João Palma Filho*
Bárbara Gracioso Santiago*
*Psicologia FMU
Dentre as inúmeras possibilidades de percurso para análise da reportagem apresentada em 05 de outubro de 2014, pelo programa intitulado “Fantástico”, da Rede Globo de Televisão, optamos por um olhar abrangente, de maneira a contemplar, a partir da leitura de Foucault (2013) e Muchail (1986), as principais relações entre a teoria de Foucault e o que foi noticiado.
Fica claro no texto que segue à reportagem, que se trata de uma série de abusos que acontecem com os funcionários de empresas no setor de telemarketing, com o objetivo de forçar os funcionários a atingirem as metas. Estes abusos são relatados quando se comenta: restrições de horários; invasão de privacidade; assédio moral; entre outros.
De acordo com Foucault, as empresas são como instituições disciplinares que tem como objetivo controlar e organizar o espaço e o tempo, bem como o indivíduo e sua conduta; com a finalidade de que o indivíduo alcance as metas e objetivos da própria instituição, e até mesmo da empresa; o que chama a atenção neste caso. Isso é salientado o quando se menciona no texto do programa de televisão “A empresa vai te trazer metas irreais, que não existem, diz uma ex-operadora […] “São metas absurdas, são abusivas demais”, diz uma exa-operadora.
Essa realidade vivida pelos funcionários compreendida a partir das ideias de Foucault resta nítida, quando toma como modelo prenunciador destas instituições um projeto de arquitetura chamado: “panóptico”. O “panóptico”, que foi uma construção feita para prisões, no qual o preso é olhado por um vigia que se encontra em uma torre elevada ao centro das celas individuais que estariam configuradas lado a lado formando um círculo. Da torre pode se ver todas as celas com clareza e todos os movimentos realizados pelos presos. Das celas não se vê nem os presos próximos e nem o vigia. Assim, não há necessidade de se ter alguém de fato exercendo a vigilância o tempo todo, pois se o preso não sabe se há alguém vigiando não tem como agir.
Atualmente o “panóptico” pode ser considerado de uma forma geral, como uma construção onde o planejamento consiste em possuir um ponto principal, no qual se consegue observar todos os outros pontos da estrutura, ou seja, criar um local no centro para que se possa observar o que todos estão fazendo. Este modelo se expande até os dias atuais sendo utilizada em muitas escolas e empresas.
Esse modelo panóptico não ficou restrito às prisões, estando “presente” em toda cultura disciplinar. O indivíduo é vigiado, adestrado e punido quase que permanentemente. E as instituições são reprodutoras deste sistema. É a sociedade controle substituindo a disciplinar. Com base no texto do programa de televisão, fica claro que o telemarketing tem em sua estrutura a adoção das medidas necessárias para manter o controle dessa vigilância de seus funcionários. Como exemplos observa-se nos seguintes comentários: “[…] a empresa controlava o tempo de ir ao banheiro. ‘Você tem cinco minutos para ir ao banheiro’ […] Cinco minutos era o tempo total, em um expediente de seis horas. […] ‘A minha gerente montou uma planilha e organizou uma escala onde as funcionárias deveriam engravidar pela ordem’, diz uma ex-operadora. Uma escala de gravidez. Acontecia em uma empresa em Minas Gerais. ‘Quem fosse engravidar teria que avisar com seis meses de antecedência’, conta a operadora.”
Esses destaques afirmam o Panoptismo. Assim, podemos afirmar que é a vigilância do comportamento através de uma visão geral; Foucault diz que vigiar a sociedade é mais barato do que punir; uma vez que esta punição resultaria na construção de mais hospitais psiquiátricos (manicômio) e prisões. Com base no texto do programa de televisão observa-se o quanto essa maneira de administrar as relações é empregada na sociedade capitalista.
