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Tutoria na Educação a Distância: Relato de uma aplicação prática a partir do referencial teórico

[1]José Reinaldo de Carli

[2]Maria Augusta Soares Polato

Resumo

Este artigo apresenta a discussão de alguns conceitos relativos a prática tutorial do Ensino a Distância e apresenta o relato de uma aplicação prática desenvolvida por tutores numa modalidade de educação na qual a mediação didático-pedagógica dos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias da informação e comunicação. Neste contexto o comprometimento do tutor no desempenho de suas funções torna-se condição indispensável para o sucesso de todo processo. A partir do relato do papel, das atribuições e forma de atuação será feito um paralelo com a prática tutorial exercida nos cursos de graduação das áreas Educacional e Tecnológica, em um pólo de apoio presencial, no que se refere ao ensino e aprendizagem e aos reflexos desta atuação junto aos alunos.

Palavras-chave: Educação a Distância, tutoria, mediação e alunos.

Introdução

A partir das atividades tutoriais desenvolvidas nos cursos de graduação e pós-graduação e buscando o aperfeiçoamento de nossa prática, sentimos necessidade de refletir sobre nossa atuação à luz das atribuições que nos compete na relação direta com os alunos, facilitando e mediando ações de aprendizagem.

Iniciaremos com um breve relato das perspectivas para o século XXI, e as grandes mudanças que afetam profundamente a sociedade – a saber, a sociedade do conhecimento e a globalização.

Diante do novo cenário que a educação nos apresenta discutiremos o papel e a postura do aluno da EaD e a importância do tutor neste processo.

Finalizando o trabalho pretendemos mostrar que na relação tutor/aluno, no diálogo com o material, na motivação e autodisciplina, pode estar a resposta para o êxito nos estudos através da Educação a Distância.

Perspectivas para o século XXI

Nas sociedades modernas, as mudanças sociais, econômicas e políticas, ocorrem num ritmo muito acelerado. O processo de globalização gera mudanças em todas as esferas da sociedade, criando novos estilos de vida e de consumo, e novas maneiras de ver o mundo e aprender. Os conceitos que nos orientaram até bem pouco tempo atrás não são os mesmos. Será que ainda podemos falar em produtos nacionais, tecnologias nacionais, empresas nacionais, economias nacionais ou indústrias nacionais?
Neste contexto, muito em breve, o único recurso verdadeiramente nacional será o povo, constituído por seus cidadãos. As capacitações e o discernimento de seu povo será o recurso principal de cada nação. A importância de uma nação será determinada pelo valor potencial daquilo que seus cidadãos podem acrescentar à economia global, enriquecendo as capacitações e habilidades de seu povo. Tais mudanças no processo econômico, na organização e gestão do trabalho, no acesso ao mercado de trabalho, na cultura cada vez mais mediatizada requerem transformações nos sistemas educacionais que cedo ou tarde vão assumindo novas funções e enfrentando novos desafios.

O campo da educação é muito pressionado por mudanças. Sabe-se há muito, que a educação é o caminho fundamental para transformar a sociedade. Muitas formas de ensinar, hoje, já não se justificam mais. A literatura científica indica que as escolas atuais não estão adequadas ao desafio que se mostra no horizonte. Com o aumento no uso das novas tecnologias de comunicação, caracterizada pela interatividade, pela sua capacidade de uso individualizado, pela assincronia, pela não-linearidade e pela capacidade de simular eventos do mundo natural e no imaginário, de forma a levar o aluno a perceber a mudança do seu papel, passa às tecnologias de informação a responsabilidade de "entregar" ao aluno a responsabilidade pelo seu aprendizado, liberando-se para ser mais um guia, um conselheiro, um parceiro na procura da informação e da verdade, aumentando assim a participação do aluno.
A motivação para a aprendizagem surge no aluno, de dentro para fora e, finalmente há o reconhecimento de que a aprendizagem permanente daqui em diante será uma tarefa constante na vida profissional e pessoal de todos. Cabe à escola capacitar o aluno para aprender qualquer assunto que lhe interessa. A ênfase estará nas competências múltiplas do indivíduo, no trabalho em equipe, na capacidade de aprender e de adaptar-se a situações novas.
No século XXI, os indivíduos precisarão desenvolver uma série de habilidades novas: autogestão (capacidade de organizar seu próprio trabalho), resolução de problemas, adaptabilidade e flexibilidade diante de novas tarefas, assumir responsabilidades e aprender por si mesmo e constantemente trabalhar em grupo de modo cooperativo e pouco hierarquizado. Há de se ter uma formação ao longo da vida. Isto significa que os sistemas de educação terão que expandir sua oferta de serviços, criando ofertas de formação continuada.
Para que se faça uma adequação nos sistemas pedagógicos, a integração de novas tecnologias de informação e comunicação, com ferramentas pedagógicas efetivamente a serviço da formação do indivíduo autônomo, se farão necessárias. Sem dúvida a Educação a Distância, por sua experiência de ensino com metodologias não-presenciais, pode vir a contribuir inestimavelmente para a transformação dos métodos de ensino e da organização do trabalho nos sistemas convencionais, bem como para a utilização adequada das tecnologias de mediatização da educação. Os educadores que pretendem lutar contra a exclusão social devem procurar adquirir uma nova cultura educacional, atualizando-se no uso de tecnologias de informação e comunicação, onde o professor é continuamente chamado a estabelecer múltiplas interações. (BELLONI, 2006)

