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O impacto do diagnóstico de câncer de mama e próstata em pacientes de idade igual ou superior a 60 anos

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Luiz Antonio Bernardes[1]

Lívia Renata Reis Valadão[2]

Vera Lúcia Carvalho Coutinho[3]

[1] Psicólogo, especialista em terapia comportamental e cognitiva pela USP e coordenador do setor de psicologia da Casa de São Rafael ([email protected]).

[2] Médica Geriatra.

[3] Psicóloga voluntária na Casa de São Rafael.

Trabalho apresentado no IV Congresso de Geriatria e Gerontologia de MG e na IX Jornada Mineira de Ciência do Comportamento.

O câncer (CA) engloba mais de 100 doenças diferentes, porém relacionadas. Elas são o resultado da multiplicação e do espalhamento descontrolados de células corporais formadoras de tumores, porém nem todos os tumores são cancerosos e levam a morte. Atualmente o alto índice de incidência e mortalidade caracteriza o CA como a segunda causa mortis no Brasil, superada apenas por problemas cardiovasculares e pela violência urbana. Dois fatores são possíveis de serem levantados para esse panorama e para a relevância deste trabalho, o aumento da expectativa de vida e propensão de pessoas com mais idade a desenvolverem o câncer.

A etiologia do câncer é algo ainda a ser descoberto. Várias explicações são dadas para seu desenvolvimento. Fatores como estilo de vida, vírus, mutações genéticas, hereditariedade e estresse são hipóteses levantadas para o risco de incidência. Essas teorias explicativas a cada dia apontam ainda mais para a interligação de fatores genéticos, comportamentais e psicológicos no desenvolvimento do câncer.

Kaplan (1997) afirma que, uma vez que a melhora no tratamento mudou a condição do câncer (de uma doença incurável para uma doença freqüentemente crônica e, muitas vezes, curável), os aspectos psiquiátricos do câncer (a reação tanto ao diagnóstico quanto ao tratamento) têm assumido crescente importância. Quando se trata de reações psicológicas dos pacientes que descobrem terem câncer é possível observar: medo de abandono e da perturbação nos relacionamentos, perda do funcionamento de papel (pai, provedor, trabalhador, entre outros) e da independência, problemas financeiros, negação, ansiedade, raiva, culpa, entre outros.

Acerca dos pacientes com câncer, Kaplan (1997) afirma que a metade deles apresenta transtornos psiquiátricos: 68% apresentam transtornos de ajustamento (reação mal-adaptativa em curto prazo, leigamente chamada de infortúnio pessoal ou psiquiatricamente chamada de estressor psicossocial), 13% apresentam transtorno depressivo-maior e 8% delirium.  A maioria desses transtornos pode representar supostamente uma reação ao fato de o indivíduo saber que tem câncer.

 Embora pensamentos e desejos suicidas sejam freqüentes em pacientes oncológicos, Kaplan (1997, p.720) constata que a incidência de suicídio real é apenas 1,4 a 1,9 vezes superior àquela da população em geral.

No que se refere aos tratamentos médicos contra o CA, as intervenções mais comuns são a radiação (radioterapia), as drogas (quimioterapia) e as cirurgias. No procedimento quimioterápico as drogas utilizadas durante o tratamento geralmente são tóxicas, quando administradas em dosagens tumoricidas, podendo ocasionar os chamados efeitos colaterais. Os pacientes submetidos a longos cursos de tratamento podem ter seu quadro agravado, sintomaticamente, pelo tratamento do que propriamente pela doença. O tratamento radioterápico pode apresentar efeitos colaterais como: náuseas, tonturas, dores de cabeça, sonolência, alterações de personalidade, perturbações cognitivas, sintomas físicos reativos de medo e depressão. O tratamento quimioterápico tem como principais efeitos colaterais as náuseas e os vômitos.

Falar de câncer é falar de doença e falar de doença não é possível sem se falar de saúde. A dicotomia saúde/doença será uma constante durante o texto e, para tratar do tema doença, é importante, a princípio, conceituar o que seja saúde. A OMS (Organização Mundial de Saúde) define-a da seguinte maneira:
 “Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade” (STRAUB, 2007, p.23).

