Singelamente, tal conceito proposto por Hayes e colaboradores (cf. Hayes & Barnes, 1997) interpreta a ampla possibilidade humana de derivar relações verbais arbitrárias de outras relações derivadas. RTF prevê ainda vários tipos de relações possíveis entre os estímulos. Além de relações de igualdade, prevê relações do tipo maior que, menor que, acima de, abaixo de, mais e menos , etc. Quadros relacionais são definidos por três propriedades: implicação mútua, implicação combinatória, e transformação de função. Interessados poderão ler estes conceitos com mais detalhes em MOREIRA, TODOROV e NALINI (2006).
Compreender a temática dos quadros relacionais ajudará psicólogos clínicos à compreenderem como uma pessoa passa a condicionar um estímulo à outro psicopatologicamente, por exemplo: talco e farinha pela propriedade cor branca serem generalizados por um sujeito com transtorno obsessivo – compulsivo à contingências de contaminação, ler todas as placas de carro para evitar que aconteça algo de grave com o seu carro, usar cueca branca em toda reunião de negócios para trazer sorte e assim por diante, porque eu quero uma roupa diferente da dele, porque eu me sinto mais ou menos do que determinada pessoa. Ajudará psicólogos organizacionais a desvendarem questões de produtividade, motivação e desmotivação, ajudará a compreender como contingências de treinamento, coaching, qualidade de vida, cargos, salários, remuneração, organização e métodos, segurança e medicina do trabalho, serviço social, recrutamento e seleção, e outros subsistemas empresariais podem ser mais efetivos e melhores empregados no desenvolvimento organizacional. Ajudará psicólogos em qualquer campo que eles estejam: Hospitais, trânsito e transportes, ongs, forense, esporte, marketing, política e assim por diante.
Mais do que nunca o psicólogo analista do comportamento prova que traz consigo uma bandeira controvérsia ao mecanicismo, que dá conta de explicar, intervir e modificar pensamentos, sentimentos, emoções, sensações, etc. Inspirado nas aulas da Prof. Maria Martha Hubner (27/11 – Curso de especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva da USP), resolvi através de uma poesia provocar nos leitores como estes quadros relacionais estão nos afetando sem mesmo que estivéssemos sequer notando sua presença.
Luis Fernando Veríssimo
E tudo mudou…
O rouge virou blush
O pó-de-arroz virou pó-compacto
O brilho virou gloss
O rímel virou máscara incolor
A Lycra virou stretch
Anabela virou plataforma
O corpete virou porta-seios
Que virou sutiã
Que virou lib
Que virou silicone
A peruca virou aplique, interlace, megahair, alongamento
A escova virou chapinha
"Problemas de moça" viraram TPM
Confete virou MM
A crise de nervos virou estresse
A chita virou viscose.
A purpurina virou gliter
A brilhantina virou mousse
Os halteres viraram bomba
A ergométrica virou spinning
A tanga virou fio dental
E o fio dental virou anti-séptico bucal
Ninguém mais vê…
Ping-Pong virou Babaloo
O a-la-carte virou self-service
A tristeza, depressão
O espaguete virou Miojo pronto
A paquera virou pegação
A gafieira virou dança de salão
O que era praça virou shopping
A areia virou ringue
A caneta virou teclado
O long play virou CD
A fita de vídeo é DVD
O CD já é MP3
É um filho onde éramos seis
O álbum de fotos agora é mostrado por email
O namoro agora é virtual
A cantada virou torpedo
E do "não" não se tem medo
O break virou street
O samba, pagode
O carnaval de rua virou Sapucaí
O folclore brasileiro, halloween
O piano agora é teclado, também
O forró de sanfona ficou eletrônico
Fortificante não é mais Biotônico
Bicicleta virou Bis
Polícia e ladrão virou counter strike
Folhetins são novelas de TV
Fauna e flora a desaparecer
Lobato virou Paulo Coelho
Caetano virou um chato
Chico sumiu da FM e TV
Baby se converteu
RPM desapareceu
Elis ressuscitou em Maria Rita?
