RedePsi - Psicologia

Artigos

A sexualidade na adolescência: uma perspectiva dos pais

Introdução

A adolescência, época de crise, é um período da vida que apresenta grande complexidade, marcado por conflitos internos e externos. É assim que a maioria dos autores e, em um âmbito mais generalista, a sociedade, caracteriza a adolescência, relacionando-a, em geral, a um significado de caráter negativo, que remete à dependência, irresponsabilidade, dificuldades emocionais e impulsividade (BECKER, 1987; CONTINI; KOLLER; BARROS, 2002; NETO; OSÓRIO, 2000; VILLELA; DORETO, 2006; ZAGURY, 2001). Apesar disso, observa-se que a adolescência é também um fenômeno constituído histórica e culturalmente e apesar das várias definições relacionadas ao termo, estas variam de acordo com o contexto social, levando-se em consideração diferentes critérios, dentre os quais, aspectos cronológicos, do desenvolvimento físico, sociológico e psicológico (PFROMM NETTO, 1976).

Atualmente, com a entrada cada vez mais cedo das crianças na puberdade e a demora em chegar à idade adulta, a adolescência vem ganhando grande valorização e relevância no que se refere as problemáticas levantadas em estudos, tanto no campo da educação quanto da saúde (OLIVEIRA et al., 2009; ZAGURY, 2001). Estando cada vez mais prolongada, esta fase constitui-se em um processo complexo e altamente mutável e, para sua adequada compreensão, requer uma abordagem integral e que contemple os fenômenos individuais, familiares e sociopolíticos de um determinado contexto e em certo período de tempo (NETO; OSÓRIO, 2000).

Hoje, a definição mais utilizada está de acordo com a Organização Mundial de Saúde (2004), em que a adolescência compreende o período dos dez aos dezenove anos de idade. Contudo, há dificuldade em estabelecer limites universais e exatos para a sua duração, pois de acordo com Pfromm Netto (1976, p. 4),

 

O início da adolescência define-se em termos fisiológicos e sua duração e término em termos psicológicos… Fisiologicamente, começa no momento da puberdade, assim que o indivíduo se torna apto para reproduzir a espécie. Psicologicamente e cronologicamente, chega ao fim quando o indivíduo atinge certo grau de maturidade em quase todos os aspectos.

 

O fenômeno da adolescência é caracterizado por alterações físicas, decorrentes da puberdade, como o surgimento de uma atividade hormonal, desenvolvimento dos órgãos genitais e aparecimento de pelos, mudanças biológicas que tornam o indivíduo apto à procriação. Além das transformações físicas, a adolescência é marcada, também, pelas descobertas e pela busca da superação de obstáculos, pela conquista da independência pessoal e emocional e pela necessidade de entrar no mundo do adulto, com a irrupção de um novo papel, que modifica sua posição frente a si, aos outros e ao mundo (ABERASTURY et al., 1991; PFROMM NETTO, 1976; SOUSA; FERNANDES; BARROSO, 2006; SUPLICY, 2000).

Dentre tantas transformações que vive o adolescente, o sexo e a sexualidade são uma das mais importantes, pois, apesar de manifestarem-se de diferentes maneiras, em todas as fases do desenvolvimento, do bebê ao indivíduo adulto, é na adolescência que se caracterizam como aspectos fundamentais. É nesta fase da vida que a personalidade passa por uma transformação, estando em fase final de estruturação, e a sexualidade se insere nesse processo, sobretudo como um elemento estruturador da identidade do adolescente (CANO; FERRIANI; GOMES, 2000; FIGUEIRÓ, 2009b; SOARES et al., 2008; SUPLICY, 2000).

“A sexualidade talvez seja uma das áreas do comportamento humano que sofreram maiores mudanças nos últimos tempos” (KUPSTAS; COSTA, 1997, p. 22). Conforme Cano, Ferriani e Gomes (2000), o sexo tornou-se um dos assuntos mais discutidos dos tempos modernos, embora Freud (1905), já no fim do século passado, tenha escrito e debatido muitas questões relativas à sexualidade e ao comportamento sexual. Embora seja vivida desde a antiguidade, somente há poucas décadas a sexualidade tem sido realmente desvendada, estudada e divulgada, antes disso, foi longamente reprimida (TIBA, 1994).

Atualmente, existe uma maior consciência e muito mais conhecimento sobre a sexualidade, porém falar deste tema ainda é um desafio, pois ele continua cercado de mitos e preconceitos. Apesar disto, a sexualidade é, sem sombra de dúvidas, um dos campos de maior importância e complexidade da vida e se faz presente em todas as etapas do nosso desenvolvimento como ser humano, manifestando-se, diariamente, em circunstâncias aparentes ou não, sendo necessário, portanto, falar deste assunto como se fala de qualquer outro (FIGUEIRÓ, 2009a).

Apesar da visão de mundo de um indivíduo desenvolver-se através da influência de diversos fatores presentes em seu contexto sociocultural, é no ambiente familiar que os tabus sobre sexualidade refletem-se mais marcantemente, sobretudo em se tratando do adolescente, um grupo que vem se apresentando cada vez mais vulnerável a riscos relacionados à saúde reprodutiva e sexual (SOUSA; FERNADES; BARROSO, 2006).

Como qualquer outro aspecto da vida, a sexualidade também sofre influências diretas da cultura e, apesar da visão de mundo de um indivíduo desenvolver-se através da influência de diversos fatores presentes em seu contexto sociocultural, é no ambiente familiar que os tabus sobre sexualidade refletem-se mais marcantemente, sobretudo em se tratando do adolescente, um grupo que vem se apresentando cada vez mais vulnerável a riscos relacionados à saúde reprodutiva e sexual (SOUSA; FERNADES; BARROSO, 2006).

O que ocorre na verdade é que, diante de todas as transformações atuais, cada vez mais rápidas, é na fase da adolescência que as famílias costumam sentir-se despreparadas para atender as “exigências” dos filhos, como é o caso da orientação sobre sexualidade em suas várias dimensões. Muitas vezes os pais não sabem como agir diante das demonstrações de sexualidade de seus filhos, pois não é, para eles, uma tarefa fácil aceitar e entender a maneira de pensar dos jovens, sendo preciso rever preconceitos e estereótipos e entender as diferenças de ideias (ALMEIDA; CENTA, 2009).

