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Discriminação e Generalização de Estímulos Temporais – Ana Catarina Castro

A sobrevivência dos organismos no mundo natural depende, por um lado, da emissão em situações novas de comportamentos já aprendidos e, por outro lado, da emissão de diferentes comportamentos em diferentes contextos. Estes fenómenos envolvem, respetivamente, processos de generalização e discriminação de estímulos.

O estudo destes dois processos começou cedo na história da psicologia, com relatos pioneiros de Pavlov e seus colaboradores, anteriores a 1910. No entanto, a primeira produção experimental e empírica de gradientes de generalização foi feita por Guttman e Kalish em 1956 (com a dimensão do comprimento de onda da luz). Este estudo teve como repercussão principal orientar o interesse dos psicólogos para o estudo da natureza e dos determinantes dos gradientes de generalização. Gradientes de generalização foram intensamente estudados em diversas dimensões do estímulo como, por exemplo, frequência do som (Jenkins e Harrison, 1960), intensidade do som (Thomas e Setzer, 1972), orientação de uma barra (Butter, 1963), intensidade da luz (Pierrel e Sherman, 1960; Heinemann e Chase, 1970; Ernst et al., 1971) e tamanho de um objeto (Grice e Saltz, 1950; Jenkins et al., 1958).

No entanto, poucos estudos sobre generalização foram realizados utilizando a duração/tempo como propriedade relevante dos estímulos. Depois de Reynolds e Catania (1962) terem produzido os primeiros gradientes de generalização temporal, apenas quatro outros estudos utilizaram procedimentos adequados ao estudo deste processo (Elsmore, 1971; Mellgren et al, 1983; Spetch e Cheng, 1998; Russell e Kirkpatrick, 2007), tendo os gradientes obtidos revelado formas diferentes. Admite-se que questões relativas aos procedimentos, que variaram entre estudos, possam ter sido responsáveis pelas diferenças obtidas.

Outros estudos na área da regulação temporal do comportamento, que têm utilizado uma tarefa chamada dupla bissecção temporal (Machado e Keen, 1999), têm produzido um resultado importante, denominado efeito de contexto. Neste procedimento, pombos aprendem duas discriminações temporais. Na presença de um disco vermelho e outro verde, é correto escolher vermelho após estímulos de 1s e verde após estímulos de 4s. Na presença de um disco azul e um amarelo, azul é correto após 4s e amarelo após 16s. O efeito de contexto, que tem sido interpretado com base no modelo LeT (Machado, 1997; Machado & Cevik, 1998), refere-se ao seguinte resultado crítico: quando, num teste posterior, os pombos têm de escolher entre verde e azul, a preferência pelo verde aumenta com a duração do estímulo. De uma forma intuitiva, o LeT sugere que os pombos escolhem o azul após durações mais curtas porque aprenderam a escolher azul num contexto em que a duração a que ele estava associado (4s) era a duração curta, enquanto que escolhem verde após durações mais longas porque aprenderam a escolher verde num contexto em que a duração à qual este estava associado (também 4s) era a duração longa.

No presente estudo foi testada uma explicação alternativa para o efeito de contexto, baseada na interacção de gradientes de generalização temporal. Numa dupla bissecção temporal, bicar verde e bicar azul são respostas controladas pela duração do estímulo antecedente. Para a resposta de bicar verde, a duração de 4s é o S+ e a de 1s o S-. Um gradiente hipotético de generalização para a resposta de bicar verde revelaria uma taxa de resposta mínima para durações de 1s e uma taxa de resposta mais elevada para as durações mais longas do que 4s. Pela mesma lógica, para a resposta de bicar azul, a duração de 4s é o S+ e a de 16s o S-. Um gradiente de generalização mostraria, neste caso, uma forma simétrica àquela do gradiente anteriormente descrito, com taxas de resposta mais elevadas para valores mais curtos que 4s. O efeito combinado destes dois gradientes revelaria uma taxa de resposta mais elevada para o azul do que para o verde para durações mais curtas que 4s e vice-versa para durações maiores do que 4s, o que permitiria explicar por que a preferência pelo verde aumenta com a duração do estímulo. Os resultados obtidos foram ao encontro das previsões, uma vez que foi possível prever o desempenho dos pombos quando confrontados com a escolha entre verde e azul a partir dos gradientes de generalização conduzidos após a aprendizagem de cada discriminação.

Foi assim demonstrado que um fenómeno aparentemente complexo e importante na área da perceção temporal – o efeito de contexto – pode ser explicado por um processo simples como a generalização do estímulo. Dada a importância que este processo pode ter na explicação dos mecanismos de controlo temporal do comportamento, é sugerido um estudo mais sistemático dos gradientes de generalização temporal. Simultaneamente é chamada à área da perceção temporal uma abordagem mais parcimoniosa, que envolve a explicação de comportamentos complexos com base em processos simples de aprendizagem, que podem ser demonstrados empiricamente.

2 thoughts on “Discriminação e Generalização de Estímulos Temporais – Ana Catarina Castro”

  1. Ana Catarina, gostaria de ter acesso as referências que você citou. Você teria para me passar, por favor?

  2. Daniel Neiva disse:

    coisa mais fofa da mãe!

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