Dessa forma, a saúde passa a vigorar não como ausência de doença física, ela passa a se alicerçar-se também em outros campos como a saúde psicológica e a saúde social. Descrever a saúde como ausência de doença limita seu âmbito. Atualmente aqueles que cuidam da saúde têm demonstrado interesses nas outras dimensões que produzem doenças, esses profissionais estrapolam o aspecto físico para entender o paciente. Procuram buscar fatores diretamente relacionados ao indivíduo que podem de alguma maneira interferir na causalidade e/ou na manutenção de sua doença.

Entender a saúde como a interligação de aspectos físicos, comportamentais, sociais e psicológicos, nos permite buscar o que favorece ou não um quadro de efetiva saúde. Assim fica inevitável não tratar do comportamento preventivo:
 “Qualquer conduta adotada por uma pessoa que se acredita saudável, com o propósito de prevenir doenças ou detectá-las em um estágio ainda assintomático ou precoce.” (Kasl, 1974 citado em Seidl & Gimenes, 1997, p. 260)

Algumas análises ao longo deste trabalho serão apresentadas e terão relação direta com o conceito acima. Se estilos de vida e estresse são teorias usadas para explicar a causa do câncer, é possível também entender que estilos de vida são capazes de evitar seu surgimento.

Os conceitos de doença, enfermidade e comportamento também serão necessários para este trabalho.

O conceito de comportamento irá se basear naquele utilizado por Analistas do Comportamento. Então, comportamento pode ser definido como a relação funcional entre estímulos, respostas e suas conseqüências, ou seja, a relação entre organismo e ambiente. Para entendermos melhor é preciso lembrar que tudo que não seja a resposta (uma ação que o sujeito faz) é, portanto ambiente – tanto interno quanto externo ao indivíduo (Matos, 2001). Qualquer análise feita por um Analista do Comportamento terá como objetivo identificar as variáveis relacionadas como a ação em si praticada pelo indivíduo, isto é, será preciso buscar as variáveis antecedentes quanto conseqüentes para aquela ação.

Starling (2001) apresenta uma diferenciação entre doença[1] e enfermidade[2]. O autor discute doença enquanto uma variável de estímulo, que pode ou não ser clinicamente aparente, excluindo os eventos que são decorrentes de fatores psicossociais. Quanto à enfermidade, ele a considerada como uma variável de resposta.

Considerando os conceitos antes expostos, é importante perceber que os problemas e dificuldades de uma pessoa serão sempre vistos através da forma como o indivíduo se comporta. Dessa maneira, a Análise do Comportamento procura buscar as variáveis de controle para o comportamento. A investigação para isso ocorrerá em três níveis de análise: filogenia, nível que investiga a história da espécie deste indivíduo (fatores genéticos), a ontogenia, que compreende sua história de vida e a cultura, neste caso referindo-se às práticas da comunidade maior na qual esse indivíduo está inserido e que são passadas de geração para geração.

O modelo biopsicossocial pode apreender o ser humano em sua totalidade. O sujeito, aqui, é contextualizado e seu comportamento é fruto de diversas condições que se entrelaçam. Entender o homem dessa maneira propicia um enfoque intervencionista dinâmico. A atuação se pauta na relação entre o comportamento humano e o ambiente. Nesse caso, o ambiente se torna o próprio selecionador de comportamentos mais adaptativos (modelo de seleção pelas conseqüências, derivado do modelo de seleção natural proposto por Darwin). Possivelmente, comportamentos que estejam presentes no repertório desses indivíduos, até mesmo aqueles entendidos como disfuncionais (exemplificando: comportamento de fuga/esquiva ao tratamento quimioterápico ou pensamentos e regras inadequadas quanto ao prognóstico) foram de alguma maneira, selecionados, ou seja, no seu processo de aprendizagem, tais comportamentos obtiveram algum tipo de sucesso e assim se mantiveram.