Estendendo-se para outros espaços que não necessariamente pretendem punir, esta forma de poder também se manifesta através da vigilância e eminência de formas de punição que castigam o corpo não de forma física, mas psicológica e biológica. O controle do tempo garante a disciplina dos indivíduos e seu adestramento, evitando atitudes de rebeldia. No texto do programa de televisão verifica-se isso claramente, entre outras ocasiões, nos seguintes destaques: ‘[…] em muitas empresas são comuns essas interferências abusivas na vida pessoal das funcionárias. […] ‘Não é só na escala de gravidez, não. O empregador quer controlar o ciclo menstrual da mulher porque, quando ele souber que ela está no período fértil, eles falam: ‘olha, não esqueça que você está em uma semana fértil. Essa semana você não pode ter relações’, diz Renata Coelho, procuradora do Ministério Público do Trabalho.”
Uma sociedade disciplinar é constituída pelo modo de organizar o espaço e controlar todas as vias de comportamento, onde o corpo é controlado como uma máquina: formado, reformado, corrigido, sendo capaz de trabalhar.
Outro aspecto do poder disciplinar se relaciona também com o espaço através das disposições e organizações do mesmo. A dinâmica do novo modelo de organização espacial foi estendida outras instituições e espaços, como escolas, hospitais, dentre outros. Os espaços fechados eram, ao mesmo tempo, arejados e amplos, permitindo a vigilância dos diversos indivíduos ali presentes.
Foucault nos diz que as disciplinas são técnicas para assegurar a ordem na sociedade. A disciplina sobre o corpo tem por finalidade produzir indivíduos dóceis e submissos a determinados sistemas e ao mesmo tempo, estes devem oferecer uma mão-de-obra de qualidade que ajude o desenvolvimento econômico da sociedade. A disciplina tem seu aspecto político ao produzir indivíduos submissos ao poder do Estado, garantindo o “equilíbrio” e a “ordem”.O poder disciplinar tem como função “adestrar”. Para o adestramento podemos entender que a exposição de funcionários que não atingem as metas propostas pelos supervisores de telemarketing, como uma maneira de submeter ainda mais às exigências da empresa. Vejamos: “Um supervisor, por não ter levado a sua equipe a bater a meta, foi colocado no que eles chamam de dinâmica motivacional, colocaram uma roupa de prisioneiro nele. Uma outra funcionária se vestiu de policial militar, e colocaram ele de quatro na frente da equipe inteira’, conta […] advogado trabalhista. […] ‘Nós chamamos hoje os telecentros de senzalas modernas, porque os trabalhadores não têm direito nem a ir ao sanitário’, afirma Joselito Ferreira, Federação Nacional dos Trabalhadores em Telecomunicações.”
O poder e a disciplina sobre o corpo possibilitam o funcionamento de instituições e grupos sociais de maneira a atender os objetivos de funcionamento da sociedade capitalista. Desta forma, Foucault diz que o corpo passa a ser considerado um objeto possível de controle disciplinar, pois o controle sobre o este e sobre o modo de vida dos indivíduos, de forma sutil, evitava possíveis levantes e protestos, mostrando-se mais eficiente.
Disciplina e Instituição estão sempre vinculadas na sociedade. Sem as instituições não há controles. Estas difundem as leis e também criam suas próprias normas de funcionamento, cercando e vigiando o indivíduo em seus menores atos.
Assim, para o funcionamento do poder disciplinar empregam-se dispositivos presentes em nossa sociedade de forma sutil, às vezes nem tanto, mas que preservam e garantem a ordem e a manutenção do meticuloso funcionamento da sociedade ocidental contemporânea.
Referências
FOUCAULT, Michel. O Panoptismo. In: Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. Trad. Raquel Ramalhete. 41 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013, p. 186-214.
Muchail, Salma Tannus. O lugar das instituições na sociedade disciplinar. In: Ribeiro, Renato Janine(org.). Recordar Foucault. São Paulo: Brasiliense, 1986, p.196-208.
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