Gal virou fênix
Raul e Renato,
Cássia e Cazuza,
Lennon e Elvis,
Todos anjos
Agora só tocam lira…
A AIDS virou gripe
A bala antes encontrada agora é perdida
A violência está coisa maldita!
A maconha é calmante
O professor é agora o facilitador
As lições já não importam mais
A guerra superou a paz
E a sociedade ficou incapaz…
… De tudo.
Inclusive de notar essas diferenças
Conclusão
Como e em que momento determinada religião, determinados costumes, determinadas músicas, artes, atores, jogadores de futebol, empresas, marcas, comportamentos, manias, gestos, roupas, moda, tendências, hábitos, costumes, leis, políticas, crimes, matérias jornalísticas, relacionamentos, amizades, sites, jogos, bebidas, alimentos, livros, revistas, ônibus, rotas, viagens, fotos, lembranças, sentimentos, remédios, empregos, brigas, beijos, calçados e tudo o que vocês conseguirem imaginar atingem o mais alto grau de influência em nossas vidas e depois simplesmente somem ou são transformadas como discutido no início desta coluna?
Como e porque repertórios comportamentais são afortunados pelas mais diferentes, estranhas e inusitadas conseqüências que alteram a probabilidade futura de seu próprio comportar-se? Como discutir livre arbítrio, auto – controle, auto – motivação e outros termos desta natureza quando mais de 90% dos ícones presentes em um quadro relacional não depende do sujeito? Qual os desafios do psicólogo analista do comportamento ao considerar o fenômeno de quadros relacionais em suas analises, intervenções, tratamentos e promoção de saúde?
Em que contexto a exclusividade de ter o comportamento verbal traz complicações a espécie humana? Estamos preparados para toda influência das agências controladoras de comportamento (Escola, Família, Empresas, Mídia, Governo, Religião…), toda agência controladora traz malefícios? A conseqüência de ordem química e social que mantém uma pessoa fumando é a mesma que mantém a indústria de cigarros aberta gerando lucros às custas de óbitos por câncer? Como uma conseqüência afeta a outra? Se uma relação comportamental muda na China, como ela pode chegar a influenciar a nossa conduta?
Certamente não é possível, aliás é humanamente impossível ter controle sobre toda esta gama de relações, entretanto, compreendê-la como responsável multidisciplinar das relações comportamentais dá ao profissional analista do comportamento, olhares mais holísticos e portanto, compreensões e ferramentas de intervenções mais eficientes, visto que ao contratar um braço de trabalho, um homem com uma história de vida X, um quadro relacional Y, uma forma de pensar, sentir e agir inteira virá junto com ele, que ao se deparar com um diagnóstico psiquiátrico, um homem com uma história de vida X, um quadro relacional Y, uma forma de pensar, sentir e agir inteira virá junto com ele, que ao aplicar um teste de inteligência, terá dados de que um homem com uma história de vida X, um quadro relacional Y, uma forma de pensar, sentir e agir inteira virá junto com ele…e assim por diante….quem vos escreve teve uma história de vida X, um quadro relacional Y, uma forma de pensar, sentir e agir junto com ele…caro leitor, você tem uma história de vida X, um quadro relacional Y, uma forma de pensar, sentir e agir junto com você que lhe dará uma interpretação única, o que você fará com este conhecimento, as suas reações a ele serão únicos e assim por diante.
Bibliografia
Hayes, S. C., & Barnes, D. (1997). Analyzing derived stimulus relations requires more than the concept of stimulus class. Journal of Experimental Analysis of Behavior, 68, 235-270.
MOREIRA, Márcio Borges, TODOROV, João Claudio e NALINI, Lauro Eugênio Guimarães. Algumas considerações sobre o responder relacional. Rev. bras.ter. comport. cogn., dez. 2006, vol.8, no.2, p.192-211. ISSN 1517-5545.