pré-científica. Faltaram experimentos e não foram desenvolvidas técnicas de controle. No requinte da descrição sem controle, é impossí­vel distinguir especificações semânticas dos fatos".

Assim, no futuro, os institutos psicanalíti­cos deveriam se esforçar para ter, no mínimo, uma parcela de toda a análise supervisionada, acessível a este exame. Isto é importante não apenas para a situação psicanalítica, como tam­bém para outras áreas de investigação. Os insi­ghts obtidos nas sessões terapêuticas inspira­ram outros modos de investigação fora da situação analítica. Um exemplo bem sucedido é a observação direta de crianças e a análise experimental do apego e da interação pais­-bebê. Para que as análises futuras experimen­tais possam se basear nos insights adquiridos na situação analítica, é da maior importância a validação da confiabilidade científica dessas situações.

Em terceiro lugar, diferentemente de outras áreas da medicina acadêmica, a psicanálise apresenta um sério problema institucional. Os institutos psicanalíticos autônomos, que persis­tiram e proliferaram ao longo do século passa­do, desenvolveram suas próprias abordagens de pesquisa e de técnica que se diferenciaram de outras formas de pesquisa. Com algumas admiráveis exceções, os institutos psicanalíti­cos não forneceram aos seus estudantes ou membros, ambientes acadêmicos apropriados para a habilitação para bolsas de pesquisa em­pírica.

Para sobreviver como força intelectual na psicologia, medicina e na neurociência cognitiva, assim como na sociedade como um todo, a psicanáli­se precisará adotar novos recursos intelectuais, novas metodologias e novos planejamentos ins­titucionais para levar adiante sua pesquisa. Vá­rias disciplinas médicas cresceram através da incorporação de metodologias e conceitos de outras disciplinas. A psicanálise falhou ampla­mente em fazer o mesmo. Porque a psicanálise ainda não reconheceu a si mesma como um ramo da biologia, ela não incorporou, dentro da perspectiva psicanalítica da mente, os ricos re­sultados dos conhecimentos da biologia sobre o cérebro e a capacidade de controle do com­portamento que ele exerce, surgidos nos últi­mos cinqüenta anos. Isto, é claro, levanta a seguinte questão: Por que a psicanálise não foi mais receptiva à biologia?

A geração atual de psicanalistas levantou argumentos pró e contra uma biologia da mente

Em 1894, Freud referiu que a biologia não tinha avançado o bastante para ser útil à psica­nálise. Ele pensou que era prematuro uni-Ias. Um século mais tarde, um significativo número de psicanalistas tem uma visão bem mais radi­cal. A Biologia, argumentam, é irrelevante para a psicanálise. Para dar um exemplo, Marshall Edelson, em seu livro "Hypothesys and Evi­dence in Psychoanalysis", escreveu:

"Os esforços para vincular a teoria psica­nalítica aos fundamentos neurobiológicos, ou combinar hipóteses sobre a mente e sobre o cérebro em uma estrutura só, de­veriam ser evitados por representar ex­pressões de uma confusão lógica. Eu não vejo razão em abandonar a posição de Rei­ser apesar de sua conhecida crença na "unidade funcional" da mente e corpo, quando ele considera a relação entre am­bos:"

"A ciência da mente e a ciência do corpo usam linguagens diferentes, conceitos di­ferentes (com níveis diferentes de abstra­ção e complexidade) e um diferente con­junto de técnicas e instrumentos. O estudo simultâneo e paralelo, do ponto de vista psicológico e fisiológico de um paciente em estado de ansiedade aguda, produz a ne­cessidade de dois distintos conjuntos de dados descritivos, de medições e de formu­lações. Não há forma de unir essas duas ciências na tradução de uma linguagem comum, ou compartilhar um marco concei­tual comum, nem são elas formadas por conceitos extensivos que poderiam servir… como intermediários ou isomórficos. Por­tanto, para todos os propósitos práticos, nós lidamos com os conhecimentos de mente e corpo como universos diferentes."

"Virtualmente, todos os nossos dados psi­cofisiológicos e psicossomáticos consistem na essência de dados covariantes, de­monstrando coincidência de eventos em dois universos do conhecimento em um in­tervalo de tempo especifico e numa fre­qüência não casual ".

Penso que seja, no mínimo, possível que os cientistas possam finalmente concluir que aquilo que Reiser descreve não reflete apenas, metodologicamente, o estado atual das coisas, ou a inadequação do nosso pensamento, mas representa, por outro lado, algo que é logicamente ou conceitual­mente necessário; algo que nenhum de­senvolvimento prático ou conceitual pode­rá atenuar.

Em minhas diversas interações com Reiser, nunca percebi nele dificuldade alguma em rela­cionar o cérebro à mente. Contudo, concordo com muito do que Edelson afirma, pois seu ponto de vista é representativo do que é com­partilhado por um número surpreendentemente grande de psicanalistas, até mesmo por Freud em seus últimos escritos. Essa perspectiva, vá­rias vezes referida como hermenêutica em opo­sição à visão científica da psicanálise, reflete uma posição que tem dificultado a continuação do crescimento da psicanálise.

Bem, a psicanálise poderia, caso desejas­se, facilmente acomodar-se nos seus lauréis hermenêuticos. Poderia continuar discorrendo sobre as notáveis contribuições de Freud e seus alunos, sobre os insights dos processos men­tais inconscientes e suas motivações, que fa­zem com que sejamos os indivíduos complexos e singulares que somos. Decerto, no con­texto dessas contribuições, poucos desafiari­am a posição de Freud como o maior pensador moderno da motivação humana ou negariam que nosso século tem sido permanentemente marcado pela profunda compreensão freudiana das temáticas psicológicas que ocuparam a mente ocidental desde Sófocles até Schnitzier.

Mas, se a psicanálise se acomodar com suas descobertas passadas, permanecerá ine­vitavelmente, como Jonathan Lear e outros des­creveram, uma filosofia da mente e a literatura psicanalítica – de Freud a Hartmann, a Erick­son, a Winnicott – deveria ser lida como uma filosofia moderna ou texto poético ao lado de Platão, Shakespeare, Kant, Schopenhauer, Nietzsche e Proust. Por outro lado, se a discipli­na almeja ser, como eu acredito que muitos psicanalistas o fazem, um contribuinte ativo na evolução da ciência emergente da mente, en­tão, a psicanálise está ficando para trás.

Daí porque eu concordo com o sentimento expresso por Lear: "Freud está morto". Ele morreu em 1939, após uma produção extraordi­nária e uma vida criativa… é importante não ficarmos fixados nele como um sintoma rígido, seja para idolatrá-Io ou para denegri-Io.

A biologia a serviço da psicanálise 

Meu foco neste artigo é em como a biologia pode revigorar a exploração psicanalítica da mente. Devo dizer, de saída, que embora esbo­çamos o quepoderia evoluir para uma significa­tiva fundamentação biológica para apsicanáli­se, estamos recém nos primórdios deste processo. Ainda não temos uma compreensão satisfatória dos complexos processos mentais. Mesmo assim, a biologia tem feito progressos notáveis nos últimos cinqüenta anos, e os pas­sos não estão diminuindo. Como os biólogos focalizaram seus esforços na compreensão do cérebro/mente, a maior parte deles está con­vencida de que a mente representará para a biologia do atual século XXI o que os genes repre­sentaram para a biologia do século XX. Desta forma, François Jacob escreveu: "O século XX, que está terminando preocupou-se com as proteí­nas e os ácidos nucleicos. O próximo se concen­trará na memória e no desejo. Será ele capaz de responder às indagações que fazem?"

Minha idéia é de que a biologia do século vindouro está, de fato, apta a responder a algu­mas questões sobre memória e desejo e que estas respostas serão mais ricas e significati­vas se forjadas por um esforço sinérgico entre biologia e psicanálise. Ademais, respostas para estas questões e o próprio esforço de provê-­Ias em conjunto com a biologia, irá fornecer uma base mais científica para a psicanálise.

Agora, é muito provável que a biologia faça profundas contribuições para a compreensão dos processos mentais, descre­vendo a base biológica dos muitos processos inconscientes, como por exemplo, do determi­nismo psíquico, do papel dos processos men­tais inconscientes na psicopatologia e do efeito terapêutico da psicanálise. Bem, mas a biologia não poderá iluminar imediatamente seus pro­fundos e centrais mistérios. Estes temas repre­sentam, juntamente com a natureza do incons­ciente, os problemas mais difíceis com que a biologia se confronta, na verdade que toda a ciência enfrenta. No entanto, já se pode esbo­çar as formas pelas quais a biologia poderá, pelo menos, clarificar alguns temas psicanalíti­cos centrais. Aqui, eu defino oito áreas em que a biologia poderia se unir à psicanálise para fazer contribuições importantes:

         1) A natureza dos processos mentais in­conscientes

            2) A natureza da causalidade psicológica

            3) Causalidade psicológica e psicopatoloógica

            4) Experiência precoce e predisposição à patologia mental

            5) O pré-consciente, o inconsciente e a cór­tex pré-frontal

            6) Orientação Sexual

            7) A psicoterapia e as mudanças estrutu­rais na mente          

            8) A psicofarmacologia como tratamento combinado com a     

              psicanálise

1. Processos mentais inconscientes

É central, para a psicanálise, a idéia de que desconhecemos muito da nossa vida mental. A maior parte do que vivenciamos, do que perce­bemos, pensamos, sonhamos ou fantasiamos não pode ser diretamente acessada através do pensamento consciente. Da mesma forma, não podemos explicar o que freqüentemente motiva nossas ações. A idéia de processos mentais inconscientes, além de ser importante por si mesma, é decisiva para a compreensão da na­tureza do determinismo psíquico. Dado o papel central dos processos psíquicos inconscientes, como pode a biologia nos ensinar a compreen­são de tais processos?

Em 1954, Branda Milner fez a notável descoberta, a partir de estudos de H.M., um paciente com amnésia, de que o Lobo Tempo­ral Medial e o Hipocampo medeiam o que hoje denominamos armazenamento da memória de­clarativa (memória explícita), que corresponde à memória consciente de pessoas, objetos e lugares. Em 1962, ela foi mais longe, desco­brindo que ainda que seu paciente não se re­cordasse conscientemente de suas memórias recentes sobre pessoas, lugares e objetos, ele era totalmente capaz de aprender novas habili­dades motoras e perceptivas. Esse tipo de memória, denomi­nada memória procedural ou memória implícita, é completamente inconsciente e se evidencia somente no seu desempenho e não nas recor­dações conscientes.

