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“Expulsão” de usuário de droga é regra na rede particular de ensino

A Escola Vera Cruz -conhecida por seus métodos alternativos de ensino- expulsou há um mês dois alunos que estavam enrolando um cigarro de maconha em uma das quadras do colégio.

A Escola Vera Cruz -conhecida por seus métodos alternativos de ensino- expulsou há um mês dois alunos que estavam enrolando um cigarro de maconha em uma das quadras do colégio.

Não é uma ação isolada. O porte de maconha já
foi motivo de expulsão no Nossa Senhora das Graças -tradicional
escola de freiras-, no Santo Américo -colégio de monges- e até
na Escola da Vila, outro núcleo alternativo de educação.

No Mackenzie, o motivo foi lança-perfume. Ninguém usou, mas o
aluno levou o frasco à escola.

Nas mais conhecidas instituições particulares de ensino de São
Paulo, a
regra é: alunos pegos portando ou usando drogas devem sair do colégio.

Na última semana, a Folha procurou 20 dessas escolas. Das oito que se
dispuseram a expor seus procedimentos, sete confirmaram a norma. A maioria diz
já ter aplicado a medida. As outras 12 instituições procuradas
não se pronunciaram -quatro delas (Equipe, Santa Cruz, Dante Alighieri
e Etapa) não comentam esse assunto.

Os casos nunca são registrados na Delegacia de Ensino -o que, ao pé
da letra, descaracteriza a expulsão. São, do ponto de vista formal,
“transferências compulsórias”. Burocracia à parte,
o resultado é a saída imediata da escola.

“A maioria das escolas adota a expulsão de forma grave, sem que
o problema seja discutido. É uma atitude de avestruz que ocorre também
nas famílias”, diz o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, que dirige
um programa de prevenção às drogas (Proad) e atende a algumas
escolas.

A opção pela expulsão é polêmica. De um lado,
as escolas alegam que não lhes resta outra saída.

“Levar drogas para a escola é proibido. É tolerância
zero. Expulsão. Risco de vida. O aluno deve ter a chance de se readaptar
em outro ambiente, mas a escola não deve ter receio de ser clara. O problema
da educação hoje é a relativização das regras”,
diz d. Geraldo Gonzalez y Lima, 41, vice-reitor do Colégio Santo Américo.

Do outro lado, médicos, psicólogos, pedagogos e o próprio
sindicato das escolas particulares afirmam que, ao expulsar o aluno, a instituição
apenas lava as mãos.

“Não se pode confundir expulsão com limites. Expulsar é
se livrar do problema de forma covarde. O que deveria ser um momento educativo
vira uma punição definitiva”, diz a psicóloga Helena
Lima, professora da PUC-SP que se dedica a ações de prevenção.

Limite, respeito e papéis
O que está em jogo é avaliar se a medida vai ajudar ou não
os alunos.
Para isso, porém, não há resposta definitiva. Disciplina
é hoje, todos concordam, um assunto controverso e bastante experimental,
na qual as balanças oscilam diariamente entre o “laissez-faire”
(deixar fazer) e as medidas drásticas de imposição de limites.

“É impossível dizer o que vai dar certo. O que sem dúvida
não cabe mais é fingir que nada está acontecendo”,
diz Ana Luiza Fonseca Martins, orientadora educacional e pedagógica do
Colégio Santa Maria, escola de freiras conhecida por ações
de vanguarda. No Santa Maria, o aluno é transferido se for pego com drogas.

O psiquiatra Içami Tiba, autor do livro “Anjos Caídos –
Como Prevenir e Eliminar as Drogas na Vida do Adolescente”, concorda com
o Santa Maria na necessidade de discussão -o que não é
consenso entre as escolas. Mas discorda da norma da expulsão.

“As atitudes drásticas têm o mérito de fazer com que
a verdade seja recolocada. Levar o debate para dentro das escolas é uma
forma de torná-lo mais sério. Só assim as expulsões
podem dar lugar a projetos de recuperação.”

Em defesa das expulsões, os argumentos se repetem: necessidade de impor
limites, de manter a autoridade e de permitir que o aluno reconstrua seu papel.

“O aluno precisa recomeçar em outro lugar, porque naquele espaço,
naquela escola, ele já adquiriu um rótulo”, resume Roseli
Fernandes Lins Caldas, 45, psicóloga escolar do Colégio Mackenzie.

“Temos de pensar no coletivo. O aluno ficará engessado em um papel.
Passam a esperar dele algumas atitudes, e ele as repete. Temos de convencer
os pais da necessidade de reconstrução desse papel em outro lugar”,
completa Ana Luiza, do Santa Maria.

Transferência de problemas
O foco no coletivo, porém, está também na raiz das críticas.
“A expulsão pode levar também os demais alunos a esconder
os problemas. E um problema embaixo do tapete é um problema fora de controle”,
diz Dartiu Xavier.

Para a psicóloga do Mackenzie, as escolas estão mais rígidas
como resposta à facilidade de acesso às drogas, ao aumento da
toxicidade das substâncias e à desestruturação das
famílias. Mas a resposta, diz a pedagoga Neide Barbosa Saisi, não
é a mais acertada.

“Claro que a escola deve se modificar com a sociedade. Mas ela não
pode só refletir e transferir problemas. Deve atuar sobre eles. Não
basta colocar na rua porque a criança é um problema que a escola
não sabe resolver. A escola tem encarar a questão como desafio,
não como afronta”, afirma Neide, que leciona psicologia de educação
na PUC.

SÍLVIA CORRÊA

AURELIANO BIANCARELLI
da Folha de S.Paulo

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