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A dialética prazer-sofrimento no trabalho de motoristas rodoviários de passageiros

1. Introdução

Em toda evolução da atividade produtiva, a lógica organizacional centrou-se na concorrência econômica, com vistas, a expansão do capital, sendo um de seus efeitos sociais, o crescimento do consumo, bem como, do conforto material.No entanto, ao passo que acontece a busca desenfreada por performances produtivas, o fator humano, na própria organização, tende a sofrer conseqüências negativas, sobretudo sobre sua saúde mental.

De fato, há muito tempo, as configurações organizacionais colocam o indivíduo em plano secundário, convocando-o apenas como recurso em prol do desempenho produtivo. Mesmo nos atuais programas de qualidade total (QVT), que em certa medida, buscam melhores condições de satisfação. A para o colaborador, seu alvo prioritário é ainda a produtividade, e assim, a integridade psíquica do trabalhador é indelevelmente atingida.No tocante ao setor de transporte rodoviário, as condições de trabalho, no plano satisfatório, são relegadas em função das demandas comerciais de mercado. A carga horária é intensiva, os horários de trabalho são irregulares e o período de repouso é insuficiente, redundando em prejuízos aos aspectos biossociais do profissional e a sociedade como um todo, dada a relevância econômica e social da profissão.O setor de transporte rodoviário de passageiros reveste-se de uma elevada importância quando se remete à mobilidade das sociedades modernas. O constante movimento de massas populacionais torna imperativo o conhecimento das condições de trabalho, às quais os motoristas profissionais estão envolvidos.           

A organização do trabalho, na qual os motoristas estão inseridos não são regidas por normas severas e transparentes que norteiam o controle e fiscalização do tempo e turnos trabalhados.Carentes de legislação específica, e de políticas públicas que regularize as atividades laborais desempenhadas, as situações de trabalho ficam, portanto, à mercê dos interesses empresariais.As relações de trabalho neste setor, desde seu princípio, têm se configurado em conflitos entre empresários e trabalhadores. Os empresários tentam exercer suas influências para que projetos de leis que procuram garantir os direitos dos motoristas sejam vetados. Os motoristas, por sua vez, lutam através dos movimentos sindicais, por condições mais favoráveis de trabalho. A situação salarial da categoria é baixa, em torno de 5 salários mínimos mensais e vem decrescendo nos últimos anos. É fato que o transporte rodoviário de passageiros encobri-se de problemáticas e forma de gestão específicas. A condução de um veículo pesado como um ônibus configura-se por inúmeras exigências, não apenas físicas, mas também mentais. A necessidade de um ajustamento corpóreo ininterrupto que requer uma contínua vigilância alia-se à necessidade de integridade psíquica em função das dificuldades peculiares e atividades complexas próprias.Sabe-se que a exposição sistemática e prolongada à situação de condução profissional de um veículo comporta vários fatores agravantes que lhes conferem uma carga física e mental elevada. A sociedade atual tem demandado mais serviços, particularmente no setor de transporte, obrigando a formação de escalas de trabalho partilhadas ao longo das 24 horas. Isso implica em horários de folgas inconstantes, que, por sua vez, geram conflito entre tempos de trabalho e ritmos biológicos. Além dos mais, o trabalho noturno acarreta um esforço acrescido, representado pelo combate contra a sonolência, contrariando o ritmo circadiano normal do trabalhador.Diante esse cenário, este estudo surgiu em face da precarização das condições de trabalho dos motoristas de ônibus rodoviários, que marcadamente se configuram numa verdadeira controvérsia entre demandas peculiares do setor de transporte e as limitações físicas e psicológicas destes profissionais.Como resultado deste embate, é possível perceber repercussões não apenas físicas, mas, sobremaneira, subjetivas, impostas a estes trabalhadores na sua relação com o trabalho.

Nesse sentido, o estudo sobre o sofrimento psíquico da categoria de motoristas do transporte rodoviário de passageiros se valida em importância e utilidade.A análise dos impactos no mundo do trabalho sobre a subjetividade do trabalhador vem sendo desenvolvida, dentre outras correntes, pela Escola da Psicodinâmica do Trabalho, cujo estudo referente à relação sofrimento psíquico-trabalho, tem recebido contribuições de enorme valor em sua produção teórica. Datando desde os anos setenta, esta abordagem vem se solidificando, através da construção teórica de diversos autores, dentre eles, o precursor Christopher Dejours, médico do trabalho, psiquiatra, psicanalista, professor do Conservatório Nacional de Artes e Ofícios da França /CNAM/ e diretor do Laboratório de Psicologia do Trabalho e das Ações, nesta mesma instituição.A princípio, a psicodinâmica do trabalho constituiu-se como estritamente francesa, entretanto, atualmente ela abrange diversos países, inclusive o Brasil. Aliás, hoje ela divide seu espaço com correntes dissidentes que possuem uma ótica divergente da sua em relação ao sofrimento no trabalho.

Os estudos de campo voltam-se à gênese e transformações desse sofrimento à organização do trabalho (divisão das tarefas e relações entre os trabalhadores). Para a escola dejouriana só se conhece as implicações à saúde mental, articulando a história psíquica do indivíduo (dimensão diacrônica) e o contexto do trabalho (dimensão sincrônica). Percebeu-se que os estudos, até então, sobre os laços entre sofrimento mental e trabalho, restringiam-se ao ambiente interno organizacional, subestimando assim, a extensão externa do trabalhador, suas interações sociais e familiares e ainda, sua própria história de vida. Nesse sentido, segundo Dejours, perdia-se de vista toda a amplitude da relação psíquica entre o indivíduo e a situação de trabalho. Ciência transdisciplinar, a psicodinâmica do trabalho articula os conhecimentos psicanalítico e psicossomático à análise de situações de trabalho. A base psicanalítica contribui para a apreensão da subjetividade, a história psíquica do sujeito, assim como as diversas estruturas da personalidade e psicopatologias; A medicina psicossomática visualiza o ser humano de forma holística, compreendendo a doença como um processo, simultaneamente, mental e somático; o contexto organizacional é analisado conforme o modo pelo qual o trabalho é organizado. Vale salientar que o trabalho pode ser também fonte de realização pessoal, bem como, favorecer a saúde. Com efeito, na mesma intensidade que a forma pela qual o trabalho é organizado, pode favorecer o desencadeamento de uma patologia mental, quando este é incompatível com a subjetividade do indivíduo, pode promover a saúde psíquica quando sua organização entra em consonância com suas necessidades intrapsíquicas.

Assim, o objetivo geral deste estudo consiste em investigar as vivências de prazer e sofrimento psíquico de motoristas rodoviários de passageiros, no que tange, especificamente, às dimensões organização do trabalho, condições de trabalho, relações sócio-profissionais e estratégias defensivas, tomando como eixo norteador, à abordagem da psicodinâmica do trabalho desenvolvida por Christopher Dejours.Para alcance dos objetivos foram propostas as seguintes questões: 1 – Como os motoristas rodoviários de passageiros vivenciam prazer e sofrimento no trabalho? 2 – Como se estrutura a organização do trabalho e qual sua influência sobre o prazer–sofrimento no trabalho? 3 – Os profissionais fazem uso de mecanismos de defesa para lidar com o sofrimento psíquico?Como justificativa para este trabalho, evidencia-se que, a ação no campo do sofrimento psíquico tem sido, geralmente, negligenciada na atuação do psicólogo organizacional. Logo, a instigação pessoal para abordar o tema, ratificando sua relevância, haja vista a onipresença do sofrimento psíquico no mundo laboral. De fato, a crítica que se faz ao psicólogo organizacional é justamente seu hábito de agregar os valores capitalistas aos seus próprios valores, de modo que, as questões essenciais que promovem a saúde psíquica, são desconsideradas em sua prática.            

Na verdade, o conhecimento sobre as conseqüências sociais do sofrimento no trabalho transformaria, não apenas, as condições organizacionais, mas também, traria benefícios à sociedade, pois a saúde psíquica do motorista traz ganhos de produtividade e um melhor serviço prestado. Se as preocupações trabalhistas, em termos de poluição, não se restringissem apenas às poluições físico-químicas, mas, fossem ampliadas às poluições psíquicas presentes nas organizações, se suas noções de ecologia não se detivessem apenas à biologia, mas estendesse seu terreno ao social, a vida das pessoas que elas empregam e dos sujeitos que mantêm laços afetivos e sociais com os mesmos, daria um grande salto qualitativo. Sob o ponto de vista das empresas do setor de transporte rodoviário de passageiros, este estudo exploratório pode propiciar contribuições, no tocante ao conhecimento da influência do modelo prescrito de trabalho sobre as vivências de prazer e sofrimento dos motoristas que empregam. Além do mais, a importância do estudo da relação do homem-trabalho, numa perspectiva psicodinâmica, consiste na identificação do trabalho como lugar de produção de significações e realizações psíquicas.Ademais, a psicodinâmica do trabalho dispõe da vantagem, com base nos conhecimentos adquiridos na experiência clínica, de conceber o homem em sua totalidade, pois atravessa sua dimensão temporal, a partir da articulação de sua história singular com a atual situação de trabalho que ele enfrenta e ainda, trespassa sua dimensão espacial, uma vez que, além do espaço interno de trabalho, convoca conhecimentos advindos fora deste ambiente: as relações familiares e sociais do trabalhador.Teve-se como universo de estudo, motoristas rodoviários de passageiros por tratar-se de uma profissão que demanda elevado nível de subsídio profissional dos profissionais de psicologia nas organizações, em particular, da empresa onde a pesquisadora é responsável pelo setor de Recursos Humanos – RH.

Observa-se que estes profissionais, por trabalhar na linha de frente da empresa, vivenciam acentuada dificuldade no relacionamento com os clientes, dado o alto nível de exigência destes, além dos problemas acarretados pela própria organização do trabalho, a qual estão submetidos (variações das jornadas de trabalho e irregularidade nas horas de repouso).O estudo utilizou a abordagem qualitativa para compreender a dinâmica subjacente, bem como o caráter distintivo da organização do trabalho, através de entrevistas coletivas semi-estruturadas.A apresentação do estudo subdivide-se em seis capítulos. O primeiro capítulo trata de diversos significados e compreensões experimentadas pela temática trabalho e seus meandros constitutivos, em seguida, explora um breve retrato das principais formas de organização do trabalho e seus vínculos ao sofrimento psíquico. Este capítulo também caracteriza o trabalho de motoristas rodoviários de passageiros apontando dados de alguns estudos sobre esta profissão. O capítulo 2 aborda o trajeto histórico e uma articulação lógica dos pressupostos e conceituações e o sistema de explicação de Christopher Dejours acerca da psicodinâmica do trabalho e as repercussões do sofrimento no trabalho. O capítulo 3 traz a metodologia de investigação, delineando o universo da pesquisa, participantes, instrumentos e procedimentos de coleta e análise dos dados.No capítulo 4 são exibidos os resultados obtidos do trabalho.O capítulo 5 expõe uma discussão à luz dos resultados adquiridos, articulando-os às perguntas norteadoras e aos objetivos propostos.Por fim, o sexto capítulo apresenta as considerações finais sobre o estudo.

2. Trabalho modelo de organização e o trabalho de motoristas rodoviários de passageiros

O presente capítulo busca apontar, num primeiro momento, diversos significados e compreensões experimentados pela temática trabalho e seus meandros constitutivos. Já num segundo momento pretende, em função do poder da organização do trabalho no engajamento dos indivíduos no sofrimento psíquico, expor uma breve explanação sobre os principais modelos de organização da produção. Vale ressaltar, que os conceitos que norteiam esta discussão são: divisão do trabalho, conteúdo da tarefa e relações com pares e hierarquia, os quais consistem em elementos pertinentes e definidores da organização do trabalho. Em seguida, o capítulo traz a caracterização do trabalho de Motoristas de ônibus rodoviários e alguns resultados de estudos realizados sobre estes profissionais.

2.1 O mundo do trabalho            

O estudo do trabalho transformou-se em um rico campo de desenvolvimento das ciências sociais e comportamentais, tornando-se um campo transdisciplinar, facilitando o diálogo entre diversas áreas.           

É fato que a sociedade mundial se estruturou, fundamentalmente, em função do trabalho. Nos diversos momentos e sociedades o executor do trabalho desempenhou diferentes papéis em sua existência (BORGES; YAMAMOTO, 2004).           

Na maioria dos idiomas, encontra-se mais de um significado ao trabalho (ALBORNOZ, 2004). O grego distingue as palavras fabricação, esforço (oposto a ócio) e pena (próxima da fadiga). O latim diferencia laborare – ação de labor e operare – obra. Em francês verificam-se os termos traveiller (trabalhar), ouvrer (fabricação), oeuvrer (obra) e tâche (tarefa). No italiano, lavorare e operare e em espanhol, trabajar e obrar. Em inglês, labour significa esforço, cansaço e work, ativa criação, obra, semelhante, respectivamente, às palavras alemãs arbeit e werk. Contudo, nas palavras portuguesas labor e trabalho reconhece-se o mesmo significado.           

No dicionário Houaiss (2001, p. 435) trabalho significa “atividade produtiva paga ou não, seu resultado, esforço, lida, funcionamento (de mecanismo), oferenda aos orixás para obter algo”.           

Além dessas atribuições, existe uma variedade de acepções que se apropriam do termo trabalho. Isso significa que a palavra (trabalho) é tratada perante uma diversidade de sentidos que de longe esgotam o tema (ALBORNOZ, 2004).           

A origem da palavra trabalho está no termo latino tripalium que significa tortura (BORGES; YAMAMOTO, 2004). Nesse sentido, já em sua gênese, o trabalho possui uma semântica associada a sofrimento.           

Na Grécia antiga, os filósofos clássicos, Platão e Aristóteles concebiam o trabalho como uma ocupação inferior e indigna, que limitava o intelecto, portanto, própria aos escravos. O cidadão, no entanto, deveria canalizar suas ações à política, não considerada um trabalho, logo, julgada como uma atividade superior (ANTHONY, 1997; HOPENHAYN, 2001 apud BORGES; YAMAMOTO, op. cit.).           

Nessa mesma lógica de pensamento, o Império Romano ratificava o sistema escravista, dada a desigualdade de classes – grande oferta de mão de obra escrava em decorrência das guerras.           

