Resumo: A terapia de grupo com enfoque analítico-funcional é uma experiência nova no tratamento da depressão. Este artigo argumenta que os princípios da Psicoterapia Analítico Funcional (FAP) ofereçam um leque de possibilidades para o tratamento de grupo da depressão. Método: Discute-se alguns aspectos do movimento feito pelas participantes de um grupo em relação com os princípios da FAP. O material colhido durante as sessões ilustra que a valorização dos indivíduos como participantes ativos dentro do grupo oferece oportunidades de desenvolver novas maneiras de interagir, de trabalhar com outros e de estar juntos. Isso torna o grupo um ambiente propício ao tratamento da depressão por oferecer contingências interpessoais que são fundamentalmente similares com aquelas com as quais a pessoa depressiva não consiga lidar no seu cotidiano.
Palavras chaves: depressão, grupo, FAP, relação interpessoal
Abstract: Functional analytic group-psychotherapy is a new experience in the treatment of depression. The article argued that the use of the principles of Functional Analytic Psychotherapy (FAP) greatly enhances the possibilities of group therapy for the treatment of depression. Method: Aspects of the changes participants of a group went through are discussed and related to the principles of FAP. The material gathered during sessions illustrates how valuing individuals as active group participants opens up opportunities to develop new ways to interact, to work with others and to be together. This makes a group into an ideal environment for treating depression, because it offers interpersonal contingencies that are fundamentally similar to those the depressed person has problems dealing with in his or her daily life.
Keywords: depression, group, FAP, interpersonal related
Da depressão à dinâmica de grupo.
A clínica comportamental da depressão nutriu-se de diferentes perspectivas, passando pela terapia comportamental clássica, a terapia cognitiva e a psicoterapia analítica funcional (FAP). Em diferentes momentos, diferentes aspectos. Seguindo a divisão tradicional do desenvolvimento da terapia comportamental em três ondas (Hayes, 2004), podemos resumir alguns aspectos de cada teoria. A primeira onda, chamada de terapia comportamental clássica, considera que a depressão é o resultado de aprendizagem problemático. Nas primeiras versões da teoria foi proposta, entre outros, uma vulnerabilidade biológica em pessoas emocionalmente instáveis e introvertidas para, quando são expostos a ambientes que propiciam condicionamento de respostas emocionais como culpa, e atitudes de apatia, desenvolvem neuroses depressivas (Eysenck & Rachman, 1965). A segunda onda, conhecida como terapia cognitivo-comportamental, a terceira, representada pela análise clínica do comportamento, à qual pertence a Psicoterapia Analítico-Funcional (FAP), enfatizaram noções diferentes.
O modelo cognitivo da depressão de Beck (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997) descreve a tríade negativa que consiste em: 1 – Visão negativa de si mesmo. A pessoa deprimida se percebe inadequada, incapaz, carente ou incapaz de cuidar de si mesma. 2 – Visão negativa do presente. O mundo perde o significado ou é um lugar desolado. 3 – Visão negativa do futuro. Nada vai mudar e não há planos para o futuro.
As pessoas deprimidas, segundo os autores acima, fazem distorções cognitivas na percepção e no processamento de informações. Na depressão, essas distorções caracterizam-se como uma estruturação das experiências do indivíduo de uma forma absolutista, moralista e invariante. O tratamento cognitivo insiste numa exploração colaborativa dos pensamentos automáticos negativos, das distorções cognitivas e dos esquemas subjacentes, que são considerados os elementos causais da depressão. Trata-se de uma reestruturação da maneira de pensar e das crenças fundamentais do paciente.
No formato de grupo, indica White (2003a), essa reestruturação cognitiva acontece por intermédio de compartilhar seus registros de pensamentos com os demais participantes do grupo de forma seletiva como um meio vívido de se referir a uma experiência fora do grupo. Além de ensinar aos participantes uma linguagem clínica em comum, o que vai facilitar o entendimento e a comunicação. O registro de pensamento automático é utilizado regularmente na lição de casa durante todo o tempo do tratamento. Ela prova ser útil quando os participantes estão enfrentando pensamentos ou sentimentos problemáticos. É também útil o registro de pensamento na terapia em grupo enquanto experimentam novas respostas adaptativas para prestar bastante atenção ao processo cognitivo, ao mesmo tempo em que colocam em prática essa experiência diferente.