Quando se busca entender os aspectos sociais do câncer, é possível se deparar com condições como: o câncer geralmente entendido como uma doença fatal, trágica, de longo sofrimento, de desenvolvimento inicial invisível e compassado e de final avassalador porque se espalha, debilita e toma todo o corpo e suas funções vitais. A própria palavra câncer culturalmente é “proibida”, como se ao dar nome à “coisa”, fosse condição para atraí-la para si. Muitos indivíduos evitam, negam e até mesmo guardam segredo o fato de estarem doentes, porque o fato de ter câncer está associado a medo, sofrimento, dor, mutilação e morte. Modernamente, o padrão estético imposto não permite a exposição da diferença. São muitas as dificuldades encontradas no tratamento do portador de câncer quando este apresenta problemas relacionados às partes da estética e da sexualidade (mama, próstata, pênis, ovário, ânus, útero, ovário, pele ou rosto), e esta é a população que este trabalho pretendeu estudar.
 

Apresentação do levantamento

Este trabalho tem o objetivo de identificar alguns dos impactos do diagnóstico de câncer na população idosa cadastrada na Casa de São Rafael, instituição situada na cidade de Pouso Alegre/MG. Essa instituição visa a prestar serviços de apoio à população infantil diagnosticada com câncer. Essa população ainda é pequena e assim o trabalho tem sido estendido à população adulta com o mesmo diagnóstico. O apoio prestado caracteriza-se por fornecimento de cestas de alimentos, medicação, suporte fisioterápico, nutricional, odontológico, assistência social e psicológica (este é o único serviço estendido aos cuidadores). Para receber o apoio na instituição, a pessoa é entrevistada pelo serviço de assistência social e, em caso comprovada a carência, é encaminhado para os serviços de que necessita.

Durante os atendimentos individuais e grupais do setor de psicologia foi possível observar relatos que configuravam o diagnóstico de câncer como um momento aversivo, na maioria das vezes ocasionando mudanças drásticas na vida dessas pessoas. Com o objetivo de investigar os principais aspectos relacionados ao impacto do diagnóstico, foi feito um levantamento das mudanças ocorridas na vida do paciente idoso após o diagnóstico de câncer.
 

Metodologia

Para esse levantamento, foi elaborado um questionário com 11 perguntas fechadas, aplicado pelos autores. Como critério de seleção, determinou-se que a população deveria apresentar idade igual ou superior a 60 anos e diagnóstico único de câncer de mama ou próstata. Foram entrevistados 07 homens e 06 mulheres nos meses de abril e maio de 2007.

Resultados

Os resultados obtidos com o levantamento mostraram que as mulheres sentiram-se mais tristes (50%) e que os homens aceitaram mais (43%) o diagnóstico. As mulheres fizeram mais exames preventivos (67%) do que os homens (29%). Elas tiveram mais contato com pessoas que tinham a mesma doença (67%) em relação aos homens (43%). A idéia principal que tanto homens (71%) quanto mulheres (83%) tinham a respeito do câncer era morte. Tanto homens quanto mulheres relataram que a principal atitude da família foi de apoio (86% para os homens e 100% para as mulheres), e que a principal atitude dos amigos também foi de apoio (57% para os homens e 50% para as mulheres).

As principais mudanças negativas pós-diagnóstico para os homens se relacionam com a alteração do prazer sexual (57%) juntamente com a realização do tratamento e seus efeitos colaterais. Para as mulheres a realização do tratamento juntamente com os efeitos colaterais, ambos com 50%. A mudança positiva mais acentuada para os homens foi aproximação familiar com 71% e para as mulheres, ficaram com valores iguais (33%) novos amigos e benefícios (financeiros). Quanto aos principais efeitos colaterais, os homens responderam impotência e incontinência (43%); e as mulheres náuseas, vômitos e queda de cabelo (33%). Os homens mostraram-se mais pessimistas quanto a sua saúde futura (57%), enquanto as mulheres declararam preferir não pensar ou se declararam otimistas (ambos com 50%).
 