O cristianismo, em seu princípio, concebia o trabalho como um castigo divino devido ao pecado original cometido por Adão e Eva (DAVIES; SHACKLETON, 1977).           

Posteriormente, os argumentos de Adam Smith (1978) e da ética protestante valorizam o trabalho como a maneira de obter êxito através do “trabalho duro”, assim como, conseguir a salvação divina, pois a profissão era entendida como uma dádiva de Deus.           

Para Marx (1983) o trabalho era visto como uma mercadoria, na qual, o trabalhador não possuindo os meios de produção, vende sua força de trabalho para o detentor do capital, possuindo características exploratórias (mais-valia), humilhantes, monótonas, discriminatórias, embrutecedoras e de submissão.           

Este autor ressaltava a distinção do trabalho humano comparando aos outros animais. Utilizava-se de termos como intencionalidade e planejamento para diferenciar o trabalho do homem, da natureza instintiva do animal. O homem ao atuar no mundo, não apenas provoca transformação neste, mas ao mesmo tempo em si mesmo.           

No século XIX (DAVIES; SHACKLETON, op. cit.) surgiram às linhas de montagem para produção em massa, como forma de ampliação da mais-valia e da racionalização científica do trabalho, a partir da idéias de Taylor, Fayol e Ford, trata-se da Administração Científica do Trabalho. Borges e Yamamoto (op. cit.) parafraseando Hopenhayn aventam que esse modelo gerou acentuado descontentamento em virtude da máxima “coisificação” do trabalhador, pois o crescimento da produtividade era o único objetivo, desconsiderando-se quaisquer outros fatores.           

No século XX, apesar dessas idéias puramente capitalistas negarem o antagonismo de classe apontado por Marx e legitimarem as dimensões de trabalho, começaram a surgir os primeiros movimentos sindicais no mundo (ANTUNES, 1989). Nas condições de trabalho eclodia uma conjuntura de excesso da jornada de trabalho e ausência de benefícios trabalhistas, culminado em sucessivas greves que levaram a conquista de direitos trabalhistas como a limitação da jornada de trabalho, trabalho feminino e construção de creches junto às empresas. Nesse período surgiu em resposta a essas manifestações mundiais, a política do bem-estar social, proposta por Keynes (keynesianismo), que sustentava a organização fordista e taylorista do trabalho, a acumulação de capitais, a economia progressista centrada nos processos de produção e consumo (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.). Neste caso, o bem-estar refere-se, em contrapartida, ao conceito de “trabalho duro”, a viabilização da satisfação financeira e interpessoal, associando o trabalho ao poder de consumo-satisfação.           

No Brasil o keynesianismo propiciou a formação das CLT (Consolidação das leis trabalhistas) (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.).           

A política de bem-estar pelo consumo não atingiu a sociedade de maneira homogênia, repercutindo no surgimento do movimento hippie, cuja principal ênfase era a oposição ao modelo capitalista de trabalho e a sociedade de consumo. O keynesianismo tão logo deflagra devido às contradições internas em sua estrutura, dando o lugar à Terceira Revolução Industrial (MATTOSO, 1995 apud BORGES; YAMAMOTO, op. cit.), que procura repensar o trabalho dentro de uma perspectiva de maior intelectualização e qualificação das relações de trabalho, porém com grande cobrança sobre os trabalhadores, gerando instabilidade no emprego e crescimento de condições insalubres de trabalho além do subemprego.           

Na atualidade, devido à rápida evolução das tecnologias, o trabalho vem, se caracterizando pelo crescimento da automação e dependência da informação (ANTUNES, 2005). Tais mudanças recolocam em pauta questões da competência do vínculo com o trabalho, do poder, dos valores e do desenvolvimento de um ser humano que continua o mesmo. Cada vez mais o ambiente de trabalho tornar-se virtualizado e por contatos físicos diminuídos e voláteis.           

Nos anos setenta, Dejours (1996) pondera que trabalho consiste num território ambivalente, uma vez que tanto, pode dar origem a processos de alienação e mesmo de descompensação de uma doença física ou mental quanto pode ser fonte de prazer e instrumento de emancipação.           

O conceito de trabalho se delimita a uma atividade coordenada, cujo resultado almejado não pode ser atingido, estritamente, por meio da execução da organização prescrita, faz-se necessário o desenvolvimento de rearranjos criativos, de modificações concretas do preestabelecido, transformando-o no real do trabalho (DEJOURS, 1996; 1999; 2004).           

Para este autor é fato que o modelo predefinido do trabalho (prescrito) se choca com a necessária mobilização intelectiva do trabalhador. Nessa medida, trabalhar significa, essencialmente, aplicar certas alterações na organização do trabalho prevista, para se tornar executável. “A prescrição tem sempre que ser objeto de reajustamentos e mesmo de reinterpretações pelos trabalhadores, na situação de trabalho, para ser operacional” (DEJOURS, 1996, p. 165).           

O trabalho se define como sendo aquilo que é somado ao prescrito para obter os resultados designados; ou ainda aquilo que se atribui de si mesmo para superar o que não funciona quando se restringe à execução das prescrições (DEJOURS, 1996; 2004).            

Considerando as contradições entre trabalho prescrito e real, cabe salientar que os reflexos deste desacordo remetem ao sofrimento psíquico, cerne da relação entre homem e o trabalho (DEJOURS, 1996; 1999; 2004). No capítulo que segue, o sofrimento psíquico originado do trabalho é abordado com mais profundidade.           

2.2 Modelos de trabalho e suas implicações à psicodinâmica do trabalho

Segue uma breve explanação dos principais modelos de organização do trabalho e suas implicações ao sofrimento psíquico.- Artesanato: É um modelo de trabalho institucionalizado em grande integração com a vida social e familiar, de modo a haver indissociação entre produtividade laboral e as ações sócio-familiares (MALVEZZI, 2004). A divisão do trabalho é mínima e se dá através da transformação da matéria prima natural, fazendo-se uso de ferramentas rudimentares, requisitando­-se, portando, de força humana, sendo esta, diversa e móvel. O operário-artesão passa, praticamente, por todas as etapas de produção. A atividade é adaptada em prol das habilidades pessoais e ritmo do sujeito, por meio do planejamento e implementação espontâneos. O sofrimento criativo encontra, nesta ocasião, seu lugar e o trabalho caracteriza-se como equilibrante, pois favorece vias de descarga adaptadas às próprias necessidades. "O trabalho torna-se, então um meio de relaxamento; às vezes a tal ponto que uma vez a tarefa terminada, o trabalhador se sente melhor que antes de tê-la começado" (DEJOURS; ABDOUCHELI, 1994, p. 137).- Taylorismo/fordismo: Escola Clássica, nascida no final do século passado. A divisão do trabalho chega a sua maximização, sendo o trabalhador convertido num anexo à própria máquina. As linhas de montagem se instalam em favor da sequenciação e fragmentação operatória priorizando o controle e a otimização produtiva. Os incentivos trabalhistas voltam-se, tão somente, à questão financeira, pois se acredita que as pessoas trabalham apenas pelo dinheiro e a maneira de motivá-las é oferecer recompensações financeiras (SELIGMANN, 1986).           

Trata-se de um modelo de organização que tem como preocupação original, eliminar o desperdício e as perdas na produtividade a partir da aplicação de métodos e técnicas da engenharia industrial (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.). Tais métodos voltam-se à análise dos tempos e movimentos despendidos, para eliminar o desnecessário e substituí-los por ações rápidas e cronometradas, suprimindo quaisquer atos de iniciativa do trabalhador. Estes sistemas são capazes de bloquear por inteiro a psique do sujeito quando este trabalha (DEJOURS, 1987; 1994a; 1996; 1997; 2004).Taylor propôs radical separação entre concepção e execução, além da utilização do monopólio do conhecimento para controlar a produção, para tanto, atribuindo plenos poderes aos gerentes. Isto decorre numa hierarquia rígida, assentada pelo controle individual.Na sua obra, Taylor justifica sua teoria argumentando que o ser humano é indolente por natureza, de modo que, sempre procura produzir menos do que é capaz (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.).           

O modelo fordista ratifica a idéia do “saber fazer” propagado pelo taylorismo e incute no seu modo de produção o controle e a imposição das normas e máxima restrição da liberdade dos trabalhadores (NETO, 1993). A restrição entre os dois modelos se dá no que se refere ao controle do ritmo no taylorismo, a supervisão direta no fordismo, a cadência da máquina (LEITE, 1994), não obstante, ambos os modos de produção partiam do princípio da mecanização e do conteúdo vazio de trabalho.           

Borges e Yamamoto (op. cit.) observam que apesar de serem construtos paralelos, o taylorismo e fordismo possuem características similares, o que faz muitos teóricos considerarem o modelo como taylorismo-fordismo, dada a interdependência de seus princípios.As conseqüências da organização científica do trabalho configuram-se pelo tolhimento da atividade psíquica que, por sua vez, incita o desenvolvimento de uma doença psíquica, exigindo do trabalhador respostas defensivas e o reforço do próprio sistema (DEJOURS, 1994a; 1996; 1997; 1999; 2000; 2004).           

Diante da monotonia e esvaziamento existencial experimentados frente a um conteúdo de trabalho sem significado dentro do processo produtivo, os trabalhadores são levados ao impedimento da atividade espontânea e qualquer envolvimento emocional prazeroso com a atividade desempenhada. Há uma verdadeira expropriação da subjetividade, a qual impele a elevados níveis de tensão e alta freqüência de sintomas psicossomáticos (DEJOURS, 1987 1996; 1997; 1999; 2000; 2004).- A Escola das Relações Humanas: através dos estudos de Elton Mayo, foi destacada a relevância das relações interpessoais à produtividade (AGUIAR, 1981).            

Através dos estudos na Hawthorne Electric Company, percebeu-se a relevância das interelações informais e o poder destas sobre a satisfação no trabalho (DAVIES; SHACKLETON, 1977). Tais estudos concluíram que há influência das relações grupais sobre a produtividade. Surge o conceito de “homem social” no trabalho, que se volta às recompensações sociais no trabalho. Nessa perspectiva, a atividade produtiva deveria ser revista, no que se refere ao individualismo e isolamento propagados pelo taylorismo. Este pensamento levou a aplicação de técnicas participantes.           

A mais proeminente pesquisa de Hawthorne foi à investigação dos efeitos do nível de iluminação sobre a produtividade (SPECTOR, 2003). Neste estudo, atribuíam-se variações na intensidade da luz, para analisar as influências desta sobre o desempenho, porém com o tempo observou-se que a produtividade havia tido um crescimento em todos os grupos experimentais, independentemente, da intensidade da iluminação atribuída. Dessa forma, concluiu-se que o aumento de produtividade estava atrelado ao sentimento de prestígio em participar da pesquisa e não pela iluminação aplicada no ambiente de trabalho.          

Apesar da contribuição promovida, percebe-se que a Escola das Relações Humanas não trouxe avanços significativos às outras necessidades humanas, que interferem sobremaneira na satisfação do indivíduo no trabalho. Segundo esta teoria, as pessoas se motivam a trabalhar para conviver com seus semelhantes e em grupos sociais. O foco na produtividade a partir das satisfatórias relações sociais no trabalho configura-se numa visão míope sobre as reais demandas subjetivas do homem (DAVIES; SHACKLETON, 1977).           

Aguiar (1981, p. 2003) acrescenta que "ao enfatizar as relações informais, usa as forças grupais e as relações interpessoais como mecanismos de controle e de aumento de produtividade" Alguns autores consideram essa escola em um neo-taylorismo, tendo em vista que nega o conflito indivíduo – ­organização e prioriza a produtividade, retirando todo e qualquer poder de decisão do trabalhador. A exemplo do taylorismo/fordismo a Escola das Relações Humanas apresenta, portanto, os mesmos efeitos patogênicos à integridade psíquica do profissional. – Enriquecimento de Cargos: desenvolvido, fundamentalmente; dentre outros autores, por Maslow e Herzberg, os quais levantam a motivação como aspecto amiúde relevante à organização do trabalho. Baseia-se na ampliação do conteúdo da tarefa, seja esta ampliação horizontal ou vertical. Maslow elaborou a Teoria da Hierarquia das Necessidades, comparando-a a uma pirâmide que segue a seguinte ascendência: necessidades fisiológicas, de segurança, sociais, de estima e de auto-realização, declarando que no princípio taylorista só é possível a satisfação das necessidades fisiológicas e de segurança, também conhecidas como necessidades primárias, as demais seriam necessidades de cunho sofisticado e intelectualizado – necessidades secundárias (CHIAVENATO, 2000).Spector (2003) referindo-se a essa teoria, explica que a dinâmica das necessidades decorre de um ciclo de satisfação. Os níveis mais elevados de necessidade emergem quando os níveis mais baixos estão relativamente satisfeitos, até que estes sejam novamente necessários e assim sucessivamente. Chiavenato (2000, p. 86) ratificando essa teoria afirma que: As necessidades mais baixas requerem um ciclo motivacional rápido, enquanto que as necessidades mais elevadas requerem um ciclo bem mais longo: Contudo, a privação de uma necessidade mesmo baixa, faz com que as energias do indivíduo se desviem para a luta pela sua satisfação.             

Spector (op. cit.) acrescenta que as necessidades primárias exigem um ciclo motivacional mais rápido, em contrapartida, o ciclo motivacional das necessidades elevadas é bem mais longo. Herzberg desenvolveu a teoria da Motivação-Higiene e afirma que os fatores determinantes da satisfação profissional não condizem com os que levam a insatisfação profissional.Chiavenato (op. cit.) citando a teoria de Herzberg, declara que os fatores de higiene (condições de trabalho, salário, segurança no trabalho, relações de trabalho, práticas de supervisão e administração e política e administração da empresa) não estimulam a motivação, mas se tornam causa de insatisfação se não forem satisfatórios.Um ambiente de trabalho seguro e saudável por si só não irá motivar os funcionários a trabalharem melhor, porém os deixa satisfeitos o bastante para que os outros fatores possam satisfazê-los. Spector (op. cit) remetendo a teoria de Herzberg, conclui que os fatores que delimitam a satisfação são diferentes dos fatores da insatisfação. A ausência dos elementos satisfatórios não provoca a insatisfação, mas sim a falta de satisfação. Nessa mesma lógica, a ausência de insatisfação não corresponde à satisfação, mas sim a falta desta. A motivação está atrelada diretamente às atividades desempenhadas no cargo em si, neste caso, sentimentos de realização, reconhecimento e crescimento estão inteiramente envolvidos (CHIAVENATO, op. cit.)           