O uso simultâneo dos dois sistemas de memória consiste mais em regra do que em exceção. Esses dois sistemas de memória se justapõem e são comumente usados em con­junto, de forma que muitas tarefas de aprendi­zagem requerem ambos. De fato, repetições constantes podem transformar a memória de­clarativa em procedural. Por exemplo, o apren­dizado de dirigir um automóvel envolve primei­ramente lembranças conscientes, mas, após um determinado número de repetições, o ato de dirigir torna-se automático, consistindo-se em atividade motora inconsciente. A memória pro­cedural constitui, por si mesma, um conjunto de processos que envolve diversos sistemas cere­brais diferentes: o ''priming'', ou reconhecimen­to de estímulos recentes, é uma função do cór­tex sensorial; a aquisição de estados emocionais diversificados envolve a amígdala; a formação de novos hábitos motores (e talvez cognitivos) requer o neostriatum; o aprendiza­do de novos comportamentos motores ou ativi­dades coordenadas depende do cerebelo. Dife­rentes contextos e experiências de aprendizado recrutam diferentes subgrupos desses e outros sistemas de memória de procedimentos, em combinação variável com os sistemas de me­mória explícita do hipocampo e de outras estru­turas afins.

Na memória procedural, temos um exem­plo biológico de um componente da vida mental inconsciente. De que forma é que esse incons­ciente biológico se relaciona ao inconsciente de Freud? Em seus últimos escritos, Freud usou o conceito de inconsciente de três formas diferentes. Primeira­mente, ele usou o termo de uma forma especi­fica e estrutural para se referir ao inconsciente reprimido ou dinâmico. Este inconsciente cor­responde ao que a literatura psicanalítica clás­sica refere como o inconsciente. Este inclui não apenas o id, como também parte do ego que contém impulsos, defesas e conflitos in­conscientes, sendo, por isso, similar à dinâmi­ca inconsciente do id. Nesse inconsciente di­nâmico, as informações sobre conflitos e impulsos são impedidas de alcançar a cons­ciência por poderosos mecanismos de defesa como a repressão.

Em segundo lugar, complementando as partes reprimidas do ego, Freud propôs que uma outra parte permanece inconsciente. Dife­rentemente das partes inconscientes do ego que se encontram reprimidas e, por esse moti­vo, assemelham-se ao inconsciente dinâmico, a parte inconsciente do ego não reprimida não está preocupada com os impulsos e conflitos inconscientes. Além disso, diferentemente do pré-consciente, essa parte inconsciente não é, de forma alguma, acessível à consciência, mes­mo não estando reprimida. Desde que este in­consciente esteja relacionado a hábitos e habi­lidades motoras e perceptivas, ele se projeta na memória procedural. Devo, então, me referir a esta parte do inconsciente como inconsciente procedural.

Finalmente, Freud usou o termo, descriti­vamente, em um sentido mais amplo – pré­-consciente/inconsciente – para referir-se a qua­se todas as atividades mentais, à maior parte dos pensamentos e memórias que alcançam a consciência. De acordo com Freud, o indivíduo não tem consciência de quase todos os proces­sos e eventos mentais, mas pode ter pronto acesso à consciência de muitos deles através de um esforço de atenção. A partir dessa pers­pectiva, conclui-se que a maior parte da vida mental ocorre no plano inconsciente, podendo tornar-se consciente somente como percepções sensórias, tais como palavras e imagens.

Desses três processos mentais inconscien­tes, apenas o inconsciente procedural, a parte inconsciente do ego que não está em conflito ou reprimida, parece projetar-se no que os neu­rocientistas chamam de memória procedural. Esta cor­respondência importante entre a neurociência cognitiva e a psicanálise foi primeiramente reconhecida em um inspirado artigo de Robert Clyman, que relacionou a memória procedural ao contexto emocional e sua relevância para a transferência e tratamento. Essa idéia foi de­senvolvida mais profundamente por Louis San­der, Daniel Stern e seus colegas do Boston Process of Change Study Group. Este grupo enfatizou que muitas das mudanças que se desenvolvem no processo terapêutico durante a análise não estão no campo da compreensão consciente e, sim, no campo dos comportamen­tos e conhecimentos não-verbais do incons­ciente procedural. Para sintetizar essa idéia, Sander, Stern e colegas desenvolveram o conceito de que há momentos de significação ­que ocorrem na interação entre paciente e tera­peuta – no contexto psicanalítico que represen­tam o alcance de um novo grupo de memórias implícitas que permite, à relação terapêutica, progredir a um novo nível. Essa progressão não depende da compreensão consciente e não re­quer que o inconsciente se torne consciente. Ao invés disto, os momentos significantes, no entender dos autores, levam a mudanças com­portamentais que aumentam o limite da ação das estratégias procedurais de ser e agir. O crescimento nessas categorias do conhecimen­to conduz a estratégias de ação que se refletem na forma com que a pessoa interage com ou­tras, inclusive na transferência.

Marianne Goldbeneger expandiu essa li­nha de pensamento, enfatizando que o desen­volvimento moral também pode ser desenvolvi­do pelos meios procedurais. Salienta que as pessoas geralmente não se lembram, de forma consciente, das circunstâncias sob as quais assimilaram as regras morais que regem seus comportamentos; essas regras são adquiridas de forma quase automática, como as regras da gramática que regulamentam a língua nativa de qualquer pessoa.

Ilustrei a distinção entre memória procedu­ral e declarativa, proveniente da neurociência cognitiva, a fim de enfatizar a utilidade, para o pensamento psicanalítico, de uma percepção fundamentalmente neurobiológica. Além dis­so, sugiro que, assim como na psicanálise, es­sas idéias biológicas são, até aqui, apenas idéias. O que a biologia pode oferecer é uma oportunidade de levá-Ias a um passo adiante. Agora, sabemos bem mais sobre os aspectos biológicos do conhecimento procedural incluin­do algumas de suas bases moleculares.

Essa interessante convergência da psica­nálise com a biologia na problemática da me­mória procedural confronta-nos com a tarefa de testar tais idéias de forma sistemática. Precisa­remos examinar, a partir de ambas as perspec­tivas psicanalítica e biológica, a extensão dos fenômenos que agrupamos sob a rubrica de "memória procedural" e observar como eles se distribuem nos diferentes sistemas neurais. A partir disto, poderemos examinar nos estudos comportamentais, observacionais e de ima­gens, em que grau diferentes comportamentos de um dado momento significante ou diferentes momentos deste tipo recrutam um ou outro sub­sistema anatômico da memória procedural. Conforme essas idéias vão se tornando mais claras, podemos perceber que uma das primei­ras limitações do estudo sobre os processos psíquicos inconscientes foi a falta da existência de uma metodologia para a observação direta. Todos os métodos de estudo dos processos inconscientes foram indiretos. Assim, a contri­buição mais importante que a biologia pode agora fazer – com a sua habilidade de inferir sobre os processos mentais e com sua habili­dade para estudar pacientes com lesões cere­brais em diferentes componentes da memória procedural – é modificar a base do estudo dos processos mentais inconscientes, desde a infe­rência indireta até a observação direta. Nesse sentido, poderemos ser capazes de determinar quais aspectos, psicanaliticamente relevantes da memória procedural, são mediados por cada um dos sistemas sub-corticais envolvidos. Além disso, métodos de imagens podem nos permitir discernir que sistemas cerebrais medeiam as duas outras formas de memória inconsciente: o inconsciente dinâmico e o pré-consciente.

Antes de voltar minha atenção ao incons­ciente/pré-consciente e a sua possível relação com o córtex pré-frontal, desejo considerar três outros aspectos relativos ao inconsciente pro­cedural: sua relação com o determinismo psí­quico, com os processos mentais conscientes e com as experiências precoces.

2. A natureza do determinismo psíquico: como dois eventos tornam-se associados na mente?

Na perspectiva freudiana, os processos mentais inconscientes proporcionam uma expli­cação para o determinismo psíquico. A idéia fundamental do determinismo psíquico é que muito pouco, ou nada, na vida psíquica de al­guém, ocorre por acaso. Cada evento psíquico, não importando se declarativo ou procedural, é determinado por um evento precedente. Desli­zes verbais, pensamentos aparentemente sem sentido, piadas, sonhos, e todas as imagens relacionadas a cada sonho, precedem aconte­cimentos psicológicos e possuem um significa­do coerente com relação ao resto da vida psí­quica de qualquer pessoa. O determinismo psí­quico é igualmente importante na psicopatologia. Até mesmo sintomas neuróti­cos, não importando o quão estranho possam parecer ao paciente, têm um sentido na mente inconsciente relacionado a processos mentais anteriores. Estas conexões entre sintomas e processos mentais causais, ou entre imagens de um sonho e eventos relacionados, encon­tram-se obscurecidas pela operação de proces­sos inconscientes dinâmicos e onipresentes.

O desenvolvimento de muitas idéias do pensamento psicanalítico e sua metodologia central, a associação livre, deriva do conceito de determinismo psíquico. O objetivo da asso­ciação livre é obter o relato, por parte do pa­ciente, de todos os pensamentos que passam por sua mente, impedindo que exerça sobre eles qualquer grau de censura ou direciona­mento. A idéia principal do determinismo psíquico é a de que qualquer fenômeno mental está causalmente relacionado a um preceden­te. Desta forma, Brenner escreveu:

"Na mente, como na natureza física ao nos­so redor, nada acontece fortuitamente ou por acaso. Cada acontecimento psíquico é determinado por um precedente".

Embora não tenhamos um modelo biológi­co sofisticado do conhecimento psíquico explí­cito e declarativo, encontramos, na biologia, um ponto de partida satisfatório para a compreen­são de como as associações se desenvolvem na memória procedural. Até onde os aspectos do conhecimento de procedimentos são relevantes para os momen­tos significativos, estes fundamentos biológicos devem provar ser úteis para o entendimento do inconsciente procedural.

Nas últimas décadas do século XIX, na mesma época em que Freud estava trabalhan­do em sua teoria do determinismo psíquico, Ivan Pavlov estava desenvolvendo uma abor­dagem empírica de um momento específico do determinismo psíquico, no nível do que hoje em dia denominamos conhecimento procedural, ou seja, a aprendizagem pela associação. Pavlov buscava a elucidação de uma característica essencial da aprendizagem que é conhecida desde a Antigüidade. Pensadores ocidentais desde Aristóteles tinham inferido que o armaze­namento da memória requer a associação tem­poral de pensamentos contínuos, um conceito posteriormente desenvolvido sistematicamente por John Locke e pelos filósofos empiristas bri­tânicos.

O mais brilhante empreendimento de Pav­lov foi o desenvolvimento de um modelo animal de aprendizado por associação que poderia ser rigorosamente estudado em laboratório. Mu­dando o tempo entre dois estímulos sensórios e observando os efeitos desta mudança no com­portamento de reflexo simples, Pavlov es­tabeleceu um procedimento no qual inferências razoáveis podiam ser feitas sobre como as mu­danças na associação entre os dois estímulos poderiam levar a mudanças no comportamento – no aprendizado.

