Há vários argumentos que costumam me apresentar para não praticar meditação. Se você pensa que a maior parte das pessoas costuma dizer que não medita porque aprendeu e não gostou, está enganado. Quase sempre, após aprender a meditar em nossos workshops, os desistentes alegam que não tiveram motivação, ou que não tiveram tempo. Sobre isso – a "falta" de tempo – conversaremos hoje.
Vamos imaginar que estamos falando de se fazer apenas uma prática meditativa diária, de 15 a 20 minutos. Sabe o quanto isso representa do total do seu dia? Cerca de 1,04 a 1,38%. Mas, e se eliminarmos o período que passamos dormindo? Então seria algo entre 1,56 a 2,08%. Assim, como é possível acreditar que você não dispõe de pouco mais de um por cento do seu tempo para investir em você? Certamente, você já passa bem mais tempo do que isso “pensando no nada”, ou navegando sem rumo na internet.
Certa vez, li em um livro um diálogo entre dois executivos, na sala de espera de um médico. Ambos haviam sido treinados em técnicas de relaxamento pelo médico, mas apenas um deles havia praticado durante as primeiras duas semanas. Aquele que não praticara, então, se explicou: “Eu bem que gostaria, mas não tenho tempo para fazer esses exercícios”. O outro, que praticou regularmente, respondeu: “Acho que você não está entendendo a situação. Você não tempo é para não fazer! A vida é curta; o stress nos persegue; a saúde se vai, ou seja, não há tempo para não fazer algo que possa nos ajudar”.
Sabem o que percebo? Na verdade, quem não encontra tempo para meditar, também não está encontrando o momento presente. Hoje, começo a perceber que há uma relação entre as duas coisas. Segundo Flávio Gikovate, em uma entrevista para a revista TPM, “…querendo ou não, vivemos o agora… …não conseguimos viver o presente, por mais que lutemos…”. Penso que é bem assim: uma luta. O agora, o presente, é absolutamente verdadeiro, mas nossa mente inquieta nos leva do passado ao futuro, de volta ao passado, de volta ao futuro, assim como um pêndulo de relógio, que nunca descansa no centro, na quietude. Lutamos com o agora, e consequentemente lutamos com a vida.
Por que será que evitamos o agora? Não sei. Talvez porque não acreditemos nele. Por incrível que pareça, acreditamos mais em dois mundos bem menos reais. O passado, que é pura memória. O futuro, que é pura imaginação. Olhando para esses dois mundos, acreditamos que estamos “vivendo” nossas vidas, e nesses mundos nos emocionamos, nos estressamos, nos identificamos, nos projetamos, pré-julgamos, repetimos os erros, tentamos controlar todos os acontecimentos, enfim, lutamos com a vida a cada instante.
Para quase todos, parece até impossível ficar no agora. Mas isso deve ter algum motivo… Hoje, creio que o grande motivo é o medo de morrer. Não me refiro à morte física, mas a morte da identidade que receamos perder, que achamos que conquistamos e temos que defender com “unhas e dentes”.
Mas que identidade é essa? O que – ou quem – é você? Apenas o produto de tudo que foi lhe dito, ou lhe foi mostrado implicitamente. Você provavelmente nunca perguntou quem era você, pois antes disso – quando você era ainda um bebê – alguém lhe disse seu nome. Você nunca perguntou quais suas preferências, porque antes disso já lhe disseram o que as pessoas devem preferir. Provavelmente, você nem teve chance de perguntar o que é Deus, pois antes disso alguém já lhe disse o que era Deus, e como você deveria acreditar nele. O que você é hoje? O que as pessoas lhe dizem que você é, ou o que lhe disseram um dia. Você já é bem sucedido? Então provavelmente foram as pessoas e os meios de comunicação que lhe apresentaram às características do “êxito” e você as identificou em si mesmo.
A mente – a cognição – serve para muitas coisas. Pode lhe ajudar a fazer compras, a organizar uma agenda, a escrever um artigo, e até mesmo a elaborar uma tese de Doutorado. No entanto, a mente não serve para uma coisa: ela não serve para lhe dizer quem você é, já que em minha opinião a nossa essência está além do terreno cognitivo. E se você acha que é o que sua mente diz que você é, saiba ainda mais uma coisa: não somos nem mesmo o que a nossa mente diz que somos; na verdade, nos identificamos com o que os outros dizem que somos. Como a mente não é capaz de definir nossa essência, ela se socorre das informações que recebe do ambiente para definir critérios, e esses critérios não vêm de você – eles vêm de fora de você.
Perceba. Sempre haverá tempo para meditar. A sensação de que não há tempo é um truque da mente para não ter que – tentar – experienciar algo que ela não é capaz de assimilar. Não tenha medo do agora. Pare. Repouse. Respire bem devagar. “Ouça” o silêncio. “Mergulhe” no agora. Medite…
Esteja no agora. Só estando nele será possível vivê-lo. Muitos dizem que devemos viver o agora e muitos fazem isso usando seu arsenal de conceitos mentais, que não tem nenhuma relação verdadeira com o agora. O que importa não é VIVER o agora, mas sim ESTAR no agora. Tentar vivê-lo sem estar inteiramente nele pode ser “um tiro no pé”. Na verdade, nem é possível viver o agora, pois ele a vida são uma só coisa. Estar fluindo no verdadeiro Agora é estar fluindo na Vida. Não há luta, embora exista movimento. Não há ordens de mudança, embora existam transformações. Não há sempre sucesso, embora exista um bem-estar que nem a mente nem as palavras seriam capazes de explicar.
Medite primeiro. Sem pressa. Esteja cada vez mais no Agora, e então comece a viver. Naturalmente. Há bastante tempo para isso. Todo o tempo do Universo.
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pqp..que texto incrivel…muito obrigado.