Os fatores motivacionais “correspondem a todas as variáveis que estão implicadas ao conteúdo, tendo como meta a promoção da satisfação do empregado” (CHIAVENATO, 2000, p. 88).            Chiavenato (op. cit.) acrescenta que a motivação parte, então, da ampliação ou enriquecimento das obrigações, desafios e objetivos do cargo. O trabalho deve ser enriquecido em certo grau de responsabilidade, o que favorece uma ampliação do campo de ação do trabalhador, tornando mais tênue a distinção entre trabalho manual e intelectual.           

Dejours (1996) argumenta que nos altos cargos hierárquicos a possibilidade de uma organização do trabalho mais flexível, amplia a satisfação e o prazer no trabalho, em contrapartida, os cargos hierarquicamente inferiores, dado o baixo poder de flexibilidade e decisão e o limitado uso pleno das habilidades pessoais, repercutem em sofrimento psíquico.            

Esse modelo, no entanto, semelhante ao taylorista primou pelo controle hierárquico e na formulação das atividades de acordo com os objetivos de cada cargo e não aos modos operatórios necessários à sua execução. 4.– Toyotismo/Volvismo: modelos de organização do trabalho alternativo a escola clássica, desenvolvida, respectivamente, pela Toyota (empresa japonesa) e pela Volvo (empresa sueca) ambas, prioritariamente, automobilísticas.

Caracterizam-se, sobretudo, pela substituição da linha de montagem tradicional por módulos de montagem paralelos, mecanização flexível, relações de trabalho cooperativas, gestão participativa e descentralizada, enriquecimento de tarefas, ritmo de trabalho independente do ciclo produtivo, trabalho em equipe autodirigida e autocontrole dos tempos e métodos de trabalho (ANTUNES, 2005).           

O toyotismo (ou ohnismo, de Ohno, autor do modelo na Toyota) e o volvismo buscaram a multifuncionalidade dos trabalhadores através da produção flexível, na qual cada operário manipula, em média, cinco máquinas, rompendo com o modelo fordista-taylorista, um homem/uma máquina (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.). A organização do trabalho é também flexibilizada por meio da formação de equipes cooperativas, responsáveis por um sistema de máquinas automatizadas (GOUNET, 1991 apud ANTUNES, op. cit.).           

No trabalho das equipes há pouca divisão de tarefas e versatilidade na produção, além da inexistência de postos de trabalho rígidos e participação nas decisões e nas inovações tecnológicas. O controle de qualidade é conduzido pela própria equipe. As conseqüências das falhas e acertos são sentidas por toda equipe, independentemente, de terem sido causadas por um único componente (ANTUNES, op. cit).           

Além do mais, em contrapartida a verticalização fordista, percebe-se nítida horizontalização, reduzindo a produção através da terceirização e subcontratação de serviços.           

No tocante aos aspectos macrossociais, há intensivo investimento em treinamento e formação educacional, longos contratos de trabalho e altos índices salariais (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.).           

Nestes modelos, o homem é percebido como complexo e autônomo. As demandas pessoais e as condições oferecidas pelo trabalho entram em consonância. Em vista disso, restitui, consideravelmente, a satisfação e motivação no trabalho, o que decorre em grande parte, da resposta às necessidades do indivíduo, com certo grau de autonomia; diversidade e desafio presentes no conteúdo da tarefa; conhecimento global a respeito da natureza do trabalho; possibilidade de desenvolvimento profissional, enfim, expectativas tangíveis de realização profissional (ANTUNES. op. cit.).Assim, há redução do sentimento de alienação do trabalhador e da incidência de danos ao seu psiquismo. Porém, é válido ressaltar, que esse sistema produtivo apresenta algumas características destoantes ä plena satisfação profissional, haja vista a primazia da inovação tecnológica em detrimento da sócio-organizacional além da exploração da força de trabalho, de modo que, um trabalhador termina absorvendo o papel de vários trabalhadores, o que resulta em acelerada redução do número de empregos (BORGES; YAMAMOTO, op. cit.).

2.3 As condições de trabalho de motoristas rodoviários de passageiros

O momento inaugural do setor de transporte no Brasil data de meados do século XX. Com a instalação de indústrias automobilísticas estrangeiras, o desenvolvimento da área atingiu grandes proporções, gerando maior número de empregos e rotas no país. Surge, então, a categoria dos motoristas rodoviários de carga e passageiros, profissão que se expandiu juntamente com as transformações econômicas e políticas da nação, cujo marco foi o advento de Brasília e o surgimento de linhas de transporte longas, dado o interesse da época de interligar as regiões nacionais (RODRIGUES [ca. 2003]).Os trabalhos de investigação no domínio dos transportes têm visado à análise de situações de trabalho, tendo como alvo os motoristas profissionais e o as condições de trabalho, nas quais, estão inseridos (NÉRI et al. [ca. 2000]). Este autor aventa que estudos voltados às condições de trabalho dos motoristas rodoviários têm revelado a presença de riscos à saúde física e mental destes profissionais. Os agravos, em parte, sucedem do próprio ambiente de trabalho, isto é, do veículo que conduzem.As pesquisas analisam aspectos como ruído, calor, ventilação, ergonomia e jornada de trabalho que somados a fatores exógenos (qualidade das estradas e hábitos comportamentais) complementam o contexto de trabalho de motoristas.Campana (1980) argumenta que os acidentes de trânsito, em grande parte, estão associados à precariedade dos fatores ambientais que afetam as condições psíquicas do motorista profissional.Quanto aos ruídos internos e externos ao veículo, Campana acrescenta que estes não provocam apenas prejuízos à acuidade auditiva, mas também são fatores que influenciam na instabilidade emocional dos profissionais das estradas.As condições ergonômicas, com freqüência, têm sido negligenciadas, no tocante às instalações dos veículos, o que termina por acometer a coluna vertebral dos motoristas (Néri et al. op. cit.). Segundo Mendes (1999 apud Néri et al. op. cit.) o esforço muscular do motorista é excedente, devido às centenas de vezes que a marcha é trocada a cada jornada de trabalho. Em estudo realizado por Kompier et al. (1990) citado por Néri et al. (op. cit.) a possibilidade de ser afetado por distúrbios músculo esqueléticos são 3,9 vezes maiores em motoristas profissionais comparando a outros servidores públicos.Néri et al. (op cit.) declara que a possibilidade de um motorista de transporte de passageiros adquirir doenças de coluna e costas é 5% maior quando comparadas a outros serviços.Nesse sentido a execução do trabalho fica comprometida e pode afetar a segurança de todos os presentes no veículo, os motoristas de outros veículos e pedestres próximos.           

Em trabalho executado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e o Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) (2001) observou-se que há uma tendência do motorista transferir para condução do veículo o desconforto e sacrifícios sentidos na realização de seu trabalho, tornando a direção do veículo mais arriscada no tocante a acidentes.Outro fato que se deve atentar é o tempo de direção demasiado, que por vez, não respeita o período de repouso e os intervalos necessários a cada jornada de trabalho (RODRIGUES op. cit.). Até o presente, não há normas referentes à duração máxima de viagem e às horas de descanso do motorista de ônibus rodoviário. Em trâmite, há um projeto de lei nº 32 de 2001 que se opõe à direção de mais de 4 horas sem intervalo, devendo descansar contínua ou descontinuamente no mínimo de 30 minutos ao longo das quatro horas dirigidas, no entanto, podendo prolongar por 1 hora, caso seja no intuito de atingir um ponto de parada adequado. Após cada viagem, o motorista fica obrigado a cumprir, no mínimo, 10 horas de descanso (RODRIGUES op cit.).Na ausência de legislação específica, algumas empresas, avessas as necessidades físicas e psíquicas de seus motoristas, impõem um ritmo de trabalho fatigante (RODRIGUES op cit.).Este autor cita o senso demográfico (1980) e uma pesquisa realizada pela PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (1990), que revelam o percentual de motoristas rodoviários, cuja carga horária ultrapassa 49 horas semanais, sendo uma das maiores, quando, comparadas aos demais ramos de atividade. A privação de sono redunda em um estado de fadiga, conseqüente de trabalhos em horários irregulares e tempo ao volante excessivo. A sensação de cansaço ou perda de energia, além de comprometer o desempenho profissional (atenção, coordenação motora, rapidez de reação e ritmo mental) tem acarretado prejuízos à saúde física e mental dos profissionais, estresse, ansiedade, depressão, irritabilidade, agressividade, distúrbios neurais, dificuldades sexuais, hipertensão, problemas gástricos e cardíacos, cefaléias, dentre outros (FLOREZ – LOZANO, 1980 apud MELLO et al. [ca. 2001]).

Mello (op. cit.) cita uma pesquisa que realizou em 2000 com motoristas de ônibus rodoviários de 20 empresas e constataram que 16% da amostra assumiram ter cochilado enquanto estavam dirigindo, 55% confirmaram que conheciam um colega de trabalho que havia cochilado ao volante. O estudo também apontou número significativo de relatos quanto à dificuldade de dormir e insônia.As pesquisas levaram estes autores à dedução de que o tempo de repouso, entre as jornadas de trabalho, deve superar 24 horas (Mello, op cit.). De acordo com Santion (2006) tramita na Câmara Federal, um projeto de lei 6.609/06 que propõe a obrigação do exame de polissonografia, popularmente, conhecido como teste do sono, ao tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), renová-la ou mudar de categoria. O exame busca diagnosticar problemas associados ao sono através do monitoramento de condições fisiológicas do sujeito. O projeto ressalta que caso seja detectado algum distúrbio do sono, a CNH teria uma validade reduzida, devendo retornar para reavaliação. A obrigatoriedade do exame estaria implicada às categorias C e D, que concede licença para o transporte de cargas com mais de 3,5 toneladas e o transporte de passageiros em veículos com mais de 8 lugares, respectivamente. O projeto apresenta como justificativa, a necessidade de avaliar com mais rigor, os condutores de veículos de maior porte, dada a exigência de maior eficiência e responsabilidade, além de repercussões mais danosas, em casos de acidente.Outro aspecto significativo a considerar é a elevada rotatividade da categoria de motoristas. Mendes (1997 apud Néri op. cit.) aponta o aspecto desgastante peculiar à profissão como uma das principais razões do turnover. Hedberg & Langedoen (1993 apud Néri op. cit.) indicam a irregularidade nas horas de trabalho e a excessiva jornada como motivos que corroboram para o pouco tempo de permanência nas empresas.Conforme Rodrigues (op. cit.) o setor de transporte no Brasil perfaz um cenário de problemáticas que ocasionam o desgaste físico e mental do motorista.

As políticas públicas voltadas a este campo de atividade são incipientes e restritas ao código de trânsito que se atêm apenas ao cumprimento das normas de direção, não contemplam às peculiares condições dos profissionais da área. Desse modo, faz-se necessária à implantação de ações que promovam menor dimensão dos potenciais problemas experienciados pela categoria.          

3. Modelo teórico da psicodinâmica do trabalho: contribuições de Christopher Dejours

3.1 Introdução histórica da psicodinâmica do trabalho                       

A necessidade de estudar mais profundamente a relação sofrimento psíquico-trabalho tem sua origem no começo do século XX, dada a ascensão do modelo taylorista desenvolvido e direcionado à racionalização do trabalho. Este modelo tem como princípios básicos à padronização de tarefas, acintosa distinção entre concepção e execução e o rígido controle hierárquico em prol da maximização da produtividade (DEJOURS, 1996).           

As repercussões destes princípios foram graves danos físicos e mentais aos trabalhadores, em resposta às prolongadas jornadas de trabalho, ritmo acelerado e carência de subjetivação na execução das tarefas. A acentuada divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual favoreceu a neutralização da atividade mental dos trabalhadores gerando sofrimento psíquico (DEJOURS, 1996).           

Dejours (1996) aponta a escola da psicopatologia do trabalho, desenvolvida desde o início da década de cinqüenta como a escola que surge para romper com a concepção taylorista da organização do trabalho, buscando compreender que tal modelo desencadeia problemas físicos e mentais no trabalhador.           

A Psicopatologia emergiu na França, tendo como principais pesquisadores Lê Guillant, Veil, Sivadon, Fernadez – Zoila e Bergoin. Através de entrevistas individuais, os estudos desses pesquisadores visavam à investigação das adversidades do trabalho, partindo do pressuposto que tais adversidades propiciavam o surgimento de distúrbios psicopatológicos.           

Esta corrente desenvolvida ao longo dos anos passou por inúmeras redefinições de conceitos até tornar-se um modelo teórico metodológico.           

Os primeiros estudos favoreceram a determinação e descrição de síndromes intimamente coligadas às situações de trabalho: "neurose das telefonistas", "neurose das mecanógrafas", "psicopatologia das empregadas-para-todo-serviço" (LE GUILLANT, 1963 apud DEJOURS, 1996, p. 151), bem como, um trabalho sobre a “psicopatologia dos mecânicos de estradas de ferro” (MOSCOWITZ, 1971 apud DEJOURS, 1996, p. 151). No entanto, a metodologia e o referencial teórico utilizados por tais estudos priorizam a psicofisiologia pavloviana direcionada e restrita, sobretudo, ao trabalho repetitivo sob pressão de tempo. O enfoque médico-psicológico como a patologia profissional e a medicina do trabalho, na seqüência, buscaram a descrição das doenças mentais na psicopatologia do trabalho, cujas interrogações, voltaram-se ao patenteamento de doenças ligadas ao trabalho. Não obstante, nesta época, havia muitas pressões normativas presentes nas organizações, cujo propósito era escamotear todos aqueles que sofressem de sintomas mentais ou distúrbios de comportamento, de modo que, a maior parcela dos trabalhadores deveriam se adequar ao patamar da normalidade. Dessa forma, não era possível dar conta de mecanismos, propriamente psíquicos e, portanto, da doença mental decorrente do trabalho. De fato, não é por acaso que a teoria neuroendócrina do stress torna-se tão em voga nessa época, uma vez que “[…] está mais bem posicionada para penetrar num domínio, no qual o psiquismo dos trabalhadores não é da normalidade" (DEJOURS, 1996, p. 152), e os critérios de avaliação em questão são de ordem somática e biológica.           

