INTRODUÇÃO
O termo “comunidade” possui vários significados e tem-se caracterizado por fornecer amplas e diversificadas possibilidades de problematização. Diversos campos do saber têm refletido sobre esta categoria de análise, tendo em vista contextos histórica e políticos. Como em qualquer conceito formulado, o de comunidade se conforma às dinâmicas sociais que se processam em cada espaço-tempo. Dessa forma, Campos (1992) considera a comunidade como mais um lugar imprevisível, no qual as pessoas vivem seu cotidiano e se relacionam, traduzindo os modos de vida contemporâneos, tanto na fragmentação e naturalização da vida quanto na possibilidade de desejar, conviver e criar.
De acordo com Bauman (2001), a convivência caracteriza- se pela premência de espaços e de tempos, pela racionalização exacerbada, por processos de desterritorialização e pela predominância de impessoalização nas relações. Assim, as atividades da investigação comunitária, são focalizadas nas trocas de recursos que envolvem pessoas, contextos e acontecimentos, cujo objetivo é criar produtos que beneficiem a comunidade como um todo.
O presente estudo tem como objetivo atender a uma determinada comunidade, conhecendo as suas necessidades e suas relações interpessoais e buscando promover algumas intervenções ou soluções para tais problemas que forem relatados e constatados.
A comunidade a ser trabalhada será uma comunidade de idosos do bairro Santos Dumont, na cidade de Itumbiara-GO, na qual a maioria dos integrantes participa do Programa do Idoso do CAIS/SMS, que acontece no bairro.
A velhice é um processo pessoal, natural e inevitável, para qualquer ser humano, na evolução da vida. Nessa fase ocorrem mudanças biológicas, como o aparecimento de rugas e progressiva perda da elasticidade e viço da pele e diminuição da força muscular; mudanças psicossociais, como consciência da aproximação do fim da vida, declínio no prestígio social, acúmulo de experiências, mudanças funcionais, como a necessidade cotidiana de ajuda para desempenhar as atividades básicas, além de transformações socioeconômicas e políticas. Feldman et al (2006), citam que, para Erik Erikson, durante a terceira idade, ocorre a oitava e última crise do ciclo de vida, que é a integridade do ego versus desespero. Nessa crise, os idosos precisam avaliar, recapitular e aceitar suas vidas para que possam aceitar a chegada da morte. Eles lutam para obter um senso de coerência e integridade ao invés de entregarem-se ao desespero pela incapacidade de viver a vida de maneira diferente. As pessoas que são bem sucedidas nessa última tarefa conseguem desenvolver uma virtude, que é a sabedoria, “uma preocupação informada e desapegada com a própria vida em face da própria morte” (Erikson, 1985, p.61).
Em todo o mundo, o contingente de pessoas da terceira idade tem crescido rapidamente. Dessa forma, políticas públicas de proteção ao idoso têm sido desenvolvidas com o intuito de garantir o cumprimento dos direitos e interesses desta população, contribuindo para a melhoria de sua qualidade de vida.
Com o intuito de contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos idosos, foram criadas algumas políticas públicas. Primeiramente, é necessário ressaltar o que compreende o termo “políticas públicas”. Estas se constituem por ações, programas, projetos, regulamentos, leis e normas que o Estado desenvolve para administrar de maneira mais eqüitativa os diferentes interesses sociais, abrangendo e organizando a dimensão coletiva de uma determinada sociedade. Porém, sabe-se que a efetivação de uma política pública, de acordo com Albuquerque et al (2007), necessita de uma atitude ética, consciente e cidadã dos envolvidos e interessados em viver envelhecendo de maneira saudável. Estado, profissionais da saúde, psicólogos, idoso e a sociedade em geral, todos são co-responsáveis por esse processo.
Existem dispositivos legais que têm por objetivos nortear ações sociais e de saúde, garantir os direitos das pessoas idosas e obrigar o Estado a proteger os mesmos. Entre eles, destacam-se o Estatuto do Idoso, a Política Nacional do Idoso e a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. O artigo terceiro do Estatuto do Idoso (2006) cita que:
Art. 3.º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: I – atendimento preferencial imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população; II – preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas específicas; III – destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso […] (ESTATUTO DO IDOSO, 2006, p. 8)
Dessa forma, o idoso tem garantido seus direitos, e, principalmente, tem a preferência no atendimento em órgãos públicos e privados e na execução de políticas públicas específicas, considerando que a população idosa constitui público alvo dessas políticas. De acordo com os autores supra citados, Albuquerque et al (2007), a Constituição Brasileira de 1988 foi a primeira a tratar o idoso e a velhice como um problema social, indo além da assistência previdenciária e assegurando a proteção na forma de assistência social.
