A Genética do Destino
Antes de tudo acentue-se aqui que as funções hereditárias do destino manifestam-se especialmente em cinco setores da vida:
(1) escolha no amor;
(2) na amizade;
(3) na profissão;
(4) na doença;
(5) no tipo de morte.
São estes os mais importantes setores de manifestação do destino. Se bem que na vida cotidiana se fale de "escolha", a genética do destino descobriu funções hereditárias latentes e ativas no inconsciente familiar.
Escolha do cônjuge, a Libidotropismo
Para uma grande parte de pessoas, a escolha no amor, na amizade e na profissão não é livre, mas dirigida pelos genes recessivos, latentes, que existem em forma análoga no patrimônio hereditário dos dois parceiros. Este fenômeno é denominado genotropismo e desempenha importante função na genética do destino. Com base em centenas e centenas de análises matrimoniais (1937 a 1963), a análise do destino comprovou a regra genotrópica da escolha dos parceiros.
Genotropismo é a atração recíproca – condicionando o destino no amor, na amizade e na profissão – dos condutores de genes análogos, latentes, recessivos.
Em conseqüência, nestes casos, a escolha é apenas aparente, porque não é dirigida pelos próprios indivíduos, mas pelos genes análogos (ancestrais). Essas pessoas que se atraem reciprocamente não são portadoras (homozigóticas) de uma predisposição recessiva que retorna; portanto, não são indivíduos aa ou aabb, mas trazem, em estado latente, e em doses individuais, os genes recessivos idênticos. Sua fórmula de hereditariedade mista (heterozigótica) é, por conseguinte, no processo hereditário monômero, Aa; no dímero recessivo, AaBb.
A fórmula da atração é, portanto, AaBb x AaBb.
Na análise do destino, esses condutores se denominam indivíduos parentes de genes ou eletivos (Goethe). E seu tipo de atração recíproca é genotrópica. Este fenômeno, que se confirmou num número muito grande de indivíduos, conduziu a um novo tipo de pesquisa familiar, que se denomina pesquisa familiar genotrópica. Consiste no seguinte:
(1) com a árvore genealógica do paciente, temos constantemente que apresentar também as árvores genealógicas de todos os indivíduos que estão em relação mais estreita com ele, através da escolha no amor, amizade ou profissão;
(2) além das doenças manifestadas, tem-se também que examinar com exatidão as profissões, os caracteres, os currículos dos parentes consangüíneos e afins, sadios e doentes. Destas pesquisas familiares genotrópicas resultou, então, a regra genotrópica da escolha dos parceiros.
Um exemplo: na árvore genealógica de uma assistente social, psiquicamente normal, a mãe figura como esquizofrênica internada. A assistente social ficou noiva duas vezes; teve, porém, que romper as duas ligações, porque nas famílias dos noivos havia igualmente parentes próximos esquizofrênicos (tio e tia), a respeito dos quais ela e seu noivo nada sabiam anteriormente. Segundo a genética da análise do destino, as duas ações eletivas não foram livres, mas de tipo genotrópico.
No primeiro livro da análise do destino são apresentadas centenas de escolhas de parceiros, todas semelhantes; entre elas, as de uma amostra de 517 indivíduos que haviam realizado escolha genotrópica.
A regra de escolha genotrópica dos parceiros foi confirmada por Rey-Ardid (1955), em Madri, em relação à esquizofrenia; por Nachin (1957), em Lyon, em relação às psicoses alcoólicas; por Wagner-Simon (1963), em Riehen, Basiléia, em relação a dificuldades conjugais; e por muitos colaboradores da comunidade de trabalho da Análise do Destino, de Zurique.