Desta forma, Pavlov desenvolveu paradig­mas poderosos para o aprendizado por asso­ciação, que levaram a uma modificação perma­nente no estudo do comportamento, movendo-se de uma ênfase na introspecção para uma análise objetiva de estímulo-resposta. Este é exatamente o tipo de mudança que estamos buscando nas investigações psicana­líticas a respeito do determinismo psíquico. Descrevi este paradigma familiar porque desejo enfatizar três pontos relevantes para o pensa­mento psicanalítico. Primeiro: no aprendizado da associação entre dois estímulos, o sujeito não aprende simplesmente que um estímulo precede ao outro. Ao invés, ao aprender a as­sociar dois estímulos, o indivíduo aprende que um vem a predizer o outro. Segundo, como veremos adiante, o condicionamento clássico é um para­digma soberbo para a análise de como o conhe­cimento pode se deslocar do plano inconscien­te para o consciente. Finalmente, o condicionamento clássico pode ser usado para adquirir não somente respostas apetitivas como também aversivas, proporcionando-nos, assim, insights relacionados à emergência de psicopa­tologias. Agora, desenvolverei especificamente cada um destes pontos.


O determinismo psíquico do condicionamento clássico é probabilístico

Por muitos anos, os psicólogos pensaram que o condicionamento clássico seguia as re­gras de um determinismo psíquico semelhante ao delineado por Freud. Pensavam que o con­dicionamento clássico dependia somente de contigüidade e de um intervalo crítico mínimo entre o estímulo condicionado e o não-condicio­nado, de tal forma que os dois eram vivencia­dos como conectados. De acordo com esta perspectiva, em cada período de tempo, um estímulo condicionado é seguido de um reforço ou estímulo não condicionado. Uma conexão neural é, assim, fortalecida entre o estímulo e a resposta ou entre um estímulo e outro, até que finalmente a conexão entre os dois se torna tão forte que é possível a mudança de comporta­mento.

A única variável relevante determinando a força do condicionamento pensava-se ser o nú­mero de pares de estímulos condicionados e incondicionados. Em 1969, Leon Kamin fez o que hoje é considerado de forma geral, a des­coberta empírica mais significativa no campo do condicionamento desde os primeiros acha­dos de Pavlov, na virada do século. Kamin cons­tatou que os animais aprendem mais do que a contigüidade: aprendem também as contingên­cias. Eles não aprendem simplesmente que o estímulo condicionado precede o não-condicio­nado, mas também que o estímulo condiciona­do prevê o estímulo não-condicionado. Deste modo, a aprendizagem associativa não depen­de de um número crítico de pares de estímulos condicionados e não-condicionados, mas do poder do estímulo condicionado de prever um não-condicionado biologicamente relevante.

Estas considerações sugerem o porquê dos animais e das pessoas adquirirem tão pronta­mente o condicionamento clássico. O condicio­namento clássico, e talvez todas as formas de aprendizagem associativa, evoluiu filogenetica­mente para capacitar o animal a distinguir acon­tecimentos que regularmente ocorrem juntos daqueles que estão associados somente pelo acaso. Em outras palavras, o cérebro parece ter desenvolvido um mecanismo simples que "dá sentido" a eventos do meio ambiente ao relacionar uma função preditiva a alguns des­ses eventos. Quais condições ambientais po­dem haver formado ou mantido um mecanismo comum de aprendizagem nas mais variadas espécies? Todos os animais devem ser capa­zes de reconhecer e evitar o perigo; eles preci­sam buscar gratificações como as provindas da nutrição e evitar a comida quando esta está deteriorada ou é tóxica. Uma forma efetiva de atingir esse conhecimento é adquirir a capaci­dade de detectar relações entre estímulos ou entre comportamentos e estímulos. É possível que, ao examinar essas relações em termos da biologia celular, podemos estar contemplando o mecanismo elementar do determinismo psí­quico.

Condicionamento clássico e a relação entre os processos mentais procedurais conscientes e declarativos inconscientes

O condicionamento clássico convencional é usualmente realizado em uma forma denomi­nada "condicionamento postergado", em que o início do estímulo condicionado precede tipica­mente o início do estímulo não-condicionado por aproximadamente 500 mseg, e ambos os estímulos terminam juntos.

Essa forma de condicionamento é prototi­picamente procedural. Quando um sujeito humano normal aprende uma resposta de pis­car a partir de um leve estímulo táctil em sua sobrancelha, este sujeito não está consciente de que está sendo condicionado. Os pacientes com danos no hipocampo e no neocórtex tem­poral medial a quem, portanto, falta memória declarativa ou explícita, podem ser condiciona­dos como os sujeitos normais, sob o paradigma do "condicionamento postergado" (delay condi­tioning).

Uma leve variação, o condicionamento de traço (trace conditioning), converte o condicio­namento implícito em memória explícita. Com o condicionamento de traço, o estímulo condicio­nado termina antes do estímulo não-condicio­nado ocorrer, de forma que o estímulo condicio­nado é breve, havendo um intervalo de 500 mseg entre o fim do estímulo condicionado e o início do estímulo não-condicionado. Richard Thompson e colegas constataram que o condicionamento "trace" depende do hipo­campo e está eliminado em experiências com animais que sofreram lesões do hipocampo. Clark e Squire ampliaram estes experimentos, estendendo-os aos humanos, constatando que o condicionamento determinado requeria lem­brança consciente. Durante o processo de con­dicionamento de traço, sujeitos normais geral­mente tornam-se conscientes do intervalo temporal que ocorre na relação entre o estímu­lo condicionado e o não-condicionado. Aqueles sujeitos que não tomam consciência deste in­tervalo não se condicionam. Além disso, essa tarefa não pode ser bem desenvolvida, por pes­soas que sofrem de amnésia – provinda de um defeito na memória declarativa – resultante de lesões do Lobo Temporal Medial.

Desta forma, uma pequena modificação na seqüência temporal transforma o determinismo psíquico de inconsciente para consciente! Este fato é consistente com a idéia de que os dois sistemas de memória, declarativa e procedural, são freqüentemente acionados por uma tarefa comum e codificam diferentes aspectos do pa­drão sensório de estímulos (ou do mundo exter­no) apresentados ao sujeito. Em que local, no Lobo Temporal Medial, ocorre esta modificação de um tipo de armazenamento da memória para outra? Para Eichenbaum, o hipocampo tem a capacidade de associar eventos não contíguos no espaço e no tempo. De fato, agora sabemos que o condicionamento de traço aciona o hipo­campo e os circuitos do Lobo Temporal Medial. Que partes do circuito do hipocampo são mais importantes para o condicionamento de traço? Há outras regiões envolvidas? O córtex pré­-frontal (que deveremos considerar adiante) ­uma área relacionada à memória de trabalho, que é considerada representativa de um aspec­to do pré-consciente-inconsciente – media as­sociações entre as memórias inconscientes e conscientes, que são o sujeito da análise?

3. Causalidade psicológica e psicopatologia

Vimos que um ponto de convergência entre a biologia e a psicanálise é o papel relevante da memória procedural para o desenvolvimento das primeiras noções morais, para a transfe­rência e para os momentos significativos na psicoterapia psicanalítica. Consideramos um segundo ponto de convergência quando exami­namos a relação entre as características asso­ciativas do condicionamento clássico e o deter­minismo psíquico. Quero agora ilustrar um terceiro ponto de convergência: aquele que se encontra entre o condicionamento para o medo, de Pavlov, uma forma de memória procedural mediada pela amígdala, a ansiedade sinal e a síndrome de stress pós-traumático nos huma­nos.

No início deste trabalho sobre o condicio­namento clássico, Pavlov referiu que o condi­cionamento é apetitivo quando o estímulo não-condicionado é gratificante, mas o mesmo pro­cedimento produzirá um condicionamento de­fensivo quando o estímulo não-condicionado for aversivo. A descoberta seguinte de Pavlov foi a constatação de que o condicionamento defen­sivo proporciona um modelo experimental parti­cularmente interessante para o surgimento da ansiedade sinal, uma forma de medo aprendido que pode ser vantajosa.

"É bastante evidente que, sob condições naturais, animais normais respondem não apenas a estímulos que trazem benefício imediato ou causam danos, como também a outros agentes químicos ou físicos… que apenas sinalizam a aproximação destes estímulos; portanto, não é a visão ou som do predador que é em si mesmo perigosa a suas vítimas, mas seus dentes e garras".

Uma proposta similar foi feita, independen­temente, por Freud. Devido ao fato dos estímu­los dolorosos se encontrarem freqüentemente relacionados a estímulos neutros, simbólicos ou reais, Freud postulou que a repetição de estímulos neutros e nocivos pode fazer com que os estímulos neutros sejam percebidos como perigosos, provocando ansiedade. Con­textualizando este postulado em termos bioló­gicos, Freud escreveu:

"O indivíduo terá feito um avanço importan­te na sua capacidade de auto-preservação se puder prever situações traumáticas des­te tipo que ocasionam desamparo, ao invés de simplesmente esperar que elas aconte­çam. Chamemos a situação que contém o determinante para tal expectativa de situa­ção perigosa. É a partir desta situação que é dado o sinal de ansiedade".

Assim, ambos, Pavlov e Freud, consideram que é biologicamente adaptativo possuir a ha­bilidade de responder defensivamente a sinais de perigo antes de o perigo real estar presente. A ansiedade sinal ou antecipatória prepara o indivíduo para lutar ou fugir se estes sinais provêm do ambiente. Freud sugeriu que as de­fesas mentais funcionam como substitutos das ações reais de fuga, só que em resposta ao perigo interno. A ansiedade sinal, portanto, pro­vê uma oportunidade para o estudo de como as defesas mentais são desencadeadas, de como o determinismo psíquico pode levar à psicopa­tologia.

Sabemos que a amígdala é importante para a memória emocionalmente carregada, como ocorre no condicionamento clássico do medo através da conjugação de um estímulo neutro com um choque. A amígdala coordena o fluxo de informações entre as áreas do tálamo e do córtex cerebral responsáveis pelo processa­mento dos estímulos sensoriais, e as áreas que processam a expressão do medo: o hipotála­mo, que regula a resposta autonômica ao medo, e as áreas de associação Iímbicas neo-corti­cais (córtex pré-frontal e do cíngulo), o córtex pré-frontal e o córtex cingulado que estão en­volvidos na avaliação consciente das emoções. LeDoux referiu que, na ansiedade, o paciente experimenta os estímulos autônomos como si­nais de que algo ameaçador está acontecendo, um incremento mediado pela amígdala. LeDoux atribui a falta de consciência a um apagamento do hipocampo devido ao stress, um mecanismo que será considerado adiante. Agora, possuí­mos métodos excelentes de visualização des­tas estruturas em animais e humanos de forma experimental com o objetivo de abordar a ques­tão de como estas conexões estão estabeleci­das, e, uma vez estabelecidas, como são man­tidas.