A Política Nacional do Idoso, instituída pela Lei 8.842/94, regulamentada em 3/6/96 através do Decreto 1.948/96, amplia significativamente os direitos dos idosos. Está norteada por cinco princípios:
1. a família, a sociedade e o Estado têm o dever de assegurar ao idoso todos os direitos da cidadania, garantindo sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito à vida;
2. o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral, devendo ser objetivo de conhecimento e informação para todos;
3. o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer natureza;
4. o idoso deve ser o principal agente e o destinatário das transformações a serem efetivadas através dessa política;
5. as diferenças econômicas, sociais, regionais e, particularmente, as contradições entre o meio rural e o urbano do Brasil deverão ser observadas pelos poderes públicos e pela sociedade em geral na aplicação dessa lei.
Analisando estes princípios, percebe-se que a lei garante uma renda e também vínculos relacionais e de pertencimento que assegurem mínimos de proteção social aos idosos, objetivando a participação, emancipação e construção da cidadania e de um novo conceito social para a velhice.
Existe um benefício de 01 (um) salário mínimo mensal pago às pessoas idosas com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, conforme o estabelecido no Art. 34 da Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 – o Estatuto do Idoso, e às pessoas portadoras de deficiência incapacitadas para a vida independente e para o trabalho. Este benefício intitula-se de Benefício de Prestação Continuada (BPC) e para ter acesso a ele, o idoso deve comprovar que possui 65 (sessenta e cinco) anos ou mais e que o total de sua renda mensal e dos membros de sua família, dividido pelos integrantes, seja menor que 1/4 (um quarto) do salário mínimo vigente. A requisição é feita nos Postos de Benefício do INSS ou órgãos credenciados por ele. Essa é uma política pública direcionada aos idosos que tem como objetivo garantir-lhes um sustento na forma de um salário mínimo por mês.
Outra política pública que tem como público alvo os idosos é o SUS (Sistema Único de Saúde), no qual a Psicologia se insere no contexto da Psicologia da Saúde. O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado pela Constituição Federal de 1988 para que toda a população brasileira tenha acesso ao atendimento público de saúde. Segundo o Estatuto do Idoso, a população idosa tem atendimento preferencial no SUS. A distribuição de remédios aos idosos, principalmente os de uso continuado (hipertensão, diabetes etc.), deve ser gratuita, assim como a de próteses e órteses. Foi criada também a Política Nacional de Saúde da População Idosa (PNSPI), cuja finalidade primordial é recuperar, manter e promover a autonomia e a independência da população idosa, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, concordando com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde. Para Albuquerque et al (2007):
A PNSPI fundamenta a ação do setor saúde na atenção integral à população idosa e em processo de envelhecimento, conforme determinam a Lei Orgânica de Saúde nº. 8080/90* (Preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral) e a Lei nº. 8842/94, regulamentada pelo Decreto nº. 1948/96. Assegura os direitos dos idosos e busca criar condições para a promoção da autonomia, integração e participação dos idosos na sociedade. Cabendo ao setor saúde prover o acesso dos idosos aos serviços e às ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde. O foco central da PNSPI (p.3) é, “recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde. É alvo dessa política todo cidadão e cidadã brasileiros com 60 anos ou mais de idade.” ( IBIDEM, 2007)
Na cidade de Itumbiara-GO, o Programa do Idoso criado pelo CAIS/SMS (Centro de Assistência Integrado de Saúde/Secretaria Municipal da Saúde) caracteriza-se por ser um programa educacional que procura instrumentalizar idosos com conhecimentos e procedimentos sobre atividade física, de modo que tenham autonomia para auto-gerir seu programa de exercícios e/ou seja, capazes de selecionar programas de exercícios supervisionados adequados para suas condições, aos quais tenham interesse de integrar-se.
Também é fonte de pesquisas sobre a qualidade de vida dos idosos, pois é feito o acompanhamento da evolução das capacidades físicas e motoras e de aspectos psicológicos e de aprendizagem dos integrantes do programa. Este acompanhamento dá base para verificar a adequação da proposta quanto às possibilidades de ativação dos domínios físicas, motor, cognitivo e psicossocial, o que redunda em conhecimentos sobre as condições favoráveis em que tal ativação ocorre, e em conhecimentos aplicados para a atuação profissional da equipe envolvida.
Os objetivos do Programa do Idoso CAIS/SMS são: 1. Instrumentalizar o idoso com conhecimentos para o auto-cuidado, ensinando-os a saberem o que fazer, como fazer e quando fazer atividades motoras que apliquem a capacidade de reserva dos diferentes sistemas do seu corpo; 2. Mudar seu comportamento para a prática sistemática de atividade física, com base na valorização desta como meio de manutenção da qualidade do envelhecer; 3. Sentir prazer em movimentar-se e viver experiências motoras com sucesso; 4. Manutenção e melhoria das capacidades físicas e motoras, da capacidade funcional e da saúde. A duração é anual e as aulas práticas acontecem duas vezes por semana, às terças e quintas, das oito às nove horas da manhã.