Atualmente, as regras e comportamentos a serem transmitidos aos filhos não são claros. Os pais, perdidos em meio às rápidas mudanças da sexualidade, encontram-se no dilema de “educar seus filhos com a liberdade pela qual lutaram ou reproduzir a educação autoritária que receberam” (TIBA, 1994, p. 11). Muitos percebem que talvez não sejam adequadas as atitudes restritivas, entretanto, não sabem como agir diante da situação (CANO; FERRIANI; GOMES, 2000; SUPLICY, 2000).

De acordo com Cano, Ferriani e Gomes (2000), esta dificuldade dos adultos que cercam o adolescente, principalmente os pais, em abordar a temática da sexualidade no dia a dia, não permite aos jovens que tenham uma fonte segura para esclarecer suas dúvidas. Entretanto, é no convívio familiar, entre pessoas que se estimam e tentam superar os problemas cotidianos que as questões da sexualidade devem ser debatidas, levando-se em conta os valores, atitudes, crenças religiosas e culturais da família.

Percebe-se que, apesar de ser tarefa essencial da família a educação sexual dos filhos, muitas vezes, há esquiva em abordar o assunto. Portanto, além dos muitos estudos sobre a visão dos adolescentes no que se refere à sexualidade, faz-se necessária a pesquisa neste campo visando compreender o assunto, também, sob a ótica dos pais destes jovens, verificando quais as suas opiniões sobre a questão da sexualidade dos filhos, sobre as rápidas transformações dos padrões de comportamento e suas principais dificuldades, preocupando-se com o tipo de comunicação estabelecida entre pais e filhos.

Deste modo, o tema do presente estudo aborda a sexualidade na adolescência, buscando compreender a percepção dos pais sobre o assunto. Os objetivos da pesquisa consistem em verificar a presença ou ausência de diálogos entre pais e filhos sobre a temática da sexualidade, compreender a importância das conversas sobre o assunto na visão dos pais, conhecer os temas mais abordados por eles nas conversas com os adolescentes e identificar se há diferenças na educação sexual, no que se refere ao gênero dos filhos.

2 MÉTODO

Este estudo classifica-se, segundo seus objetivos, como uma pesquisa exploratória, e segundo os procedimentos técnicos, como um estudo de campo, métodos que visam maior aprofundamento e familiaridade com as questões propostas (GIL, 2008).

A amostra da pesquisa foi selecionada por conveniência, sendo composta por sete casais, pais e mães de adolescentes, de ambos os gêneros, com idades entre 12 e 16 anos, período em que, como ressalta Tiba (1994), a sexualidade está no auge de seu desenvolvimento. Os participantes foram escolhidos por conveniência. Para a coleta dos dados, optou-se pela entrevista semi-estruturada, conduzida com uso de um roteiro, mas com liberdade de serem acrescentadas novas questões (MARTINS; THEÓPHILO, 2007).

Após o contato com os participantes para o esclarecimento dos objetivos da pesquisa, foram agendadas datas e horários para a realização das entrevistas com cada casal, para o levantamento dos dados desejados. Todos os participantes fizeram a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As entrevistas gravadas foram transcritas na íntegra. Os dados foram analisados a partir do método qualitativo, com base na análise de conteúdo categorial ou temática, que funciona por operações de desmembramento do texto em unidades, em categorias segundo reagrupamentos analógicos (BARDIN, 2000).

 

3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
 

Buscando considerar a percepção dos pais sobre a sexualidade de seus filhos adolescentes, os resultados da pesquisa, obtidos por meio das entrevistas, foram analisados e classificados categorialmente, a partir da análise de conteúdo. Após a verificação das falas dos entrevistados foram identificadas as seguintes categorias: Conceito de sexualidade; Início do esclarecimento sexual; Percepção sobre a sexualidade dos filhos; Importância do diálogo; Temas abordados; Dificuldades; Diferenças na educação sexual, que serão discutidas na sequência.

 

Conceito de Sexualidade

O conceito de sexualidade é muito amplo. A sexualidade faz parte da vida de todos os indivíduos e talvez se constitua num dos tópicos mais importantes e mais difíceis para a sociedade como um todo, principalmente quando refere-se à adolescentes e seus pais (ALMEIDA; CENTA, 2009; OUTEIRAL, 1994). Para os pais ainda é muito difícil falar sobre o assunto sexualidade, dificuldade esta representada pelo evidente constrangimento dos mesmos durante as entrevistas, uma vez que, quando questionados sobre o significado subjetivo da palavra sexualidade, os pais hesitaram em responder. Os participantes demonstraram não saber expressar o que de fato caracterizava a sexualidade, entretanto cada um apresentou sua opinião sobre o que acreditava defini-la. O conceito de sexualidade foi relacionado, principalmente, com relação sexual, o que para os entrevistados é uma “coisa normal”, que acontece nos relacionamentos e que faz parte de toda e qualquer pessoa.

– “[…] é sexo né, sexo é assim, quando que duas pessoas se relacionam né […].” (Mãe 6)

Para alguns pais, entretanto a sexualidade demonstra algo mais do que somente o ato sexual, mas uma forma de relacionar-se ou um “complemento do amor”.

– “Sexualidade é abrangente, eu acho que não envolve só o sexo em si e também afetividade, a maneira de se relacionar com os outros.” (Mãe 3)

– “Sei lá, no meu ponto de vista demonstra um gesto de carinho, de afeto por outra pessoa, eu acho, não é só ter uma relação.” (Pai 3)

Principalmente para as mães, a sexualidade, também, está ligada a transição da infância para a adolescência, caracterizando uma fase do desenvolvimento humano. Isto se justifica, pois é justamente nesta fase que o sexo e a sexualidade recebem maior atenção, uma vez que é na adolescência que ocorrem as mais perceptíveis alterações biológicas/fisiológicas, psicológicas e sociais, pelas descobertas e pela busca da superação de obstáculos, incluindo, também, a conquista da independência pessoal e emocional (SUPLICY, 2000; PFROMM NETTO, 1976; SOUSA; FERNANDES; BARROSO, 2006). É, também, durante esta fase que a personalidade passa por uma transformação, estando em fase final de estruturação, e a sexualidade se insere nesse processo, sobretudo como um elemento estruturador da identidade do adolescente (CANO; FERRIANI; GOMES, 2000; SUPLICY, 2000).