Nesse sentido, tornou-se viável transformar, epistemologicamente, a psicopatologia do trabalho, a partir do reconhecimento da normalidade dos trabalhadores no contexto do trabalho, de maneira que sua investigação se conduziu não mais em direção às doenças mentais, mas ao estratagema psíquico utilizado pelos trabalhadores em defesa à própria conjuntura do trabalho. Nessa medida, o termo tratado mais condizente com essa proposta passou a ser psicodinâmica do trabalho. “A normalidade aparece então, como um equilíbrio precário (equilíbrio psíquico) entre constrangimentos do trabalho desestabilizantes ou patogênicos, e defesas psíquicas" (DEJOURS, 1996, p. 153). Foi postulado então, que o equilíbrio, isto é, a normalidade, de longe pode ser denominada como natural, seria, na realidade, vestígio no combate à doença mental. Luta esta, portanto, a custo de muito sofrimento.            

Além do mais, percebeu-se que os sintomas da doença mental tinham, em grande parte, origem na história singular e pessoal de cada indivíduo e não na situação de trabalho em si, daí, mais um motivo para dedicar às pesquisas aos mecanismos psíquicos utilizados do que nas doenças propriamente ditas.Nessa perspectiva, a partir do fim dos anos setenta, a indagação clínica em Psicodinâmica do Trabalho, baseada em conceitos psicanalíticos, na psicossomática relacionados às condições de trabalho passou a se concentrar nos procedimentos subjacentes à normalidade sofredora, salientando, a organização do trabalho (divisão de tarefas e relações de produção) para adentrar no campo trabalho-sofrimento mental, em contrapartida, às situações de trabalho, ou melhor, ao seu conteúdo ergonômico (pressões físicas, químicas, biológicas e mesmo psicossensoriais e cognitivas), as quais vêem no corpo seu alvo primordial, sendo sua proposta de intervenção metodológica, a pesquisa ação. Nessa medida, a psicodinâmica (termo que pertence a Psicanálise) do trabalho torna-se a pedra angular da teoria dejouriana, a qual designa a dinâmica psíquica no tocante à etiologia e transformações do sofrimento mental, articulado à organização do trabalho. Dejours volta-se à subjetividade inerente ao elo entre sofrimento mental e trabalho, centralizando sua análise nessa problemática.

3.2 Prazer e sofrimento no trabalho

Pensando na saúde do trabalhador, especialistas tentam a todo custo, banir o sofrimento do trabalho, no entanto, eles não compreendem que sofrer corresponde a um estado indelével da condição humana, à medida que sempre toma outras formas, tão logo é excluído. Por outro lado, o sofrimento é a base que confere sentido à vivência do sujeito, trazendo-lhe reconhecimento e identificação por meio da criatividade – intermediária principal da livre organização do trabalho, a qual promove a sublimação do próprio sofrimento articulando aspectos que dizem respeito à história singular com aspectos relativos à situação atual, o contexto preexistente de cada trabalhador com a presente organização do trabalho que ele enfrenta (DEJOURS, 1996). São trespassadas as dimensões temporal e espacial. Os limites do contexto interno organizacional são excedidos aos fatores sócio-históricos que compõem a vida do sujeito. Por organização do trabalho, entende-se como a divisão do trabalho, o conteúdo da tarefa, o sistema hierárquico e relações de poder, as modalidades de comando e responsabilidades (DEJOURS, 1987; 1994a; 1996; 1997). O sofrimento criativo torna-se patente quando diante do contexto coletivo, cada um põe, mediante a organização do trabalho, o que existe de mais único em seu comportamento, adquirindo identidade própria, que se torne reconhecida pelos outros. É justamente, por isso, que buscamos, normalmente, situações de trabalho desafiadoras, a fim de gerir nosso próprio sofrimento em proveito da nossa integridade psíquica (DEJOURS, 1994; 1996).Este autor denomina de ressonância simbólica a sintonia entre as necessidades subjetivas do sujeito, construídas ao longo de sua história, e a situação de trabalho onde se insere. "A ressonância simbólica aparece então como a condição necessária para a articulação bem-sucedida da dicotomia singular com a sincronia coletiva" (DEJOURS, 1996, p. 157).Em contrapartida, quando a organização do trabalho, por sua natureza rigidamente definida, impede a adaptação entre a personalidade, os desejos e motivações do indivíduo e o modo operatório instituído, o sofrimento de criativo passa a patogênico, uma vez que os trabalhadores são desapropriados de sua liberdade inventiva, de modo que, o processo sublimatório perde seu espaço tornando-se inexeqüível, obrigando-os, então, a lutar contra sua própria atividade psíquica espontânea e gerando a necessidade de estratégias defensivas particulares ou mesmo coletivas que busquem de toda forma paralisar o pensamento imaginativo.Assim, o sofrimento patogênico surge quando não é possível negociar as demandas internas do sujeito com a organização do trabalho (DEJOURS; ABDOUCHELI, 1994; DEJOURS, 1996; 1997; 2000; 2004).

O autor explica que o sofrimento torna maior à medida que haja discrepância entre o trabalho prescrito e o trabalho real.Por trabalho prescrito compreende-se o modo operatório preestabelecido, o qual, de acordo com Dejours jamais pode ser realizado rigorosamente segundo sua prescrição, necessitando de rearranjos para se tornar exeqüível.O trabalho real seria aquele que apresenta uma parte de revés sobre o prescrito de modo a reajustar seus objetivos e técnica. O êxito no trabalho para Dejours (1996; 1999; 2004) estaria associado a não observância estrita dos procedimentos.Dejours (2004, p. 3) anuncia que trabalhar é preencher a lacuna entre o prescrito e o real. Ora, o que é preciso fazer para preencher esta lacuna não tem como ser previsto antecipadamente. O caminho a ser percorrido entre o prescrito e o real deve ser a cada momento, inventado ou descoberto pelo sujeito que trabalha.                  

A intolerância organizacional no tocante ao trabalho real gera maior sofrimento aos trabalhadores (DEJOURS, 1999), uma vez que estes se sentem impotentes ao ter que seguir escrupulosamente, o trabalho prescrito.     

Para se defender do sofrimento resultante de uma organização do trabalho rígida, o ritmo do trabalho é não só acelerado, exacerbadamente, no ambiente profissional, mas também mantido fora deste, de maneira que o ofício abranja sua vida por inteiro, preenchendo e saturando seu campo de consciência com uma sobrecarga sensório-motora e, conseqüentemente, com fadiga capaz de deixar o funcionamento psíquico inerte. Com efeito, nos momentos que poderiam ser dedicados ao lazer ou à vida familiar, o sujeito impõe a si mesmo a manutenção de tal repressão psíquica, logo, evitando a necessidade de reconstituí-la, ao passo que, o serviço é retomado. Sendo assim, instala-se um verdadeiro estado de embotamento mental, que repercute não apenas na própria existência do operário, mas também, nas pessoas que lhes são próximas. Portanto, ao que tudo indica, o sofrimento é a fonte de exploração organizacional, à medida que os mecanismos de defesa decorrentes conduzem à maximização da força de trabalho, com vistas ao aumento contínuo da produtividade, nesse caso, suprimindo seu livre-arbítrio pela subjugação do empregador. O que é explorado não é o sofrimento, em si mesmo, mas, sobretudo as estratégias defensivas utilizadas em oposição a esse sofrimento (DEJOURS, 1996; 2004). Diante desse quadro, nas pesquisas em Psicodinâmica do Trabalho, veio à tona a associação entre as tarefas anti-sublimatórias [1] e à eclosão de uma doença.Caso haja incompatibilidade entre o conteúdo da tarefa e seus desejos inconscientes, a energia pulsional [2] não será sublimada, obrigando o trabalhador a utilizar mecanismos de defesas psicológicos individuais ou coletivos para manter seu equilíbrio psíquico e evitar descompensações psicopatológicas ou psicossomáticas (DEJOURS, 1994a).

Na inacessibilidade das alterações necessárias à expressão da autenticidade no trabalho resulta em processo de sofrimento freqüente que culmina em uma doença física ou psíquica (DEJOURS, 1994a; 1996; 1997; 1999; 2000; 2004).O trabalho é, portanto, considerado por Dejours (1994a) "lócus" de descarga da energia psíquica, que através de um trabalho que privilegie as demandas mentais idiossincráticas, encontra via de canalização.Por sua vez, quando resulta em bloqueio ou acúmulo de energia psíquica, pela inexecutabilidade das gratificações intrínsecas do trabalhador, torna-se fonte de tensão e sofrimento.Em termos de economia psíquica, dispomos de três vias de descarga da energia proveniente, tanto das excitações exteriores ou psicossensoriais como, das interiores ou pulsionais: vias visceral, motora e mental (DEJOURS, 1994a).O autor explica que o desenvolvimento da personalidade confere uma escala hierárquica a essas três instâncias: a via visceral é, progressivamente, suplantada pela via motora e esta, por sua vez, pela via psíquica, a qual corresponde ao nível mais elevado.  Conforme a flexibilidade dos mecanismos de defesa e o grau de evolução da personalidade, distinguem-se, em clínica, os que se servem das vias psicomotoras e viscerais (são as neuroses de caráter e de comportamento) e os que se servem, principalmente, da via mental (as psicoses e neuroses clássicas) (MARTY, 1976 apud DEJOURS, 1994, p. 23). Dessa forma, para o sujeito neurótico sua necessidade pulsional solicita um trabalho em que a atividade possa facilitar a canalização dos seus desejos. Já para o artista a demanda é de criação. Para o neurótico de comportamento o empenho é psicomotor além de um exercício prazeroso é absolutamente imprescindível.            

O conteúdo ergonômico do trabalho (gestos, postura, exigências químicas e físicas que buscam no corpo sua máxima economia em situação de trabalho) deve, impreterivelmente, levar em conta as necessidades da personalidade.  A insatisfação proveniente de um conteúdo ergonômico inadaptado à estrutura da personalidade não é outra coisa do que uma carga de trabalho psíquica. Esta carga de trabalho não é idêntica à carga de trabalho física ou psicossensoromotora. Os efeitos desta carga e o sofrimento estão no registro mental (DEJOURS, 1994a, p. 61). Nesta relação, tomam parte três componentes: a pressão física e psicomotora, a de caráter psicossensorial, assim como a intelectual; o desenvolvimento ou não da carga de trabalho depende das aptidões do indivíduo. Se há predileção pela inteligência lógica nada mais salutar do que uma atividade laboral que o contemple, o mesmo ocorre com os demais tipos de inteligências. (DEJOURS, 1994a).           

Dejours salienta na manifestação da psicopatologia, três fatores que a compõem: a fadiga, o sistema frustração/agressividade reativa e a organização do trabalho, os quais, etiologicamente, correspondem ao bloqueio dos esforços do trabalhador à adequação do modo operatório, às necessidades de sua estrutura mental. Em termos econômicos, isto significa que a sobrecarga mental resultante da privação de uma canalização apropriada da energia pulsional, cujas vias de descarga são inexoráveis à história peculiar do sujeito, que se concretiza e se integram através de seus desejos, motivações, preferências, enfim a sua estrutura psíquica e o modo, pelo qual, ele visualiza e busca agir em seu meio. Neste caso, haverá uma descompensação neurótica para estruturas neuróticas, o mesmo sucedendo com as demais estruturas (DEJOURS, 1997).            A doença somática surge da falta de uma elaboração psíquica que desencadeia no organismo, desajustes endócrino-metabólicos. A ciência psicossomática possui uma visão holística e monista do ser humano. “Não se quer dizer que o distúrbio psíquico preceda, no tempo, o distúrbio somático: as seqüências somatopsíquicas se estudam ao mesmo nível" (DONGIER, 1971, p. 241).           

É o monismo de duplo aspecto que visualiza o homem numa perspectiva holística e unitária, em contraposição ao dualismo cartesiano que enfoca a gênese psicológica da doença em primeira instância, causadora, por conseguinte, da enfermidade física.           

As doenças somáticas surgem naqueles indivíduos que possuem uma pobre canalização das defesas psíquicas (DEJOURS, 1997).           

Trata-se de neurose de caráter ou de comportamento. Quando as defesas psíquicas não conseguem dissipar os conflitos suscitados, sem que ocorra uma descompensação neurótica ou psicótica, surge a doença somática.           

Há na verdade, uma verdadeira resistência à doença somática, quando se tratar de uma estrutura neurótica e psicótica, de modo que, os portadores de doença somática grave estão preservados das neuroses e psicoses (DEJOURS, 1997).Contudo, é preciso esclarecer que a exploração do sofrimento através da organização da produção, de jeito algum, poderia gerar doenças mentais específicas. As patologias mentais estão atreladas à formação da personalidade do sujeito. "As descompensações psicóticas e neuróticas dependem, em última instância, da estrutura das personalidades, adquiridas, muito antes, do engajamento na produção" (DEJOURS, 1997, p. 122). A possibilidade, neste caso, é do patenteamento de uma descompensação, a partir de uma potencialidade estrutural preexistente. Além do mais, a sobrecarga de energia psíquica é antes de tudo, fonte de tensão e desprazer, tendo essa vivência subjetiva como expressão específica, a fadiga, de forma que, durante esse estado, não há espaço para a instalação de uma patologia. De fato, a sensação fatigante consiste em seu prelúdio, salientando, ainda, que não se trata, necessariamente, de um resultado de esforço físico excessivo, mas da dissonância entre a organização do trabalho e a descarga da energia pulsional, isto é, o exercício da atividade espontânea. Nessa perspectiva, a fadiga pode ser suscitada pelo ócio que seria uma coibição da atividade espontânea (DEJOURS, 1997).            Assim, o operário dispõe de uma tendência natural para modificar, voluntariamente, o modo operatório, aperfeiçoando-o, de acordo, com suas aspirações e competências. A observação mostra que os diferentes modos de empreender a tarefa trazem um conteúdo próprio da personalidade de quem o exerce (DEJOURS, 1994a; 1996; 1997; 2004).Pode-se deduzir, então que a posição na hierarquia sócio-profissional é diretamente proporcional à economia psicossomática pessoal, uma vez que, quanto mais baixo o nível social no organograma organizacional, mais subjugação existirá na execução do trabalho. O contrário proporciona mais autonomia na realização do trabalho (DEJOURS, 1994a).Nesse sentido, a livre organização do trabalho é imprescindível não só para a satisfação, mas para o equilíbrio psicológico (DEJOURS, 1994a; 1996; 1997; 2004).Dejours (2004) acrescenta que com o advento do neoliberalismo houve um agravamento e o surgimento de novas patologias mentais resultantes do trabalho. Os suicídios, a violência e as patologias do assédio no ambiente de trabalho são apontados como conseqüências das transformações experimentadas no mundo do trabalho após a virada neoliberal.Em contrapartida, Dejours revela que o trabalho possui um aspecto mais favorável, anunciando que apesar dos resultados funestos da evolução contemporânea da organização do trabalho, esta ainda pode ser fonte de prazer. Apenas depende de uma renovação conceitual que contemple adequadamente as relações entre subjetividade, trabalho e ação.Como condição necessária à existência de prazer no trabalho, o autor sugere o desenvolvimento de uma gestão que contemple à realização profissional, que proporcione o pleno emprego das habilidades e aptidões pessoais e que se caracterize pela flexibilidade.

