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Diálogos entre Oliver Sacks e B.F. Skinner: O ver e o não ver

Esse artigo começa com uma afirmação muito interessante encontrada em diversas culturas, e em diferentes contextos, que consiste na capacidade de olharmos muitas coisas, mas só vermos algumas. Mas o que essa afirmação quer dizer exatamente?

A ciência prova que os olhos do ser humano são capazes de captar/ver diversos objetos, dependendo da intensidade luminosa dos mesmos. Contudo, somente alguns objetos chamam nossa atenção, ou mesmo "ficam em nossa memória" para serem recordados futuramente. Para exemplificar esse raciocínio pode-se utilizar a frase popular "estava bem debaixo do meu nariz, mas mesmo assim não vi". Esse fato ocorre em diversas situações, desde casos patológicos até mesmo no cotidiano de pessoas que gozam de plena saúde física e mental. Mas como esse fenômeno é explicado pela ciência?

Oliver Sacks, em seu livro intitulado "Um antropólogo em Marte", publicado em 1995, aborda tal fenômeno ao descrever um caso de um homem praticamente cego desde os primeiros anos de vida e que aos 50 anos passa por uma cirurgia ocular, recuperando a possibilidade de ver.

Segundo o autor:

Quando abrimos nossos olhos todas as manhãs, damos de cara com o mundo que passamos a vida aprendendo a ver: O mundo não nos é dado. Construímos nosso mundo através de experiências, classificação, memória e reconhecimentos incessantes. Mas quando Virgil abriu os olhos (…) não havia mundo algum de experiências e sentido esperando-o. (p. 129)

Em outras palavras, o ser humano vê aquilo que aprendeu a ver. O ato de ver determinado objeto envolve um longo aprendizado de identificar esse objeto dentro de um ambiente onde existem milhares de objetos. Ou seja, para ver determinado objeto o ser humano precisa aprender a vê-lo.

Skinner (1976) concorda com essa idéia ao dizer que:

Uma pessoa não é um espectador indiferente a absorver o mundo como uma esponja. (…) Não estamos simplesmente "cientes" do mundo ao nosso redor; respondemos a ele de maneiras idiossincráticas por causa daquilo que aconteceu quando estivemos em contato com ele ( p. 82)

Para explicar melhor o trecho de Skinner, faz-se necessário abordar o conceito de discriminação, extremamente importante em sua obra. O conceito de discriminação pode ser entendido como o controle de estímulos antecedentes sobre a emissão da resposta, sendo esse controle produto de uma história específica de reforçamento, onde a resposta foi seguida de reforço quando emitida na presença de determinados estímulos e não foi seguida de reforço quando emitida na presença de outros estímulos.

Ao longo de sua obra, Skinner evidencia que a relação de controle de estímulos antecedentes sobre a emissão da resposta é característico do comportamento operante.      Para o autor, o fato de mesmo comportamentos elementares envolverem discriminação tem uma implicação importante: todo comportamento operante, do mais simples ao mais complexo, é produto de um processo que envolve experiências concretas do indivíduo com o mundo.

Através da experiência concreta com o mundo, cada ser humano adquire o comportamento de ver, entendido aqui como o comportamento de discriminar um objeto dentro de um ambiente composto por milhares de objetos. Assim, não vemos os objetos simplesmente porque eles existem no mundo concreto, mas os vemos porque há uma história de reforçamento onde a minha resposta de ver um objeto foi reforçada. O ver, o que é visto e quando é visto são construídos na nossa história de interação com o mundo.

REFERÊNCIAS

SACKS, Oliver. Ver e não ver. In: SACKS, O. Um antropólogo em Marte. São Paulo, Companhia das Letras, 1995.

SKINNER, Burrhus Frederic. About behaviorism. New York, Vintage.  1974.

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