– “Sexualidade, é quando, penso eu, a criança passa pela fase da adolescência e começa a se descobrir, a se conhecer.” (Mãe 7).

As definições ressaltadas pelos entrevistados traduzem alguns aspectos da sexualidade, entretanto, essa aparente dificuldade dos pais em relação ao conceito pode estar relacionada a não existência de uma única definição para a palavra. Os autores, em sua maioria, colocam que a sexualidade está presente em nossa vida desde o momento em que nascemos até a nossa morte e manifesta-se, diariamente, em circunstâncias aparentes ou não, representando um dos campos de maior importância e complexidade da vida humana. É revelada em expectativas, imaginações, anseios, crenças, postura, valores, atitudes práticas, papéis e convivência. Abrange, além do corpo, a história, os costumes, as relações afetivas e a cultura. É uma das dimensões do ser humano que inclui gênero, identidade sexual, orientação sexual, erotismo, envolvimento emocional, amor e reprodução (FIGUEIRÓ, 2009a; KUPSTAS; COSTA, 1997).

Segundo a OMS (1975, apud MELO; POCOVI, 2002, p. 17),

 

A sexualidade humana forma parte integral da personalidade de cada um. É uma necessidade básica e um aspecto do ser humano que não pode ser separado de outros aspectos da vida. A sexualidade não é sinônimo de coito e não se limita a presença ou não de orgasmo. Sexualidade é muito mais do que isso. É a energia que motiva a encontrar o amor, contato e intimidade, e se expressa na forma de sentir, nos movimentos das pessoas e como estas se tocam e são tocadas.

 

Pode-se perceber que, apesar de não haver um conceito universal do termo sexualidade, os autores concordam que esta não se resume ao ato sexual. O sexo é apenas um dos aspectos desta rica dimensão humana. A sexualidade se constitui numa elaboração histórica e cultural, que está presente em todos os contextos e em qualquer relação humana (MELO; POCOVI, 2002).

 

Início do Esclarecimento Sexual

No que diz respeito à idade adequada para o início do esclarecimento sexual, não houve consenso entre os pais. Dos quatorze pais entrevistados, a maioria (50%) acredita que o esclarecimento deve ter início após os dez anos, sendo a idade ideal entre os 10 e os 13 anos, pois esta é a fase em que há um entendimento maior por parte dos filhos e o corpo começa a se desenvolver e modificar-se.

– “[…] entre 10, 12 ou 13 anos por aí é bom […], eu acho que com 12 anos já é uma boa idade pra aprender.” (Mãe 5)

– “[…] eu acho que seria ali por volta dos 11 ou 12 anos já começar falar sobre isso né.” (Pai 4)

A crença dos pais de que a partir dos 10 anos a criança esteja preparada para conversar sobre sexo, coincide com o início da puberdade, que segundo Eizirik, Kapczinski e Bassols (2001, p. 117),

 

[…] é uma fase do ciclo vital biológico que abrange um conjunto de mudanças corporais causadas por hormônios, tais como crescimento das mamas, mudança de voz, primeira menstruação, e que está intimamente ligada com o processo de crescimento físico, maturacional. É um processo de maturação lento e progressivo, quando comparado com outras mudanças biológicas que ocorrem durante a vida e também com características mais dramáticas devido a sua magnitude.

 

É também no período dos 10 anos que ocorre o que Freud chamou de “período de latência”, momento em que ocorre a repressão da energia sexual decorrente do Complexo de Édipo. Esta energia então é temporariamente deslocada e como não pode ser eliminada, é canalizada para outras finalidades ligadas ao desenvolvimento intelectual e social da criança, através da sublimação (FREUD, 1905-1996). “A sexualidade que permanece reprimida durante este período, aguarda a eclosão da puberdade para ressurgir. Enquanto a sexualidade permanece dormente, as grandes conquistas da etapa situar-se-ão nas realizações intelectuais e na socialização” (RAPPAPORT; FIORI; DAVIS, 1981, p. 45).

Apesar dos indicadores do processo de puberdade, alguns pais relatam não haver uma idade definida ou preestabelecida para o início dos diálogos sobre a sexualidade. Ressaltam, porém, a importância de falar sobre o assunto desde cedo, para que os filhos aprendam de uma “forma correta”, mas de acordo com sua própria necessidade ou curiosidade.

– “Quanto antes melhor né, por que sabe, se você deixar eles aprenderem de uma forma que não devia talvez aconteça o que acontece hoje em dia[…], se eles vêm desde criança entendendo o que significa isso, eu acho que já muda um pouco esse conceito.” (Pai 3)

– “Olha, eu acho que não tem assim uma idade pra ter início, por que eu acho que, automaticamente, eles vão aprendendo durante toda a vida […].” (Pai 7)

– “Quando eles têm perguntas a fazer, quando eles acham que eles querem aprender.” (Mãe 3)

Na realidade, é impossível saber precisamente quando o filho estará pronto para receber informações sobre sexualidade, pois como coloca Nunes (1997, p. 19), “não há uma época a iniciar a 'educação sexual'. Desde que nascemos somos seres sexualizados […]”. Apesar de a sexualidade só alcançar sua plenitude durante a adolescência, a educação é transmitida desde o nascimento e se caracteriza como um processo contínuo, que irá se desenvolver durante toda a vida. Exemplos disso são a escolha do nome, as cores do quarto, os brinquedos e o tipo de brincadeiras entre pais e filhos, que vão transmitindo, mesmo que não explicitamente, os valores e crenças da família sobre a sexualidade (TIBA, 1994).

É necessário que os pais percebam a importância dos diálogos familiares desde a infância, pois de uma forma ou de outra eles estarão educando seus filhos sexualmente. Até mesmo não falar sobre sexo, passa uma informação, pois o silêncio pode transmitir uma sensação de constrangimento e de relutância em falar sobre sexo ou então de falta de interesse e até de desaprovação em relação ao assunto. É importante, também, desvincular a crença de que apenas com a chegada da puberdade é que se deve iniciar o processo de educação sexual, como se, quando chegada essa época da vida, os pais fossem obrigados a discutir sobre sexo com seus filhos.