Uma outra forma de reestruturação cognitiva, segundo White (2003a), é pela contestação dos pensamentos e, em especial, aqueles associados a comportamentos mal adaptativos. E pode ser feito buscando as evidências contra ou a favor. Ou ainda perguntando: será que existem outras maneiras de olhar para a mesma situação? Esta é a única conclusão a que podemos chegar? Alguém no grupo também já vivenciou algo semelhante como foi sua experiência? White sugere que num primeiro momento o terapeuta toma a frente da contestação, mas, no decorrer do tratamento, os pacientes aprendem cada vez mais como fazê-lo de sua própria maneira, dentro e fora da sessão.
O grupo terapêutico é muito adequado para se trabalhar as crenças. Quando as crenças condicionais vêm à tona, pode-se estar observando se são válidas ou não. Ajuda os pacientes a tomar consciência das hipóteses que estão formando, se são válidas ou não. Por exemplo, uma cliente que tinha medo de ser rejeitada pelo grupo caso ela falasse o que realmente sentia, poderia ser incompreendida e rejeitada, isso foi discutido no grupo e ela teve a oportunidade de se expressar e testar a validade de sua hipótese. No grupo, o processo de reestruturação de crenças favorece ao paciente conferir uma experiência dos resultados positivos e imediatos (White, 2003a ).
Sobre as lições de casa, na TCC em grupo para a depressão é incentivada, mas não exigida, diz White (2003a), que afirma sua importância com base no fato de que ela ajuda as pessoas a melhorarem mais rápido e porque compartilhar as experiências ajuda a todos no grupo. Cada participante no grupo define a lição de casa que será relevante para seu progresso em terapia e o que precisa ser praticado e aprendido e é comum que a lição de casa surge da escolha individual de algum aspecto da resposta adaptativa gerada pelo grupo, e da decisão de como aplicá-la em sua vida pessoal na semana seguinte. É importante que os participantes do grupo no final da sessão terapêutica sugiram qual será a próxima tarefa, isso os estimula positivamente. White aponta que assim modela-se uma disciplina saudável baseada na iniciativa, o que geralmente falta numa vivência depressiva.
Na visão analítico-funcional da depressão, segundo Garcia, Aguayo e Montero (2000), os clientes depressivos apresentam déficits em habilidades sociais que os levam com mais freqüência ao fracasso. O baixo nível de reforçamento social mantém a depressão. As pessoas deprimidas apresentam forte resistência à mudança. E, considerando que a depressão não é um fenômeno unitário, portanto, merece uma explicação pluricausal. Para considerar essas diferentes hipóteses, uma terapia de grupo analítico-funcional deve oferecer um universo dinâmico de experiências e oportunidades interpessoais. Assim, a abordagem prática da terapia cognitivo-comportamental de grupo é mantida, mas reinterpretada a partir de uma visão analítico-funcional, acrescentando o intenso trabalho com relações interpessoais da FAP.
A relação interpessoal tornada terapêutica.
No modelo cognitivo-comportamental de White (2003b), uma tarefa fundamental do terapeuta é manter a coesão do grupo. Essa tarefa se inicia com a seleção dos participantes do grupo. Os autores dizem que é a força social em um grupo que permite aos participantes tolerarem as diferenças e desacordos existentes.
Considerando que a depressão é caracterizada por imobilidade e isolamento social, buscar um grupo já pode significar um primeiro passo para a mudança. Pode restabelecer o compromisso da responsabilidade consigo e com o outro. Entrar num grupo possibilita a retomada de habilidades e sentimentos perdidos no percurso da vida, o interesse pela vida e a assumência de novos papéis e da valorização dos mesmos.
