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Deficiência e inclusão social: construindo uma nova comunidade

O livro tem por objetivo evidenciar que o planejamento e os suportes oferecidos para a pessoa com deficiência proporcionam melhores condições para a inclusão social, com  autonomia e uma melhor qualidade de vida. Entretanto, as condições apresentadas para a inclusão permanecem distantes no Brasil de hoje. Isso porque as possibilidades de toda uma organização para o atendimento da pessoa com necessidades especiais, consoante proposto pelo autor, não corresponde até aqui à construção histórica de um conjunto de novas oportunidades concretas para que ocorra a inclusão.  
Oxalá essa obra incentive novas mobilizações para se promover a inclusão, com possibilidades reais de um acolhimento social. Outrossim, este livro destina-se principalmente a profissionais envolvidos com inclusão social e/ou escolar. Entretanto, pelas características de sua linguagem acessível e de simples compreensão, proporciona uma maior interação com os que se interessam pelo assunto, oferecendo um aprofundamento e enriquecendo efetivamente os debates acerca da inclusão.

O autor estruturou a obra em duas partes. Na primeira, expõe considerações teóricas importantes que fundamentam a segunda parte, na qual relata uma experiência de inclusão na comunidade.Logo na introdução, o autor oferece um breve panorama do que será tratado, destacando a idéia de “uma sociedade mais acolhedora”(p.18) em que as pessoas com algum tipo de desvantagem possam “contar com suportes para […] participar de forma igualitária em todas as atividades disponíveis aos demais cidadãos.”(p.18) Nesse prisma, a idéia de uma comunidade inclusiva, assume um caráter de importância ao longo dos demais capítulos, na medida que  aprofunda o conceito de suporte e o exemplifica, trazendo-o à dimensão realizadora.

Ao explorar questões relacionadas à sociedade e à deficiência, mencionando outros trabalhos, Correr afirma que os autores desses trabalhos “postulam que as relações estabelecidas entre sociedade e deficiência é que determinam a incapacitação, a desvalorização e a exclusão das pessoas com deficiência.”(p.26).  A seguir realiza um breve histórico sobre essas relações, destacando que, no decorrer do processo, a questão da inclusão social passou a ser associada ao princípio de qualidade de vida, cujo conceito significa “viver bem”. Para se chegar a isso, é primordial que durante o desenvolvimento, a pessoa com deficiência adquira habilidades para “manter uma vida social repleta de possibilidades e limites.”(p.32) Desse modo, torna-se importante o paradigma do suporte. Isso significa que o sujeito necessita de recursos(social, econômico, técnicos e instrumentais) para garantir a inclusão nas diversas áreas de convívio, comum a todos os cidadãos. Além disso, a idéia de suporte também envolve a necessidade de manifestação dos desejos do deficiente.

O paradigma do suporte é embasado na “constatação, o reconhecimento, a aceitação e o respeito à diversidade humana”(p.36). Na década de 80, tiveram início movimentos com o objetivo de proporcionar uma maior amplitude na rede de suportes, com vistas à inclusão da pessoa deficiente na comunidade. Isto significava capacitar a pessoa com deficiência para atingir uma autonomia com qualidade de vida, incentivando-a a atividades comuns da vida, buscando reduzir significativamente a segregação. Com isso, surgia também a idéia de ajustar os suportes ao ambiente, tornando-os adequados às necessidades especiais. Na década de 90, foi dada ênfase a esses suportes, atribuindo-se um caráter de significativa importância aos direitos de cidadania.

Dentre esses direitos, a inserção no mercado de trabalho assume o papel de condição fundamental para o desenvolvimento pessoal e garantir a qualidade de vida. Torna-se imprescindível então compreender como a comunidade pode ser envolvida na inclusão. Nessa perspectiva, o exemplo mencionado pelo autor, relativa a uma experiência ocorrida nos EUA, ressalta a importância da colaboração da comunidade  para que os suportes alcancem os objetivos de inclusão social. A experiência americana evidenciou a necessidade de a comunidade ser informada sobre atitudes a serem adotadas para a inclusão da pessoa com deficiência. Os papéis desempenhados pelos demais sujeitos da comunidade é que possibilitam a inclusão nas atividades de emprego, lazer e as outras atividades do cotidiano.

Dentre os suportes destacados pelo autor, temos a família cujas condições de vínculo e proximidade pode contribuir para o desenvolvimento da pessoa com deficiência, sobretudo ao proporcionar condições para que a ação da família seja efetiva. Para esclarecer melhor a questão do suporte, o autor relata uma experiência. Como sujeito, menciona o jovem Antônio, com quinze anos de idade, deficiente mental, com limitações para desempenhar atividades sociais. O autor também destaca um grupo participante (família, vizinhos e membros da comunidade), bem como um outro grupo, de profissionais (médicos, psicólogos, professores e outros), com vistas a prover suportes, num cenário de vida familiar e comunitária.

Dentre os comportamentos de Antônio, notava-se uma tendência ao isolamento no cotidiano, apresentando um quadro de passividade, irritabilidade, agravando-se ainda mais esse isolamento, quando compungido a executar tarefas na presença dos outros. Também não apresentava autonomia para utilizar transporte coletivo. Além disso, o lar em que Antônio cresceu, até os quinze anos, era inadequado para o seu desenvolvimento, considerado pelo autor como um ambiente com inconsistências no processo de educação(tolerância exacerbada, superproteção, exigência de habilidades etc).  Diante desse quadro, com o fim de planejar e implementar uma “comunidade acolhedora”(p.54), foram diagnosticados os contextos em que vive Antônio.

A partir daí, foi elaborado um planejamento juntamente com um grupo denominado norteador, formado por familiares, vizinhos, membros da comunidade e profissionais. Foi escolhido um desses sujeitos, denominado facilitador, e atribuiu-lhe a função de promover as ações planejadas.

A formação do grupo obedeceu alguns procedimentos para sua constituição e para o desempenho de atividades que a eles seriam conferidas. Depois foram identificados os suportes sociais e sua hierarquia a partir de mais próximas “sem as quais ‘a pessoa com deficiência não poderia viver’.”(p.64). No que concerne à comunidade, foram identificados os locais freqüentados por Antonio, as pessoas com a quais se relacionava e as atividades exercidas por ele. Buscou-se então tomar conhecimento das qualidades de Antônio, com vistas a identificar seus desejos e necessidades num momento subseqüente. A par do contexto, foi realizado um estudo envolvendo o futuro de Antônio quanto a moradia, a profissão e o lazer. Com isso, estabeleceu-se como objetivo a construção de um conjunto planejado de ações, que possibilitassem a criação de um contexto inclusivo e, para que isso ocorresse, foi necessário definir os suportes, a organização e implementação para que acontecesse a inclusão na comunidade e uma particularidade importante desse planejamento consistiu no caráter de flexibilidade, a fim de se atender a novas demandas.

Nas considerações finais, o autor comenta sobre as mudanças no comportamento de Antônio, especialmente na dimensão das relações sociais, à medida que buscava incluir-se no meio social. Nessa perspectiva, essa experiência proporciona condições para compreendermos que a inclusão da pessoa com necessidades especiais, constitui-se num processo sustentado por um planejamento, envolvendo também a comunidade, com um imprescindível caráter de acolhimento.

* CORRER, Rinaldo. Deficiência e inclusão social: construindo uma nova comunidade. Bauru: Edusc, 2003. 124 p. O autor é psicólogo e professor, tem se dedicado ao estudo da inclusão social de pessoas com deficiência. É representante do Conselho Regional de Psicologia CRP/SP no Conselho Municipal da Pessoa Deficiente em Bauru/SP. 

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