 

Percepção sobre a sexualidade dos filhos

A maneira como os pais percebem a sexualidade de seus filhos, bem como as demais transformações decorrentes da adolescência é extremamente importante. Uma percepção adequada pode revelar aos pais o que está acontecendo com seus filhos em termos de experiências sexuais, conseguindo identificar quando estes desejam conversar sobre sua sexualidade ou quando estão prestes a iniciar sua vida sexual (DIAS; GOMES, 1999).

Um dado que merece atenção é que os pais entrevistados afirmam não perceber muita coisa relacionada, especificamente, à sexualidade dos filhos. Os aspectos mais destacados pelos pais foram as mudanças maturacionais, de desenvolvimento e comportamento dos adolescentes. No que se refere à sexualidade, os entrevistados apenas relatam perceberem-na como uma característica normal, agindo com naturalidade frente às mudanças que vem ocorrendo com os filhos.

– “Ai, eu não vejo muita coisa assim […].” (Mãe 4)

– “Eu vejo como uma coisa normal, que vai acontecendo né […].” (Pai 1)

– “Eu acho normal, eu acho que faz parte do desenvolvimento […].” (Pai 7)

A justificativa dos pais para essa não percepção da sexualidade está na crença de que os filhos ainda são inocentes e tímidos perante os aspectos mais aprofundados que a caracterizam. Entretanto, como ressaltam Sousa, Fernandes e Barroso (2006), frequentemente, os pais tendem a negar que os filhos cresceram e enganam-se com a ideia de que ainda não estão preparados para receber informações, evidentemente, subestimando a sexualidade de seus filhos adolescentes. Acreditando que os filhos não pratiquem relação sexual, os pais evitam discutir sobre sexo e ficam à espera de “algum sinal” que indique que os jovens descobriram a sexualidade. Entretanto, esse sinal pode surgir como produto de uma prática sexual desprovida de orientações ou baseada em informações inadequadas. Muitas vezes, é justamente esta não aceitação da sexualidade do adolescente que impede a implementação de um diálogo eficiente sobre sexualidade entre pais e filhos. 

– “Ele é bastante tímido ainda, não resolveu namorar ainda […], mas eu já percebo o olhar dele pras meninas, as meninas começam olhar pra ele […].” (Mãe 3)

– “Olha, nesse ponto ela ainda é bem assim tímida […], eu acho que ela ainda ta numa fase assim bem criança ainda, que não chegou a despertar ainda a adolescência sabe nela.” (Mãe 7)

Outra percepção relatada pelos pais é de que os filhos encontram-se bastante esclarecidos sobre a temática da sexualidade, pensando, inclusive, que os adolescentes tem melhores informações que eles próprios sobre o assunto. O que ocorre, entretanto, na maioria das vezes, é que por acreditarem que os filhos estão melhor informados do que realmente estão, os pais fornecem aos jovens, apenas informações superficiais, julgando que estes já conhecem o suficiente sobre o assunto (DIAS; GOMES, 1999).

– “Ah, eles já sabem de tudo né […].” (Mãe 6)

Para alguns pais, a sexualidade dos adolescentes também é percebida como fonte de preocupação. Isto se dá pelo fato de, atualmente, existirem muitos fatores negativos envolvidos ao assunto, principalmente no que se refere à relação sexual, como a gravidez precoce e as doenças sexualmente transmissíveis.

– “A gente pede né, que preste atenção no que ta fazendo né, se for fazer alguma coisa que faça com segurança né, por que hoje em dia ta meio complicado né, esse negócio de doença e tudo né.” (Pai 4)

Entretanto, como ressaltam Nogueira, Saavedra e Costa (2008), “é importante falar, na educação sexual, da vivência da sexualidade na intimidade, no prazer e no desejo, independentemente da orientação sexual, e não incidir apenas na visão negativa dos comportamentos de risco (embora esses não possam ser esquecidos), a par de uma clara informação de como os evitar.”

 

Importância do diálogo

O diálogo é fundamental para um bom relacionamento, principalmente em se tratando de pais e filhos. Para as mães entrevistadas essa importância é reconhecida, uma vez que estas responderam, em sua maioria (86%) (n=6), afirmativamente com relação à presença de diálogo sobre sexualidade com seus filhos adolescentes. Apenas uma das mães relatou nunca ter conversado com o filho sobre o assunto. No entanto, no que diz respeito aos homens, quatro deles alegaram nunca ter tido nenhum tipo de diálogo referente à sexualidade com os adolescentes e os três restantes disseram que os diálogos até ocorrem, mas raramente e de modo superficial. Estas evidências demonstram a pouca frequência de diálogos e participação do pai na vida de seus filhos, especialmente das filhas, sendo que estes acabam relegando esta função à mãe.

– “Ela busca informação com a mãe.” (Pai 1)

Os dados obtidos através das entrevistas corroboram as informações levantadas por Borges, Nichiata e Schor (2006), afirmando que os pais são a principal fonte de esclarecimento de dúvidas sobre assuntos relativos à sexualidade, apesar dos adolescentes de ambos os sexos referirem-se, majoritariamente, às suas mães na busca do diálogo. A frequência do diálogo com a figura materna também foi bastante alta na pesquisa realizada por Wagner e colaboradores (2002), onde a grande maioria dos adolescentes (75%) afirma conversar muito com a sua mãe e apenas 2,1% dos sujeitos referem não conversar nada.

Esses dados parecem confirmar a tradicional função da mãe como responsável pelo cuidado e mediação das relações familiares, cabendo a ela, normalmente, a função de cuidadora do lar e dos filhos. Entretanto, apesar da mãe, aparentemente, ter a função de conversar com os filhos, a iniciativa de diálogo, partiu, em sua maioria (57%) (n=4), dos próprios adolescentes, que as procuraram para esclarecer dúvidas ou relatar fatos vivenciados.

– “Foi ela que veio procurar eu pra gente conversar.” (Mãe 2)

– “Sempre deixei eles livres pra perguntar […].” (Mãe 3)

– “Ela vem contar, assim, uma coisa que ela ouviu, que as amigas falam né, daí a gente entra no assunto e conversa sobre isso.” (Mãe 5)

Apesar da importância e abertura dos filhos em tomar iniciativa com relação aos diálogos sobre sexualidade, para Figueiró (2009b) é preciso também que os pais compreendam que, diante de uma dúvida ou pergunta do filho sobre o assunto, “não basta responder, é preciso conversar, o que implica também em não somente aguardar as perguntas, mas propô-las à criança, instigando sua vontade de saber”.