Postura do aluno na EaD e a importância do tutor neste processo

Conforme Cortelazzo e Romanowski (2007, p. 17), considera-se que a diferença básica entre educação presencial e a distância está no fato de que, nesta, o aluno constrói o conhecimento – ou seja, aprende – e desenvolve competências, habilidades, atitudes e hábitos relativos ao estudo, à profissão e à sua própria vida, no tempo e local que lhe são adequados, não com a ajuda em tempo integral da aula e do professor, mas com a mediação de professores (orientadores ou tutores), atuando ora a distância, ora em presença física ou virtual, e com o apoio de sistemas de gestão e operacionalização específicos, bem como de materiais didáticos intencionalmente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados através dos diversos meios de comunicação. (2007, p.17)

Educação a Distância de alta qualidade, sem sombra de dúvidas requer interação aluno-tutor contínua e estimulante. A interação mediada entre alunos e tutor já provou ser um meio valioso para o suporte da aprendizagem e para o desenvolvimento das habilidades cognitivas. Os serviços de tutoria e apoio são fundamentais, especialmente se considerarmos o fato de que na EaD, o aluno será sempre estimulado a demonstrar habilidade de trabalhar sozinho e em grupos – até mesmo virtuais – e saber buscar apoio quando necessário. Cabe ao tutor acompanhar as atividades discentes, motivar a aprendizagem, orientar e proporcionar ao aluno as condições de aprendizagem autônoma.
O tutor deve estar atento para identificar os problemas relacionados à aprendizagem dos alunos; deve relembrar sempre os objetivos de aprendizagem a serem alcançados, bem como as etapas e o calendário e a serem cumpridos; utilizar os diferentes meios de comunicação (impressos, áudio, vídeo, informática); organizar alternativas diferenciadas de aprendizagem; estimular o aluno a analisar os problemas de forma crítica; incentivar e reconhecer as contribuições dos alunos; criar um ambiente de confiança e solidariedade, estimular o interesse pelas atividades; valorizar a experiência de cada um; mediar os conflitos e solucionar os problemas relacionados à gestão educacional fornecendo feedback e, assim, cumprir com os prazos definidos pelos diversos atores do processo de Educação a Distância. O tutor deve ter bem claro para si e para os alunos de que tem sim a consciência de que não é ele o detentor exclusivo do conhecimento, mas que é, antes de tudo, uma ponte para a fluência dos saberes em construção (GONZALEZ, 2005, p.85).

Para que o aluno tenha sucesso é necessário que desenvolva disciplina nos estudos, isto é, tenha uma rotina de estudos pré-estabelecida e busque apoio e orientação com os tutores, pois uma relação pedagógica conclama a uma construção cotidiana.

Aspectos necessários para o sucesso no estudo na modalidade de EaD

O sucesso do estudo na modalidade EaD se deve à interação de alguns fatores, a saber:

  • Relação tutor/aluno motivadora – pois a partir daí ficará mais fácil para o tutor empreender ações de apoio, reforço e orientações, adequadas e oportunas. Por sua vez isso fará com que o aluno se sinta realizado nos estudos;
  • Motivação e autoconfiança – são condições sine qua non no êxito dos estudos;
  • Diálogo e pesquisa – a educação aberta e à distância deve basear-se no diálogo e na pesquisa – isto implica que a educação seja centrada no estudante e reconheça sua autonomia. O diálogo deve ser estimulado, não apenas entre o tutor e o estudante, mas entre os próprios estudantes (através de grupos de estudo, encontros com tutor etc.) e entre eles e os contextos sociais onde vivem e trabalham. O diálogo pode ser encorajado através de materiais didáticos e tecnológicos que ofereçam aos alunos conhecimento, habilidades, idéias e valores de seu interesse e necessidades.

Relato de uma prática em tutoria de EaD

No início de nossa prática, percebemos que a tutoria na EaD abria um leque de possibilidades muito maior do que havíamos suposto, e também uma série de preocupações, as quais pretendemos compartilhar neste artigo.