4. Experiência precoces e predisposição para a psicopatologia

A ansiedade sinal representa um exemplo simples de uma psicopatologia adquirida. Mas, como ocorre com todas as coisas adquiridas, algumas pessoas têm uma maior disposição constitucional que outras para desenvolver an­siedade neurótica. Quais fatores predisporiam um indivíduo a associar uma variedade de estí­mulos neutros com estímulos ameaçadores?

Em Luto e Melancolia e em outros de seus escritos, Freud enfatizou o papel de dois com­ponentes na etiologia da psicopatologia adqui­rida. São eles: predisposições constitucionais (incluindo a bagagem genética) e experiências precoces (especialmente, perdas). De fato, exis­tem evidências no desenvolvimento de muitas formas de doenças mentais para ambos os fa­tores; genéticos e experienciais (ambos, expe­riências do desenvolvimento, precoces e precipi­tantes agudos tardios). Como exemplo, enquanto há uma nítida contribuição genética à suscetibilidade à depressão, muitos pacientes com um quadro de depressão maior passaram por experiências estressantes durante sua in­fância como o abuso ou negligência, sendo estes estressores importantes na predição da depressão. O caso é ainda mais evidente na desordem ocasionada por stress pós-traumáti­co (PTSD), que requer para seu diagnóstico a presença de uma experiência estressante tão grave que se encontra fora do limite das vivên­cias humanas normais. Aproximadamente 30% dos indivíduos traumatizados desta forma de­senvolvem subseqüentemente a síndrome com­pleta. Esta penetrância incompleta levanta a seguinte indagação: que fatores, além da baga­gem genética, predispõem ao desenvolvimento em algumas pessoas da PTSD e de outras perturbações relacionadas ao stress?

O componente referente às experiências precoces que demonstrou ser o mais importan­te nos casos humanos, na realidade, para todos os mamíferos, é o principal cuidador do bebê, normalmente a mãe. A psicanálise por muito tempo referiu que a maneira como ocorre a interação entre a criança e a mãe cria na mente da criança as primeiras representações men­tais, não somente a respeito de outra pessoa, como também do estilo da interação em si, ou seja, do modelo de relacionamento entre elas. Esta(s) representação(s) inicial(is) das pessoas e relações é considerada relevante para o pos­terior desenvolvimento psicológico da criança. A interação ocorre em um fluxo recíproco. A forma com que o bebê se comporta com relação à mãe exerce influência considerável no com­portamento dele. Um apego seguro entre mãe e criança acredita-se que favoreça um sentimen­to de aceitação de si e confiança básica nos outros, da mesma forma que um apego insegu­ro é reconhecido como promotor de ansiedade.

Uma das primeiras idéias-chave a emergir de ambos os estudos do desenvolvimento, cog­nitivo e neurobiológico, é de que o desenvolvi­mento dessas representações internas pode somente ser desencadeado durante um perío­do precoce definido e crítico na vida infantil. Durante estes períodos críticos, e somente ne­les, a criança (e sua mente em desenvolvimen­to) deverá interagir com um ambiente responsi­vo (um ambiente em média previsível, nos termos de Heinz Hartmann), se o desenvolvi­mento de seu cérebro e de sua personalidade for satisfatório.

A primeira evidência da importância das relações precoces entre os pais e seus bebês partiu dos estudos de Anna Freud sobre os efeitos traumáticos das disfunções familiares durante a Segunda Guerra Mundial. Este tema foi desenvolvido mais profundamente por René Spitz, através de pesquisas comparativas en­tre dois grupos de crianças separadas de suas mães. Um dos grupos habitava uma Fundação para crianças abandonadas e era cuidado por enfermeiras, cada qual responsável por sete crianças, e outro grupo pertencia a uma creche vinculada a uma prisão feminina, onde as crian­ças eram cuidadas diariamente pelas mães. No final do primeiro ano, a performance motora e intelectual das crianças do orfanato caiu muito abaixo daquela das crianças da creche. Estas crianças eram retraídas e mostravam pouca curiosidade e alegria.

Harry Harlow levou este estudo ainda mais longe, elaborando um modelo animal para o desenvolvimento do bebê. Observou que, quan­do os macacos recém-nascidos eram isolados por um período de seis meses a um ano e depois retomados à companhia de outros ma­cacos, eles se mantinham fisicamente saudá­veis, mas apresentavam perturbações devasta­doras em seus comportamentos. Estes macacos ficavam agachados no canto das suas jaulas e embalavam-se para trás e para frente como fazem as crianças autistas ou severa­mente perturbadas. Eles não interagiam com outros macacos, nem lutavam, brincavam ou mostravam qualquer interesse sexual. O isola­mento de um animal em idade mais avançada por um período comparável não causava ne­nhum efeito destrutivo. Assim, nos macacos como nos humanos, foi constatado haver um período crítico para a socialização. Harlow pos­teriormente demonstrou que a síndrome pode­ria ser parcialmente revertida através da substi­tuição da ausência da mãe por uma mãe postiça de madeira revestida com tecido. Esta substitu­ta desencadeava o comportamento de apego no macaco isolado, mas era insuficiente para que ocorresse o desenvolvimento completo da socialização. A socialização completa normal poderia apenas ser resgatada se, além da mãe substituta, o animal isolado tivesse tido conta­to, por algumas horas durante o dia, com maca­quinhos normais que ficavam o resto do dia na colônia dos macacos.

O trabalho de Anna Freud, Spitz e Harlow foi relevantemente desenvolvido por John Bowl­by, que começou a pensar a interação entre a criança e seus cuidadores em termos biológi­cos. Bowlby formulou a idéia de que a crian­ça indefesa mantém a proximidade ao seu cui­dador através de um sistema de padrões de responsividade emocional e comportamental, denominando-o sistema de apego. A concep­ção de Bowlby sobre o sistema de apego era de um sistema inato instintivo ou motivacional, si­milar a sede ou fome, responsável pela organi­zação dos processos de memória da criança e pelo seu direcionamento na busca de proximi­dade e comunicação com a mãe. A partir de um ponto de vista evolucionista, o sistema de ape­go claramente aumenta as chances de sobrevi­vência da criança, pois permite ao cérebro ima­turo o uso das funções maduras dos pais para organizar seus próprios processos vitais. O me­canismo de apego de uma criança é espelhado nas respostas sensíveis dos pais aos sinais dela. As respostas parentais servem tanto para amplificar como para reforçar os estados emo­cionais positivos da criança e atenuar os esta­dos negativos, ao proporcionar à criança segu­rança quando ela está frustrada. Estas experiências repetidas tornam-se codificadas na memória procedural como expectativas que ajudam a criança a sentir-se segura.

Deve ser observado que, durante os 2 a 3 primeiros anos de vida, quando a interação da criança com sua mãe é particularmente impor­tante, a criança depende primeiramente de sua memória procedural. Tanto em animais usados para experimentação, como nos humanos, a memória declarativa se desenvolve em um pe­ríodo posterior. Assim, a amnésia infantil, que resulta no pouco acesso a memórias da primei­ra infância após a vivência desta, é evidente não somente nos seres humanos, como tam­bém em outros mamíferos, incluindo roedores.

Esta amnésia, presumivelmente, não é devida à repressão das lembranças do período da re­solução do complexo edípico, mas tem como causa o desenvolvimento vagaroso do sistema da memória declarativa.

Bowlby descreveu a resposta à separação como ocorrendo em duas fases: protesto e de­sespero. Fenômenos que perturbam a proximi­dade da criança ao objeto de apego produzem primeiramente protesto observado em compor­tamentos como o agarramento, comportamento de seguir, buscar, chorar e excitação fisiológica aguda com duração de minutos a horas. Estes comportamentos servem para restaurar a proxi­midade. Quando o contato é restabelecido, es­tes comportamentos de agarramento são extin­tos, segundo Bowlby, por um mecanismo de feedback. Então, são ativados sistemas de com­portamento alternativos principalmente explo­ratórios. Se a separação é prolongada, o desâ­nimo (desespero) gradualmente toma o lugar daquelas respostas precoces, à medida que a criança reconhece que a separação pode ser prolongada ou permanente. Os comportamen­tos de ansiedade e fúria são substituídos por tristeza e desesperança. Enquanto o protesto é concebido como adaptativo pelo aumento da probabilidade de pais e crianças se encontra­rem novamente, pensa-se que a desesperança pode preparar a criança para a sobrevivência passiva por períodos prolongados de tempo, através da conservação da energia e afasta­mento do perigo.

Devemos a Levine e seus colegas, Ader, Grota e Hofer, a descoberta de que siste­mas similares de apego existem nos roedores. A extensão desta pesquisa para o modelo com os roedores, que é bem mais simples, embora continue no campo dos mamíferos, é extrema­mente relevante e poderosa. Por exemplo, nos ratos, os genes podem ser expressos ou supri­midos, o que permite uma abordagem poderosa da relação de genes individuais com o compor­tamento. Levine verificou que filhotes de ratos demonstram protesto imediato à separação. Os filhotes emitem vocalizações de alta intensida­de, comportamentos de busca agitada e de as­seio (lamber seus próprios pêlos). Se a mãe falha em retornar e a separação continua, os comportamentos de protesto dominam por um período de horas, para após serem substituídos por uma quantidade de comportamentos mais vagarosos, semelhantes à desesperança, como tornar-se menos alerta e responsivos. Estes comportamentos são observáveis fisiologica­mente pela redução do batimento cardíaco e temperatura corporal. Assim como o trabalho de Harlow foi capaz de delinear os componen­tes do cuidador que eram essenciais para o desenvolvimento normal do caráter, também Hofer demonstrou três aspectos diferentes dos comportamentos padrões de respostas protes­to/acomodação que eram desencadeados por três reguladores ocultos na interação mãe/filho: falta de calor, falta de alimento e falta de esti­mulação táctil.

Levine e seus colegas foram os primeiros a levar essas análises ao nível molecular, estu­dando a forma com que os muitos graus de apego infantil afetavam a habilidade de respos­ta ao stress. Hans Selye salientou já em 1936 que tanto humanos quanto animais experimen­tais respondiam a experiências estressantes ativando o eixo hipotalâmico-hipofisário-suprarrenal (HHS). O produto final do sistema HHS é a liberação de hormônios glicocorticóides pela glândula suprarrenal. Estes hormônios servem como importantes reguladores da homeostase – do metabolismo intermediário, tônus muscu­lar e função cardiovascular. Juntamente com as catecolaminas liberadas pelo sistema nervoso autônomo e pela medula da suprarrenal, a secreção de glicocorticóides é essencial para a sobrevi­vência frente ao stress.