Alguns pais (28%) (n=2) também demonstraram a importância da escola e dos amigos na transmissão de conhecimento sobre sexualidade aos adolescentes. Freitas e Dias (2010) afirmam em seus estudos que os adolescentes adquirem informações sobre a sexualidade, principalmente com amigos, em revistas, filmes, televisão e internet. Isto se dá, pois os pais abordam apenas superficialmente o tema com os filhos, quando o fazem. Diante do silêncio em casa, o adolescente tende a procurar informações com os amigos, que, na maioria das vezes, também são adolescentes desinformados, contribuindo, dessa maneira, para a prática do sexo de forma insegura (LEVANDOWSKI; SCHMIDT 2010; SOUSA; FERNADES; BARROSO, 2006; VENTURA; CORRÊA, 2006).

– “Ah, isso aí eu acho que com as amigas né, na aula, as amigas.” (Pai 2)

– “Acho que eles aprendem tudo na escola, eles tem aula sobre isso e tudo né.” (Pai 6)

O papel da escola, sem dúvida, é também extremamente importante na educação sexual dos adolescentes, entretanto, todo e qualquer processo educacional, principalmente o escolar, não pode prescindir de um trabalho integrado, onde a função da família é fundamental, pois ela é o núcleo de construção social da sexualidade, onde são repassadas as primeiras percepções e valores. Entretanto, muitas vezes os pais transferem a responsabilidade da educação sexual para a escola, e a escola para os pais, o que acaba deixando o adolescente perdido e sem as informações necessárias (FREITAS; DIAS, 2010).

Um item que merece atenção é o fato de alguns pais acreditarem que seus filhos não buscam informações sobre esse assunto, por serem “inocentes” no que se refere à temática da sexualidade. Percebe-se que muitos pais acreditam erroneamente que os adolescentes estão ou muito avançados ou ainda não preparados em relação à temática sexualidade, não precisando, portanto, de orientação sobre o assunto. Mas os adolescentes não só querem essa orientação como precisam dela, vinda de quem realmente se preocupa com eles, visando seu desenvolvimento pleno e saudável.

– “No meu ponto de vista ele não procura, por que pelo que a gente vê, que ele não tem interesse a respeito disso, ele é bem inocente assim, sobre esses assuntos, não vai muito a fundo.” (Pai 3)

Apesar de os diálogos serem escassos entre os pais e os adolescentes, todos os participantes acreditam que as conversas sobre sexualidade são importantes, principalmente para educação dos filhos e para sua prevenção. Para as mães, o fator prevenção demonstrou ter um teor de maior importância, ao passo que para os pais, o foco esteve na educação e no esclarecimento.

– “[…] daí eles também podem evitar, hoje em dia tem tanta coisa né […].” (Mãe 1)

– “[…] não cometer os erros que muitas cometem né, de pegar AIDS […], pra pegar camisinha, comprar os preservativos.” (Mãe 2)

– “É pra esclarecer, pra explicar sobre os perigos que tem por aí, tanto de doença como de engravidar, e até de se portar assim […].” (Mãe 5)

– “Eu acho que é muito importante a gente conversar com os filhos sobre isso aí, esclarecendo, tentando ensinar o que a gente sabe também.” (Pai 1)

– “[…] se todos tiverem o conhecimento dessa relação, do conceito do que é o pênis, o que é a vagina, se eles conhecerem no dia a dia deles de criança, não vai ser aquela coisa de desejo, desejo, de querer conhecer aquilo e ter curiosidade de saber, então aí eles já vão ter o conhecimento e saber quando é hora certa de ter uma relação […].” (Pai 3)

Esta preocupação dos pais faz todo sentido, uma vez que estudos demonstram a importância da família como fonte de informações acerca da sexualidade, sendo o diálogo familiar uma das principais medidas para aumentar a taxa de utilização de métodos contraceptivos e de prevenção na primeira relação, evitando, assim, uma gravidez não planejada e as doenças sexualmente transmissíveis. Estes estudos indicam, também, que a educação sexual promovida pela família e/ou pela escola contribui para postergar a iniciação sexual dos adolescentes (BORGES; NICHIATA; SCHOR, 2006; LEVANDOWSKI; SCHMIDT, 2010).

 

Temas abordados

Com relação aos temas mais abordados pelos pais durante as conversas com seus filhos adolescentes, verificou-se que a maior parte dos assuntos refere-se à prevenção, tanto de doenças sexualmente transmissíveis como da gravidez precoce. A importância do uso dos preservativos também foi mencionada. Algumas mães ressaltaram, ainda, os diálogos sobre relacionamentos, como namoro, indicando a necessidade de ter conhecimento sobre a pessoa com quem se relaciona e, também, certa maturidade para se envolver sexualmente. Apenas uma das entrevistadas mencionou conversar com a filha sobre aspectos do desenvolvimento, que incluem as transformações e o amadurecimento característicos da puberdade/adolescência.

– “[…] não é muito sobre a parte do sexo, é mais sobre namoro, gostar, essas coisas assim, conhecer, família […].” (Mãe 1)

– “[…] eu falo muito sobre prevenção, sobre o uso da camisinha, sobre ele ter maturidade pra se envolver sexualmente […].” (Mãe 3)

– “[…] é mais ou menos pra ela se cuidar […], eu procuro sempre falar de gravidez, de doença, essas coisas.” (Mãe 5)

Como é sabido, os pais têm o instinto fundamental de proteger seus filhos. Isso se aplica a todos os aspectos da vida, inclusive a sexualidade. Essa preocupação torna-se visível quando nas entrevistas os pais citam a enorme relação dos perigos e responsabilidades que acompanham uma pessoa sexualmente ativa, afirmando abordar nas conversas, em sua maioria, apenas aspectos negativos da sexualidade. Esse tipo de discurso sinaliza uma versão da sexualidade centrada no risco, no perigo e na doença, o que pode, entretanto, reforçar sua aparência muitas vezes pejorativa, omitindo os prazeres e benefícios que esta pode proporcionar (NOGUEIRA; SAAVEDRA; COSTA, 2008).