Discussão dos resultados

É possível observar, nos dados referentes à forma como homens e mulheres entendem o câncer, um quadro desfavorável quanto à concepção do que é o câncer e seu estágio atual de tratamento. É possível questionar a pouca difusão e evolução que os tratamentos para o câncer alcançaram nas últimas décadas. O CA ainda é considerado por essa população, uma doença sem volta. Fica clara aqui a importância do aspecto educacional como um favorecedor de mudança de comportamento. Os aspectos psicossociais do câncer podem contribuir para uma concepção equivocada do quadro atual de tratamento. Os sujeitos ainda se comportam (geralmente fugindo em detrimento ao enfrentamento) em relação ao câncer como há anos atrás, quando a doença ainda era sinônimo de morte.

Quanto a exames preventivos, comportamentos de evitação/fuga[3] são passíveis de discussão. Isto pode ser discutido em termos da forma como são os exames preventivos para esses cânceres. A mamografia e o exame de toque retal são considerados pela maioria dos pacientes como exames invasivos (invasores da privacidade), difíceis de serem feitos e muitas vezes dolorosos.  A falta de informação quanto à prevenção pode estar relacionada à baixa taxa de comportamento preventivo.

O comportamento de fuga/esquiva para o tratamento pode também ter como variável controladora, eventos encobertos (pensamentos) como regras disfuncionais (descrições equivocadas das contingências que estão atuando). Talvez mais oportunidades de acesso às informações sobre tratamentos e clareza de orientações por parte da equipe médica, possam contribuir para essa mudança, porém sempre iremos nos deparar com a história comportamental de cada indivíduo. O padrão atual de enfrentamento ou não de situações aversivas poderá nos contar como esses indivíduos fizeram ou fazem em outras contingências com a mesma função.

Tanto homens quanto mulheres demonstraram que a família e os amigos são estímulos reforçadores nesta contingência[4] (termo que pode geralmente ser interpretado como qualquer relação de dependência entre comportamento e ambiente ou entre eventos ambientais). Muitos deles relataram a diferença que faz pessoas significativas por perto durante esse período. Normalmente declaram sentirem-se mais tranqüilos quando alguém de sua confiança está por perto. O apoio social tem papel relevante no que diz respeito aos comportamentos de enfrentamento da doença. Uma família que apóia o paciente pode muitas vezes criar condições favorecedoras para o paciente oncológico consiga lidar melhor com todo o processo de adoecimento e de tratamento.

Homens e mulheres evidenciaram a importância do apoio social tanto no diagnóstico quanto durante o tratamento. Importância essa, principalmente porque o contexto de tratamento dessas pessoas geralmente é o SUS (Sistema Único de Saúde). O deslocamento entre cidades surge como uma condição aversiva não só pelo deslocamento em si, mas por suas variantes como horários das viagens, companheiros, estradas ruins, efeitos colaterais entre outros.

No que se refere a relatos de sentimento precisos, esse parece ser um repertório comportamental que os entrevistados não apresentaram. Os relatos não foram detalhados, sendo que apenas alguns dos entrevistados que detalharam seu estado emocional no momento do diagnóstico quanto pós-dagnóstico. Esses dados apontam para o que parece ser uma característica masculina, o não aprofundar em relato de sentimentos. Os entrevistados apresentaram-se mais diretos e objetivos que as mulheres. As mulheres durante as entrevistas mostraram-se mais disponíveis e mais detalhistas no quesito falar sobre sentimentos.

As respostas para a pergunta sobre as conseqüências aversivas teve respostas relacionadas à sexualidade mais preponderantes para os homens enquanto que para as mulheres, foram as relacionadas à estética. Aspectos esses que parecem diretamente ligados ao que diz respeito à identidade masculina e feminina.

A oportunidade de acompanhar um caso de câncer parece ter um diferencial na forma como homens e mulheres encaram a doença. Neste trabalho é possível observar que as mulheres apresentam mais respostas positivas para esta pergunta do que os homens. Cabe ainda perguntar em relação a este dado se ter contato direto com um doente, favorece ou não a aceitação quando se tem o mesmo diagnóstico? As mulheres se tornariam menos sensíveis ao desenvolvimento da doença? Os homens teriam mais dificuldades para entender o processo da doença pelo fato de não acompanharem outros casos? Respostas que só poderão ser encontradas apenas em outro levantamento.