A FAP faz parte da terceira onda de terapias comportamentais. Assim, é indiretamente herdeira da terapia comportamental clássica e da terapia cognitivo-comportamental. Ela aceita a possibilidade que as hipóteses etiológicas de outros modelos se aplicam a um determinado paciente depressivo, mas as reconsidera em termos de controle verbal e modelação por contingências. Assim, por exemplo, as táticas da terapia cognitiva podem ser usadas de uma forma alternativa, a partir de uma análise do comportamento verbal que constitui as trocas interpessoais na relação terapêutica (Kohlenberg e Tsai, 2001). A FAP procura promover a mudança na vivência de uma relação terapêutica intensa e íntima que ofereça oportunidades de aprendizagem direta com a experiência.
As estratégias da FAP são os esforços do terapeuta de promover, ao longo da terapia, maneiras curativas de o cliente vivenciar a relação terapêutica. São elas que definem a FAP como abordagem distinta da terapia comportamental clássica e da terapia cognitivo-comportamental. Um exemplo é a organização da estrutura e do conteúdo das sessões de tal forma que facilitem a emissão de comportamentos clinicamente relevantes. Outra estratégia constante da FAP é a promoção de comportamento novo do cliente no seio da relação terapêutica, sempre considerando essas mudanças na luz da análise que o terapeuta faz das outras relações significativas do cliente. Essas estratégias são concretizadas por intermédio de uma variedade infinita de táticas que são relacionadas com os alvos terapêuticos da sessão. Exemplos de táticas são propor um objetivo concreto para um certo cliente, dar ou cobrar uma tarefa de casa, oferecer ou pedir crítica, oferecer interpretações da linguagem corporal do cliente. É nas táticas que pode se expressar a criatividade do terapeuta. Num nível de análise mais concreta ainda, as táticas podem ser analisadas num número limitado de técnicas típicas, funcionalmente definidas. As técnicas são maneiras habituais de trabalhar momento a momento. São a evocação de comportamentos clinicamente relevantes; o reforçamento; a extinção; a descrição de relações entre comportamentos, pensamentos e sentimentos; o bloqueio de fuga ou esquiva; a apresentação de estímulos discriminativos.
Do ponto de vista da psicoterapia analítica funcional, o grupo é um ambiente interessante para o tratamento da depressão porque possibilita um leque de contingências que são funcionalmente similares com aqueles que, no cotidiano, mantêm o contexto depressivo. Ele evoca comportamentos interpessoais, sentimentos problemáticos e comportamentos verbais (crenças e pensamentos), que podem ser trabalhados ao vivo (Vandenberghe, 2003). O grupo possibilita assim o reforçamento natural de melhoras ao vivo e a quebra de padrões interpessoais implicados no quadro depressivo.
Relações íntimas, por definição, envolvem uma sensibilidade aos efeitos do comportamento de uma pessoa sobre outra pessoa. Como Kohlenberg e Tsai (2001) enfatizam, ter dificuldades em relacionar-se com intimidade é um problema comumente apresentado dentro do consultório.
Na visão analítico-funcional, sentimentos são efeitos de contingências interpessoais. Por isso, deve-se entender e trabalhar os encobertos em termos de relações entre pessoas. A psicoterapia, desse ponto de vista, trabalha o que realmente acontece entre o terapeuta e o cliente como pessoas. Ela focaliza a subjetividade por intermédio do jogo da relação terapeuta-cliente. Isto significa que o terapeuta também se vulnerabiliza e não se coloca como o detentor do saber, mas como aquele que desembarcou na viagem de descoberta junto com o grupo.
Para criar uma terapia de grupo analítico-funcional, repetimos para o processo de grupo a mesma análise que Kohlenberg e Tsai (2001) fizeram para a psicoterapia individual. Na terapia analítico-funcional de grupo, o contexto em que os comportamentos clinicamente relevantes podem ocorrer é estendido para o jogo da relação entre todos os participantes. A situação de grupo evoca, em cada participante, sentimentos, pensamentos e ações em relação não só ao terapeuta, mas também aos demais clientes (Vandenberghe, 2003). Considerando que nosso comportamento é modelado pelas contingências do cotidiano e essas contingências são ao menos parcialmente resultado do nosso comportamento, temos numa terapia em grupo um contexto favorável para trabalhar uma diversidade de padrões clinicamente relevantes.