Segundo Cano, Ferriani e Gomes (2000), atualmente, com a banalização da sexualidade, tem ficado cada vez mais difícil a tarefa de educar, de associar sexo a afeto, responsabilidade e promoção da saúde. O lado positivo da sexualidade acaba sendo quase que totalmente encoberto pelo lado negativo, onde encontram-se as gravidezes precoces, as doenças sexualmente transmissíveis e os abusos sexuais em todas as suas formas. Todavia, é importantíssimo apresentar aos filhos ambos os lados.

Outra questão relevante é o fato de muitas vezes os pais também não conversarem com seus filhos nem mesmo sobre temas básicos. Assuntos como o mecanismo de funcionamento do corpo relacionado à puberdade, a maturação sexual, as vivências e conflitos decorrentes do crescimento e da sexualidade, que, geralmente, são pouco abordados pelos pais (GOMES et al, 2002).

 

Dificuldades

Como em qualquer relacionamento, a relação entre pais e filhos também é marcada por algumas dificuldades, principalmente no que diz respeito aos diálogos sobre sexualidade. Entre as mães de adolescentes, a maioria (57%) (n=4) afirma haver dificuldades para abordar assuntos relacionados à sexualidade com seus filhos. As mães dizem-se constrangidas em abordar o assunto, com medo de falar ou de não saber o que falar. Sentem-se mal, principalmente, quando o assunto é a relação sexual. Outro ponto ressaltado é que a dificuldade torna-se ainda maior quando as conversas se referem aos filhos de gênero oposto ao seu, o que pode, também, ser verificado nas respostas obtidas com os pais.

– “[…] tem coisas assim que dá medo de falar, não é medo, como é que eu vou dizer, eu me sinto mal assim de falar certas coisas […], que nem de relação sexual (sussurrando), daí pra mim é mais difícil […]”. (Mãe 5)

– “Vergonha eu acho, sei lá, vergonha e por que eu não sei como começar o assunto”. (Mãe 4)

As falas podem ser claramente justificadas, pois em períodos não muito distantes, o costume era o pai falar em particular com o filho, logo que percebia que o mesmo entrava na puberdade, ao passo que as mães tinham como tarefa falar sobre a maternidade para suas filhas. No entanto, as conversas nem sempre orientavam os filhos para a sexualidade, pois muito do que era dito relacionava-se a valores, na relação a dois, no casamento e às obrigações formais de pai e mãe (FIGUEIRÓ, 2009b).

Justamente por isso, Pfromm Netto (1976, p. 230) afirma que “as relações entre pais e filhos dependem dos sexos, isto é, o pai tem muito mais contato com os filhos que a mãe, e as suas relações com a filha são mais distantes que com o filho. Mãe e filha mantêm contato íntimo durante toda a vida, ao passo que o filho tende a afastar-se da mãe durante a adolescência”.

Ao contrário das mães, quando se trata dos pais, a maioria (57%) (n=4) afirma não haver dificuldades em estabelecer um diálogo sobre sexualidade com seus filhos, o que traz a tona uma importante questão: se os pais (homens) não percebem nenhuma dificuldade para conversar abertamente sobre sexualidade com seus filhos adolescentes, porque então eles não o fazem?

Os pais que ressaltaram a existência de alguma dificuldade apresentam as mesmas angústias já citadas pelas mães, incluindo o constrangimento em falar sobre o assunto, a dificuldade por não saber o que informar e ainda a questão referente ao gênero dos filhos.

– “Mais é com as meninas, com o filho não, com o filho é normal o pai debater sobre sexo, agora com a menina mais é a mãe, né”. (Pai 1)

– “Sei lá, de talvez ele não escutar, ou talvez a gente não saber falar bem certo o que é, o que não é né […]”. (Pai 4)

– “É acho que tem né, por que sabe a gente não estudo pra isso né, a gente não tem como chega e conversar diretamente né, pra nós é ruim, a gente fica constrangido”. (Pai 6)

Os pais revelam constrangimento, não falando, portanto, com liberdade sobre a sexualidade, sem sentir algum tipo de desconforto. Esta dificuldade em discutir livremente o assunto como qualquer outro, causa impressão de que a sexualidade é uma manifestação que precisa ser escondida, algo feio e vergonhoso, que não pode ser comentado em família. Entretanto, percebe-se que outra dificuldade encontrada pelos pais é que a maioria dos filhos, também, reluta em falar francamente sobre sexo. Sua resposta habitual é algo do tipo “ah mãe eu já sei, já sei o que tu vai falar”, ou então os adolescentes apenas ouvem o discurso dos pais em um silêncio desconfortável, não correspondendo ao diálogo. O que muitas vezes os pais não percebem é que os adolescentes relutam muito mais em discutir sexo abertamente quando sentem que os pais estão constrangidos com o assunto.

Na realidade não é fácil nem para os pais nem para os próprios adolescentes falar sobre sexualidade. Os problemas de comunicação entre pais e filhos frequentemente surgem porque ambos se sentem constrangidos ao tratar do assunto. Mas, apesar do embaraço, muitos pais se acham na obrigação de dizer algo para livrar-se do que entendem como seu dever, o que ocorre muitas vezes em momentos inoportunos e de uma forma desajeitada.

 

Diferenças na educação sexual

Em nossa sociedade, antes mesmo do nascimento de uma criança, a família já começa a diferenciá-la sexualmente através de roupas, cores, brinquedos e objetos. Os pais sutilmente vão impondo, principalmente durante a infância, as diferenças entre meninos e meninas, porém, a definição da identidade sexual só se dará ao longo de um complexo processo bio-psico-social, no qual as atitudes da família influem de maneira determinante (CANO; FERRIANI; GOMES, 2000).

A maioria dos pais confirma esta ideia, acreditando que existam diferenças na educação sexual, de acordo com o gênero dos filhos. Os pais concordam que para as meninas a educação deve ser mais rígida, sendo esta tratada com maior cuidado e menos liberdade. Já para os meninos, acreditam que a educação seja “mais tranquila” ou “mais fácil”, proporcionando-lhe, assim, maior liberdade e menos repreensão.

