RedePsi - Psicologia

Artigos

Serge Leclaire (1924-1994). Uma Singela Homenagem

Serge Leclaire foi, sem dúvida alguma, um dos maiores expoentes da psicanálise mundial, sobretudo na França. Tendo realizado a sua análise pessoal com Jacques Lacan, participou do movimento psicanalítico de uma forma ímpar, tornando-se leitura imprescindível para todos aqueles que militam no campo da psicanálise. Pretendo poder fazer juz com essa singela homenagem.
Pretendo com a realização deste trabalho, prestar uma singela homenagem àquele que foi, sem a menor sombra de dúvida, um dos maiores ícones da psicanálise na França. Leclaire teve um papel particular e único na produção existente na literatura psicanalítica. Sabemos que foi sempre um profissional muito preocupado com aquilo que poderia ser uma espécie de "unificação do movimento psicanalítico". Contam os historiadores que Leclaire chegou a ser considerado como o "clínico mais importante da França".

Foi considerado o "primeiro lacaniano" da história, tendo realizado a sua análise pessoal com Jacques lacan, tendo criado com ele em 1969, o departamento de psicanálise da Universidade de Vincennes. Teve em sua vida profissional, como temáticas de pesquisa preferida: as psicoses; a neurose obsessiva e a sexualidade infantil.

"Leclaire gostava de repetir que a psicanálise é a disciplina do conflito, sendo ele intrapsíquico ou não. Assim, no conflito nada é isolado".

Em comparação a Freud, sabemos que Lacan era de uma outra época, não sendo positivista, nem cientificista e nem ateu, contudo possuía o seu próprio projeto. Lacan dizia que pretendia restaurar o gume da disciplina freudiana, tendo fundado "A Escola Freudiana de Paris". Temos notícias de que o analista Leclaire, teve o seu percurso realizado entre dois pólos: um, de filiação institucional e, outro de filiação marginal.

Alguns dados históricos:

Em 1953, teve início o tempo da filiação institucional, tendo se constituído num tempo de ativismo, de militantismo no seio da Sociedade Francesa de Psicanálise e isolada da Internacional IPA. Já, em 1964 fundou-se A Escola Freudiana de Paris, sendo que logo se instalou o tempo da filiação "à margem". Parece que se tratava de manter aberto um certo distanciamento, assim como ocorre também com o trabalho do psicanalista. Esclarecemos que estar à margem, não significa estar "fora do jogo"; não se ocupa a posição sem ter que responder por ela. Leclaire declarou: "O sujeito é a função que, de modo vivo, permite alternativamente uma relação com o sistema das representações e com o real".

Podemos verificar que Leclaire leva o Édipo muito à sério, concebendo que "a ordem das coisas é o incesto", o qual consiste em construções sobre os sistemas representacionais, implicando em um alto custo de investimento libidinal, como outras tantas reedições do modelo materno. Assim, "para além da mãe, guardiã sagrada dos representantes da potência fálica, abre-se um mundo de angústia. Sendo a angústia proporcional à defesa, trata-se de dar espaço aos laços que fazem consistir a nossa fantasia".

Para esse autor, nossa ideologia dominante incestuosa, é qualificada também de homosssexual, uma vez que a imagem protetora da mãe está no princípio do reencontro com o mesmo, um mundo sem outro, hermético em sua auto-reprodução, sempre recalcando a diferença para garantir o poder do "um". Leclaire se pergunta: "Como reconhecer que há outro, mais exatamente de outro sexo, quando na nossa rotina, o real do sexo permanece mascarado sob o emblema fantasístico fálico? A ordem assim estabelecida === incestuosa, homossexual=== não é senão o poder do "um", reconduzido repetitivamente para a ladeira da pulsão de morte".

Leclaire faz uso de uma metáfora extremamente interessante:

O analista seria então, um eterno cavaleiro andante, com a missão de subtrair o sujeito às condições dominantes, à situação incestuosa como um estado comum, modelo das sociedades fundadas na religião do pai? Ele a entende como uma interpretação no sentido analítico do termo, querendo a metáfora expressar que a ordem à qual estamos submetidos, sob um fundo de angústia de castração, é da responsabilidade do psicanalista.
 
Citamos que houve uma época em que Leclaire foi considerado o "semeador" da subversão na Escola freudiana de Paris, o que para nós consistiria numa prova irrefutável de que os analistas não são menos cegos que os outros à verdade do desejo. Historicamente, o ápice da subversão foi quando Leclaire lançou em 1989, um apelo à criação de uma instância ordinal dos psicanalistas. Para a atmosfera da psicanálise francesa, isso foi recebido como uma provocação e tratada como tal.
 
A bem da verdade, sabe-se que Serge Leclaire sempre se expôs, mantendo-se contudo coerente com as suas posições. Ele estava fadado à produção de algo que fosse "da ordem" da psicanálise, e encontrar-se em posição falsa em relação a toda posição de mestria.
 
Pretendemos encerrar essa exposição, com a utilização de uma citação de Christian Simatos, o qual acompanhou o trabalho de Serge Leclaire: "Se tivéssemos de situá-la hoje, no espírito de nossa época, gostaríamos de dizer que a razão de ser da psicanálise é, mais do que nunca, fazer frente às ideologias e exercer, diante delas, uma espécie de contrapoder".

Acesso à Plataforma

Assine a nossa newsletter