Ainda que a regra e o método da pesquisa familiar do genotropismo continuem a ser discutidos, podem apoiar-se em eminentes predecessores desse pensamento. Em particular, numa afirmação intuitiva de Johannsen, que escreve:
"Os cálculos (da difusão de genes recessivos anormais entre a população) não podem pretender nem mesmo uma exatidão aproximada. Apresentam, contudo, certo interesse. Uma suposição, a respeito da qual as pesquisas populacionais apresentam, talvez maior inexatidão, é a de que os casamentos são concluídos 'ao acaso', ou seja sem prévia escolha eletiva, que obedece a padrões diversos. É bem possível, e até provável, que a inclinação recíproca consciente ou inconsciente de indivíduos análogos Aa se faça valer e, em tais casos, o cálculo baseado no número de indivíduos realizados aa daria como resultado uma freqüência demasiado grande do gene recessivo em questão. É de se esperar, para a humanidade como um todo, que esta consideração tenha alguma validade, e que, portanto, genes recessivos anormais não tenham tão grande difusão, como fazem temer os cálculos acima citados".
Johannsen já pressentia, portanto, a inclinação recíproca, consciente ou inconsciente, de indivíduos análogos Aa. Mas tal inclinação, denominada genotropismo, só foi demonstrada pela Análise do Destino.
Como importante constatação empírica, mencionamos a regra biológica dos parceiros de Stumpfl (1935). Escreve ele:
"Constatou-se que o índice de criminalidade de um grupo populacional, selecionado sob um ponto de vista sociológico unitário, corresponde ao índice de criminalidade dos cônjuges desse grupo, isto é, está numa correlação numericamente definida. Acreditamos, com isto, haver enunciado uma regra, que se apóia no fato de que na escolha conjugal atua uma recíproca atração de caracteres e que – apesar das múltiplas diversidades desses caracteres – deve ser reconduzida finalmente a uma similitude essencial, profunda e imanente.
A semelhança entre essas pesquisas e as da Análise do Destino está em haver Stumpfl estendido igualmente suas investigações às famílias dos cônjuges, e em considerar também a atração como um processo biológico. A regra biológica dos parceiros de Stumpfl apóia-se, embora não definidamente, numa profunda semelhança, essencial, entre os parceiros. Só em 1937, dois anos mais tarde, pôde a Análise do Destino provar, em artigo provisório sob o título de "Analysis of Marriages", que tal "semelhança essencial" consiste na igualdade dos cônjuges (indivíduos Aa), ou seja, numa analogia dos genes recessivos, latentes, dos parceiros, como já supunha Johannsen.
Também Von Verschuer menciona, entre as pressuposições de uma análise genética da população, a pan-mixia, condição segundo a qual "a escolha matrimonial não se dá casualmente, mas com freqüência dentro de determinados grupos de pessoas (seleção de casais)". Que este "grupo de pessoas" é formado por indivíduos heterozigotos análogos Aa ou AaBb, e que os genes recessivos, análogos, latentes, causam a atração, eram fatos desconhecidos também deste autor.
Escolha na Amizade, o Sociotropismo
Apóia-se, como a escolha dos cônjuges, na mesma igualdade dos genes recessivos latentes.
Escolha da Profissão, o Ópero ou Ergotropismo
Como uma forma especial de genotropismo, possui uma alta importância, tanto na sociologia como em relação ao fenômeno da heterogeneidade no homem. Na escolha da profissão, um grupo de pessoas procura uma atmosfera de trabalho na qual possa colaborar com indivíduos portadores manifestos em forma latente e em doses individuais – de genes análogos. Exemplo clássico é a semelhança das árvores genealógicas de psiquiatras, psicanalistas e psicólogos com as de seus pacientes. Nas árvores genealógicas de famosos psiquiatras e psicanalistas encontrou-se, uma porcentagem acima da média de parentes consangüíneos e de escolha psicóticos e às vezes esquizofrênicos. No círculo familiar e seletivo de indivíduos Homo sacer (sacer do latim: sagrado; sacerdotes, monges, monjas, pastores, rabinos); a freqüência do morbus sacer (parentes consangüíneos epiléticos) é quase 10 vezes maior entre casamento de parentes por afinidade, e quase 4 vezes mais freqüente que na média da população. Este fato foi constatado em estatística baseada numa pesquisa sobre hereditariedade, a qual englobou 707 parentes consangüíneos e 712 por afinidade de 25 sacerdotes; portanto, um total de 1419 pessoas. Assim ficou também confirmada, de modo significativo, a exatidão do libidotropismo e, portanto, da forma mais freqüente de genotropismo.