Este programa, além de oferecer benefícios para a saúde física e psicológica, promove o convívio social entre os idosos. Segundo Otto (1987), o idoso tem perda de até 5% da capacidade física a cada 10 anos e pode recuperar 10% através de atividades físicas adequadas. Estas atividades também atuam como antidepressivos, sendo benéficos para todas as idades e sexos. A recreação é uma alternativa para adaptar-se melhor a esta fase, a participação é coletiva, estimula a solidariedade, é através do jogo e da dança que o idoso diminui as tensões, angústias, faz amigos e se diverte. É uma atividade alegre que o faz esquecer do dia a dia, buscar a socialização e gostar de estar com pessoas da mesma idade.
Sendo assim, algumas necessidades já notadas através de alguns contatos com a instituição e diretamente com os participantes do programa, e equipe técnica do Programa do Idoso, percebemos assim através de relatos, que o idoso que participa do programa tem muita vontade de aprender informática, pois assim se sente mais próximo a tecnologias. Quando perguntamos se tem algum incentivo eles nos responderam que alguém sempre começa, mas quando o projeto é encerrado eles não aprenderam muito.
Outra necessidade que foi notada pelo grupo é que eles se sentem mal tratados em relação ao atendimento pelo SUS (Sistema Único de Saúde), e sentem que não conseguem fazer nada para melhorar. Alguns idosos do programa também relataram que sentem vontade que fossem oferecidas mais palestras sobre qualidade de vida, bailes, bingos, enfim, eventos que todos da família pudessem participar.
Assim sendo, a proposta de intervenção, é possibilitar aos idosos um momento de atividades sociais, onde eles possam conversar sobre esses aspectos que são um pouco esquecidos; falar sobre sua vida afetiva, sobre seus gostos.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A coleta de dados nos permitiu averiguar o quanto realizar suas atividades sem dependência de alguém é de suprema importância para os idosos, eles relataram que realizam e gostam de realizar tarefas domésticas sem auxílio de outrem. Quanto às perdas da percepção dos sentidos, a que se mostrou mais temida foi a perda da visão e a maioria dos entrevistados relatou apresentar doenças crônicas, como diabetes e hipertensão arterial.A maioria dos entrevistados respondeu que está sempre disposta a participar das atividades propostas pelo Programa do Idoso, e considera que o convívio social é muito importante.
A independência mostrou-se um fator de grande relevância sendo citada pela maior parte dos entrevistados, os quais argumentaram que realizam atividades físicas sem ajuda de pessoas ou auxílio mecânico. Quanto à afetividade, a maioria dos idosos alegou que considera mais importante gostar de si mesmo, intelectualmente, demonstrando que a preocupação com a auto-estima, relacionada à qualidade de vida na velhice tem ganhado cada vez mais relevância. Eles consideram fundamental ter um cônjuge ou companheiro e a dimensão espiritual ocupa um lugar de destaque na vida dos idosos, sendo constatado que ter fé em Deus é uma necessidade para garantir uma boa qualidade de vida.
A maioria dos idosos relatou que o Programa do Idoso do CAIS/SMS promove interação social, melhoria da saúde física e psicológica e citou que possui muitos amigos que participam do programa. A maioria também afirmou estar sempre disposta a freqüentar as atividades fornecidas pelo Programa, o que funciona como uma maneira de promover a socialização. Quanto às políticas públicas, os idosos declararam que as condições de saúde pública precisam ser melhoradas.
BIBLIOGRAFIA
ALBUQUERQUE, Gelson Luiz; ERDMANN, Alacoque Lorenzini; MARTINS, Josiane de Jesus; SCHIER, Jordelina. Políticas públicas de atenção à saúde do idoso: reflexão acerca da capacitação dos profissionais da saúde para o cuidado com o idoso, Rev. Bras. Geriatr. Gerontol. Rio de Janeiro, v.10 n.3, 2007.
BAUMAN, Z. (2001). Modernidade líquida. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.
BRASIL, Estatuto do Idoso. Ministério da Saúde, 2. ed. rev. – Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2006.
Campos, R. (1992). Trinta anos de regulamentação: Análise de Regina Helena Freitas Campos. Psicologia: Ciência e Profissão, 12(1), 05-07.
FELDMAN, Ruth Duskin; OLDS, Sally Wendkos; PAPALIA, Diane E. Desenvolvimento Humano. 8 ed., Porto Alegre: Artmed, 2006, p.527.
OTTO, E. R. C. Exercícios Físicos para a Terceira Idade. São Paulo: Manole, 1987.