A princípio, quando iniciam no curso, observamos a passividade dos alunos ainda dependentes do modelo presencial. E contrário ao que supõe a metodologia, estão sempre à espera de que os tutores resolvam todos os seus problemas, sem se darem ao trabalho de buscar todas as informações pertinentes por si mesmo.
Interessante ressaltar que nos cursos tecnológicos esta característica é muito menos evidente do que nos cursos de formação – na licenciatura e especialização. E neste caso, a própria estrutura do curso pressupõe uma carga muito maior de atividades práticas do que nos cursos de tecnologia.
Por vezes, reclamam sobre o acúmulo de atividades solicitadas e a falta de tempo para realização das mesmas – fato este que de certa forma é amenizado quando há harmonia entre os elementos do grupo na realização das atividades. Por vezes, reclamam da falta de responsabilidade e compromisso de alguns companheiros com relação à entrega das tarefas, o que pode vir a prejudicar o grupo na avaliação final.
Mas, à medida que o curso vai avançando, acabam compreendendo e se adequando à natureza das atividades, e aquela ansiedade inicial é extremamente reduzida. Aos poucos vão se organizando, de tal forma que na maioria dos casos o trabalho começa a fluir adequadamente, com aproveitamento de todos aqueles que se envolvem ativamente nas atividades.

No que se refere às funções administrativas da vida acadêmica, alguns poucos se mostram muito acomodados e dependente dos colegas. Relutam em aderir à rotina de ler os materiais que o professor regente disponibiliza no sistema antes da aula e normalmente o faz na hora de estudar. Ficam à espera de que o tutor comunique suas notas e o oriente no caso da necessidade de solicitar provas de recuperação de conceito ou de 2ª chamada. Estes aspectos estão sendo ressaltados no sentido de mostrar que a tão esperada autonomia tem se mostrado na maioria dos casos uma característica que o aluno vai adquirindo gradualmente – à medida em que o curso avança – , o que de certa forma é natural, considerando-se que a grande maioria dos alunos vem de um modelo de educação centrada no professor. A autonomia é uma característica que o aluno vai desenvolvendo dia-a-dia, no decorrer do curso.

Nos foros eletrônicos, nem todos participam com a seriedade que se requer de um programa de especialização e sentem falta de intervenções mais consistentes dos professores durante os foros coletivos. O modelo de aprendizagem desenvolvido com o uso do ambiente virtual de aprendizagem – AVA – ainda sofre alguns percalços no cotidiano das relações no campo virtual, no que se refere à interação das equipes, quando formada por elementos que não apenas os da própria Telessala. E os processos interativos, tão valorizados nesta modalidade, por vezes ficam prejudicados, pois é mais fácil e mais rápido trabalhar individualmente.

Apesar disto, procuramos incentivar a interação, apontando sempre para as tendências de globalização dos mercados. Incentivamos o uso das tecnologias, onde fica cada vez mais evidenciado o papel da afetividade e das emoções, tanto no campo virtual como na tutoria presencial. Os alunos precisam ser escutados em suas angústias e de obterem respostas assertivas e rápidas.

Procuramos ser companheiros, pacientes, ler nas entrelinhas, buscando sempre ser sensível às necessidades dos alunos. A interação permanente, estabelecida num clima de confiança e amizade, tem sido nossa grande responsabilidade, como forma de  garantir o sucesso do ensino através da EaD.

Considerações Finais

Diante do que foi exposto, pode-se concluir que a EaD é uma modalidade educativa que caminha para a democratização do saber, pois amplia oportunidades de acesso ao conhecimento, levando a educação a todos os cantos de um país com características socioeconômicas, políticas e geográficas tão distintas quanto o nosso.

Referências bibliográficas

BELLONI, M.L. Educação à distância. Campinas: Autores Associados, 2006.

FACULDADE INTERNACIONAL DE CURITIBA. CORTELAZZO, I. B.; ROMANOWSKI, J.P. Guia de orientação de curso. Curitiba: Ibpex, 2007.

MORAN, J.M.& cols. Novas tecnologias de mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000.

OLIVEIRA, V.B. (org.) Informática em psicopedagogia. São Paulo: Senac São Paulo, 1996.

PALLOF, R.M. & PRATT, K. Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço. Porto Alegre: Artmed, 2002.

GONZALEZ,M. Fundamentos da tutoria em Educação a Distância. São Paulo: Editora Avercamp, 2005.


[1] Graduado em Administração de Empresas com especialização em Matemática.

[2]  Bacharelado e Licenciatura em Psicologia com especialização em Psicopedagogia.

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