É interessante notar que, nas árvores genealógicas de bombeiros, foram achados piromaníacos; nas de juristas, paranóicos com compulsão de querela, e por aí vai.
Estes resultados da Análise do Destino provam, pela primeira, vez, que a heterose desempenha relevante função também no homem. Denomina-se heterose ao fenômeno verificado nos indivíduos heterozigotos de hereditariedade mista, portadores – em doses individuais – de genes letais ou de grave morbidez, que apresentam uma força vital, tanto somática quanto germinativa, aumentada. A vitalidade acima da média desses heterozigotos foi verificada, sobretudo em determinadas espécies de cereais e, parcialmente, também no reino animal.
Escolha da Doença, o Morbotropismo
Assim designa-se o fenômeno em virtude do qual o indivíduo reage às vezes com uma perturbação a surtos infecciosos ou a traumas; sendo que esta perturbação, sem infecções ou traumas, já existia, de forma endógena, na família. Pode-se conseqüentemente presumir uma atuação dirigente dos genes latentes.
Em uma família, a sífilis congênita conduziu à surdez; nessa família, porém, a surdez hereditária já existia em diversos membros.
Num outro caso, a sífilis transmitida por herança levou à epilepsia numa família em que esta – sem sífilis – já existia hereditariamente. Interessante também é o caso daquela família onde cinco membros tinham dificuldades auditivas. Essas dificuldades apareceram, num deles, após um surto de tifo; num outro, após um ferimento na cabeça; num terceiro, depois de uma inflamação cerebral; em dois outros, após acessos de malária.
Escolha da Morte, o Tanatotropismo
Significa, como destino, a escolha e o tipo do suicídio. Nesse ponto, a Análise do Destino pode confirmar as estreitas ligações entre epilepsia latente e suicídio, entre homossexualidade egodistônica, esquizofrenia paranóide, mania e suicídio, através de pesquisas sobre a família.
Os suicidas do grupo hereditário paranóide-homossexual preferem veneno ou revólver; os do grupo de sádicos utilizam de preferência a corda, a navalha, a faca, o punhal, o machado ou a espada. As formas de suicídio preferidas pelo grupo hereditário epileptiforme são o salto em profundidade, da janela ou torre, da ponte, do trem, e a morte pelo fogo ou a autocombustão (com benzina, petróleo). O tipo mais freqüente de suicídio no grupo catatônico-esquizomorfo é a morte pela fome (por exemplo, na anorexia nervosa), ou atirando-se sob as rodas de um carro. Suicidas do tipo circular escolhem freqüentemente tipos de morte por via oral: ingestão de morfina, álcool, barbitúricos, raticidas etc. Neste último caso há um relato sobre a existência de oito suicidas na mesma família.
O Diagnóstico Experimental do Destino
A Análise do Destino tentou evitar as dificuldades que se apresentam na pesquisa genotrópica do destino de certas famílias, de modo que fez os pacientes escolherem, de uma coleção de 48 fotografias, as 12 mais simpáticas e as 12 mais antipáticas. As fotografias são expostas em 6 séries de oito fotografias.
Cada série consta de 8 fotografias que reproduzem:
(1) um hermafrodita (h);
(2) um sádico (assassino) (s);
(3) um epilético genuíno (e);
(4) um histérico (hy);
(5) um catatônico (k);
(6) um paranóico (p);
(7) um depressivo (d);
(8) um maníaco (m).
Pela escolha das 12 fotografias mais simpáticas e das 12 mais antipáticas é estabelecido um perfil de primeiro plano do paciente; as restantes 24 fotografias são expostas novamente em 6 séries quádruplas, e de cada série devem ser escolhidas as 2 fotografias mais simpáticas e as 2 mais antipáticas. Assim se origina um segundo perfil, o perfil complementar experimental, que torna visíveis as funções do plano de fundo das pulsões e do ego. Essa experiência de fase dupla é então repetida 10 vezes, em dias diferentes e – após a aplicação de um determinado método de cálculo – verificam-se os resultados.