Os comportamentos clinicamente relevantes podem ser facilmente observados e/ou evocados em grupo e várias vivências podem ser usadas como táticas para explorar sentimentos. Observou-se, nesse grupo, a expressão de sentimentos pelo contato com situações que iam contra a estratégia da cliente. A terapeuta introduziu vivências para expressão de sentimentos, para promoção do toque e afetividade por serem estas algumas das dificuldades do grupo.
Uma das causas para as dificuldades dos clientes em expressar sentimentos provavelmente seja que eles podem não saber como se sentem porque nunca aprenderam a discriminar seu mundo privado ou escutar seus corpos. A ausência da expressão pode também resultar de repreensão em numerosos contextos. Quando criança, expressões de sentimentos podem ter sido punidas pelos pais por serem inconvenientes ou porque os perturbam.
Na vida adulta, a cultura estabelece proibições para a demonstração de emoções negativas. A pessoa pode aprender que, expressando seus sentimentos, se torna vulnerável para reações arbitrárias dos outros. Demonstração significa que a pessoa "está fora de serviço" e não está atendendo à tarefa que lhe foi designada. Essa é uma avaliação de sociedade, em que o individuo deve ser antes de tudo capaz e eficaz, respondendo às tarefas que lhe foram delegadas pela família, pelo trabalho. Quando a expressão de sentimentos é punida, as condições que evocam respostas emocionais tornam-se facilmente aversivas e evitadas.
De acordo com a FAP, trabalhar diretamente com emoções evocadas por lembranças é importante, pois o problema fundamental produzido por um trauma passado é que os estímulos presentes que nos lembram do trauma são evitados (Kohlenberg e Tsai, 2001). Uma tática com que se procura quebrar a esquiva é o exercício de visualização, que visa o ver na ausência do objeto concreto. Este visualizar é um operante. Caso haja uma história de punição, ou se o contato com lembranças visuais não foi reforçado positivamente, o ver operante não ocorrerá. Em tais situações, a terapeuta poderá facilitar um lembrar por aproximação.
Lembrando-se de situações aversivas, de acordo com Kohlenberg e Tsai (2001), o cliente pode aprender com as vivências com os quais ele não entrou em contato até agora. Em outras palavras, ele pode compreender essas vivências passadas de forma que possam ajudar a melhorar a qualidade da sua vida atual. A lembrança pode também promover novas experiências que permitam a aprendizagem de novos comportamentos.
No grupo, o contato com experiências passadas possibilita ao terapeuta observar as reações de cada participante durante o processo de visualização e como estes implicaram as interações subseqüentes no grupo, para tentar facilitar a construção de significados novos e mais produtivos de experiências particularmente aversivas.
Trabalhou-se com a expressão de sentimentos provocados por estímulos privados e não apenas por estímulos públicos. A intenção foi que os participantes conseguissem perceber os sentimentos e descrevê-los, como reações a condições de vida, o que favoreceria a construção de uma perspectiva de observador, promovendo a capacidade de um distanciamento compreensivo (Hayes e Gregg, 2002; Hayes, 2004). Tal tomada de consciência de sua própria perspectiva (Kohlenberg e Tsai, 2001) é compreender que padrões de ação, pensamentos e sentimentos que temos não são nossa essência, mas conteúdos e comportamentos que passam por nós e que podemos observá-los a partir de um distanciamento psicológico, sem nos sujeitar a eles.
Formulação FAP do grupo.
De modo geral, as mulheres do grupo apresentavam dificuldades de relacionar-se socialmente. Se não concordavam com alguma opinião ou declaração, mantinham-se em silêncio – algumas contraíam tanto o corpo que pareciam crianças assustadas. Elas relataram histórias permeadas de raiva, culpa, ressentimentos ou medo, acharam difícil contatar amizades antigas ou formar novos vínculos. Em seu cotidiano, dominavam decepções e frustrações nos relacionamentos com namorados, maridos, mães, pais.
Paradoxalmente, elas buscavam nessas pessoas a segurança, proteção e validação de seus comportamentos e sentimentos. Queixavam muito da falta de reconhecimento das pessoas próximas por sua obediência e silêncio. Choravam muito e cada vez mais se isolavam. Seus projetos pessoais ficavam cada vez mais distantes. As famílias promoveram esses comportamentos com frases do tipo "Melhor ficar sozinha que mal acompanhada", "Não se deve mesmo confiar nas pessoas", "Não falei que estava procurando mais problemas", "É melhor ficar no seu canto".