Daí a razão porque Levine levantou a se­guinte questão: poderia a resposta a longo ­prazo do sistema HHS ser modulada pela expe­riência? E, se possível, seria particularmente sensível a experiências precoces? Levine des­cobriu que, quando, ao longo das duas primei­ras semanas de vida, os filhotes eram separa­dos de suas mães por apenas alguns minutos, estes demonstravam um aumento de vocaliza­ção, que desencadeava o aumento do cuidado maternal. As mães respondiam lambendo, lim­pando e carregando estes filhotes com mais freqüência do que fariam se estes não tivessem sido removidos. Este aumento de grau dos com­portamentos de apego materno foi capaz de reduzir, para o resto da vida do filhote, os níveis de resposta de glicocorticóide a uma variedade de estressores! Concomitantemente, isto redu­ziu o medo e a vulnerabilidade a doenças rela­cionadas ao stress. No entanto, quando, durante o mesmo período de tempo, os filhotes eram separados de suas mães por períodos de tempo mais prolongados (3 a 6 horas por dia, durante duas semanas), ocorreu uma reação oposta. Neste caso, as mães ignoraram os fi­lhotes, e estes demonstraram um aumento de ACTH e glicocorticóides no plasma, iguais às respostas adultas ao stress. Assim, diferenças nas interações mãe-bebê – diferenças que es­tão dentro do espectro dos comportamentos maternos que ocorrem normalmente – constitu­em fatores cruciais de risco para a futura res­posta do indivíduo ao stress. Aqui, temos um exemplo notável de como as experiências pre­coces alteram a regulagem das respostas bio­lógicas ao stress.

Estudos desenvolvidos por Charles Neme­roff e Paul Plotsky verificaram que estas expe­riências precoces adversas resultavam no au­mento da expressão do gene sintetizador do fator de liberação de corticotrofina (CRF), o hormônio liberado no hipotálamo para desen­cadear a resposta HHS. A separação diária materna durante as duas primeiras semanas de vida está associada, nos ratos, com o profundo e persistente aumento na expressão do RNA mensageiro para o CRF, não somente no hipo­tálamo, mas também nas áreas límbicas que incluem a amígdala e o núcleo da base terminal do striatum.

Entretanto, a compreensão dos fatores bio­lógicos com relação à teoria do apego não pa­rariam por aqui. Bruce McEwen, Robert Sa­polsky e seus colegas descobriram que o aumento dos glicocorticóides que se segue à separação da mãe tem efeitos adversos no hi­pocampo. Há dois tipos de receptores para os glicocorticóides: tipo 1 (receptores mineralocor­ticóides) e tipo 2 (receptores glicocorticóides). O hipocampo constitui um dos poucos locais no cérebro que possui ambos! Assim, experiên­cias estressantes repetidas (ou exposição a altos níveis de glicocorticóides por mais de al­gumas semanas) causam a atrofia dos neurô­nios do hipocampo, reversíveis quando o stress ou a exposição aos glicocorticóides é interrom­pida. No entanto, quando o stress ou a exposi­ção ao alto índice de glicocorticóide é prolonga­da por muitos meses ou mesmo anos, ocorrem danos permanentes, resultando em perda dos neurônios do hipocampo. Como podemos pre­ver a partir do papel central do hipocampo na memória declarativa, ambos os casos (atrofia reversível ou dano permanente) resultam no enfraquecimento da memória. Este déficit na memória pode ser detectado no nível celular. Isto se torna evidente no enfraquecimento do processo chamado potenciação de longo prazo (Long-term Potentiation), um mecanismo intrínseco considerado como crítico para o for­talecimento das conexões sinápticas relaciona­das à aprendizagem.

Assim, o que pode inicialmente parecer re­pressão pode vir a ser, na verdade, uma amné­sia verdadeira: danos no sistema do lobo tem­poral medial do cérebro.

Este conjunto de experimentos tem um sig­nificado profundo na relação dos processos in­conscientes precoces com os processos poste­riores conscientes. Experiências estressantes no início da vida ocasionadas pela separação da criança de sua mãe produzem uma reação na criança que é armazenada primeiramente na memória procedural, o único sistema bem dife­renciado de memória que a criança possui nes­te estágio da vida. Porém, a ação do stress na memória procedural lidera um ciclo de transfor­mações que tem como conseqüência o dano do hipocampo e, por meio deste, uma modificação persistente na memória declarativa.

Este modelo em roedores tem relevância clínica direta. Pacientes portadores da Síndro­me de Cushing produzem glicocorticóides aci­ma do nível normal como resultado de um tu­mor na glândula suprarrenal, na glândula hipófise, ou na parte do hipotálamo que controla a hipófise. Starkman e seus colegas estudaram es­tes pacientes e verificaram que aqueles que haviam tido a doença por mais de um ano apre­sentavam atrofia seletiva do hipocampo e per­da de memória. Atrofia e perda de memória similares parecem ocorrer no stress pós-trau­mático. Bremner e colegas constataram que pacientes com PSTD (transtorno de stress pós-­traumático) relacionada aos combates, apre­sentavam déficits na memória declarativa, as­sim como a redução de 8% no volume do hipocampo direito. Aqui, entretanto, a atrofia e perda de memória não são secundári­as ao aumento de glicocorticóides, mas ocor­rem devido a outros mecanismos, visto que nestes pacientes o nível de glicocorticóides en­contra-se mais baixo que o normal.

Na década de 70, Sachar, pela primeira vez, demonstrou que fenômenos similares ocor­riam no eixo hipotalâmico-hipofisário de pacien­tes com depressão. Mais de 50% dos pacientes deprimidos demonstraram ter níveis elevados de glicocorticóides. Estudos subseqüentes de­monstraram que a elevação dos glicocorticói­des encontrava-se relacionada ao decréscimo no número de receptores destes e com a resis­tência à supressão do cortisol pela dexameta­sona. Consistente com os dados dos roedores, pacientes com depressão apresentam redução significativa no volume do hipocampo e uma elevada perda de memória declarativa.

Nemeroff e colegas verificaram que, em pacientes deprimidos, a secreção de CRF apresenta-se significativa­mente elevada. Este fato sugeriu a idéia inte­ressante de que, em pacientes deprimidos, os neurônios secretores de CRF no cérebro en­contram-se hiperativos. Consistente com essa idéia, quando o CRF é injetado diretamente no sistema nervoso central de mamíferos, este pro­duz muitos sinais e sintomas característicos da depressão. Dentre estes, encontram-se a dimi­nuição do apetite, alteração da atividade do sistema nervoso autônomo, diminuição da libi­do e perturbações do sono. Com base nas evi­dências de que experiências desfavoráveis pre­coces na vida aumentam a probabilidade de uma pessoa sofrer depressão ou outros distúr­bios específicos de ansiedade na vida adulta, Nemeroff sugeriu que esta vulnerabilidade é mediada, provavelmente, pela hipersecreção de CRF.

Este entendimento pode ter diversas apli­cações. A primeira é o desenvolvimento de mo­delos animais progressivamente mais refinados para aqueles fatores que predispõem ao stress e à depressão. Esses modelos podem permitir a identificação destes fatores em animais expe­rimentais e, talvez, no futuro, até mesmo em humanos dos genes ativados pelo CRF e que predispõem à ansiedade. Em segundo lugar, a pesquisa estratégica de medicamentos que blo­queiam a ação do CRF pode vir a provar ser útil para certos tipos de depressão. Finalmente, poderemos ser capazes de acompanhar as res­postas dos pacientes à terapia através de ima­gens do hipocampo e de observar o grau de mudanças anatômicas que são interrompidas, ou mesmo revertidas e, até mesmo, ver de que forma a resposta à psicoterapia está relaciona­da aos níveis de CRF e glicocorticóides.

5. O inconsciente pré-consciente e o córtex pré-frontal

Até agora só consideramos o inconsciente implícito. Mas quanto ao inconsciente pré-cons­ciente, relacionado a todas as memórias e pen­samentos capazes de acesso à consciência e quanto ao inconsciente reprimido? Temos moti­vos para acreditar que aspectos do inconscien­te pré-consciente podem ser mediados pelo cór­tex pré-frontal. Talvez o argumento mais forte seja de que o córtex pré-frontal esteja envolvi­do em trazer uma variedade de conhecimentos explícitos para o domínio consciente. O córtex pré-frontral de associação tem duas funções principais:

. Integrar a informação sensorial

. Conectá-Ia ao movimento planejado

Devido ao córtex pré-frontal mediar essas duas funções, ela é tida como um dos substra­tos anatômicos das ações dirigidas a objetivos no planejamento e julgamento de longo prazo. Pacientes com lesão nas áreas de associação pré-frontal têm dificuldade em alcançar objeti­vos realistas. Como resultado, eles freqüente­mente conseguem pouco na vida, e seus com­portamentos sugerem que sua habilidade para o planejamento e organização das atividades diárias encontram-se diminuídas.

Nas quase três últimas décadas, tornou-se claro que o córtex pré-frontal serve como um compo­nente de um sistema que tem um papel impor­tante no armazenamento da informação de cur­to-prazo, incluindo as informações armazenadas ou relembradas a partir da me­mória declarativa. Esta idéia emergiu a partir de descoberta de que lesões no córtex pré-frontal produzem um déficit específico no componente de curto prazo da memória explícita, chamada memória de trabalho. O psicólogo cognitivo Alan Baddeley, que desenvolveu a idéia da memória de trabalho, sugeriu que este tipo de memória integra as percepções de momento a momento ao longo do tempo, exercita-as e combina-as com informações armazenadas so­bre experiências, ações ou conhecimentos pas­sados. Este mecanismo de memória é crucial para muitos aspectos aparentemente simples da vida cotidiana, como entabular uma conver­sação, dirigir um automóvel ou somar uma lista de números. A idéia de Baddeley foi desenvol­vida mais profundamente em experimentos neu­robiológicos por Joaquin Fuster e Patricia Gol­dman-Rakic, que sugeriram, pela primeira vez, que alguns aspectos da memória de trabalho encontram-se representados na associação do córtex pré-frontal e de que a lembrança de qual­quer informação explícita da memória – a pas­sagem do pré-consciente para o consciente ­requer a mediação da memória de trabalho. Uma predição possível de ser feita, a partir deste achado, é que no condicionamento de traço, o estímulo não condicionado pode ativar o sistema de memória de trabalho do córtex pré-frontal dorso lateral. Este, conseqüente­mente, agirá, geralmente, junto com o hipocam­po, submetendo à consciência o processo as­sociativo que, não fosse assim, seria procedural. Estudos clínicos de pacientes com lesões sugerem que o córtex pré-frontal tam­bém parece representar alguns aspectos dos julgamentos morais; ele governa, ao mesmo tempo, nossa habilidade de planejar de forma inteligente e responsável. Isto leva à interes­sante possibilidade de que a lembrança do co­nhecimento explícito pode depender de uma avaliação adaptativa e realista da informação a ser recordada. Neste sentido, o córtex pré-fron­tal poderia, como sugeriu Solms, estar envol­vido, por um lado, com as funções executivas que a psicanálise atribui ao ego e, por outro, com o superego.

6. Orientação sexual e a biologia dos impulsos

Freud concebia os impulsos como os com­ponentes energéticos da mente. Um impulso, argumentava, conduz a um estado de excitação ou tensão, um estado chamado atualmente de estado motivacional pelos psicólogos cogniti­vos. Os estados motivacionais impulsionam a ação com o objetivo de reduzir a tensão.

