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A Dúvida e a Dor

Importante deixarmos claro, o intenso sofrimento que acomete o portador do Transtorno Obsessivo Compulsivo. Segundo grandes estudiosos do tema, como por exemplo, André Green, a erotização incide sobre o pensamento do sujeito; em outras palavras, sobre as cadeias representacionais.
Sabemos que existe um tipo de paciente, o qual podemos considerar como sendo portador da assim chamada "loucura com consciência". Quando não se encontram no âmbito asilar, costumam sair frequentemente em busca dos médicos clínicos, psicólogos e psicanalistas. Costumam descrever as suas angústias com muito boa fé, além de estarem muito aflitos. Acabam reclamando por uma "cura", e esperam do profissional que os tranqüilize de pronto. Mostram-se bastante confiantes, deixando-se "influenciar" com um tipo de credulidade quase infantil.

Dessa forma, ao falarmos da "loucura com consciência" ,podemos citar como uma espécie de exemplo paradigmático, a "loucura da dúvida", a qual costuma vir acompanhada pelo delírio do tato". Nesse tipo de pacientes, encontramos a presença de um "delírio ativo, expansivo", o qual não apresenta nenhum tipo de correlação com o "delírio persecutório" ou com  o "delírio da melancolia". Foi durante muito tempo considerado erroneamente como fazendo parte da hipocondria e também da histeria.

Esse tipo de "loucura" chegou a ser vislumbrada por Esquirol J., Falret, Griesinger, Morel e outros.

A própria expressão "loucura da dúvida com delírio do tato", nos parece deixar entrever uma intenção formal de se designar a patologia, e isso ocorre através dos signos clínicos preponderantes. A dúvida causa uma interrogação mental e acaba por dar início a uma cena mórbida. Só muito tempo depois, as excentricidades do tato acabam por concluí-la. Julgamos importante que fique claro que a "doença" não ocorre de forma contínua, mas sim apresenta-se em "surtos" e com "fases suspensivas bast" ante prolongadas. Isso muitas vezes pode levar o clínico a idéia equivocada de que teria ocorrido a "cura", através da "remissão da sintomatologia inicial".

 
Segundo pesquisa nos autores citados, entendemos que a evolução, embora lenta, passa por três etapas:

1) é compatível com as melhores condições de saúde quer física ou intelectual, e consiste na produção involuntária e irresistível de certas séries de pensamentos sobre temas indeterminados, teóricos, abstratos, porém sem a presença de ilusões ou mesmo alucinações. Parece se apoderar do sujeito um sentimento vago de "dúvida" e sempre em relação às mesmas coisas. As vezes também, lhe ocorrem certas imagens e as subseqüentes e fixas preocupações em relação a elas. Esse período ainda parece ser caracterizado pelo silêncio relativo as queixas verbais.

 
2) nesse período, apresentam-se os seguintes tipos de fenômenos:

 = revelações inesperadas à família e amigos.

= excrúpulos exacerbados.

= acessos de excitabilidade.

= necessidade patológica de repetir as mesmas coisas para a mesma pessoa, além de ser tranqüilizado pela mesma.

= temor de tocar em certo tipo de objetos.

= compulsão à limpeza.

Ainda assim, a inteligência parece estar preservada.

3) caracterizado por um estado patológico sério, importante, além de permanente. Acaba por evoluir a cada dia, fazendo com que a sociabilidade desapareça progressivamente. A realização de atos normais do cotidiano, tornam-se impossíveis de serem realizados pelo sujeito. A lentificação motora se faz presente e o paciente acaba dedicando " horas à toilette". O circuito da ideação delirante vai se estreitando, fazendo com que as angústias aumentem. Existe também uma repulsa por determinados objetos, e dos temores já não temos mais notícias verbalizadas. Pelos movimentos labiais, podemos inferir a presença de uma linguagem mental. Depois dessa fase, nos parece que a vida desemboca nu ma espécie de imobilidade e subseqüente declínio existencial.

 

Penso podermos dizer que essa seria como que uma resenha da história de uma neurose grave. Segundo a maioria dos autores pesquisados, o início dessa jornada tem início na puberdade. A existência humana de quem dela padece, acaba por ficar completamente comprometida.

O delírio, em sua origem, está constituído por uma idéia estranha que se impõe na mente, e que vai assumindo cada vez mais importância. Acaba por absorver uma grande parte da existência psíquica do indivíduo. Ela é o ponto de partida de uma série de reflexões, apresentando sempre como centro a idéia delirante original ou primitiva. A demanda por tratamento, parece começar a partir do início do segundo período, e uma das primeiras indicações profissionais parece ser a abolição da ociosidade, além de uma conduta firme e confiante do profissional assistente. Entendemos que esse tipo de conduta, concorre para o estabelecimento do vínculo (transferencial?).

Em suma, quando mencionamos uma idéia estranha que se impõe à mente do sujeito, devemos considerar que ela poderá ser relativa ao tema do suicídio, além de que as tentativas de morte voluntária não são raras. Deriva daí a necessidade de uma atenção estreita em relação a esse tipo de paciente, muitas vezes tendo inclusive que ser considerada a possibilidade de uma contenção a nível institucional. Claro é que essa consideração deverá envolver a presença dos familiares mais próximos.

Apenas a título de esclarecimento, quando falei que essa seria uma espécie de "resenha" de uma história de intenso sofrimento, quis me referir ao fato de que, num segundo momento, pretendo desenvolver mais detalhadamente, tanto teórica quanto técnicamente, a patologia do transtorno obsessivo compulsivo e seus sérios infortúnios.

Bibliografia Auxiliar:

 
Pontalis, J-B.  Perder de vista – da fantasia de recuperação do objeto perdido.

Freud,S. O homem dos ratos- Obras Completas- Edições Amorrortu.

Green,A. O Discurso Vivo – Uma teoria psicanalítica do afeto.

Green,A. Narcisismo de vida – narcisismo de morte.

Acesso à Plataforma

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