3.2.1 Estratégias defensivas e sofrimento no trabalho            

Com o objetivo de lidar com o conflito psíquico resultante da incoerência entre a subjetividade do trabalhador e a realidade da organização do trabalho, o trabalhador faz uso de estratégias defensivas (DEJOURS, 1996; 1997; 1999; 2000).           

Dejours defende que as defesas são processos, estritamente mentais utilizados pelo trabalhador em busca de modificar, ou mesmo, minimizar sua percepção da realidade de trabalho que o faz sofrer.            

As defesas podem ser individuais ou coletivas. As defesas individuais ocorrem no âmbito interno e singular, enquanto, que as estratégias coletivas dependem da presença de condições externas, consensualmente amparadas por um grupo específico de trabalhadores.           

Estas defesas estão sujeitas à concordância tácita de todos os membros do grupo, é preciso que estes busquem a contínua manutenção das defesas para que não seja rompido o pseudoequilíbrio decorrente (DEJOURS, 1997).            

Dessa forma, aquele que não presta colaboração e compartilha com a ideologia de defesa sofre rechaço e exclusão do grupo.           

Nesse sentido, as defesas coletivas permitem aos trabalhadores maior resguardo na luta contra o sofrimento, se comparadas às situações que são utilizadas apenas defesas individuais.            Manifestados coletivamente, os mecanismos de defesa têm o intuito de lidar com diferentes tipos de sofrimento. Variam de acordo com a organização do trabalho, pondo em evidência a sutileza, criatividade variedade e inventividade.           

Dejours (1997; 1999) adiciona que as defesas podem tornar-se um fim em si mesmas, na intenção de superar as pressões psicológicas do trabalho. Nessa medida, as estratégias defensivas corroboram para um processo de alienação, tolhindo qualquer tentativa de modificação do contexto vigente.           

A alienação favorece que o sofrimento não seja associado à situação de trabalho, sendo percebido como enfraquecimento das defesas (DEJOURS, 1999).A ideologia defensiva surge quando a estratégia de defesa tornar-se programa de ação coletiva. Tem lugar na construção de um imaginário social, no qual a estrutura opõe-se à elaboração do sofrimento. Cria-se uma ordem simbólica, promovendo processo de alienação da realidade. (Dejours, 1999, p. 131).             

Dejours (1996) cita a repressão pulsional, como uma defesa que inibe o surgimento de doenças mentais, suscitando apenas doenças somáticas em resposta às pressões organizacionais.            Em pesquisa realizada com operários da construção civil, Dejours (1997) descreve o uso da negação como mecanismo utilizado para ignorar os riscos de acidentes peculiares à profissão. Os trabalhadores adotam atitudes viris, se abstendo ao uso dos equipamentos de segurança, negando assim, a existência dos potenciais perigos oferecidos por este setor de trabalho, no intento de controlar

 o próprio sentimento de medo, na maioria das vezes, rejeitado pelo coletivo de trabalho.            Dejours e Jayet (1994) revelaram em pesquisa desenvolvida com trabalhadores de uma central nuclear que comportamentos defensivos como o isolamento, a desconfiança e a desunião entre equipes de trabalho são os comumente utilizados, mediante a organização do trabalho, ao qual estão submetidos.           

Em outro estudo, Dejours (2000) propõe que os mecanismos de defesa mais utilizados pelos trabalhadores, de maneira geral, são o individualismo e a negação do sofrimento de si e o dos colegas de profissão. O individualismo surge na associação do sofrimento às atitudes dos colegas de trabalho. Para não associar o sofrimento à organização do trabalho, cria-se um clima de desestruturação das relações psicoafetivas no ambiente de trabalho, tendo este clima como pretexto para a causa do sofrimento, de modo a tratar as dificuldades da situação de trabalho como derivadas dos conflitos interpessoais.           

Trata-se de um processo de alienação, em que, anula-se a responsabilidade do conteúdo do trabalho em si, no tocante ao desenvolvimento do sofrimento.             Dejours coloca que o individualismo é a estratégia da apatia. Acontece em função da negação do sofrimento alheio e acompanha a sensação de inutilidade, da perda da identidade e do sentido do trabalho.            Dejours retorna a citar a negação que, por sua vez, é utilizada quando o trabalhador não encontra alternativas para lidar com o sofrimento ou quando este é percebido de forma constrangedora.          

O autor ainda interpõe que as estratégias defensivas não restringem ao espaço de trabalho, mas podem se estender à vida privada do sujeito, repercutindo no funcionamento psíquico da família.           

Neste mesmo estudo, o autor assinala ainda duas novas modalidades de estratégias defensivas: a racionalização e a distorção comunicacional. A racionalização remete à situação de atribuir motivos lógicos aceitáveis para situações inadmissíveis. No contexto do trabalho esta defesa é empregada, em função, de ações incompatíveis à ética profissional, isto é, em casos de atos de injustiça ou que provoquem sofrimento ao outro.           

A distorção comunicacional é identificada como uma estratégia defensiva baseada na negação do real do trabalho. Implica em excessiva valorização da concepção e no gerenciamento. A ausência de êxito no trabalho é interpretada como conseqüência da incompetência, falta de preparo, de seriedade, indolência ou incapacidade humana. Trata-se de um discurso amparado no desempenho assertivo, na produtividade e na eufemização do sofrimento e injustiças que os trabalhadores sofrem no trabalho. 3.3 Aspectos ansiogênicos no espaço de trabalho                       
Em “A loucura do trabalho”, no capítulo “Trabalho e medo”, Dejours (1997) acrescenta que o medo e a ansiedade são inerentes ao trabalho, mesmo naquelas profissões que não oferecem riscos aparentes à integridade física, a exemplo das linhas de montagem e trabalho de escritório, nos quais o medo se configura em resposta às pressões e jogos políticos proporcionados pelas próprias organizações, em busca de gerar desunião e senso competitivo nos trabalhadores. Ademais, ainda há as mudanças estruto-funcionais, impostas de acordo com as demandas empresariais, que ameaçam a estabilidade no emprego, bem como, aniquilam a autonomia do trabalhador. Dejours (1997) analisa a ansiedade e seu aspecto impactante no local de trabalho: a ansiedade decorrente da desestruturação do relacionamento psico-­afetivo espontâneo, bem como, da discriminação e desconfiança advindas da relação com a hierarquia e suas implicações agressivas. Tudo leva a crer, que a distância entre o trabalho prescrito e o trabalho real leva os operários a fazerem uso de certas táticas "para preencher e ultrapassar, as incoerências, as inconveniências, as insuficiências e as impossibilidades práticas da organização prescrita do trabalho" (DEJOURS, 1997, p. 52). O estilo de trabalho é rearranjado no intuito de transgredir os regulamentos prescritos da empresa para criar uma organização real que funcione. ''No plano subjetivo, a prática do quebra-galho pode ser, a acreditar nos trabalhadores, uma fonte essencial de interesse no trabalho. Mobilizando a inteligência astuciosa e a esperteza” (DEJOURS, 1994b, p. 52). Para tanto, faz-se necessário, o reconhecimento e a cooperação, mesmo que, silenciosamente, entre os operadores e os executivos. Porém, na prática, acontece o oposto, esse contexto faz nascer um clima de desconfiança, de modo que, cada um refugia-se no individualismo para assegurar-se no emprego (DEJOURS, 1997).

Tal contexto faz nascer um clima de desconfiança – as ideologias defensivas, a priori, contrapostas ao sofrimento gerado pela organização do trabalho se voltam aos outros trabalhadores.Trata-se do auge da alienação, em que os trabalhadores ficam uns contra os outros, transferindo seu sofrimento à outra fonte que nada tem a ver com a verdadeira nosologia do problema. O problema se instala e a válvula de escape é o próprio companheiro de trabalho, quem na verdade é mais uma vítima do sistema.Os executivos intermediários situados hierarquicamente entre a chefia e os agentes operacionais, frente aos reajustes da organização prescrita se vêem num fogo cruzado: de um lado o sistema perverso que aniquila a atividade espontânea e destoa o trabalho prescrito do real, do outro, o trabalhador que sofre e que demanda empatia e flexibilidade (DEJOURS; JAYET, 1994). O executivo tomado por esse conflito é colocado numa situação denominada por Dejours e Jayet como “psicologia espontânea do executivo”.De acordo com Dejours (1996), no desfecho dessas questões, o ideal seria abrir um espaço de palavra (espaço público de voz e decisão) no interior das organizações, em todos os seus setores, de modo que, a organização do trabalho possa ser questionada e o trabalho real torne-se, de fato, inteligível e transparente, que faça com que, a partir de uma administração participativa, o sofrimento criativo resultante das transgressões do trabalho prescrito, seja oportunamente, instrumento de aperfeiçoamento do trabalho, assim como, haja a quebra do individualismo, criando um verdadeiro clima de confiança e cooperação, de modo que, tanto na base como na chefia seja reconhecida no colega de trabalho à figura de um companheiro.Na seqüência, Dejours (1997) descreve a ansiedade como produto da desorganização do funcionamento mental, por meio do tolhimento psíquico, conseqüente da luta pela manutenção do condicionamento à organização do trabalho. Os fantasmas, a imaginação e o sofrimento criativo chegam a entrar em concorrência com a injunção de executar um modo operatório prescrito e rigidamente definido. A ponto de os trabalhadores chegarem a lutar contra sua própria atividade de pensar espontânea, porque essa última tende

O trabalhador é logo obrigado a lutar contra as emergências de seu pensamento e de sua atividade fantasmática (DEJOURS, 1996, p. 162). Um terceiro tipo seria a ansiedade proveniente do aviltamento orgânico, que corresponde, as más condições de trabalho, as quais colocam o corpo em situação de perigo, seja este em caráter súbito e de grande gravidade (intoxicação, mutilação, morte etc.) ou de ordem profissional, que repercute em morbidez e psicossomatização. Entretanto, vale esclarecer que o "medo está presente em todos os tipos de ocupações profissionais, inclusive nas tarefas repetitivas e nos trabalhos de escritório, onde parece ocupar um papel modesto" (DEJOURS, 1997, p. 63).Exemplificado pela construção civil, a vivência ansiosa permanece recôndita e é a todo instante negada pelos mecanismos de defesa.Os trabalhadores não conseguiriam dar conta das tarefas se a ansiedade perante os riscos não fosse neutralizada, logo, a ideologia defensiva, ou seja, a total coletividade no sistema defensivo é imprescindível. Ademais, muitos apelam ao consumo do álcool e/ou medicamentos psicotrópicos, cujo papel psicológico é justamente facilitar o enfrentamento das condições de trabalho. Tal hábito é na verdade, uma defesa tradicional na vida dos trabalhadores (DEJOURS, 1997).

Contudo, deve-se lembrar que "no caso do trabalho parcelado e repetitivo, no qual há pouca comunicação entre os trabalhadores e onde a organização do trabalho é muito rígida, há pouco esforço para a elaboração de ideologias defensivas" (DEJOURS, 1997, p. 73).Em contrapartida, remetendo aos pilotos de caça, Dejours (1997), em certa medida, contrapõe sua própria teoria, pois estes profissionais que enfrentam situações de riscos constantes, tangíveis inclusive à própria vida, não sofrem as repercussões ansiogênicas dos trabalhadores da construção civil, já comentado. Dejours argumenta que a organização do trabalho, a qual estão submetidos é constituída por conteúdos que trazem significado às necessidades egóicas destes profissionais, dado o nível de qualificação profissional, permanentemente auferido que lhes confere elevado respeito dentro das forças armadas, além da autonomia nas execuções das tarefas, cujos lados manual e intelectual trabalham em perfeita harmonia. O processo seletivo acintosamente rigoroso, que permanece durante toda a carreira, cria-se um autoconceito necessário e de sobrevalorização que conseguem ultrapassar qualquer condição insalubre que a profissão ofereça.Por fim, a ansiedade gerada pela "disciplina da fome": apesar do sofrimento mental que não pode mais ser ignorado, os trabalhadores são obrigados a permanecer expostos às ameaças à saúde mental contidas no trabalho, pois sobre ele há uma impreterível exigência: sobreviver (DEJOURS, 2000 apud CICCACIO; FERREIRA, 2000) Dejours afirma que em meio à crescente ampliação da insegurança do trabalho, o fenômeno ansiogênico agrava-se ainda mais, apontando para uma maior desordem no mundo do trabalho, a qual se dá em diferentes níveis: insegurança no mercado de trabalho, no cargo, no rendimento financeiro, na contratação e naquilo que o trabalho representa. As modificações tecnológicas do trabalho acirram a competitividade e restringem o acesso ao emprego.