Falar sobre seus sentimentos parecia aversivo. Elas se sentiam abandonadas, traídas ou não amadas. Elas assumiam culpa pelos sofrimentos dos demais e percebiam as relações interpessoais muito como unilaterais, determinadas por um dos participantes. Elas não apresentavam confiança ao tatearem suas emoções e sentimentos e estavam sempre buscando afirmação por outros. Sustentavam-se em regras culturalmente transmitidas e erroneamente adaptadas a suas vidas.
CCRs1 do grupo.
Alguns CCRs1 foram muito freqüentes entre as participantes. O grupo começou apático. A maioria sempre esperava que a terapeuta tomasse a iniciativa e dissesse o que deveriam fazer. Inicialmente, não buscavam contatos, não trocavam telefones entre si no grupo, reclamavam que não tinham com quem falar. Evitavam falar de seus desejos ou projetos. Quando entravam em contato com situações que provocavam sofrimento, ficavam inquietas, agitadas, assustadas e não escutavam o que as colegas ou a terapeuta estavam falando. Comportavam-se como se fossem incapazes de cuidar de si mesmas. Algumas não se percebiam responsáveis pelas suas falas e atitudes e outras assumiam responsabilidades exageradas.
Alvos para o grupo como um tudo.
Permitir que elas se organizassem em função de seus projetos para o futuro. Tomar iniciativa, abrir-se para novos relacionamentos, arriscar-se mais, enfrentar situações desagradáveis, observar suas sensações corporais e aceitar seus sentimentos. Falar francamente sobre o que estavam sentindo e pensando. Aceitar críticas e verificar se realmente valem para si. Vivenciar que assumir responsabilidades pode provocar ansiedade e levar a ganhos. Aceitar e assumir suas carências e as suas diferentes experiências. Tolerância de sensações e emoções sem tentar de controlar suas respostas.
As táticas terapêuticas foram desenvolvidas em função do crescimento do grupo, com a intenção de favorecer relações interpessoais mais variadas e incluindo mais reforço positivo. As componentes do grupo notaram como elas estavam responsáveis pelo que lhes acontecia no grupo. Serem capazes de observar, descrever e interpretar seu próprio comportamento.
Táticas.
Táticas da terapeuta que podem ilustrar o trabalho no grupo incluem: (1) Contar com a participação do grupo para organizar a agenda da sessão. A terapeuta afastou-se em vários momentos do comando da terapia e deixou que o grupo se organizasse e direcionasse.
(2) A terapeuta diretamente instigou participação social, abertura, aproximação em relação aos membros do grupo (promover intimidade). Ela favoreceu que as participantes se vulnerabilizassem, relatando como se sentiam. Dramatizações com a troca de papéis e relato de como cada uma se sentia no lugar da outra eram outras táticas que serviam aos mesmos alvos. Ela pediu ajuda pelas dificuldades apresentadas pelas colegas e valorizou a colaboração espontânea entre participantes e o compromisso com o grupo.
(3) A terapeuta não permitiu conselhos protetores e favoreceu espaço para a crítica, para deixar às participantes a oportunidade de aprender e enfrentar situações aversivas de maneira direta e construtiva.
(4) Quando uma participante assumia o papel de sofredora, às outras participantes sempre foram pedidas para que manifestassem seus sentimentos e suas percepções em relação a tais comportamentos, para que ela pudesse entrar em contato com o efeito que este papel teve sobre as outras pessoas.
(5) Escolheram-se táticas que permitissem que cada uma das participantes assumisse responsabilidades e tomasse iniciativas. Mostrou-se que, ao vulnerabilizar-se, a pessoa pode tornar-se mais forte. Proporcionaram-se situações favoráveis à expressão de sentimentos positivos, contrapor algumas de suas opiniões, e interferiu-se cada vez que alguém começou ‘pisando em cascas de ovos', implicando implicitamente que uma certa colega seria frágil demais para poder ouvir uma certa verdade.
