Os sentimentos de onipotência e auto-estima passam por extenso desenvolvimento e mudança, concomitante ao desenvolvimento do ego. Existe um sentimento de onipotência desde o começo, mesmo antes de existir a concepção de objetos. O mundo exterior é percebido pelo organismo como parte dele (do organismo), como algo dentro dele, embora não haja ainda a concepção de não-ego. Fenômenos semelhantes são observados em transtornos mentais quando perdem contato com a realidade e recaem num nível infantilóide de comportamento emocional: a pessoa perde a distinção entre sua personalidade (ego) e o meio ambiente (realidade). Essa pessoa entra num estado de onipotência primitiva, acredita ser onisciente e onipotente, e alimenta fantasias que não conhecem limites. Para chegar a esse estado de onipotência primitiva, o paciente passa geralmente por uma fase de renascimento. Ele acredita ter voltado ao ventre materno; representa esse papel, enrosca-se numa posição fetal e comporta-se como bebê. Em tal estado de onipotência, o paciente pode expressar idéias de que é capaz de mover o universo, criar a guerra e a paz, gerar milhões de crianças etc. Nos adultos, o sintoma é mais comumente chamado de megalomania. (Hinsie)
Esse sentimento de onipotência ilimitada, freqüentemente designado por "sentimento oceânico", torna-se limitado à medida que se desenvolvem o ego e o sentido de realidade; isso ocorre quando a criança experiencia tensões que não pode dominar, o que, por sua vez, acarreta movimentos não coordenados de descarga. "Algo lá fora" torna-se necessário para tranqüilizar a tensão da criança e, através do reconhecimento desse "algo lá fora", a criança faz a sua primeira distinção entre ego e objeto. Ela também desenvolve um novo conceito de onipotência. Quando seus movimentos são entendidos pelo meio ambiente como um sinal pedindo a tranqüilização da sua tensão, a criança experiencia essa seqüência de eventos como uma "onipotência de movimentos". Entretanto, ela ainda anseia por seu "sentimento oceânico" original. A sua reação mais precoce aos objetos consiste em engoli-Ios; tenta "engolir" ou incorporar todas as sensações agradáveis e, através da introjeção, fazer com que partes do mundo externo fluam, como tributários, para dentro do seu ego. As sensações desagradáveis são percebidas como não-ego e "cuspidas". Assim, através da introjeção, tudo o que é agradável torna-se parte do ego; e, através da projeção, tudo o que for desagradável converte-se em não-ego.
Todos esses esforços para restabelecer o "sentimento oceânico" do narcisismo primário, assim como a "onipotência de movimentos", estão condenados, entretanto, a fracassar, dado que a criança, através de suas experiências, dá-se conta de que não é o ser todo-poderoso que se julgava. Agora, o adulto é considerado onipotente e, ao reunir-se a essa força onipotente no mundo externo, a criança procura compartilhar dessa onipotência: ou incorpora partes desse mundo, ou tem a fantasia de ser incorporada por ele. Este último tipo de onipotência está em ação no êxtase religioso e no patriotismo. Os movimentos políticos de massa podem também atestar a participação dos seguidores impotentes na onipotência dos seus líderes. O sentimento de estar em comunhão com uma força onipotente é conhecido como "narcisismo secundário". O anseio de onipotência do narcisismo primário é a "necessidade narcisista" que todas as pessoas experienciam. "A 'auto-estima' é a consciência da pouca distância a que o indivíduo se considera da onipotência original". Inicialmente, a ânsia de onipotência era um desejo veemente de remoção da tensão instintiva, o que restabeleceria o estado narcisista sem objeto: a auto-estima era restaurada mediante a eliminação de um estímulo desagradável. Isso era feito através da alimentação. Assim, a primeira regulação da auto-estima e satisfação da necessidade narcisista fazia-se através do alimento. Depois de a criança renunciar ao seu sentimento de onipotência, entretanto, e manifestar a tendência para participar na onipotência do adulto, a sua auto-estima passa a ser regulada por testemunhos de amor por parte dos adultos. A criança ganha auto-estima quando ganha afeição e perde auto-estima quando perde afeição; através das promessas de amor e das ameaças de nega-lo ou retirar, a criança fica pronta para obedecer à autoridade e renunciar a outras satisfações. "Isto é o que torna as crianças educáveis."
No desenvolvimento subseqüente, as necessidades de auto-estima, as necessidades narcisistas, são de importância suprema; elas se desenvolvem nas relações entre o ego e o superego. Os sentimentos de culpa diminuem o sentimento de amor-próprio, e a realização plena de ideais o aumenta. Mas até na relação com objetos, em que as necessidades sexuais se desenvolvem, parte da relação continua sendo governada pelas necessidades de auto-estima. Em pessoas fixadas nesse nível, a necessidade dominante, decorrente dos objetos, é narcisista. Esses indivíduos podem tentar manter sua auto-estima através de um comportamento agressivo ou submisso em face de seus objetos ou através de ambos os métodos simultaneamente. (Fenichel)