DEJOURS (1999) declara que se desemprega, terceiriza-se, paga-se duas vezes menos, e tudo bem. Essas mudanças engendram uma nova forma de sofrimento, chamada de sofrimento ético. Ratificando essa argumentação de Dejours, Harvey (1992) e Antunes (2005) discorrem que tais transformações caracterizam-se pelo surgimento de novos setores de trabalho, novos mercados e nova ótica na prestação de serviços, cujo cerne seria a tecnologia, desencadeando também, alto nível de desemprego, dinâmica acelerada na construção e destruição de cargos, perdas salariais e do poder sindical.De acordo com (BORGES; YAMAMOTO, 2004; ANTUNES, op. cit.) tem havido uma redução no emprego industrial em contrapartida ao crescimento do setor de serviços, com implementações tecnológicas nos mais variados seguimentos.Para estes autores o desemprego atinge principalmente aqueles que têm menos flexibilidade à mudança, sendo a única alternativa para se libertar da falta de alternativa profissional, o constante aperfeiçoamento e abertura às mudanças.Antunes acrescenta que o crescimento de empregos informais, parciais e temporários já faz parte do nosso dia-a-dia. A estabilidade própria da década de 1960 é atualmente utópica. Os autores questionam sobre a qualidade de trabalho e a saúde emocional dos que estão empregados nesse clima de instabilidade e constantes mudanças.Segundo Malvezzi (2000) há cinco pilares nas transformações no mundo do trabalho: a desenfreada compactação da informação; a competitividade das empresas cada vez mais globalizadas; as constantes mudanças; o aumento da dimensão simbólica no mundo do trabalho e a necessidade de adaptação para diferentes profissões em prazo de tempo cada vez mais curto.

À vista disso, constata-se uma decadência do quantitativo comparado à elevação do qualitativo, ratificado pela propagação dos programas de qualidade total, tão em voga atualmente, de sorte que, a terceirização, responsável por cortes massivos de empregados, encontra justificativa no discurso de que as empresas devem concentrar-se no que sabem fazer melhor, na sua competência central, destinando as demais atividades as terceiras (ANTUNES, 2005). Neste espaço social, cria-se uma lacuna gigantesca entre profissionais superqualificados e uma geração culturalmente tradicional, assalariada.                

4. Metodologia

Este estudo utilizou a abordagem metodológica qualitativa, por meio de entrevistas semi-estruturadas, com o objetivo de compreender a dinâmica do trabalho de motoristas rodoviários de passageiros.

4.1 Universo da pesquisa            

Este estudo foi realizado com motoristas rodoviários de uma empresa de grande porte de transporte de passageiros. Os dados foram coletados na filial de Teresina – PI, sendo a matriz em Fortaleza – CE e possuindo outras filiais no Nordeste, Norte e Centro-Oeste do país.           

O esquema de trabalho dos motoristas é realizado, a partir de cinco jornadas consecutivas, com descanso entre as mesmas, no mínimo de onze horas, sendo a média em torno de doze horas. A folga se dá no sexto dia, cuja carga horária é de no mínimo, trinta e seis horas. Geralmente há horas extras, remuneradas conforme a CLT. As horas extras sucedem, sobretudo, no período de alta estação, isto é, nos meses de janeiro, fevereiro, julho e dezembro, bem como em feriados.           

A maior parte das viagens, cerca de 70%, é realizada no período noturno. O setor de tráfego, responsável pela escala de trabalho, busca alternar as escalas entre viagens noturnas e diurnas.           

Inserido no sistema de escala, dois motoristas são escalados como plantonistas (doze horas cada um). O plantonista fica à disposição, caso ocorra a necessidade de substituição de motorista.            
As viagens duram, em média, seis horas, com paradas para embarque e desembarque de usuários ou refeições (de acordo com o horário). Em cada Ponto de Apoio (cidades, onde as viagens terminam ou que há troca de motorista) há alojamentos, nos quais, os motoristas repousam e aguardam a próxima viagem. Os Pontos de Apoio interligados à filial de Teresina correspondem às cidades de Parnaíba – PI, Picos – PI, Floriano – PI, Santa Inês – MA, São Luis – MA e Sobral – CE.           

A velocidade máxima prescrita, permitida pela empresa consiste em 80 Km/ h. Faz-se o controle deste critério, bem como, dos tempos de paradas, por meio do monitoramento do disco diagrama que é inserido no tacógrafo (aparelho digital que tem por objetivo, registrar os tempos de condução, repouso, velocidades, distâncias percorridas e tempos de trabalho) presentes em todos os veículos. O disco diagrama é inserido, previamente, ao início de toda viagem.            Ademais, todos os veículos estão equipados com um sistema de rastreamento via satélite que propicia, em tempo real, a localização precisa dos veículos.           

O trabalho dos motoristas é, esporadicamente, fiscalizado por profissionais terceirizados a paisana, que monitoram, indiretamente, os procedimentos tomados durante as viagens. Caso ocorra a detecção de algum procedimento indevido, são emitidos relatórios ao gerente de tráfego, que, por sua vez, decide a punição devida.

4.2 Participantes            

A escolha por motoristas rodoviários ocorreu devido a pesquisadora ser responsável pelo setor de Recursos Humanos da citada filial, dispondo, portanto, de condescendência e facilidade estrutural e funcional de acesso aos participantes. Além do mais, trata-se da classe profissional que demanda maior respaldo dos serviços de Psicologia na referida empresa, dado o número de queixas, no tocante ao relacionamento com os clientes, bem como, com a escala noturna e dificuldades com o descanso e sono conseqüentes. Para prosseguimento do estudo, no entanto, foi solicitada prévia autorização à gerência regional, que responde pela filial.          

 Para participar da amostra, foram eleitos os motoristas que apresentaram atestados médicos com maior incidência entre os anos de 2002 a 2006, período este, em que a empresa sofreu maior número de absenteísmo devido a motivos de saúde.           

Tal seleção justifica-se dado o maior percentual de ausência no trabalho, por motivo de adoecimento.           

Todos os participantes acataram o convite, voluntariamente.           

O estudo contou com a participação de 20 motoristas, divididos em quatro grupos de 5 participantes.           

A idade dos participantes varia entre 36 e 47 anos. Todos são casados. No tocante ao nível de escolaridade, 4 possuem Ensino Infantil completo, 11 Ensino Fundamental incompleto, 3, Ensino Fundamental completo e 2, Ensino Médio incompleto. Toda amostra possui mais de 15 anos de profissão e o tempo de empresa ficou entre 4 a 9 anos.           

Estes dados chamam atenção para a predominância da baixa escolaridade, assim como, para o vasto tempo de experiência profissional.           

Os dados acima apontam que foi mantida a proporcionalidade em relação ao número de motoristas da população investigada.

4.3 Instrumentos                       

O instrumento utilizado neste estudo foi a entrevista coletiva semi-estruturada, a qual permite, apropriadamente, apreender o contexto real e subjetivo do trabalho, pois favorece o compartilhamento dos sentimentos relacionados aos trabalho, de modo que, os entrevistados sentem-se apoiados no grupo que vivenciam os mesmos sentimentos (DEJOURS, 1994b).            De fato, este é o instrumento de investigação, pelo qual, a abordagem psicodinâmica do trabalho se serve. Partindo desta abordagem, são analisadas as vivências subjetivas e as articulações singulares e coletivas.           

Segundo Minayo (1998) a entrevista é um instrumento de coleta de dados privilegiado, pois na fala estão contidos o sistema de valores e as representações de um grupo.          

As entrevistas foram realizadas com quatro grupos de cinco motoristas. Os temas abordados foram as atividades desenvolvidas, as estratégias para lidar com sentimentos e dificuldades relacionadas ao trabalho, as influências físicas, mentais e sociais do trabalho, o reconhecimento e as relações sociais de trabalho (pares e chefia), a margem de liberd

ade e o uso de criatividade e a participação nos processos decisórios. 4.4 Procedimentos             Para selecionar a amostra, foi verificada, junto ao departamento médico da empresa, a freqüência de atestados. Foram acessadas as planilhas anuais que identificam os colaboradores e quantidades de atestados e dias respectivos de afastamento.           

Através da intermediação do setor de tráfego, responsável pela escala de trabalho dos motoristas, obteve-se acesso à escala e números de telefones da amostra, de maneira que, de acordo com a compatibilidade e disponibilidade de horário, os motoristas triados foram convidados, via telefone, a participar da pesquisa. Durante o convite houve prévio esclarecimento sobre os objetivos do estudo.           

Os quatro grupos foram constituídos, de acordo com a disponibilidade dos participantes.           

Os dados da entrevista foram coletados em março de 2007. As entrevistas foram realizadas na sala do RH da empresa. Tiveram duração média de duas horas. Foram gravadas, com prévia autorização de todos, em MP3 player e posteriormente, transcritas integralmente.           

As entrevistas foram iniciadas com explicações gerais sobre a pesquisa, aproveitando, para assegurar a confidencialidade dos dados e identidade dos participantes. 4.5 Análise dos dados As entrevistas foram analisadas, de acordo com a análise de conteúdo proposta por Laurence Bardin. Esta abordagem refere-se a um conjunto de técnicas sistemáticas que buscam através da análise da comunicação descrever as mensagens por meio de inferências. (BARDIN, 1977).Como técnica, foi utilizada a análise de categoria temática, cujo objetivo é o desmembramento do texto em categorias a partir da investigação dos temas do discurso. (BARDIN, 1977).Em uma primeira etapa, as entrevistas foram analisadas, pela pesquisadora, a partir de repetidas leituras a fim de selecionar as verbalizações que poderiam representar os temas. Em seguida, os temas foram classificados em categorias, pela pesquisadora e seu orientador, com base no critério de semelhança de significado semântico e lógico.Os resultados do estudo são apresentados e discutidos nos próximos capítulos.    

5. Resultados

Neste capítulo, são apresentados os resultados da análise de conteúdo, conforme as entrevistas coletivas realizadas.  Foram identificadas cinco categorias temáticas:1. "A maior dificuldade que existe se chama lutar com gente";2. "Rodando a noite a gente passa muito sono";3. "Ao final de cada viagem sinto dor nas costas";4. "A margem de liberdade é o mínimo, cumprimos determinações o tempo todo";5. "Tem colega que quer ganhar nome em cima das costas do outro". Abaixo, cada categoria é apresentada, explicitando-se a definição, os temas e as verbalizações que as compuseram. A primeira categoria refere-se às relações que os motoristas mantêm com os clientes. Categoria 1: "A maior dificuldade que existe se chama lutar com gente". DefiniçãoAfirmam que os clientes possuem um nível de exigência elevado e que nem sempre os tratam de forma respeitosa. Precisam administrar diversos tipos de reclamações como temperatura do ar condicionado, mau-cheiro do toalete, tempos de paradas, atrasos, dentre outras demandas que caracterizam como imprevisíveis. Além do mais, relatam que a relação firmada depende do estado de humor do cliente; quando este está mal humorado a tendência é descarregar seu temperamento no trato com o motorista. Como não podem expressar hostilidade, temendo denúncias, procuram controlar-se, bem como, manter o controle da situação, já que a empresa determina que o atendimento seja fundamentado na satisfação de sua clientela. TemasRelacionamento com o clienteNível de exigência do clienteImposição da empresa para um bom atendimento Verbalizações"

A maior dificuldade que existe se chama lutar com gente"."(…) cada cliente tem uma mentalidade diferente. Descarregam sua raiva no primeiro que encontrar, no caso, o motorista"."(…) Mas, tem que tratar bem, mesmo achando ruim tem que tratar bem"."Comprou a passagem, entende que pode tratar mal o motorista"."Tem passageiro que às vezes abusa da gente, se for engrossar, não adianta. A gente fica calmo e tenta acalmar ele"."Temos que ter cuidado com o que falamos para o cliente, o melhor é procurar falar só o estritamente necessário, para não ter problema"."(…) Se você deixar, o cliente toma conta, ele bagunça mesmo, aí lá na frente ele ainda chama a gente de otário"."Se a gente não souber conversar com o cliente, a viagem é todo tempo enrolada". A segunda categoria está relacionada a problemas de sonolência decorrentes do trabalho em turnos alternados. Categoria 2: "Rodando à noite a gente passa muito sono" DefiniçãoRelatam privação de sono devido aos horários rotativos de trabalho e a dificuldade conseqüente de dormir em momentos diferentes do dia. Atribuem, aos horários noturnos, fatores determinantes para desorganização do período de repouso e uma má qualidade de sono, além de ser o turno em que sentem maior sonolência durante o trabalho. Referem-se ao turno diurno, no qual se encontram mais em pleno das suas capacidades de alerta, com exceção do momento localizado após a hora de almoço. O tempo e a eficácia do sono diurno costumam ser menores comparando ao sono noturno. Os horários irregulares de sono provocam inadaptação, no que se refere, ao padrão de sono suficiente e reparador. Alguns não conseguiram instituir em casa hábitos de silêncio que lhes permitam repousar. Reclamam da falta de compreensão e colaboração da família para a manutenção do silêncio. As conseqüências reveladas são irritação, nervosismo e comprometimentos diversos à saúde, como elevação da pressão arterial, dor de cabeça e distúrbios do sono. Frisam preocupação com horários de trabalho, no sentido de estarem realmente preparados para a próxima jornada, isto é, de estarem descansados o suficiente. Percebem que esta preocupação gera menor eficiência no sono. Recorrem a estratégias diversas, na tentativa de combater a sonolência durante o trabalho. TemasPrivação do sonoProblemas de sonolênciaHorários irregulares de sonoQualidade do sonoConseqüências de privação do sono Verbalizações"Rodando à noite a gente passa muito sono".

"Quando passo muito sono tenho dor de cabeça"."Tem dia que você rola, rola, os olhos ardendo, está com sono, mas não é o caso de simplesmente dormir na hora que quer"."Minha mulher diz que quando estou rodando à noite, meu comportamento muda em casa, fico mais agressivo, mais irritado"."Trabalhar a noite, é mais complicado (…) quando passo muito sono, a pressão costuma subir (…) se fosse só de dia seria melhor"."Às vezes passo muito sono, eu vou deitar e às vezes transpassa o tempo e não consigo dormir. Quando estou de férias, durmo bem, acho que o sono acumula tanto que a gente dorme bem"."Depois do almoço, bate um sono, mas dá para passar porque é de dia""A gente sempre tem preocupação, principalmente, à noite. É preciso ter mais atenção, a luz alta dos carros atrapalha muito e ainda podem avançar na nossa faixa"."A minha preocupação é com meus horários, para descansar o suficiente, na minha profissão não se pode errar. Se eu errar mato cinqüenta, comigo cinqüenta e um. Tem que se trabalhar com muito cuidado porque um errinho pode ser fatal"."Na estrada tenho um problema sério com sono, quando vem, vem mesmo. Tenho que parar e jogar água gelada no rosto".

