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Considerações sobre a Erotomania

Palavras chave: erotomania, amor de transferência, transferência de resistência, transferência psicótica, critérios de analisabilidade.

Pretendo desenvolver nesse trabalho a temática da erotomania, a qual está presente, não de forma infreqüente, em algumas pessoas que passam por um processo de análise.

Damos início a esse desenvolvimento, citando Georges de Clérambault, que foi quem muito batalhou para que a erotomania fosse reconhecida como fazendo parte do contexto nosológico das psicoses passionais, e como se constituindo como uma erotomania pura. Durante o período em que ele procurava por uma diferenciação que fosse mais rigorosa entre as formas clínicas da psicose, Freud trabalhava nos textos referentes ao presidente Schreber, e localizava o termo erotomania como sendo uma simples ilustração para a sua teoria das relações entre a paranóia e a homossexualidade.

Muitos foram os trabalhos publicados sobre o tema da erotomania no período assim denominado pós-freudiano. Gostaríamos de citar o trabalho de J. Kestemberg, “A propos de la relation érotomaniaque”. Ressalta que, entre outras questões não menos importantes, a erotomania se constitui como uma tentativa de estruturação, e que ao se tentar abalá-la, corre-se o risco de ver surgir uma angústia de anulação( só existo,se confundido com o objeto!)

O que propomos agora é a análise de algumas questões:

= Uma vez que pode ser reconhecida uma singular aptidão da mulher para a erotomania, será que não seria justo solicitarmos à problemática referente à sexualidade, que nos apresente uma chave suplementar para a teoria do amor como delírio?

= No homem, costuma-se notar a erotomania como uma figura parcial presente num quadro clínico em que a paranóia, a debilidade, ou o desequilíbrio psicótico aparecem mais do que o tema erotomaníaco.

= Em relação à síndrome erotomaníaca, diremos que essa não oferece um campo privilegiado para que se faça um estudo comparativo da fixação passional e do amor de transferência. De acordo com alguns autores, o sujeito erotomaníaco questiona a análise na figura daquele que a representa como seu fiel depositário; questiona até mesmo a relação pessoal do psicanalista em relação à psicanálise.

A condição narcísica da mulher num estágio “pré” erotomaníaco é certamente precária, uma vez tendo falhado na situação edípica e apresentando pais incestuosos ou omissos, mães submissas, etc.

Segundo F. Perrier, tudo acontece como se devesse faltar na erotomaníaca “aquilo que” no corpo, como pequena coisa separável ou não, como objeto virtual, real, perdido ou invisível, pode ser lugar da simbolização do objeto parcial, como suporte da significância do desejo. Numa tentativa de explicação através de outras palavras, diríamos que tratar-se-ia de mulheres que não teriam passado pela fase fálica, a qual é comum estruturalmente tanto para meninos como para meninas.

Freud dividiu a transferência em positiva e negativa. A transferência positiva é aquela objetivada e onde o paciente colabora com a própria análise. Já a transferência negativa está dividida em transferência agressiva e transferência erótica.

Sabemos que esse último tipo de transferência, obstaculiza o processo analítico, e acaba assumindo uma concretude muito difícil de ser superada. Autores como por exemplo Horácio Etchegoyen, a denominam como sendo uma transferência psicótica. A(o) paciente volta seus impulsos libidinais em relação à figura do analista e diz ser a “ele” a quem ama. Num outro trabalho que escreví, utilizei como metáfora para essa situação, um jogo de futebol onde existem as traves e o goleiro, porém o goleiro (paciente) tem as exatas dimensões do espaço entre as traves. Nesse caso, convenhamos que fica “impossível” se marcar um gol (interpretação). Decorre dessa atitude do paciente, a necessidade do analista cuidar-se muito para não se sentir o real depositário dos impulsos libidinais. Por outro lado, como nos lembra enfáticamente Pierre Fédida, não podemos simplesmente “virar as costas” para o dizer do paciente, uma vez que essa atituide do analista seria sentida pelo paciente como uma "injúria ao seu amor".

Uma outra questão que se nos coloca a partir daqui, é a verificação dos critérios de analisabilidade, sem o que estaremos conduzindo uma análise que nunca deveria ter começado.

Além dessas considerações, temos que nos indagar "de que lugar" o(a) paciente nos fala, fazendo uso de sua demanda de amor. Em seu importante trabalho datado de 1914, "Introdução ao Narcisismo", Freud nos fala da sua "majestade o bebê". Um bebê,que no viés imaginário, seria o fiel depositário de todas as possibilidades libidinais e isento de toda a possibilidade de frustração. Essa impossibilidade de frustração o(a) acompanha,e na análise não poderia se conduzir de forma diferente. O complicador dessa situação, ocorre quando o paciente não pode simbolizar o analista em sua condição de metáfora de seus impulsos libidinais, assumindo este último uma condição de concretude completamente a-metafórica. Estaremos ingressando assim no terreno das "psicoses narcísicas", quadro grave e de prognóstico bastante reservado.

Bibliografia Auxiliar:

= Einrich Racker – “ Estudos sobre Técnica
Psicanalítica ”.

= Horácio Etchegoyen – “ Estudos sobre Técnica
Psicanalítica ”.
= Jean Laplanche – “ A Transferência ”.

= Pierre Fédida – Clínica Psicanalítica – Estudos.

= Tovar Tomaselli – Considerações sobre o amor de transferência sob as ópticas dos conceitos de narcisismo e pulsão de morte.(Instituto Sedes Sapientiae)- 1992.

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