– “Eu acho que se for menino é mais fácil, com menino é mais tranquilo, eu pra mim com menina é mais ruim, com menino dá pra ter mais liberdade”. (Pai 2)

– “Tem, por que assim pra filha mulher já é um conselho que é mais pra se cuidar e tal e coisa e pra filho homem já tem um pouco mais de liberdade né […]”. (Pai 5)

– “Ah, tem bastante, são bem diferentes um do outro. As meninas tu tem que segurar mais […]”. (Mãe 2)

– Eu ainda acho que exista diferença, não deveria existir, mas eu ainda percebo que sim. A gente sempre trata a menina como uma princesinha que tem que ter cuidado […]”. (Mãe 3)

Os dados corroboram os achados de Sousa, Fernandes e Barroso (2006), que verificaram que os tabus sobre sexualidade refletem-se mais marcantemente no ambiente familiar do adolescente do sexo feminino, uma vez que os pais tendem a ser mais rígidos com as garotas. “As desigualdades de gênero condicionam os indivíduos a assumirem padrões de comportamento distintos; assim, o ser adolescente é culturalmente direcionado a pensar e agir de acordo com a natureza de seu sexo” (SOUSA; FERNANDES; BARROSO, 2006).

 

O ser 'menino' ou 'menina' é transmitido às crianças desde o nascimento pela educação informal, que estabelece as características da categoria a qual deverão pertencer, de tal forma que cria a estereotipia dos gêneros. O significado implícito na categoria deverá ser construído ou simplesmente aprendido com o tempo (RIBEIRO, 1996, p. 15).

 

Werebe (1998) concorda com o supracitado, dizendo que, frequentemente, as regras fixadas são diferentes para os dois sexos, com maiores restrições para as mulheres. A sexualidade, principalmente dentro da família, está sujeita a normas. As regras impostas à mulher não são as mesmas impostas ao homem sendo que este duplo padrão de moralidade, onde há liberdade sexual para o homem e restrições sexuais para a mulher, perdura até hoje.

Percebe-se que, apesar de os pais ressaltarem a importância dos diálogos, bem como da não diferenciação entre gêneros, continuam reproduzindo de forma acrítica o modelo de educação recebido por seus próprios pais, impregnado de medos, tabus e preconceitos que passam de geração para geração. Apesar disso, os pais já se encontram mais abertos e passíveis de mudanças, e para que essa renovação de valores e atitudes possa ocorrer, faz-se necessário que estes compreendam sua própria história em relação à sexualidade e as transformações nela ocorridas em diferentes épocas e culturas.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A adolescência é uma fase de emoções intensas, na qual o sujeito está em busca da consolidação de sua própria identidade e a sexualidade se insere neste contexto com um papel fundamental. É, principalmente, neste momento, em que, geralmente, os adolescentes acabam afastando-se um pouco da família, onde a comunicação entre pais e filho torna-se peça essencial para auxiliar o estabelecimento de relações mais satisfatórias e saudáveis.

Apesar da pouca frequência dos diálogos familiares, verificada no estudo, o ideal seria que os pais se aproximassem, dando mais oportunidades aos filhos para que estes possam falar o que pensam e sentem, pois é no lar que se desenvolve uma vivência mais próxima, gerada pela convivência diária. O primeiro passo é quebrar o tabu generalizado contra a sexualidade, podendo, assim, falar dela livremente. Há necessidade de conhecer melhor os mitos e a realidade da sexualidade para que os pais possam abordá-la de forma mais tranquila, mantendo um diálogo franco, desenvolvendo uma atitude positiva em relação à sexualidade e encorajando sua expressão desde a infância.

O que se pretende ressaltar é que apesar de todas as dificuldades para estabelecer uma conversa saudável em família, os pais devem oportunizar um espaço de diálogo, pautado pelo acolhimento das dúvidas e o fornecimento de informações diretas e adequadas ao desenvolvimento e contexto dos adolescentes. A oportunização deste espaço parece ser a melhor forma para se abordar a temática da sexualidade. O método mais eficaz de educação sexual, certamente, é aquele em que se estabelece um diálogo entre pais e filhos, tornando as discussões parte natural e normal de uma conversa. Desse modo, o pai ou o adolescente podem se sentir livres para discutir a sexualidade com naturalidade.

Por fim, constata-se que os estudos sobre a sexualidade infantil e na adolescência, em particular, sob a perspectiva dos pais, ainda são poucos, havendo muito por fazer. Uma sugestão seria investigar, também, “porque os pais, principalmente do gênero masculino, afirmam não ter dificuldade em estabelecer diálogo sobre sexualidade com seus filhos adolescentes e, no entanto, não o fazem?”

 

REFERÊNCIAS

 

ABERASTURY, Arminda et al. Adolescência. 6. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. 246 p.

 

ALMEIDA, Ana Carla Campos Hidalgo de; CENTA, Maria de Lourdes. A família e a educação sexual dos filhos: implicações para a enfermagem. Acta paul. enferm. [online]. 2009, vol.22, n.1, p. 71-76. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ape/v22n1/a12v22n1.pdf>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2000. 225 p.

 

BECKER, Daniel. O que é adolescência. 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. 97 p.

 

BEE, Helen L.. O ciclo vital. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. 656 p.

 

BORGES, Ana Luiza Vilela; NICHIATA, Lúcia Yasuko Izumi; SCHOR, Néia. Conversando sobre sexo: a rede sociofamiliar como base de promoção da saúde sexual e reprodutiva de adolescentes. Rev. Latino-Am. Enfermagem [online]. 2006, v.14, n.3, p. 422-427. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692006000300017&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.
 

BUENO, Francisco da Silveira. Dicionário escolar da língua portuguesa. 11. ed. Rio de Janeiro: FENAME, 1982. 1261 p.

 

CANO, Maria Aparecida Tedeschi; FERRIANI, Maria das Graças Carvalho; GOMES, Romeu. Sexualidade na adolescência: um estudo bibliográfico. Rev. Latino-Am. Enfermagem [online]. 2000, v.8, n.2, p. 18-24. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692000000200004&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

CONTINI, Maria de Lourdes Jeffery; KOLLER, Sílvia Helena; BARROS, Monalisa Nascimento dos Santos (Org.). Adolescência e psicologia: concepções, práticas e reflexões críticas. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Psicologia, 2002. 144p.
 