Muito cedo em sua carreira, talvez influen­ciado por Havelock Ellis, Magnus Hirschfeld e Richard Krafft-Ebing, Freud acreditou que a orientação sexual de uma pessoa era signifi­cantemente influenciada por processos natos do desenvolvimento e que todos os humanos eram constitucionalmente bissexuais. Esta bis­sexualidade constitucional era um fator chave na homossexualidade feminina e masculina. Mais tarde, no entanto, ele veio a pensar na orientação sexual como uma característica ad­quirida. Freud pensava especialmente na ho­mossexualidade masculina como representa­ção de um fracasso no desenvolvimento sexual normal, uma falha na adequada separação do menino de sua mãe, mantendo um intenso vín­culo sexual com ela. Como resultado, o menino, já crescido, identificar-se-ia com ela e procura­ria fazer seu papel na tentativa de provocar o renascimento da relação que existia entre am­bos. Freud propôs que a incapacidade do meni­no de separar-se de sua mãe podia ser o resul­tado de diversos fatores, incluindo uma relação extremamente próxima com uma mãe posses­siva e um pai fraco, ausente ou hostil. Em ter­mos de suas três fases do desenvolvimento psicossexual, Freud via a homossexualidade masculina, com ênfase no intercurso anal, como uma incapacidade de progredir normalmente da fase anal para a genital. A homossexualida­de feminina estava definida de forma menos clara na mente de Freud, mas ele pensava nela como uma imagem em espelho do processo que destacou na homossexualidade masculina. Freud também via um componente homossexu­al latente na paranóia, no alcoolismo e na dro­gadição.

A perspectiva de Freud sobre a sexualida­de está agora fazendo, no mínimo, 50 anos de idade, e em alguns casos, perto de 90. Algumas visões sobre a sexualidade, foram, compreen­sivelmente, abandonadas, graças ao pensa­mento psicanalítico moderno e todas foram mo­dificadas. Entretanto, eu as relato, não para manter Freud ou a comunidade psicanalítica responsáveis por idéias ultrapassadas, mas para ilustrar que qualquer insight clínico ou psi­cológico da sexualidade, não interessando se atual, com toda a certeza pode ser mais escla­recido por melhores compreensões biológicas da identificação de gênero e orientação sexual, ainda que no momento saibamos pouco. À me­dida que a homossexualidade tem se tornado mais abertamente aceita pela maioria da socie­dade, vêm ocorrendo discussões polêmicas na comunidade homossexual, na comunidade psi­canalítica e na sociedade sobre o grau com que a orientação sexual é inata ou adquirida. A observação de Freud e de outros analistas de que alguns homossexuais tendem a lembrar seus pais como hostis ou distantes e suas mães como mais próximas que o comum tem tido confirmações recentes.

Apesar disto, outros estudos sugerem uma contribuição genética à orientação sexual. Esta é uma área complexa, porque gênero genotípi­co, fenotípico, assim como identificação de gê­nero e orientação sexual, são distintos uns dos outros, porém inter-relacionados. De fato, o re­conhecimento desta complexidade pode confe­rir a termos-padrão como masculino, feminino, macho, fêmea, certa imprecisão e necessidade de esclarecimento.

O gênero genotípico é determinado pelos genes, enquanto o gênero fenotípico é definido pelo desenvolvimento da genitália externa e interna. A identificação de gênero é mais sutil e complexa e refere-se à percepção subje­tiva que alguém possui de seu sexo. Finalmen­te, a orientação sexual refere-se à preferência por parceiros sexuais. Os fatores que contribu­em aos vários aspectos do gênero ainda não foram completamente entendidos, mesmo as­sim os discuto porque, historicamente, esta é uma área que tem sido central para a psicanáli­se, pois, desde que a dicotomia natureza/cultu­ra tem sido confrontada repetidamente pela bi­ologia e, algumas vezes, esclarecida, penso que nesta área a biologia pode contribuir signi­ficativamente. Embora a identificação de gêne­ro e a orientação sexual sejam complexas e tenham feições que são distintamente huma­nas, podendo não ser acessíveis à experimen­tação animal, muitos outros aspectos do com­portamento sexual são similares aos comportamentos de fome e sede – tão essen­ciais à sobrevivência, que se encontram extre­mamente conservados entre os mamíferos, en­volvendo sistemas cerebrais e hormonais comuns, e até mesmo comportamentos estere­otipados. Em função disto, temos aprendido muito sobre os controles neurais dos hormô­nios e comportamentos sexuais dos estudos experimentais com animais como ratos e ca­mundongos.

O desenvolvimento embrionário das gôna­das, no seu início, é idêntico em machos e fêmeas. O gênero genotípico é determinado por um complemento individual dos cromossomos sexuais: fêmeas têm dois cromossomos X, en­quanto os machos têm um X e um Y. O fenótipo de gênero dos machos é determinado por um único gene, chamado fator determinante dos testículos, no cromossomo Y. Este gene inicia a transformação da gônada bissexual primitiva no testículo, que produz testosterona: na au­sência deste fator, a gônada se desenvolve em um ovário e produz estrogênio. Todas as outras características sexuais fenotípicas resultam dos efeitos dos hormônios das gônadas em outros tecidos. De interesse particular, tanto para bió­logos como para psicanalistas, é que o dimor­fismo sexual se estende ao cérebro e daí para o comportamento.

O comportamento de machos e fêmeas di­fere, mesmo antes da puberdade. Como muitos aspectos da sexualidade são conservados en­tre todos os mamíferos, os comportamentos sexuais relevantes para a sexualidade humana podem ser estudados em primatas e até mesmo em roedores. Macacos machos jovens jogam e brincam de forma barulhenta (esculhambação) com mais freqüência do que as fêmeas, uma diferença relacionada aos níveis de testostero­na. Meninas que foram expostas, no período pré-natal, a altos níveis de andrógenos, como resultado da hiperplasia suprarrenal congênita, pre­ferem o mesmo tipo de brinquedo dos meni­nos. Parece provável que as diferenças sexuais nos comportamentos lúdicos sejam in­fluenciadas, ao menos parcialmente, pelos efei­tos organizacionais do nível de andrógenos pré-­natais.

O nível da testosterona apresenta outros efeitos dramáticos no comportamento. Ratos machos que foram castrados antes, ou logo após o nascimento, falham quando adultos em demonstrar o comportamento típico mascu­lino de "montar" (sexualmente) na presença de fêmeas receptivas, mesmo se Ihes for adminis­trado testosterona. Além disso, se a estes ratos for administrado estrógeno e progesterona na vida adulta, imitando a situação hormonal das fêmeas adultas, eles apresentam a mesma pos­tura, sexualmente receptiva típica de fêmeas no cio. Se a castração é feita alguns dias após o nascimento, nenhum destes efeitos ocorrem. Assim, da mesma forma que as habilidades perceptivas e de coordenação motora, o com­portamento sexual típico é estruturado durante um período crítico, em torno do nascimento, mesmo que o comportamento propriamente dito não apareça até bem mais tarde.

As diferenças sexuais no comportamento, na medida em que manifestam diferenças nas funções cerebrais, devem, ao menos em parte, resultar de diferenças sexuais estruturais do sistema nervoso central. Uma possível localiza­ção anatômica para estas diferenças é o hipo­tálamo, que está comprometido com o compor­tamento sexual como também com uma variedade de outros impulsos homeostáticos. A estimulação elétri­ca do hipotálamo intacto de ratos e macacos Rhesus geram comportamentos tipicamente se­xuais. Biólogos verificaram uma diferença di­mórfica impressionante na área medial pré-óp­tica do hipotálamo em roedores. Neste ponto, há quatro grupos funcionais de neurô­nios desconhecidos em sua função, chamados, desde então, de núcleos intersticiais do hipo­tálamo anterior (INAH-1 a INAH-4). Um destes núcleos, INAH-3, é cinco vezes maior no rato macho do que na fêmea. Muitas células nestes núcleos morrem durante o desenvolvimento fe­minino; estas células são salvas nos filhotes machos pela circulação de testosterona e po­dem ser recuperadas nas fêmeas através de injeções de testosterona durante as janelas crí­ticas do desenvolvimento.

Também podemos ver características do dimorfismo nos diferentes graus de espessura das várias regiões do cérebro no córtex de ratos. Por exemplo, há uma maior assimetria nos machos: a espessura do lado esquerdo do córtex do rato macho é maior do que do direito. Talvez como conseqüência, o joelho do corpo caloso contém um número maior de neurônios na fêmea. Outras regiões do cérebro também apresentam dimorfismo sexual, e sem dúvida há muito mais a ser descoberto.

A verificação de uma base biológica para o genótipo e fenótipo de gênero coloca a seguin­te questão: qual é a base biológica para a orien­tação sexual? Para começar, é óbvio que o desenvolvimento do gênero é multifatorial, de forma que a etiologia da orientação sexual deve ser também multifatorial. Presumivelmente, esta é determinada por hormônios, genes e fatores ambientais. É quase certo que um traço comportamental, como a orientação sexual, não é causado por um simples gene, uma única alteração em um hormônio, ou na estrutura ce­rebral, ou uma experiência única de vida. O progresso contínuo nos estudos sobre as ca­racterísticas do dimorfismo sexual irá, sem dú­vida, ajudar os psicanalistas a melhor compre­ender a identidade de gênero e a orientação sexual.

Os estudos na área da anatomia sobre a orientação sexual estão apenas começando. Precisaremos de muito mais informação antes de nos sentirmos confiantes para publicar acha­dos sobre as diferenças anatômicas. No mo­mento, estes devem ser considerados como possibilidades interessantes. Simon LeVay, obteve cérebros de homens homossexuais e de, presumivelmente, homens heterossexuais, todos mortos pela AIDS, assim como cérebros de mulheres. O INAH3, o mais proeminente dos núcleos sexuais dimórficos presentes no hipo­tálamo dos ratos, encontrava-se, em média, de duas a três vezes maior nos homens presumi­velmente heterossexuais do que nas mulheres. Entretanto, nos homossexuais, o INAH3 encon­trava-se, em média, do mesmo tamanho que nas mulheres. Nenhum dos outros três núcleos de INAH demonstraram diferenças entre os gru­pos. Além dos problemas potenciais da amos­tra estudada, não é possível, com base na ob­servação de LeVay, determinar se estas diferenças estruturais estavam presentes no nascimento, ou se influenciaram os homens a tornar-se homossexuais ou heterossexuais, ou ainda se o dimorfismo é resultado de diferenças no comportamento sexual. Mas, com melhores amostras e os desenvolvimentos nas técnicas de visualização dos exames cerebrais, talvez seja possível responder a estas questões.