O processo relativo à pesquisa experimental das funções pulsionais e do ego apóia-se num sistema de oito fatores de pulsão. Todos eles condicionam, em grupos de dois, tendências pulsionais dialeticamente opostas. São eles:
(1) fator do amor pessoal humanitário;
(2) fator do sadismo e masoquismo;
(3) fator da intenção assassina de Caim e da justiça de Moisés, ou da ética;
(4) fator do exibicionismo e do retraimento, da moral:
(5) fator de possuir-tudo ou negar-tudo;
(6) fator do ser-tudo e do ser-nada;
(7) fator da procura e do apego:
(8) fator do agarramento e da separação (os dois últimos fatores originam-se de Hermann).
A Análise do Destino dá aos oito fatores pulsionais o nome de raízes ou radicais da vida instintiva, porque através de milênios permaneceram essencialmente iguais. Os radicais pulsionais hereditários possuem efetivamente algo de não histórico, algo de conteúdo ainda não especificado totalmente, que atravessa toda vivência, comportamento e realização, estando continuamente presentes para cada indivíduo (Jaspers).
O sistema dos oito fatores pulsionais comprovou-se bem no último quarto do século XX, em especial por ser capaz de analisar experimentalmente os fenômenos em aparência unitários da vida pulsional, quase através de uma "análise espectral" nas suas raízes nutritivas radicais.
Com base em milhares de exames (na Hungria e na Suíça), pode-se dizer o seguinte sobre essas pesquisas experimentais do destino:
(1) o teste revela as doenças psíquicas extremas de tipo familiar, cujo portador é o examinando;
(2) torna visíveis, pois, de modo especial, as funções latentes das pulsões e do ego, que pela hereditariedade ameaçam o portador;
(3) além disso, o teste pode revelar 17 estruturas diferentes de pulsões e do ego, que podem ser avaliadas como "possibilidades de destino" ou formas de existência; 12 entre as 17 são diagnosticáveis como formas existenciais de perigo; as 5 restantes, como formas existenciais de defesa;
(4) determinando as proporções das existências perigosas e protetoras, pode-se indicar um tratamento psicoterapêutico.
Através de um cálculo especial e também do julgamento social das reações individuais à escolha das fotografias, conseguiu Beeli elaborar um prognóstico bastante útil do destino.
A respeito do sistema de pulsões de Gall, escreveram Leibbrand & Wettley em sua conhecida obra, A Loucura:
"Antes de Freud, Gall reconheceu a sexualidade precoce da criança. Admitiu uma espécie de senso de estrangulamento ou de assassinato, cuja legitimidade, no homem, provém de sua participação no gênero carnívoro. Gall identificava um senso de furto, uma faculdade de imitação, um senso lingüístico, léxico, cromático, tonal. Acentuava, de novo, não se tratar absolutamente de predisposições fixas, mas de possibilidades. É justamente esse 'conceito de possibilidade', em sua multiplicidade combinável, que estabelece o fundamento prático para pedagogos e juízes. Gall pensava poder utilizar essa teoria no sentido de uma psicoterapia e psiquiatria socializada. Achou, portanto, o mesmo que hoje Szondi espera conseguir com sua teoria das pulsões, isto é, que o conhecimento das possibilidades das pulsões vá levar à compreensão do ego. Além disso, acreditava, assim como Szondi, que estaria em condições de fazer prognósticos pulsionais que pudessem ser utilizados juridicamente."
Esse interessante retrospecto médico-histórico, destacando a Teoria das Pulsões de Gall (1758-1828), prova mais uma vez que nada é novo debaixo do sol.
A Patologia do Destino
Já foi discutido que o destino humano é dirigido por um sistema de funções. Essas funções criativas e dirigentes do destino, como, por exemplo, as funções hereditárias pulsionais, afetivas do ego e da mente, podem em parte e – algumas vezes na totalidade – sofrer perturbações ou "adoecer". Conforme as modalidades das ligações funcionais perturbadas, originam-se diversas formas patológicas de destino.
Pergunta-se: que ligações funcionais específicas podem ser experimentalmente descobertas atrás dos transtornos psicopatológicos fenomenicamente diversificado?
Neste ponto, evitando exposições individuais, fazemos referência ao livro Triebpathologie (Patologia das Pulsões) no qual, para todas os transtornos psíquicos, foram prescritos tratamentos em relação às latentes ligações funcionais das pulsões.