Foi possível observar a partir dos dados que homens nomearam mais situações aversivas do que reforçadoras, diferindo das mulheres. Ficou claro a facilidade com que homens relatam suas dificuldades durante todos os estágios da doença, enquanto que as mulheres mesmo relatando suas dificuldades ainda assim, mostraram-se capazes de apontar conseqüências positivas da condição de paciente oncológico.

Dentre as conseqüências aversivas relatadas, a respeito dos efeitos colaterais, as mulheres nomearam mais efeitos físicos relacionados à estética enquanto que os homens relacionaram aqueles que diziam respeito à masculinidade, novamente podemos pensar na relação com processos de identidade do sujeito, enquanto homens e mulheres.

Interessante é quanto à perspectiva de futuro, homens apresentaram mais respostas pessimistas e mulheres preferindo não pensar. Outra vez, é possível observar comportamentos de fuga/esquiva. O reforçamento negativo gerado pelo comportamento de fuga/esquiva faz com que o indivíduo evite a estimulação aversiva (pensar no futuro) ao contrário de emitir respostas que possam ser reforçadas no futuro (aderir ao tratamento).

Muitas das respostas dadas às perguntas mostraram que os entrevistados apresentam um padrão de comportamento que pode ser caracterizado como contracontrole[5]. Padrão esse que se apresenta através de respostas de fuga/esquiva ao evitar ou negar a existência/contato direto com o câncer. O próprio diagnóstico caracteriza-se como estímulo aversivo que requer a emissão de respostas também aversivas e conseqüentemente gerando conseqüências aversivas. O sujeito ao se deparar com tal contingência pode engajar-se em comportamentos que visem anular/neutralizar a intensidade da estimulação aversiva gerada.

Uma alternativa para esse quadro poderia ser o estabelecimento de um programa de autocontrole, onde os sujeitos possam ser capazes de modificar e/ou controlar seu próprio comportamento através da manipulação de contingências imediatas em prol de contingências atrasadas. Seria criar condições para que comportamentos de baixa probabilidade de emissão se tornem possível, a exemplo tomar diariamente a medicação prescrita pelos médicos a fim de evitar nova incidência.
Skinner (1953/1974) apresentou uma alternativa valiosa para esse tipo de compreensão, quando fala que o sujeito pode alterar a probabilidade de uma dada resposta ser punida, manejando as variáveis da qual aquela resposta é função, o sujeito favorece a emissão de uma resposta incompatível e que seja reforçada. Seja no autocontrole intelectual ou ético, o que o sujeito faz é alterar as contingências e a partir daí extrair e aplicar novas regras.A grande dificuldade nesse caso está ligada aos conflitos gerados nessas contingências.

O conflito se caracteriza pela sinalização de conseqüências tanto reforçadoras quanto aversivas diante de tal resposta (tomar a medicação e passar mal, por exemplo). O papel do autocontrole é propiciar um novo curso de ação que favoreça respostas com conseqüências positivas (aquelas que aumentem a probabilidade de voltar a acontecer) em alta probabilidade e respostas com conseqüências aversivas em baixa probabilidade.O conflito básico de autocontrole surge em situações onde há oportunidade física para emissão de duas ou mais respostas, em alguns casos, para responder ou não responder. Isto acontece porque as contingências de reforçamento para a resposta de autocontrole são imprecisas, só ocorrerão no futuro enquanto que as contingências para o comportamento controlado possuem contingências mais específicas e imediatas. A importância do comportamento de autocontrole surge quando o reforçador a longo prazo tem certo atraso que não é suficientemente poderoso para que as respostas incompatíveis a curto prazo não sejam emitidas com grande freqüência.

Nico (2001) trata da diferença entre três tipos de manipulação de variáveis: solução de problemas, tomada de decisão e autocontrole, e distingue o autocontrole como sendo a única onde o indivíduo conhece antecipadamente o repertório a ser desempenhado e suas conseqüências.