Allen e Gorski encontraram outra diferen­ça entre homo e heterossexuais na comissura anterior, um atalho entre os lados direito e es­querdo do cérebro que é geralmente maior na mulher do que no homem. Allan e Gorski verifi­caram que a comissura anterior se encontrava, em média, maior nos homossexuais do que nos heterossexuais. Na verdade, ela é maior nos homossexuais do que nas mulheres.

Outra questão, que está sendo abordada atualmente, é se a orientação sexual é inata ou adquirida. A orientação sexual parece so­frer a influência dos genes, e esta influência é, como poderia se esperar, complexa. A orienta­ção sexual é um fator familiar. Se uma pessoa é homossexual, as chances de um gêmeo ser também homossexual, cresce significativamen­te. Em casos de gêmeos monozigóticos, indiví­duos que possuem os mesmos genes, o índice de equivalência é de 50%. Para gêmeos dizigóti­cos, o índice é de 25%. Em contraste, a incidên­cia da homossexualidade masculina na popula­ção em geral é menor do que 10%. Para a homossexualidade feminina, a relação genéti­ca é mais fraca; aproximadamente 30% em gêmeos monozigóticos e 15% em dizigóticos. Estes números parecem, de certa forma, simi­lares àqueles de outros traços complexos, indi­cando que ambos, fatores genéticos e não­genéticos, são importantes e operantes.

Como estes achados são recentes, sua consistência nos diversos grupos de pessoas, tanto heterossexuais quanto homossexuais, ainda está sendo questionada. Porém, os méto­dos estão disponíveis para o estabelecimento da existência ou não de diferenças anatômicas confiáveis entre pessoas de distintas orienta­ções sexuais. Como havia sugerido antes, es­tes achados poderão influenciar, enormemen­te, o pensamento psicanalítico sobre a dinâmica da orientação sexual.

7. Resultados terapêuticos e mudanças estruturais no cérebro

Trabalhos experimentais recentes em ani­mais indicam que a memória de longo prazo leva a alterações na expressão dos genes e a alterações anatômicas subseqüentes no cére­bro. Mudanças anatômicas no cérebro ocorrem ao longo da vida e provavelmente moldam as habilidades e o caráter dos indivíduos. A repre­sentação das partes do corpo no córtex cere­bral das áreas motoras e sensoriais depende do uso e, assim, das experiências particulares de cada um. Edward Taub e seus colegas esca­nearam os cérebros de instrumentistas de cor­das. Durante as performances, instrumentistas de cordas estão constantemente engajados em hábeis movimentos de mão. O segundo até o quinto dedo da mão esquerda, que entram em contato com as cordas, são manipulados indivi­dualmente, enquanto os dedos da mão direita, que movimentam o arco, não expressam movi­mentos tão diferenciados. Imagens cerebrais destes músicos revelaram que seus cérebros eram diferentes dos cérebros dos não músicos. Especificamente, a representação cortical dos dedos da mão esquerda, mas não da direita, era maior nos músicos.

Tais mudanças estruturais são adquiridas mais prontamente nos primeiros anos de vida. Assim, Johann Sebastian Bach era Bach não somente porque tinha os genes certos, mas provavelmente também porque começou a pra­ticar habilidades musicais em um tempo em que seu cérebro era mais sensível a ser modificado pela experiência. Taub, e colegas, verificou que músicos que aprenderam a tocar seus ins­trumentos pela idade de 12 anos tinham uma representação cerebral maior dos dedos na mão esquerda, a mão mais importante no tocar, do que aqueles que começaram mais tarde na vida.

Estas constatações levantam uma questão central para a psicanálise: A terapia pode tra­balhar desta maneira? Caso positivo, onde ocorrem as mudanças induzidas pela psicote­rapia? As mudanças estruturais terapeutica­mente operam nos mesmos locais do cérebro alterados pelas desordens mentais, ou estas mudanças, terapeuticamente induzidas, cau­sam modificações compensatórias independen­tes em outros locais inter-relacionados?

Mudanças de longa duração nas funções mentais envolvem alterações na expressão ge­nética. Assim, no estudo de mudanças es­pecíficas que subjazem estados mentais per­sistentes, tanto normais quanto perturbados, deveríamos também procurar por alterações da expressão genética. Como a expressão altera­da de genes conduziria a alterações de longa duração dos processos mentais? Os estudos sobre as alterações na expressão genética em animais, associados com a aprendizagem, indi­cam que tais alterações são seguidas por mu­danças nos padrões de conexões entre as célu­las nervosas, o que representa, em alguns casos, o crescimento e a retração de conexões sinápticas.

É intrigante pensar que até onde a psicaná­lise tem sido bem sucedida em proporcionar mudanças persistentes em atitudes, hábitos e comportamentos conscientes e inconscientes, isto seja feito pela alteração na expressão de genes que produzem mudanças estruturais no cérebro. Estamos diante da interessante possi­bilidade de que, na medida em que as técnicas de visualização do cérebro melhorem, estas técnicas possam ser úteis, não apenas para o diagnóstico das várias doenças neuróticas, como também para o monitoramento do pro­gresso da psicoterapia.

8. Psicofarmacologia e psicanálise

Já em 1962, Mortimer Ostow, um psicana­lista com formação em neurologia que tinha um antigo interesse na relação entre a neurobiolo­gia e a psicanálise, apontou a utilidade do uso de drogas durante o tratamento psicanalíti­co. Ele argumentou que, adicionado ao seu valor terapêutico, a farmacologia poderia servir como uma ferramenta biológica no estudo das funções afetivas. Ostow observou que um dos principais efeitos dos agentes psicofarmacoló­gicos se manifesta no afeto, o que o levou a argumentar que o afeto, muitas vezes, seja um fator determinante mais importante dos com­portamentos e das doenças do que a ideação ou interpretação consciente. Esta idéia reforça a posição de Sanders, Stern e do Boston Pro­cess of Change Study Group sobre importância relativa dos afetos inconscientes sobre os insi­ghts conscientes, insistindo, uma vez mais, na importância das mudanças no conhecimento inconsciente procedural (como as que ocorrem em momentos significativos), como índice de progresso terapêutico, tão importante, para o Grupo de Boston, quanto os insights. Ambos, os argumentos de Boston e de Ostow, deixam claro que as mudanças nas representações in­ternas inconscientes podem beneficiar o pro­gresso, mesmo sem atingir a consciência. Tal­vez, nestes casos, o inconsciente seria até mesmo mais importante do que o próprio Freud avaliava! Assim, a temática emergente do estu­do de Ostow sobre as ações dos agentes far­macológicos no processo psicanalítico confir­ma as idéias de Sanders e Stern, que insistem que o progresso na psicoterapia passa por um componente procedural importante e de que muito o que acontece na psicoterapia não pre­cisa estar diretamente relacionado ao insight.

É necessário um diálogo genuíno entre a biologia e a psicanálise para alcançarmos uma compreensão coerente da mente

Como sugeri anteriormente, a maioria dos biólogos acredita que a mente é, neste século XXI, o que o gene foi para o século XX. Discuti brevemente como as ciências biológi­cas em geral e a neurociência cognitiva em particular irão provavelmente contribuir para uma compreensão mais profunda de um grande número de questões chaves na psicanálise. Uma questão que seguidamente é levantada é que uma abordagem neurobiológica da psica­nálise poderia reduzir os conceitos psicanalíti­cos aos neurobiológicos. Se assim fosse, iria privar a psicanálise de seu conteúdo e riqueza essencial específica e conseqüentemente mu­dar o caráter da terapia. Tal reducionismo não é apenas indesejável, mas impossível. Os con­teúdos psicanalíticos, da psicologia cognitiva e da neurociência, imbricam-se, mas não são, de forma nenhuma, idênticos. As três disciplinas possuem perspectivas e objetivos distintos que convergem apenas em alguns pontos críticos.

O papel da biologia neste contexto é o de iluminar aquelas direções que provavelmente levarão a insights mais profundos em proces­sos paradigmáticos específicos. A força da bio­logia está em sua forma rigorosa de pensar e em sua profundidade de análise. Nossa com­preensão sobre a hereditariedade, regulação genética, a célula, a diversidade da imunologia, o desenvolvimento do corpo e do cérebro hu­mano e a produção de comportamentos foram profundamente expandidos na medida em que a biologia se aprofunda cada vez mais na dinâ­mica molecular dos processos vitais. A força da psicanálise está em seu escopo e na complexi­dade das questões tratadas, força que não pode ser diminuída pela biologia. Assim como a me­dicina tem reiteradamente indicado direções à biologia, à psiquiatria e à neurociência, também a psicanálise pode servir como um tutor compe­tente e realisticamente orientado para uma com­preensão mais sofisticada da mente-cérebro.

Durante a metade do século passado, as­sistimos a várias integrações bem-sucedidas nas ciências biológicas, sem que isto causasse o desaparecimento das disciplinas centrais. Por exemplo, a genética clássica e a biologia mole­cular se mesclaram em uma disciplina comum: a genética molecular. Agora sabemos que os traços que Gregor Mendel descreveu e os ge­nes em locais específicos nos cromossomos que Thomas Hunt apontou, são pedaços de dupla hélice de DNA. Este conhecimento nos permitiu entender como os genes se replicam e como controlam as funções celulares. Estas compreensões revolucionaram a biologia, mas não aboliram a disciplina da genética. Ao con­trário, com o término do genoma humano a genética está flo­rescendo. Ela fez uso dos poderosos conheci­mentos da biologia molecular, aplicou-os efeti­vamente aos seus próprios fundamentos e foi adiante. Que o mesmo aconteça com a psica­nálise.

Estamos assistindo a um início de diálogo?

Como temos visto, a biologia poderia aju­dar à psicanálise de duas formas: conceitual e experimentalmente. Estamos, na verdade, co­meçando já a ver sinais de progresso concei­tual. Um número de institutos psicanalíticos, ou pelo menos, um número significativo de pes­soas dentro da psicanálise, tem lutado para tornar a psicanálise mais rigorosa e aproximá-­Ia da biologia. Freud buscou esta posição no início de sua carreira. Mais recentemente, Mor­timer Ostow, membro do Neuroscience Project of the New York Psichoanalytic Institute e Da­vid Olds e Arnold Cooper do Columbia Institu­te, assim como outros nos Estados Unidos, já vinham expressando, anteriormente, idéias si­milares às que esbocei aqui.

Durante muitos anos, tanto a Association for Psichoanalytic Medicine de Columbia quan­to o New York Psichoanalytic Institute, para ficar apenas em dois exemplos, instituíram (com a ajuda de meu colega, James H. Schwartz), centros neuropsicanalíticos para conduzir os interesses comuns da psicanálise e neurociên­cia. Os estudos realizados nestes centros inclu­íam temáticas como consciência, processos in­conscientes, memórias autobiográficas, sonhos, afeto, motivação, desenvolvimento mental infantil, psicofarmacologia e a etiologia e tratamento das doenças mentais. O prospec­to do New York Psichoanalytic Institute hoje é apresentado da seguinte maneira:

A explosão de novos conhecimentos a res­peito de inúmeros problemas de interesse vital para a psicanálise necessita ser inte­grada de forma significativa com velhos conceitos e métodos como vêm ocorrendo com o surgimento crescente das tecnologi­as de pesquisa e tratamentos farmacológi­cos. Semelhantemente, os neurocientistas que estão explorando, pela primeira vez, o complexo problema da subjetividade, têm muito o que aprender de mais de um século de questionamentos psicanalíticos.

