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O que é realidade?

Como é o acesso que temos ao mundo? Essa pergunta, que possivelmente a maioria das pessoas ignora no seu dia-a-dia, foi levantada por diferentes filósofos e psicólogos durante a história dessas disciplinas.
Uma das possíveis respostas é que o acesso ao mundo é direto, e, portanto, quando vejo e seguro minha caneta, o faço graças à existência real desse objeto. Esse posicionamento em relação ao problema recebe o nome de realismo, devido à defesa de uma existência “em si” dos objetos do mundo (realidade). Segundo o realismo o caráter de realidade da caneta é inquestionável, pelo menos, por dois motivos: primeiro, porque posso pegar a caneta na mão, sentir sua textura, ver sua cor, e assim por diante; e segundo, porque a caneta continua a existir mesmo quando não estou presente. Mas poderíamos perguntar a um defensor do realismo: como você sabe que a caneta continua a existir na sua ausência? Se você não está lá para ver, o que garante que a caneta não desapareça quando você sai?

O realista admitirá então que a crença na existência contínua do objeto fundamenta-se em certos episódios, como por exemplo, quando ele sai da sala e deixa sua caneta sobre a mesa, na volta encontra a caneta no mesmo lugar. Mas ainda assim podemos insistir, o que garante que a caneta que você encontra quando volta é a mesma de quando você saiu? Nosso amigo realista terá então de concluir que embora ele veja duas canetas (uma quando saiu e outra quando retornou à sala), elas possuem as mesmas propriedades (a mesma cor, textura, peso, etc.), e por isso as considera como a mesma caneta vista em dois momentos distintos. De onde podemos concluir que a fonte da crença da existência da caneta (seja na presença ou a ausência do observador) é, em última instância, os dados fornecidos pelos sentidos. No entanto, é comum que nos enganemos em relação ao que é mostrado pelos sentidos.

Quando, por exemplo, olho para o tronco de uma árvore e não vejo nada além do próprio tronco, e no instante seguinte percebo que havia um inseto mimetizado nele. Se eu fosse um defensor do realismo, teria de admitir que nos dois casos havia um inseto no tronco da árvore, mas que no primeiro os meus sentidos me enganaram. E sendo assim, cabe a pergunta, por que eu deveria depositar tamanha confiança nos sentidos se eles podem falhar? Mas, o simpatizante do realismo pode argumentar que o exemplo acima mencionado é um caso extremo, e que geralmente os sentidos revelam a realidade. Mas nesse ponto a posição inicial do realista já não se sustenta, pois agora temos que admitir uma diferença entre realidade e experiência – onde a primeira é o que existe em si, e a segunda é o que os sentidos nos informam sobre essa existência (informação que pode, em alguns casos, ser falsa). Assim encontramos uma das famosas dicotomias que perseguem a psicologia desde de seus primórdios, experiência versus realidade.

Ao assumir essa dicotomia teremos de admitir que tudo que conhecemos acerca da realidade está fundamentado na experiência, ou em outras palavras, nunca temos contato direto com a realidade. Se radicalizássemos essa posição, poderíamos perguntar, por que devo defender a existência de uma realidade que nunca posso acessar? Isso abre caminho a um ponto de vista tão coerente quanto o anterior: a possibilidade de se defender que não há nada para além da experiência – o “mundo externo” é uma construção indevida, pois tudo começa e termina na nossa experiência. Grosso modo, essa é a concepção defendida pelo idealismo. Mas como a psicologia se posiciona diante desse debate? Na história da psicologia encontramos praticamente todas as possibilidades acima descritas. Do realismo ingênuo (Watson), passando pelo realismo crítico ou pelo ceticismo mitigado (alguns defensores contemporâneos da psicologia da Gestalt), até o idealismo (McDougall). Há ainda uma outra possibilidade que não posso desenvolver aqui. Trata-se da tentativa de negar a legitimidade da dicotomia experiência versus realidade, construindo uma posição que fuja das duas possibilidade apresentadas. Tenho recentemente trabalhado com essa possibilidade, mas, até o momento, ainda não tenho resultados dignos de apresentação.

Fica, então, apenas registrada a possibilidade dessa outra posição (e de que, quem sabe em um futuro próximo, eu escreva sobre ela). Não estamos aqui interessados em tentar resolver esse dilema. Existem dilemas e questões que não têm solução (ou que têm várias soluções possíveis); a discussão entre realismo e idealismo talvez seja um deles. O intuito aqui é tentar mostrar que não podemos fazer psicologia séria e coerente sem se posicionar com relação a esses problemas. Assim, parece que o melhor seria assumir de antemão um posicionamento, para não correr o risco de ser acusado no futuro de algo que você está defendendo sem saber!

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