A terceira categoria faz menção às afecções físicas vivenciadas pela amostra. Categoria 3: "Ao final de cada viagem sinto dor nas costas" DefiniçãoOs participantes se queixam de algumas afecções físicas. Problemas na coluna vertebral, pressão alta e dores de cabeça, são os mais freqüentes. Atribuem ao assento, quando mal projetado, somado a vibração do veículo as mais relevantes causas para as dores nas costas. Lembram que o trabalho requer que passem horas a fio sentados ao volante. Alguns relacionam a dor de cabeça e a hipertensão arterial à privação de sono. Ocorrem ainda, queixas relacionadas à tontura e dores nas pernas. Há casos em que apesar da queixa sintomática, os exames médicos não apontam causas orgânicas. TemasAfecções físicasEtiologia dos sintomas Verbalizações"Tenho um problema sério de coluna, costumo tomar X, que é muito bom para dor de coluna"."Ao final de cada viagem, sinto dor nas costas. O carro vibra muito e a cadeira não ajuda"."Minha pressão às vezes dá alterada (…) eu já senti tontura na hora de viajar.

Levaram-me ao hospital"."Sinto dor nas costas. É normal a gente sente mesmo"."Sinto dor nas pernas, costumo ter câimbras"."(…) Dependendo da cadeira que eu pego, a coluna dói, tem umas cadeiras empenadas que é só sentar e as costas começam a doer. Quando a gente pega uma cadeira ruim influi muito"."(…) Tenho enxaquecas fortíssimas, que até para caminhar, sinto dificuldade"."Tinha tontura, até a cabine do carro torcia, fiz exames, não deu em nada". A quarta categoria está relacionada à percepção dos motoristas sobre a margem de liberdade que possuem na realização da profissão. Categoria 4: "A margem de liberdade é o mínimo, cumprimos determinações o tempo todo". DefiniçãoNa percepção da amostra, há pouca liberdade de gestão do trabalho. Apesar de enfrentar, a todo o momento situações inusitadas na estrada, que solicitam resoluções imediatas, julgam escassa a margem de autonomia que possuem. Afirmam que em todas as complicações que enfrentam, há sempre uma determinação da empresa, própria para a solução do problema. Ressaltam que no cargo que exercem, não cabe decisão, mas apenas cumprimento de ordens. Frisam que se tivessem maior poder de liberdade, resolveria eficazmente as dificuldades que enfrentam e contribuiriam mais com a empresa. Acrescentam que o fato de trabalharem segundo um esquema de escala diário, restringe a forma com que administram as horas de condução e descanso. TemasFalta de autonomiaCumprimento de determinações Verbalizações"A margem de liberdade é o mínimo, cumprimos determinações o tempo todo"."Liberdade de decisão é uma coisa que não cabe a nós, a gente é sempre mandado".

"Não somos pagos para dar opinião, não gosto de misturar as coisas"."Se tivéssemos mais liberdade, parte dos problemas que a empresa tem com o passageiro, nem existiria"."Temos que estar à disposição para qualquer escala, e isso independe da nossa vontade".A quinta e última categoria estar relacionada às relações que mantêm com os clientes internos. Categoria 5 : "Tem colega que quer ganhar nome em cima das costas do outro" DefiniçãoOs entrevistados percebem união na categoria. Ressaltam companheirismo, solidariedade e respeito entre eles, porém distinguem uma minoria que atuam apenas de acordo com interesses pessoais e, por isso, prejudicam os interesses da maioria. Afirmam que estes colegas, para se promover, favorecem intrigas junto à chefia, são aqueles que delatam as falhas cometidas por seus pares. Os motoristas sentem-se traídos e acreditam que lograriam muito mais conquistas se não existisse esse grupo dissidente. Outras relações socioprofissionais, com demais setores e chefias, costumam ser estritamente profissionais, no entanto, normalmente, sem atritos. A gerência é tida como distante, carecem de mais reuniões com a mesma, nas quais possam relatar as dificuldades vivenciadas no trabalho. No entanto, acentuam, que quando procurado, o gerente é acessível. TemasRelacionamento com os paresDissidência na categoriaRelacionamento com outros setores e chefia Verbalizações"Tem colega que quer ganhar nome em cima das costas do outro"."A categoria não é tão unida como deveria ser (…) se fosse mais unida ganharíamos até melhor"."Tem uns que só pensam em babar o chefe"."Teve uma vez que o colega me 'entregou' para o gerente"."(…) Quando o colega erra, eu chego para ele e falo. Nunca fui de levar caso para gerente".

"Da maioria, há união, agora há um mínimo que gosta de prejudicar a profissão";"Aqui e acolá tem uns 'fuxiqueiros', que só atacam por traz";"Deveríamos ter mais reunião, nosso trabalho ganharia muito";"(…) Tirando alguns colegas da profissão, não tenho nada que reclamar de toda equipe da filial".                            

6. Discussão

Tendo por base a apresentação dos resultados obtidos na aplicação da análise de conteúdo das entrevistas e o seu confronto com os dados veiculados pelos princípios teóricos da Psicodinâmica do Trabalho, desenvolvidas por Christopher Dejours, surge a presente discussão dos resultados. Para a discussão ficar mais elucidativa, fazemos menção também à literatura correspondente às pesquisas apontadas no referencial teórico, sobre o setor de transporte. A discussão segue a ordem das questões que nortearam o estudo.A primeira questão procura investigar como os motoristas vivenciam prazer-sofrimento no trabalho. A categoria temática inicial "A maior dificuldade que existe se chama lutar com gente" contempla a percepção dos motoristas, no que tange ao relacionamento com os clientes.

Trata-se de um tema muito recorrente no discurso destes profissionais, que pode ser justificada pela natureza complexa da prestação de serviço ao público. De acordo com as verbalizações dos motoristas, observa-se que, geralmente, a relação com o cliente tem sido fonte de sofrimento.Relatam que, nessa relação, nem sempre são tratados de maneira educada, que estão expostos a todo tipo de demanda, que o nível desta, tem sido cada vez mais elevado e que as solicitações, muitas vezes, são transmitidas de forma agressiva e impertinente. Além do mais, de acordo com as prescrições da empresa, os motoristas são exigidos, nestas circunstâncias, a manter o equilíbrio emocional e tentar atender às necessidades dos clientes, com cordialidade, buscando sempre a satisfação destes.Impedidos de expressar suas verdadeiras emoções, por mais que sintam, os motoristas vivenciam sentimento de desvalorização profissional, o que corrobora para o seu sofrimento psíquico.Este fato é válido sob o prisma do conceito dejouriano (DEJOURS, 1994a) cuja defesa indica que a prevalência do prazer ou sofrimento no trabalho depende da maneira em que tal contexto de trabalho é constituído e da relação que o trabalhador estabelece com o contexto.Dejours ainda pondera que quando as condições operatórias são cercadas por total inflexibilidade, que impede redefinições pessoais, a incompatibilidade entre a história individual portadora de desejos, aptidões, potencialidades e limitações próprias e o universo laboral, desapropria o sujeito de situações favoráveis à sublimação, isto é, à reinvenção criativa e espontânea do trabalho tão necessária ao equilíbrio psíquico, uma vez que confere ao indivíduo identidade pessoal e, em decorrência, reconhecimento social.Na verdade, para a psicodinâmica do trabalho, o sofrimento é visto enquanto fenômeno indestrutível.

Logo, é um esforço em vão tentar eliminar o sofrimento do trabalho. Apesar de, infelizmente, esta ainda ser uma lógica presente nas práticas administrativas. No entanto, isso não quer dizer que tal sofrimento não possa ser transcendido ou sublimado, na verdade, é esse processo que confere prazer ao trabalho e, em última instância, traz sentido ao trabalhador. (DEJOURS,1996) De fato, não é por acaso que o sofrimento sempre se renova e toma outras formas ao passo que abolido. Ademais, dificilmente o ser humano se contenta com tarefas nas quais lhe faltam desafios, na realidade, estes são peças ­chave na arte de jogar com o sofrimento, transformando-o em algo que o sujeito se identifique e que o faça se sentir útil. Vê-se, portanto que a minimização do sofrimento psíquico no trabalho é diretamente proporcional à liberdade de adaptar à organização do trabalho à própria personalidade. Na ausência desta adaptação, o sofrimento de criativo passa a patogênico – porta de entrada para a descompensação psíquica ou somática (DEJOURS, 1987; 1994a; 1996; 1997; 1999; 2000; 2004). Diante do exposto, é importante notar que a inviabilidade de atribuir um novo modo de ser às situações experienciadas com os clientes obsta o encontro da subjetividade do profissional com o trabalho que realiza.

A falta de liberdade de expressão é um fator que determina a manifestação direta da vivência de sofrimento.A literatura aponta que as exigências do trabalho, sejam ergonômicas, psicossensoriais ou intelectuais, devem, necessariamente, estar de acordo com a estrutura mental do trabalhador, evitando assim, uma sobrecarga energética de trabalho – carga psíquica do trabalho, cujo efeito volta-se, mais cedo ou mais tarde, à psique. A princípio, na forma de fadiga, que de fato, corresponde ao prelúdio da descompensação (DEJOURS, 1994a).Na categoria "Rodando a noite a gente passa muito sono" há uma revalidação do sofrimento psíquico, dado que o trabalho que realizam impõe um tipo de vida com fortes constrições ao período de sono, devido à irregularidade dos horários de trabalho.Ademais a percepção subjetiva da sonolência, em si, e a luta contra o sono, particularmente durante a noite, representa um aumento da carga de trabalho e constitui um fator de fadiga e estresse.Conforme relato de alguns motoristas, o déficit de sono provoca alterações no estado de humor, como irritação e nervosismo, além de efeitos negativos à saúde física, como hipertensão, cefaléia e distúrbios do sono (insônia).Esse fato é coerente com a concepção de carga de trabalho da psicodinâmica do trabalho, a qual afirma que o estado de esgotamento conduz o trabalhador ao sofrimento e à exposição aos riscos de adoecimento.Esta evidência é ratificada nos estudos de Florez – Lozano (1980) citado por Mello et al. [ca. 2001] cujas conclusões asseveram que a privação do sono redunda em fadiga, que por sua vez, repercute negativamente na saúde física e mental do motorista. Além dos problemas supracitados narrados pelos participantes do presente estudo,

Florez – Lozano cita outras enfermidades confirmadas em sua pesquisa, como depressão e distúrbios sexuais.A análise teórica de Dejours (1997) aborda o papel das condições de trabalho sobre a saúde física do trabalhador, enfatizando que é no corpo que o trabalhador expressa sua inadequação ao trabalho.Analisando a categoria "Ao final de cada viagem, sinto dor nas costas" percebe-se o acometimento de patologias físicas específicas à profissão. Nesse sentido, determinadas variáveis próprias as condições de trabalho também favorecem a vivência de sofrimento.As dores de coluna são as mais freqüentes no discurso dos motoristas. Narram que as instalações dos ônibus não estão de acordo com os requisitos ergonômicos ideais. A inadequação do assento somada a intensa vibração, durante as viagens, são as principais causas citadas pelos participantes.Esse resultado é consoante com as conclusões de Kompier et al. (1990 apud Néri et al.) que avaliaram maior risco na profissão para desordens músculo-esqueléticas.

Outras afecções associadas ao trabalho também foram notificadas como dor de cabeça e hipertensão, neste caso, associadas com a privação de sono, como já citado. Tontura e dor de cabeça também foram assinaladas.Consoante à psicodinâmica do trabalho, as enfermidades físicas do trabalhador são prováveis frutos da dissonância entre demandas psíquicas do sujeito e o trabalho que realizam (DEJOURS, 1997).Dejours assegura que a doença somática surge em decorrência de parcas defesas psíquicas, de modo que a carga psíquica é descarregada diretamente no corpo.Os achados deste estudo indicam que o trabalho dos motoristas rodoviários de passageiros é, preponderantemente, fonte de sofrimento, dados a gama de problemáticas que enfrentam e do sentimento de impotência diante à impossibilidade de fazer a ressignificação das contradições do trabalho para transformá-lo em fonte de prazer.Dejours (1994b; 1996; 1997; 1999; 2000; 2004) declara que a dialética prazer-sofrimento no trabalho é diretamente subordinada à organização do trabalho.Nesse sentido, a pergunta dois busca analisar a estruturação da organização do trabalho e qual sua influência sobre o prazer-sofrimento no trabalho.A quarta categoria "A margem de liberdade é o mínimo, cumprimos determinações o tempo todo" percebe-se que a organização do trabalho não oferece margem de liberdade.Os motoristas trabalham num sistema de escala diário, experimentando condicionantes que introduzem no seu dia de trabalho restrições que lhes limitam a liberdade para gerir os seus tempos de condução e de folga. Com efeito, neste setor, não há margem para decidir a forma de organização do seu trabalho, com maior liberdade, tendo em conta o tipo de serviço que realizam. Ficam condicionados aos horários de viagens pré-definidos pela empresa, aos locais e tempos permitidos para paradas, além da quilometragem máxima permitida.Dejours (1994b; 1996; 1997; 1999; 2000; 2004) salienta que a falta de liberdade no trabalho ocasiona sofrimento patogênico, uma vez que, o indivíduo não encontra mobilização subjetiva.Dejours assegura que quando a organização do trabalho, por sua natureza rigidamente definida, impede a adaptação entre a personalidade, os desejos e motivações do indivíduo e o modo operatório instituído, o sofrimento de criativo passa a patogênico, uma vez que os trabalhadores são desapropriados de sua liberdade inventiva, de modo que, o processo sublimatório perde seu espaço tornando-se inexeqüível, obrigando-os, então, a lutar contra sua própria atividade psíquica espontânea.