Fragmento de sessão
A mais velha das participantes não interagia nem se expressava adequadamente quando solicitada. Quando a terapeuta ou qualquer outra participante tentava envolvê-la, ela falava coisas apenas do seu interesse. Em tal momento, "S" começou a rir.
T. – "Aconteceu alguma coisa?"
"C" – "Não agüento mais ouvir "A" falar, fico sempre pensando, agora ela vai conseguir falar de forma coerente. Mas não, parece que nada muda, nada desperta reação diferente, está sempre com esse sorriso, me incomoda muito. A terapeuta pergunta uma coisa e ela responde contando a história dela que às vezes não tem nenhuma ligação com o assunto que estamos falando."
T. – A "A" te lembra alguém lá fora?"
"C". – "Ela me lembra minha mãe. Ela não muda, está sempre reclamando ou então fica calada, me sinto cobrada por ela, parece que estamos disputando alguma coisa. Mas ela não consegue ser carinhosa, cuidadosa com os filhos, nós é que temos de cuidar dela. Estou realmente cansada disso."
T. – "Você já conversou com ela sobre esse seu sentimento?"
"C." – "Não, não tenho coragem."
T. – "Agora que você falou sobre o seu sentimento, como você se sente?"
"C." – "Estou bem, eu gosto muito de ‘A', mas ela cansa muito a gente. Quando ela começa a falar, eu penso: ai meu Deus, é agora! Parece que ninguém consegue prestar atenção no que ela está falando, faz uma confusão…"
T. – "Será que é isso mesmo que as outras pessoas sentem?"
Algumas afirmaram. Outras falaram que não se importavam e que entendiam "A".
T. – "'A', como você está se sentindo depois de ouvir esses comentários?"
"A" – "Eu não me importo, eu acho que estou bem melhor depois que comecei a terapia. Estou fazendo coisas que antes não fazia. Estou sendo aprovada no teste do Detran para tirar minha carteira e isso é muito bom para mim. Eu vejo que estou crescendo."
Este foi um momento em que o grupo pôde perceber que, mesmo ficando ansiosa, expressar o que se sente e pensa não significa afastar as pessoas. A "S" se sentiu aliviada, aceita pelo grupo e O. não se sentiu ofendida e continuou gostando de "S".
Conclusão:
Com base nas estratégias gerais da FAP, foram utilizadas táticas que permitissem que cada uma das participantes assumisse responsabilidades e que enfrentasse situações aversivas. Foram proporcionadas a elas oportunidades de aprendizagem ao vivo. As participantes gradualmente desenvolviam novas táticas de enfrentamento, tanto no grupo como fora dele.
Em algumas situações, o foco centrava mais em um ou em outro membro do grupo, sem perder de vista o desempenho do grupo. E, a cada sessão, os participantes podiam estar definindo seus objetivos, atividade que era acolhida como melhora, já que pessoas deprimidas não conseguem ou têm dificuldade de estabelecer objetivos. Pôde-se observar que as participantes do grupo chegaram a interagir entre si, trocar telefones e se comunicar fora da psicoterapia. Houve momentos de discordância clara de participantes com algumas atitudes da terapeuta. Quando vieram de mulheres cujos problemas eram relacionados com submissão e passividade excessivos, os protestos foram também acolhidos pela terapeuta.
Passaram a depender menos da terapeuta na organização da agenda para a sessão e a ampliar também as intervenções nos casos das outras participantes, se sentiam mais seguras quanto a suas atitudes e comportamentos.
Assim, a partir do relato do trabalho com um grupo de oito mulheres depressivas, este artigo propõe possíveis contribuições da FAP para a terapia de grupo. Espelhando-se nas linhas diretrizes da FAP, promoveu-se a relação genuína e intensa entre as participantes do grupo (incluindo pacientes e terapeuta), permitindo-se a vulnerabilidade emocional, a expressão de sentimentos e a construção de intimidade na relação interpessoal. A experiência com este grupo mostrou que a relação interpessoal tornada terapêutica constitui uma oportunidade excelente de aprendizagem ao vivo.
Referência bibliográfica
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