DIAS, Ana Cristina Garcia; GOMES, William B. Conversas sobre sexualidade na família e gravidez na adolescência: a percepção dos pais. Estud. psicol. (Natal) [online]. 1999, v.4, n.1, p. 79-106. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-294X1999000100006&lang=PT>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

EIZIRIK, Cláudio Laks; KAPCZINSKI, Flávio; BASSOLS, Ana Margareth Siqueira (org). O ciclo da vida humana: uma perspectiva psicodinâmica. Porto Alegre: Artmed, 2001 xii, 200 p.

 

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, 1838 p.

 

FIGUEIRÓ, Mary Neide Damico. Educação sexual: em busca de mudanças. Londrina, PR: UEL, 2009a. 208 p.

 

______. Educação sexual: múltiplos temas, compromisso comum. Londrina, PR: UEL, 2009b. 190 p.

 

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade: a vontade de saber. 10. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1990, v. 1, 152 p.

 
FREITAS, Kelly Ribeiro de; DIAS, Silvana Maria Zarth. Percepções de adolescentes sobre sua sexualidade. Texto contexto – enferm. [online]. 2010, v.19, n.2, p. 351-357. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072010000200017&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

FREUD, Sigmund. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Um caso de histeria, três ensaios sobre a sexualidade e outros trabalhos). Rio de Janeiro: Imago, 1905-1996.  v. 7.

 

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: 2008. Atlas, 175 p.

 

GOMES, Waldelene de A. et al. Nível de informação sobre adolescência, puberdade e sexualidade entre adolescentes. J. Pediatr. (Rio J.) [online]. 2002, vol.78, n.4, pp. 301-308. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0021-75572002000400009&script=sci_arttext>. Acesso em: 20 out. 2011.

 

KUPSTAS, Marcia; COSTA, Cristina. Comportamento sexual em debate. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1997. 144 p.
 

LEVANDOWSKI, Daniela Centenaro; SCHMIDT, Márcia Moura. Oficina sobre sexualidade e namoro para pré-adolescentes. Paidéia (Ribeirão Preto) [online]. 2010, v.20, n.47, p. 431-436. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X2010000300015&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

MARTINS, Gilberto de Andrade; THEÓPHILO, Carlos Renato. Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas. São Paulo: Atlas, 2007. 225 p.

 

MELO, Sonia Mª. Martins de; POCOVI, Rosi Mª. De Souza. Caderno pedagógico 1: Educação e Sexualidade, 2002, 2ed., Florianópolis, UDESC.

 

MICHAELIS: dicionário escolar língua portuguesa. 7. ed., atual. São Paulo: Melhoramentos, 2006. 868 p.

 

NETO, Francisco Baptista; OSÓRIO, Luiz Carlos. Aprendendo a conviver com adolescentes. Florianópolis: Insular, 2000. 199p

 

NOGUEIRA, Conceição; SAAVEDRA, Luisa; COSTA, Cecília. (In)Visibilidade do gênero na sexualidade juvenil: propostas para uma nova concepção sobre a educação sexual e a prevenção de comportamentos sexuais de risco. Pro-Posições [online]. 2008, vol.19, n.2, pp. 59-79. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-73072008000200006&script=sci_arttext>. Acesso em: 20 out. 2011.

 

NUNES, Cesar Aparecido. Desvendando a sexualidade. 2. ed. Campinas, SP: Papirus, 1997 . 141 p.

 

OLIVEIRA, Denize Cristina de et al. Atitudes, sentimentos e imagens na representação social da sexualidade entre adolescentes. Esc. Anna Nery [online]. 2009, vol.13, n.4, pp. 817-823. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452009000400018&lang=pt >. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Definitions. 2004. Disponível em: <http://www.who.int/es/>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

OUTEIRAL, José. Adolescer: estudos sobre adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. 95 p.

 

PFROMM NETTO, Samuel. Psicologia da adolescência. 5. ed. São Paulo: Pioneira, 1976. 420 p.

 

RAPPAPORT, Clara Regina; FIORI, Wagner da Rocha; DAVIS, Cláudia. Psicologia do desenvolvimento: teorias do desenvolvimento, conceitos fundamentais. São Paulo: E.P.U., 1981. v. 1.

 

RIBEIRO, Cláudia. A fala da criança sobre sexualidade humana: o dito, o explícito e o oculto. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1996. 136 p.

 

SOARES, Sônia Maria et al. Oficinas sobre sexualidade na adolescência: revelando vozes, desvelando olhares de estudantes do ensino médio. Esc. Anna Nery [online]. 2008, v.12, n.3, p. 485-491. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1414-81452008000300014&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

SOUSA, Leilane Barbosa de; FERNANDES, Janaína Franscisca Pinto; BARROSO, Maria Grasiela Teixeira. Sexualidade na adolescência: análise da influência de fatores culturais presentes no contexto familiar. Acta paul. enferm. [online]. 2006, v.19, n.4, p. 408-413. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-21002006000400007&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

SUPLICY, Marta. Conversando sobre sexo. 21. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. 389 p.

 

TIBA, Içami. Adolescência: o despertar do sexo. 17. ed. São Paulo: Gente, 1994. 140 p.

 

VENTURA, Miriam; CORRÊA, Sonia. Adolescência, sexualidade e reprodução: construções culturais, controvérsias normativas, alternativas interpretativas. Cad. Saúde Pública [online]. 2006, v.22, n.7, p. 1505-1509. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2006000700014&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

VILLELA, Wilza Vieira; DORETO, Daniella Tech. Sobre a experiência sexual dos jovens. Cad. Saúde Pública [online]. 2006, v.22, n.11, p. 2467-2472. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2006001100021&lang=pt>. Acesso em: 13 abr. 2011.

 

WAGNER, Adriana et al. A comunicação em famílias com filhos adolescentes. Psicol. estud. [online]. 2002, vol.7, n.1, pp. 75-80. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pe/v7n1/v7n1a08.pdf>. Acesso em: 20 out. 2011.

 

WEREBE, Maria José Garcia. Sexualidade, política e educação. São Paulo: Autores Associados, 1998. 217 p.

 

ZAGURY, Tania. Encurtando a adolescência. 7. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. 306 p.

 

Acesso à Plataforma

Assine a nossa newsletter