O autor explica que o sofrimento patogênico torna maior à medida que haja discrepâncias entre o trabalho prescrito e o trabalho real, isto é, quando não é possível a utilização de ajustamentos pessoais.Ademais, para toda resolução de problema, os motoristas precisam recorrer às normas da empresa. Narram que, sentem-se tolhidos e que, em algumas situações, desejam solucionar os problemas de acordo com suas próprias opiniões e acreditam que contribuiriam mais com a empresa. Observa-se que esta circunstância resulta em prejuízo para o sentimento de autonomia e para dinâmica do reconhecimento. Esse resultado converge com a proposição de Dejours (1996; 1999; 2004) que lembra sobre a discrepância existente entre o trabalho prescrito e o trabalho real, sendo que a eficácia profissional é, às vezes, conseqüência da insubordinação do trabalho prescrito, de modo que, o trabalho só é executado com êxito quando não há observância estrita dos procedimentos. Em contrapartida, a execução, à risca, das prescrições repercute na chamada "greve do zelo", que pode resultar na ineficiência do trabalho.Para esse autor, o prazer no trabalho está atrelado às possibilidades de aprender sobre um fazer específico, criar, inovar e desenvolver novas formas para a execução da tarefa.Com relação à dimensão da organização do trabalho, relações sócio-profissionais, pode-se analisar que as relações, no ambiente interno, retratadas na categoria "Tem colega que quer ganhar nome em cima das costas do outro" é possível constatar que há ambivalência nas relações construídas com os colegas de profissão. Atribuem à maioria, o sentimento de companheirismo e solidariedade, sendo a relação resultante, fonte de prazer. Apesar da atuação profissional, em si, ser individual, os resultados indicam que os participantes estabelecem relações ativas com seus pares, sobretudo nos alojamentos da empresa, o que lhes permite compartilhar sentimentos e situações de trabalho e ainda reconhecerem-se integrantes de um coletivo de trabalho.

A análise dos dados sinaliza que o grupo vivencia, substancialmente, a sensação de prazer ao conviver com os colegas de trabalho.Em contrapartida, distinguem a atitude de alguns pares como desonesta com a categoria, pois tomam determinadas atitudes apenas em prol de interesses pessoais, geralmente, através de delatações das falhas dos próprios colegas de trabalho, junto à chefia. Esta situação se apresenta determinando um clima de segregação, bem como, a percepção de deslealdade que lesa, em parte, o poder de representação da categoria. Essa condição desfavorável ao senso coletivo produz sofrimento psíquico, pois compromete a função essencial que o coletivo de trabalho possui, que é a troca de sentimentos relativos ao trabalho, além do processamento da dinâmica de reconhecimento do trabalho, características fundamentais à vivência de prazer no trabalho.Esses dados vão, na mesma direção, das afirmações de Dejours (1999) que aponta para o papel do coletivo de trabalho como espaço de fala e compartilhamento das situações de trabalho e de construção de reconhecimento de trabalho.Segundo o autor, a falta de integração com os colegas de profissão, é um fator determinante para a vivência de sofrimento e conseqüentemente, desestabilizante do equilíbrio psíquico. Quanto à relação com a chefia, os entrevistados percebem distanciamento desta, sentem falta de reuniões, nas quais possam colocar em debate, de forma coletiva, a suas vivências profissionais, o que seria imprescindível à superação do sofrimento decorrente das dificuldades citadas nesta discussão.

Dejours (1996; 1997; 2004) aponta a necessidade de existência de um espaço público de discussão que seria um dos requisitos para viabilizar o processo de mobilização coletiva para transformação das situações concretas de trabalho. Este espaço representa a inteira abertura para a apresentação de argumentos em função da visão sobre o contexto laboral, promovendo mobilização subjetiva em busca do reconhecimento e do resgate do sentido no exercício da profissão.A ausência de um espaço público de discussão acentua o sofrimento por impedir sua ressignificação.A terceira e última questão norteadora do estudo investiga se os profissionais fazem uso de mecanismos de defesa para lidar com o sofrimento psíquico.O predomínio de indicadores que denotam sofrimento no trabalho permite inferir que a amostra parece vivenciar um processo de adaptação por meio do uso de estratégias defensivas.Com base na psicodinâmica do trabalho, o trabalhador, para suportar o sofrimento advindo do contexto laboral, desenvolve, impreterivelmente, estratégias defensivas ou coletivas (DEJOURS, 1996; 1997; 2000; 2004).As verbalizações apontam para o uso de estratégias de mediação defensivas individuais.Na narrativa "Tem passageiro que às vezes abusa da gente, se for engrossar não adianta.

Agente fica calmo e tenta acalmar ele". Está expresso o uso da estratégia defensiva denominada passividade, ou seja, os motoristas têm consciência das dificuldades na relação com os clientes e do sofrimento decorrente, mas para se defender psiquicamente, desenvolvem um estado de conformismo ligado à falta de alternativas de resolução ou transformação do problema.Nas verbalizações "Temos que ter cuidado com o que falamos para o cliente, o melhor é procurar falar só o estritamente necessário, para não ter problema" e "Não somos pagos para dar opinião, não gosto de misturar as coisas", são também exemplos claros da utilização da passividade como estratégia. Pode-se inferir que o predomínio desta estratégia defensiva deve-se à natureza rígida da organização do trabalho e a falta de percepção e perspectiva de modificação deste contexto.Dejours (2000) coloca que nesse tipo de situação, instaura-se uma passividade coletiva que revela numa espécie de conformidade taciturna e servidão consentida.Outra estratégia defensiva evidenciada neste estudo foi o individualismo, ilustrado na verbalização "Tem colega que quer ganhar nome em cima das costas dos outros", conforme discutido na segunda pergunta, a relação com os colegas de trabalho apresenta aspectos contraditórios, ocorrendo, concomitantemente, cumplicidade e individualismo.Nas verbalizações, o grupo critica e se queixa de colegas que se comportam em função, apenas de interesses pessoais.

São aqueles que procuram obter prerrogativas junto ao setor administrativo da empresa em troca de informações sobre o comportamento profissional dos próprios pares. Não se empenham em favor da categoria e assim, desencadeiam desequilíbrio no coletivo de trabalho.De acordo com a tese do individualismo desenvolvida por Dejours e Jayet (1994) o comportamento individualista elimina a reciprocidade e cooperação no coletivo de trabalho. Os trabalhadores percebem as situações laborais de forma singular, sem considerar a história que as produziu.Dejours (1999) acrescenta que o individualismo trata-se de uma das estratégias mais utilizadas pelos trabalhadores, em geral, e se caracteriza pela falta de comprometimento e desmobilização, de modo que, o indivíduo se preocupa apenas em resistir, sem dar importância ao sofrimento dos companheiros de trabalho.O comportamento passa a ser cada vez mais individual, competitivo e vigiado por todos. Ocorre que, para se defender do sofrimento advindo das situações de trabalho, o trabalhador se volta contra os próprios pares, afugentando os reais motivos do sofrimento, já que estes não podem ser combatidos diretamente (DEJOURS, 1997; 1999; 2004).Estas defesas possibilitam, simultaneamente, a manutenção do equilíbrio psíquico, mas também, da alienação das causas do sofrimento, incapacitando o processo de mudança das situações organizacionais, as quais, os profissionais estão submetidos.Considerando a análise dos resultados, percebe-se que o impedimento de superar coletivamente os problemas da profissão está associado de um lado ao modelo rígido de organização do trabalho, e de outro da subjetividade dos sujeitos que criam mecanismos defensivos, como atribuir a alguns pares a responsabilidade da divisão de categoria.

Discutidas as três questões do estudo, pôde-se identificar que o sofrimento é vivenciado com predominância, dada a ausência de flexibilidade da organização do trabalho, a privação e baixa qualidade do sono, as relações contraditórias com os pares e o relacionamento distante com a gerência. Dessa forma, o contexto organizacional não oferece margem de liberdade para os trabalhadores coletivamente realizarem a ressignificação do sofrimento, nem a gestão dos antagonismos do trabalho para transformá-lo em fonte de prazer. Nesse sentido, decorre apenas a eufemização do sofrimento por meio da utilização de estratégias defensivas, particularmente, passividade e individualismo.A seguir, o último capítulo exibe as considerações finais deste estudo.           

7. Considerações Finais

 Este estudo foi realizado com motoristas rodoviários de passageiros de uma empresa privada do setor de transporte. Teve-se como objetivo investigar as vivências de prazer e sofrimento no trabalho realizado por estes profissionais, enfocando, especificamente, o modelo de organização do trabalho e as estratégias defensivas utilizadas.A partir da análise das articulações teóricas e discussões dos resultados, puderam-se delinear as seguintes considerações finais:.

A condução profissional de veículos tem vindo a tornar-se cada vez mais exigida devido aos avanços tecnológicos inseridos nos veículos e, sobretudo, pelas demandas temporais cada vez maiores.§   Os motoristas vivenciam, majoritariamente, sofrimento no trabalho, sustentado por estratégias defensivas.

O prazer é vivenciado nas relações que mantêm com alguns pares, que favorecem a troca de sentimentos e reconhecimento relativos ao contexto profissional.  

A organização do trabalho propicia o sentimento de impotência, mediante a impossibilidade de mudança das dificuldades vividas, restando-lhes a utilização de defesas individuais para preservar seu funcionamento psíquico.  

As vivências de sofrimento aparecem associadas à relação com os clientes e colegas de trabalho que não contribuem com a integração da categoria, às privações e baixa qualidade de sono, devido aos horários de trabalho irregulares e a falta de flexibilidade da organização do trabalho e liberdade de expressão e decisão, que só seriam possíveis num espaço aberto de discussão.§    As situações relatadas, próprias às dificuldades vividas no contexto profissional fomentam o adoecimento, com o surgimento de sintomas físicos e psicológicos.  

A percepção da imobilidade sugere a cristalização de mecanismos como a acomodação, passividade e individualismo, impedindo o acesso coletivo ao prazer.  

De modo geral, foi identificada a predominância de estratégias defensivas contra o sofrimento, em detrimento do uso de recursos subjetivos inerentes à ressonância simbólica, que permitem a transformação do sofrimento em prazer.A contribuição deste estudo pode ser atribuída à caracterização dos aspectos profissionais de motoristas rodoviários de passageiros, utilizando a abordagem da psicodinâmica do trabalho, dada a ausência de estudos sobre esta categoria profissional na literatura revisada pertinente a essa área teórica, apontando conclusões que ampliam seus conhecimentos teóricos.           

A pesquisa anuncia a necessidade de rever a natureza da organização do trabalho, a qual os motoristas de ônibus rodoviários estão submetidos, cujo contexto de trabalho demanda políticas administrativas que contemplem mais a identidade de cada sujeito, de modo que torne viável coadunar resultados econômico-financeiros com a satisfação profissional.            N

essa medida, esta pesquisa realça as colaborações sociais que norteiam os princípios fundamentais desta abordagem que orientam para a promoção do prazer no trabalho, a partir da defesa da flexibilidade de sua organização, em conformidade à subjetividade do indivíduo, bem como, da introdução de um espaço de interlocução e decisão no ambiente laboral.            Do mesmo modo, o estudo denota a relevância de fortalecer o coletivo do trabalho, dado ter sido o único fator patente de favorecimento do prazer no trabalho.           

Pode-se atribuir as limitações deste estudo ao caráter incipiente de pesquisa fundamentada na psicodinâmica do trabalho relativa à categoria profissional estudada, demandando análises mais aprofundadas. Além disso, para ser mais abrangente, o estudo necessitaria contemplar outras variáveis relevantes a essa abordagem teórica, como a história de vida do sujeito e o desenvolvimento psíquico-sexual infantil, que não constituíram fatores de análise.           

Outro limite é o fato de que o estudo foi conduzido com profissionais de uma empresa específica. Isto leva à indicação da necessidade de novas pesquisas com motoristas que trabalham em outras organizações, com o objetivo de tornar gerais os resultados obtidos.           

Nessa perspectiva, propõe-se para pesquisas futuras:

Realização de estudo comparativo com motoristas de empresas distintas. Inquirir motoristas afastados do trabalho devido ao adoecimento, em conseqüência do trabalho. Estabelecer relação dialógica com outras disciplinas como a Sociologia, a Ergonomia, a Psicologia social e Organizacional.           

Entende-se que o presente estudo levou a efeito o objetivo desejado e aspira-se à uma concreta contribuição científica, bem como, à benfeitoria à categoria profissional pesquisada.           

Desse modo, para que a saúde mental e a qualidade de vida do trabalhador sejam realmente promovidas, deve ser repensado o papel administrativo nas organizações baseado na ética, e que constitua um espaço de palavra e decisão, cuja transparência minimize a lacuna gigantesca entre o trabalho prescrito e o real, reconhecendo, assim a singularidade de cada um e facilitando uma organização produtiva emancipada em prol do sofrimento criativo e, portanto, da realização profissional.                          

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Apêndices                     

Roteiro de entrevista: 1 – Como vocês tornaram-se motoristas? 2 – Me falem sobre sua rotina de trabalho. Contem-me um dia de trabalho, desde o momento que iniciam ao que encerram uma jornada. 3- Quais as dificuldades vivenciadas no dia-a-dia de trabalho? 4- Como fazem para superar as dificuldades? O que fazem para lidar com o trabalho? 5- Como se sentem no trabalho? Quais os sentimentos relacionados ao trabalho? Como lidam com os sentimentos? 6- De que forma o trabalho influencia as suas vidas? No que se refere aos estados físico, mental e social? Como lidam com essa influência? 7- Como está sua saúde desde que trabalham nesta empresa? Há queixas físicas? Qual a freqüência? 8- Vocês possuem margem de liberdade e decisão no trabalho? Costumam usar de criatividade? 9- Vocês já exporam idéias, sugestões, opiniões perante a chefia? Como foi aceita?10- Sentem-se reconhecidos pelos pares e chefia? Há solidariedade e cumplicidade nas relações de trabalho?  


[1] Segundo a psicanálise, por sublimação entende-se a capacidade de investir energia sexual em atividades superiores, mais bem aceitas socialmente, como as artísticas, intelectuais e científicas (FREUD, 1969).  

 

[2] A pulsão consiste numa energia psíquica, inconsciente, cuja meta é a realização de um desejo. (FREUD, op cit.)

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