Foram meses de preparação. Visitas à nutricionista, incontáveis sessões de fisioterapia, freqüentes consultas com o psicólogo, além é claro do acompanhamento constante do treinador. Naquela manhã levantou-se cedo. Estava sentindo-se bem e tudo o que havia feito como preparação para aquela prova parecia ter sentido.
É como se estivesse tudo perfeito. Nada melhor do que aquela sensação para enchê-la de autoconfiança e motivação. Era uma prova importante. Uma competição internacional, o seu principal objetivo na temporada. Analistas de performance esportiva apontavam-na como a principal candidata ao primeiro lugar.
Logo na largada percebeu que o ritmo seria forte. As adversárias não iriam lhe dar moleza. Nos primeiros metros da prova teve de se esforçar bem para se manter entre as primeiras. Sentiu uma forte angústia, logo acalmada com a idéia de que as adversárias não iriam agüentar o ritmo e, em breve, sucumbiriam sobrando umas poucas rivais para brigar pelo título.
Completando o primeiro quarto do percurso viu uma adversária de quem já ganhara facilmente em outras competições abrir uma considerável vantagem. “Vou seguir minha estratégia e chegar inteira para o sprint final”. Estava acostumada a ver atletas que tentavam ganhar vantagem no inicio das provas até mesmo para pressionar e desconcentrar as adversárias. Até então não achou que seria grande coisa a vantagem da outra. Porém, próximo a metade do trajeto viu o treinador, misturado ao público, mostrando o cronômetro e brandindo algo como: “Vaaaaaai!!!! Vaaaaaai!!!!” Bateu o desespero.
Começou a acelerar o mais que podia, esquecendo-se de qualquer estratégia. Até então ocupava a segunda posição, mas isto não iria lhe satisfazer. Pensava no público, nos patrocinadores, na família… e no treinador!
Acelerou como se estivesse nos últimos metros de prova. Em rápidas olhadelas percebeu que as adversárias mais próximas estavam ficando para trás. Mas onde estava a primeira colocada? Continuou acelerando. A respiração estava muito ofegante. A musculatura das pernas começava a pedir arrego. Chegou ao terceiro quarto da prova sentindo-se bastante mal. Pegou um copo, dois copos d’água distribuídos pela organização, mas não conseguiu bebê-los. Um forte enjôo tomava-lhe conta. O máximo que conseguiu foi jogar o restante da água na cabeça e sobre o peito.
Já perto do ultimo km o desenho do percurso apresentava uma curva de 180° na qual pode ver a primeira colocada, com uma vantagem de cerca de 200 metros. Porém algo a fez perder o ritmo. Viu na expressão da adversária que ela não estava tão cansada assim. Parecia que ela administrava a prova. Viu também um meio sorriso na cara da adversária e para ela aquilo foi o fim. Foi sentindo suas forças se esvaindo e sem que nada pudesse fazer foi ultrapassada por outras atletas. Nem sequer percebeu as sombras delas se aproximando. Quando deu por si pode ver pernas em um ritmo mais rápido passando pelas suas. Também não conseguiu ver quem era. Estava tão cansada que apenas juntava suas forças para cruzar a linha de chegada. Cruzou-a , em quinto lugar, chorando. Nem todos que estavam próximos puderam perceber, pois as lágrimas se misturaram com o suor intenso. Em sua cabeça imediatamente pensou em desistir das competições. Sentou-se prostrada e nem sequer ouviu os aplausos do público que reconhecia o esforço apesar do resultado. Recebeu um copo d’água e naquele momento conseguiu beber. Sentiu parte de suas forças retornando. Enquanto ia se colocando de pé se perguntou “O que aconteceu?” Passou a pensar na nutricionista, no fisioterapeuta, no psicólogo, no treinador… Iria começar tudo de novo.