Das pesquisas comparativas, englobando casos de psicoses diversas, neuroses, psicopatias, anomalias sexuais, como também de crimes e vícios (relacionando-se os diagnósticos clínicos e os resultados das análises experimentais de pulsões e do ego), tiram-se as seguintes conclusões:
(1) os resultados das pesquisas relativas às pulsões e ao ego de doentes mentais mostram que a idéia de uma unidade patológica (na concepção de Kraepelin) não seria simplesmente "caça a um fantasma", como acentuaram os extremistas das síndromes, entre eles Roche, Schneider e Tripicchio;
(2) verificou-se experimentalmente que predisposições especiais vetoriais, do ego e das pulsões, funcionam no homem, dinamicamente, como radicais biológicos, que determinam se, sob certas circunstâncias, poderia o indivíduo adoecer antes, de forma esquizofrênica ou na forma circular;
(3) finalmente, as funções pulsionais e do ego, em conjunto, como associações de função, condicionam o rumo da doença: (a) pelo tipo especial de cisão, hereditariamente determinado, das funções pulsionais e do ego; (b) pelo setor, pulsional e do ego, onde o perigo é maior; (c) pelo tipo especial de defesa do ego.
(4) segundo essas pesquisas experimentais, a idéia de unidade patológica se apóia num fato biológico: cada indivíduo possui uma disposição individual, pulsional e do ego, que determina onde – sob dadas circunstâncias – poderiam ocorrer os maiores riscos. Conseqüentemente, apenas nesse sentido se pode afirmar a idéia de unidade patológica. O caráter da catatonia conduz o ego psicologicamente à negação, à aniquilação de todos os valores; o da paranóia resume-se numa ilimitada ego-diástole, num impulso de projeção e de inflação. Na depressão destaca-se o impulso insaciável de busca; na mania, o impulso imoderado de desligar-se de toda ligação com o mundo;
(5) o resultado mais importante dessas pesquisas é o seguinte: cada ser humano é portador (em seu inconsciente familiar) de uma disposição pulsional e do ego para todos os quatro grandes grupos de doenças, compreendendo as formas circulares esquizofrênicas, paroxísticas ou hístero-epiléticas e da possibilidade de doença sexual.
Assim sendo, não há duplicidade, mas quadruplicidade dos grupos doentios do destino. As diferenças individuais caracterizam-se tão somente pela graduação proporcional dessas quatro disposições fundamentais. A disposição para as psicoses hereditárias é sempre condicionada pelas proporções hereditárias. Estas proporções são evidenciadas nas experiências, através das proporções de latência das ligações funcionais;
(6) a psiquiatria funcional e a psicologia da profundidade distinguem-se, em conseqüência, da escola de psiquiatria clássica clínica, principalmente em dois pontos: (a) procura nas disposições pulsionais e do ego os radicais biológicos das unidades patológicas; (b) considera as doenças mentais sempre nas proporções, nas relações potenciais dos diversos conjuntos funcionais. Só do aspecto proporcional é possível, em nossa opinião, entender, de modo multidimensional a natureza dos doentes, em todas as direções de suas possibilidades de destino;
(7) em lugar de diagnósticos clínicos, deveriam ser especificadas, em cada caso, as proporções individuais das funções pulsionais e do ego, como conjuntos ocultos. Nisto vemos o fundamento mais importante de uma psiquiatria funcional.
Estes resultados das pesquisas experimentais relativas a conjuntos funcionais de doentes mentais concordam com os conceitos da genética. Luxemburger, um dos representantes desta escola, escreve:
"É possível que um esquizofrênico possua, junto ao genótipo esquizofrênico pleno, disposições parciais maníaco-depressivas ou epiléticas e vice-versa." E continua: "Sou até de opinião que um mesmo indivíduo pode tornar-se primeiramente epilético, depois esquizofrênico e, finalmente, ainda, maníaco-depressivo, como proposto pela concepção de Psicose Única. Com o grau atingido pelas pesquisas relativas à hereditariedade, não há razão para supor que as psicoses hereditárias se excluam reciprocamente. Pesam contra tal visão, justamente ao lado de tão freqüente combinação familiar de diversas psicoses hereditárias (também em irmãos de ambos os sexos), o grande número de esquizofrenias atípicas, ciclotomias e epilepsias, assim como aqueles casos dificilmente diagnosticáveis que foram denominados 'psicoses mistas' [melhor dizer, associadas e/ou enxertadas]".