Durante a discussão dos dados foi possível perceber que qualquer análise que seja feita de maneira unilateral não permite o entendimento da contingência estabelecida pelo diagnóstico de CA. É importante considerar que vários aspectos estão envolvidos neste momento, sejam eles psicológicos, físicos e sociais. O ser humano é todo o tempo multicontingenciado. Percebê-lo apenas fisicamente torna-o incompleto, podendo levar a intervenções inadequadas para o caso.

 
Considerações finais         

Este trabalho não tem pretensa, o de que seus dados sejam generalizados para a população idosa em geral, devido à sua pequena abrangência populacional, nem mesmo que tenha abordado todas as mudanças. Objetiva apenas elucidar o que acompanha o diagnóstico de CA. Pretende proporcionar reflexões a respeito do que é ser paciente oncológico, do que acontece quando se é e o que pode ser feito a partir de então. Cabe àqueles que lerem este trabalho investigar melhor a proposta aqui levantada e também propor novas formas de atuação. Perante o que foi considerado durante o texto é possível sugerir como atuação com essa clientela:

1. Estabelecer programas que visem em primeira instância promover a divulgação do câncer e a importância da prevenção;

2. Oferecer tratamento aos cuidadores, sabendo que muitas das vezes os que mais precisam de acompanhamento são eles. Os familiares geralmente são os responsáveis pelos cuidados do paciente e respondem a exigências cada vez maiores. A ansiedade e depressão dos membros familiares exigem intervenção ativa.
   
3. Encaminhar tanto paciente quanto outro interessado a qualquer serviço que se faça necessário dentro de uma instituição ou fora dela.

Após a apresentação dos dados e suas análises cabe pensar ainda qual é o papel da psicologia da saúde no tratamento do câncer. Entendemos que seja trabalhar em conjunto com as especialidades médicas a fim de promover comportamentos funcionais (pró-ativos) no ambiente de prevenção e tratamento de doenças, bem como o de melhorar o bem-estar e a qualidade de vida daqueles que dependem dos serviços destes profissionais.

Os dados podem validar os relatos até então observados dentro dos ambientes de consultório dessa instituição, o diagnóstico de CA influenciando de maneira significativa a vida dessas pessoas. É possível observar mudanças de natureza aversiva em maior escala que aquelas que foram nomeadas como positivas e este parece ser o momento em que essa população mais necessita de cuidados. Porém não é possível negligenciar a importância do comportamento preventivo, pois atuar apenas no âmbito curativo é parece ser ainda pouco.

     
Referências Bibliográficas
 
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[1] “… uma ruptura ou alteração na estrutura e/ou na função de alguma parte do corpo ou sistema determinada por estímulos biológicos que, devido a uma variedade de causas, pode persistir, avançar ou regredir (…)”.(p.272)

[2] “O conjunto de respostas de um indivíduo a um dado estímulo ou conjunto de estímulos, do ambiente interno ou externo, que a sua história comportamental e/ou cultural selecionou como respostas funcionais à discriminação da estimulação de variáveis biológicas potencialmente aversivas e/ou potencialmente reforçadoras”.(p.273)

[3] “Consideramos que um comportamento é uma fuga no momento em que um determinado estímulo aversivo está presente no ambiente, e esse comportamento retira-o do ambiente, … Já a esquiva é um comportamento que evita ou atrasa o contato com um estímulo aversivo, isto é, o comportamento de esquiva ocorre quando um determinado estímulo aversivo não está presente no ambiente, e emitir este comportamento (de esquiva) faz com que o estímulo não apareça, ou demore mais para aparecer.” (Moreira & Medeiros, 2007, p.66)

[4] Este termo pode ser descrito pela Análise do Comportamento como “a probabilidade de um evento pode ser afetada ou causada por outros eventos”. (Catania, C. (1993, p.368) In Souza, D.G. (2001)

[5] Emissão de respostas que visam controlar o comportamento do controlador, ou seja, daquele que dispõe as contingências, neste momento, caracterizado pela equipe médica, a família, etc.

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