Já rendeu prêmio Nobel para um psicólogo, tem por objeto de estudo o comportamento (econômico) numa abordagem científica e vê o mundo como uma rede de incentivos, reforços e aprendizagem. Se você acha que estou falando da Análise Experimental do Comportamento, errou: é da Economia Comportamental. “Ué”, você pode estar se perguntando, “Qual a diferença?”.
Coisa de Psicólogo ou de Economista?
Em 2002, Daniel Kahneman, psicólogo israelense ganha o prêmio Nobel de Economia por suas pesquisas a respeito do comportamento econômico. (Aliás, foi o primeiro Nobel conferido a um psicólogo e esse fato passou em brancas nuvens, sem a comemoração que merecia!). Em 2006 um importante economista dos EUA, Steven Levitt publica uma obra de divulgação científica que virou bestseller mundial: Freaknomics, onde uma visão da Economia centrada no comportamento humano, e não em abstratas cifras e índices, é exposta. Parece curioso, mas tanto Kahneman, psicólogo, quanto Levitt economista, estão falando do mesmo assunto: Economia Comportamental.
Incentivos, Interesses, Decisões
Diferente da visão que o brasileiro tem da Economia (basicamente monetária e extremamente hermética, conforme reza a tradição acadêmica latina), os cientistas dos EUA e Israel defendem que essa disciplina científica é na verdade o estudo da dinâmica de interesses, motivações e decisões de pessoas em grupo. Por exemplo, seria uma questão genuinamente econômica: “Como três garotos devem fazer para dividir duas barras de chocolate, sendo dois deles egoistas e um altruista?”
Portanto, a Economia não seria apenas uma forma de gerenciar recursos escassos (sua definição clássica, de Adam Smith e afins), mas seria também o estudo de como motivações afetam a decisão de indivíduos e grupos.
Na visão Econômica Comportamental as sociedades são uma complexa rede de incentivos onde os participantes compartilham da mesma motivação fundamental: a busca de valor para suas vidas (entendendo por “valor” maximizar ganhos e minimizar perdas). Lembre-se que nessa Economia, dinheiro é apenas um detalhe. O dito “valor” pode significar meio ambiente, estética, amor, amizade, saúde, ética, etc. Enfim, são valores humanos. Assim, por exemplo, um Economista Comportamental pode estudar a dinâmica da sedução masculina, tomando o valor “beleza feminina” como critério de análise. De fato, a Economia Comportamental tem rendido estudos curiosos. Levitt, em Freaknomics, chega a demonstrar “por A mais B” porque é um bom negócio para traficantes de trinta anos de idade morar com suas mães! (Dentre outras teses aparentemente estapafúrdias que você e se pergunta “Nossa, isso é Economia ou Psicologia?”).
A essa altura você pode estar se dizendo: “Já vi isso antes…” As semelhanças com a proposta filosófica de Skinner, o Behaviorismo, não param por aí.
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Sentimentos Interferem na Economia?
As pesquisas de Kahneman questionam a Economia Clássica e sua visão simplista de Homem. Na dita Economia Clássica o Homem é um ser infinitamente racional que toma decisões econômicas visando sempre o seu próprio bem. (Isto é, o Homem é inteligente, egoísta e sensato).
Kahneman demonstrou, e vem daí o seu Nobel, que as pessoas, em meio a situações econômicas (poupar, gastar, investir, etc) muitas vezes não são racionais, nem egoístas e nem sensatas. Entre a situação econômica e a resposta emitida há processos comportamentais que Kahneman apelidou de “viéses psicológicos”. Sua obra é uma dissecação desses viéses, que são uma espécie de filtro decisório que se mescla à racionalidade lógico-matemática na hora de tomar decisões econômicas.
Por exemplo, nossos comportamentos econômicos são influenciados por nossa auto-imagem (“Sou mesmo o bom em finanças. Nada pode me deter!”), pelo que aprendemos por comunicação social (“Meu primo me disse que devo começar a investir na Bolsa”), por ilusões de controle (“Se deu certo antes, vai dar certo sempre”), por estados de ânimo e humor(“Melhor não ir comprar nada hoje, estou deprimida e farei um estrago na loja”), etc.
O economista comportamental é alguém que leva em conta os viéses psicológicos das pessoas e analisa a contingências envolvidas nas situações como redes de incentivos que interferem nas decisões. Por exemplo: “Martha é uma jovem investidora da Bolsa que, por razões de auto-estima elevada, ilusão de controle do ambiente e entusiasmo emprestado dos amigos, resolve arriscar mais que podia. Que sistema de incentivo poderia ser criado para evitar que Martha e pessoas com o mesmo perfil agisse de tal forma?”
Pára! Isso não é Análise Experimental do Comportamento?
Levitt, apesar de ser dos EUA, a terra de Skinner e até hoje o grande centro do Behaviorismo, não fala uma palavra sequer sobre o Behaviorismo & CIA. Kahneman se diz um cognitivo-comportamental, e não um behaviorista, e não cita muito a obra de Skinner em suas pesquisas.
Parece que esses autores fazem questão de associar a Economia Comportamental a matemática da Teoria dos Jogos, que também rendeu um Nobel de Economia.
Contudo, ao aplicado e dileto estudante de Psicologia é impossível ler sobre a Economia Comportamental e não lembrar de Skinner, que fala o tempo inteiro em sua obra a respeito de incentivos sociais, e chega a dizer que a Análise Experimental do Comportamento teria mais a contribuir a Política e às instituições econômicas do que a terapia. Ele chegou a falar em uma engenharia comportamental que iria modelar, dentre outras coisas, sistemas de incentivo econômico.
E as Diferenças?
O Analista do Comportamento não restringe seu trabalho a fatos econômicos, ao passo que o Economista Comportamental está exclusivamente atento para o que pode observar em termos de ações como poupar, investir, gastar, etc. Talvez esse recorte de realidade seja a maior diferença entre os dois grupos. Outra diferença seria o fato do Analista se apoiar em uma filosofia para seu trabalho (o Behaviorismo). Na Análise do Comportamento os sentimentos, a linguagem e outros fenômenos afins são também muito mais estudados que na Economia Comportamental, já contando com muito conhecimento sistematizado a respeito.
Conclusões:
Seja como for, isto é, seja a Economia Comportamental uma cria que não assume sua genealogia, ou seja, ela algo mesmo inédito, seu advento tem uma utilidade muito grande para Analistas do Comportamento em geral: evidenciar que Skinner tinha razão ao dizer que a terapia seria apenas uma das aplicações possíveis da Análise do Comportamento.
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Muio bom!
Muito bom, tem algum artigo relacionado com a bolsa de valores e o behaviorismo?