Este ponto de vista é plenamente confirmado pelas pesquisas experimentais sobre o destino. Até agora, porém, não pôde a genética verificar as proporções individuais e atuais das predisposições hereditárias. Hoje, entretanto, podemos consegui-Io com a ajuda do Teste de Escolha de Fotografia. O destino de um homem, como indivíduo, é habitualmente marcado pelas proporções pessoais de sua predisposição hereditária, e especialmente através de suas predisposições pulsionais e de seu ego. Conseqüentemente, deve também cada doente mental ser apresentado nas proporções de suas predisposições funcionais, nunca por um único diagnóstico clínico.
Com estas considerações esclarecemos que a Análise do Destino construiu seu sistema sindrômico experimental sobre os transtornos dos conjuntos de funções, invisíveis latentes; e não, como fazem Hoche, Schneider e Tripicchio, sobre sintomas clínicos manifestos. Como estes conjuntos hereditários invisíveis constam de funções do destino coercitivo, a Análise do Destino fala em uma patologia do destino, referindo-se a esses quadros psicopatológicos e hereditários.
A Egologia do Destino – A Doutrina do Eu
A importante ação das manifestações do ego no destino de cada indivíduo manifesta-se de muitas maneiras:
(1) na conscientização e na capacidade de conscientização das pretensões ancestrais inconscientes do inconsciente familiar. Isto acontece parcialmente através da conscientização, isto é, da projeção inconsciente das imagens ancestrais, em conseqüência da qual se efetuara até aquele momento a busca e a escolha de um parceiro; parcialmente através da conscientização do fato de que a pessoa fica obsedada por tendências ancestrais opostas, isto é, da inflação;
(2) o ego deve tomar posição quanto às possibilidades de destino herdadas: deve ou afirmá-Ias, incorporá-Ias ao próprio ego, identificando-se, com elas, ou negá-las e, em casos extremos, até mesmo destruí-las;
(3) como já foi mencionado no início da parte I, o ego pode em circunstâncias favoráveis desenvolver-se tanto que fica incapaz de conciliar os antagonismos da existência. Isto é, o sonho e a vigília; o inconsciente e o consciente; os mundos subjetivo e objetivo; a onipotência e a impotência; o corpo e a alma; a feminilidade e a masculinidade; a mente e a natureza; o aquém e o além. Já mencionamos que a Análise do Destino denomina esse ego altamente desenvolvido de Pontifex Oppositorum. Esse ego, capaz de supervisionar e conciliar todas as antinomias, tem o poder de escolher, entre as possibilidades do destino compulsivo herdado, um destino de livre escolha.
O Destino de Livre Escolha
Preliminarmente foi feita a pergunta: que instância tem então o poder de eleger um destino de livre escolha, em lugar do destino compulsivo? Essa instância é o Ego Pontifex, em outras palavras, as funções do ego, conciliando os antagonismos conscientizados. Para poder construir conscientemente um destino de livre escolha, o ego deve exercer as seguintes funções:
(1) a integração: o ego deve dominar e dirigir soberanamente suas funções elementares. Isto implica, psicologicamente, que o ego examina as diversas pretensões ancestrais até o momento projetadas para fora (projeção) e as conscientiza (inflação), com a medida da realidade; e, se uma, das muitas possibilidades de existências herdadas, lhe oferecer a oportunidade de um destino melhor, ele a confirma, a incorpora (introjeção), e nega (negação) o destino coercitivo até então vivido, seja uma anormalidade sexual, uma neurose afetiva do ego ou de contato, ou até mesmo uma pré-psicose;
(2) a transcendência: O ego deve poder transcender até a mente. Deve procurar uma ligação com uma idéia superior (humanidade, arte, ciência ou religião) e ativar a função de crença na humanidade;
(3) a participação mental: O ego deve unificar-se de maneira duradoura com esta idéia superior, isto é, o ego deve poder participar.