Desta forma, os psicanalistas estão come­çando a aprender sobre a ciência neurológica e psicofarmacologia, um estimulante passo a frente, um passo que deve conduzir, por fim, a um novo currículo para os psicanalistas clíni­cos.

Como resultado destes esforços, tem havi­do um pouco de progresso na segunda função da biologia: a função experimental. Muitos in­vestigadores têm assistido à possibilidade esti­mulante da combinação experimental da psica­nálise com a biologia. Têm sido admiráveis as tentativas de Karen Kaplan-Solms e Mark Sol­ms para identificar sistemas anatômicos no cérebro, relevantes para a psicanálise, através do estudo de alterações de funções mentais de pacientes com lesões cerebrais. Kaplan Solms e Solms acreditam que o poder da psicanálise deriva de sua habilidade para investigar pro­cessos mentais a partir de uma perspectiva subjetiva. Entretanto, como eles assinalam, esta grande força também é sua grande fragili­dade. Os fenômenos subjetivos não se entre­gam facilmente à análise empírica subjetiva. Precisamos desenvolver novas formas de estu­do dos fenômenos subjetivos. Como resultado, estes investigadores argumentam que somente através da conexão da psicanálise com os fe­nômenos neurobiológicos objetivos, como nas mudanças de personalidade conseqüentes a lesões cerebrais focais, é possível relaciona­rem-se correlatos empíricos com os construtos subjetivos da psicanálise. De forma semelhan­te, há também a longa tradição do trabalho de Howard Shevrin, que correlaciona a percepção de estímulos subliminares e supraliminares com potenciais cerebrais relacionados a eventos, na tentativa de analisar aspectos dos processos mentais inconscientes.

Estes estudos iniciais são extremamente encorajadores. Mas, para que a psicanálise se revigore, será necessário integrar esta reestru­turação intelectual com mudanças institucio­nais. Para que a biologia possa ajudá-Ia, dois aspectos da psicanálise requerem atenção es­pecial: os resultados terapêuticos e o papel dos institutos psicanalíticos.


A avaliação dos resultados em psicanálise

Como forma de terapia, a psicanálise não é mais tão amplamente praticada como era há 50 anos. Jeffrey sugere que o número de pa­cientes que procuram a psicanálise tem decres­cido de forma estável, 10% ao ano, nos últimos vinte anos, assim como tem decrescido o nú­mero de psicólogos e psiquiatras talentosos que procuram treinamento em institutos psicanalíticos. Este declínio é frustrante, porque a terapia psicana­lítica parece haver se tornado mais focalizada realisticamente, daí tendo maior probabilidade de ser eficaz. Durante as últimas décadas, a psicanálise tem abandonado de forma ampla os objetivos não-realísticos da década de 50, quando tentava tratar sozinha do autismo, da esquizofrenia e de doenças bipolares graves, distúrbios para os quais tinha pouco ou nada a oferecer. Nos dias de hoje, pensa-se que a psicanálise pode alcançar mais sucesso com pessoas com distúrbios de caráter não-psicóti­cos, como pessoas que encontram maiores difi­culdades em trabalhar de forma efetiva ou man­ter relações de forma satisfatória e que desejam adquirir meios melhores de conduzir suas vi­das. Um grande número desses pacientes so­fre dos transtornos de personalidade borderli­ne com perturbações afetivas concomitantes. Nestes casos, a psicanálise e a psicoterapia de orientação analítica são consideradas úteis, juntamente com a  farmacoterapia. Como resultado deste estreitamen­to de foco para pacientes não psicóticos, a psicanálise e a psicoterapia de orientação ana­lítica podem ser hoje mais efetivas do que anti­gamente.

Lembro aqui de Kay Jaminson e de sua espantosa discussão de sua própria doença maníaco-depressiva e da resposta efetiva da combinação da medicação com lítio e psicote­rapia:

"Neste ponto em minha existência, não pos­so imaginar como levar uma vida de forma normal sem o tratamento do lítio e os bene­fícios da psicoterapia. O lítio previne meus "picos" sedutores, mas desastrosos, dimi­nui minhas depressões, torna mais clara a confusão da desordem de meu pensamen­to, me desacelera, tornando-me menos im­pulsiva, me ajuda a não arruinar minha car­reira e relacionamentos, mantém-me fora do hospital, viva, e torna a psicoterapia possível. Mas a cura ocorre através da psi­coterapia. É ela que dá sentido à confusão, governa o território dos sentimentos e pen­samentos, me dá controle e esperança e a possibilidade de aprender com tudo isto. Os medicamentos não podem trazer você de volta à realidade de forma amena, eles podem somente fazer com que alguém vol­te rapidamente, repentinamente, o que pode ser muito duro algumas vezes. A psi­coterapia é um santuário; é um campo de batalha; é um lugar onde estive psicótica, neurótica, exaltada, confusa e desespera­da para além do que se possa acreditar. Mas, sempre, é onde eu acreditei, ou apren­di a acreditar, que um dia eu poderia ser capaz de vencer tudo isto."

"Nenhum comprimido pode me ajudar a lidar com o problema de não querer tomá-Ios; da mesma forma, nenhuma terapia sozinha pode prevenir minhas manias e depres­sões. Preciso de ambos. É estranho, dever sua vida aos comprimidos, seus subterfúgi­os e persistências e a esta única, estranha e profunda relação chamada psicoterapia."

Constatados estes avanços, por que a prá­tica da psicanálise não está florescendo? Este declínio no uso da psicoterapia psicanalítica é atribuível, em grande parte, a causas externas à psicanálise: à proliferação de diferentes for­mas de psicoterapias breves (muitas, em mui­tos graus, derivadas da psicanálise), à emer­gência da farmacoterapia e ao impacto econômico do Manage Gare. Mas uma causa importante deriva da psicanálise em si. Um sé­culo inteiro após sua fundação, a psicanálise ainda não fez o esforço necessário para a ob­tenção de evidências objetivas para convencer a cética profissão médica de que é um método mais efetivo do que placebos. Assim, diferente­mente de várias formas de psicoterapia cogniti­va e de outras psicoterapias, para as quais, agora existem evidências objetivas – tanto como terapias em si ou como acessórios funda­mentais à farmacoterapia – não há ainda evi­dência objetiva, além de impressões subjeti­vas, de que a psicanálise funcione melhor do que as terapias não-analíticas ou place­bos.

O fracasso da psicanálise em prover evi­dências objetivas de que é efetiva como terapia não pode mais ser aceita. A psicanálise tem que ser persuadida pela perspectiva realista e crítica de Arnold Cooper:

"Até onde a psicanálise considera ser um método de tratamento, estamos, para me­lhor ou pior, dentro da órbita da ciência e não podemos escapar da obrigação da pes­quisa empírica. À medida que desenvolve­mos profissionais que são membros de uma determinada profissão e cobram por seus serviços, é responsabilidade nossa estudar o que estamos fazendo e como afetamos nossos pacientes."

Como Cooper assinala, um número de es­tudos importantes inicialmente destinados a avaliar os resultados terapêuticos – as pesqui­sas de Wallerstein e os estudos revisados por Kantrowitz e Bachrach – abandonou seus objetivos de longo-prazo pelos de curto­-prazo mais acessíveis e não relacionados aos resultados. Apesar de seu custo e complexida­de, os estudos rigorosos sobre os resultados terapêuticos, em comparação com as terapias breves e de orientação não analítica e place­bos, necessitam estar no topo da lista de priori­dades se a psicanálise deseja ser reconhecida como uma boa opção terapêutica.


Um relatório flexner para os institutos psicanalíticos?

O passo mais difícil, porém, é ir além da apreciação da biologia. É ter uma pequena elite de pesquisadores profissionais para desenvol­ver, na psicanálise, uma atmosfera intelectual que tornará uma pequena fração de analistas competentes em neurociência cognitiva e an­siosos por testar suas próprias idéias com no­vos métodos. O desafio para os psicanalistas é tornarem-se participantes ativos na difícil tarefa de unir a biologia à psicologia, incluindo a psi­canálise, na compreensão da mente. Se dese­jarmos que ocorra esta transformação da at­mosfera da psicanálise, como acredito que deva ocorrer, os institutos psicanalíticos devem dei­xar de ser escolas vocacionais – um tipo de corporação – para tornarem-se centros de pes­quisa e pós-graduação.

Neste século XXI, os institu­tos psicanalíticos norte-americanos asseme­lham-se a escolas médicas privadas que povo­avam o país no início do século XX. Na virada século XIX, os Estados Unidos vivenciaram uma grande proliferação de escolas médicas – 155 declaradas – a maioria delas sem laboratórios para o ensinamento das ciências básicas. Nes­tas escolas, os estudantes eram ensinados por profissionais particulares que, freqüentemente, encontravam-se ocupados com suas próprias clínicas.

Para examinar este problema, a Garnegie Foundation contratou Abraham Flexner para avaliar a educação médica nos EUA. O relatório Flexner, finalizado em 1910, enfatizou que a medicina é uma profissão científica e requer uma educação estruturada na ciência básica e sua aplicação à medicina clínica. Para promo­ver uma educação qualificada, o relatório Flex­ner recomendou limitar as escolas médicas no país àquelas integradas a universidades. Como conseqüência deste relatório, muitas escolas inadequadas foram fechadas, foram estabeleci­dos padrões para credenciamento para o ensi­namento e prática da medicina. Para retornar ao vigor de sua fundação e contribuir de forma relevante à compreensão da mente, a psicaná­lise precisa examinar e reestruturar o contexto intelectual em que é feito seu trabalho formati­vo e desenvolver formas mais críticas de forma­ção de profissionais no futuro. Assim, o que a psicanálise talvez precise, se quiser sobreviver como força intelectual neste século, é de algo similar ao Relatório Flexner com rela­ção aos institutos psicanalíticos.

O que levou tantos de nós à psicanálise, nos finais de 1950 e início de 1960, foi sua audaciosa curiosidade e seu zelo investigativo. Eu mesmo fui levado ao estudo neurobiológico da memória por conceber a memória como cen­tral para uma compreensão mais profunda da mente, um interesse primeiramente iluminado pela psicanálise. Pode-se esperar que a anima­ção e o sucesso da biologia atual reacendam as curiosidades investigativas da comunidade psi­canalítica, e que uma disciplina unificada da neurobiologia, da psicologia cognitiva e da psi­canálise levem a um novo e mais profundo entendimento da mente humana.

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