Integração, transcendência e participação ideal super personalizada, dão ao ego a força de negar o destino compulsivo e, entre as possibilidades familiares conscientizadas, escolher livremente seu próprio destino, e viver de acordo com tal opção.
A Terapia do Destino
Talvez seja válido afirmar que as três condições já mencionadas, das quais depende o surgimento do Ego Pontifex, são também passíveis de condicionamento hereditário. Pois é impossível negar que uma elite humana, nem sempre constituída de intelectuais, pode alcançar espontânea e naturalmente esse alto grau do Ego Pontifex.
Parém, a Análise do Destino comprovou que também em muitas doentes mentais estas mesmas condições existem em estado latente, embora vivam seu difícil destino compulsivo como neuróticos ou psicóticos. Esta circunstância forçou a Análise do Destino a experimentar métodos artificiais, psicoterapêuticos, com a ajuda das quais é possível transformar o destino compulsivo em destino livre.
Do ponto de vista "rumo-efeito" da psicoterapia analítica, podemos classificar as curas em processos diretos e indiretos. Como paradigma do processo direto, deve ser mencionado a psicanálise. Neste método, o terapeuta visa diretamente as tendências pulsionais, reprimidas (complexo de Édipo etc.), os quais são responsáveis pelo surgimento dos sintomas. A terapia da Análise do Destino não pode aplicar esses métodos diretos de tratamento nos casos em que as pretensões ancestrais herdadas e causadoras da doença, nunca foram conscientes e, em conseqüência, não foram também reprimidas; contudo, apesar disso, ameaçam de modo latente o destino do indivíduo através do inconsciente familiar. Por exemplo, uma predisposição familiar para a autodestruição ou para a epilepsia. A Análise do Destino deve, portanto, com freqüência, escolher meios indiretos de tratamento. São eles:
(1) inversão dos destinos pulsionais dialeticamente construídos da forma social-negativa para a social-positiva do destino. Paradigma: piromania latente –> bombeiro; esquizofrenia latente –> clínico psi; mania processual latente –> advogado; mania religiosa latente –> psicologia da religião etc. Nestes casos, o operotropismo atua terapeuticamente, depois do paciente tomar consciência de que seu destino compulsivo está intimamente ligado à possibilidade de escolha de uma determinada profissão;
(2) inversão das partes cindidas (e, portanto, dos destinos complementares do ego) em determinadas doenças que acarretam uma cisão. Alguns exemplos: a paranóia projetiva – mania de perseguição como uma parte cindida do ego pode, sob determinadas circunstâncias, inverter-se na outra parte cindida complementar, a existência de trabalho compulsivo. Ou: a megalomania (paranóia inflativa) pode desaparecer se, pela inversão, a outra parte cindida do mesmo ego (o ego evasor) continuar a viver como viajante profissional, glob-trotter etc.
(3) permuta de uma forma de existência doentia por outra mais inofensiva, para a qual existia uma predisposição que será descoberta no patrimônio hereditário do paciente através do teste e do exame da árvore genealógica. Assim, é possível que o paciente consiga permutar a paranóia esquizofrênica por uma cefalalgia paroxística, ou por paroxismos de outro tipo; ou a paranóia e a mania por uma compulsão.
Para promover essas permutas das formas de destino, a terapia analítica do destino elaborou métodos especiais (método do martelamento, do psicochoque).
Apresentamos as transformações do conceito de destino na psicologia profunda, e chegamos a uma psicoterapia que ousa até transformar as normas de destino do indivíduo. É nova essa ousadia? No livro já citado, A Loucura, de Leibbrand & Wettley estes salientam que; em 1843, Von Struve elaborou uma Frenologia Profunda destinada, sobretudo, a tornar-se a base do tratamento das doenças psíquicas. É possível, e até provável, que há mais de cem anos a Frenologia Profunda tivesse os mesmo objetivos que tem hoje a Psicologia Profunda. Atualmente, porém, qual dos adeptos da Psicologia Profunda conhece o nome de Von Struve e sua Frenologia Profunda? Provavelmente o mesmo destino aguarde, daqui a cem anos, os atuais representantes da Psicologia Profunda.