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Modelo disso x modelo daquilo: isso é benchmarking no Brasil?

É comum entre os profissionais de recursos humanos uma prática de melhoria contínua de processos denominada de “Benchmarking”. Em síntese, é uma tendência americana que traduz a troca de informações, cases, ideias, material de diferentes naturezas que por sua vez, propicia o desenvolvimento de estratégias de gestão de pessoas. 
É um processo gerencial permanente, que requer atualização constante da coleta e análise cuidadosa daquilo que há de melhor externamente em práticas e desempenho para as funções de tomada de decisões e de comunicações em todos os níveis da empresa, em especial, frente aos concorrentes. A partir da premissa de “aprender com o que o outro faz, fez ou deixou de fazer”, o benchmarking rapidamente virou modismo entre os departamentos de Rh no Brasil. 

No portal do www.yahoo.com.br existe um serviço gratuito denominado “Yahoo groups”, através dele, pessoas se encontram com objetivos comuns e organizam grupos, fóruns on line, troca de e-mail e informações. Um grupo famoso voltado à área de Rh é o grupo “João Honório”, fundado e administrado pelo mesmo que após o seu falecimento em 2011 vêem sendo moderado pelo seu neto Rodrigo Silvério que diga-se de passagem, vem conseguindo cumprir a imensa responsabilidade de continuar o árduo trabalho de seu avô frente a discussões e interfaces entre RHs brasileiros.

Em julho de 2012 o grupo já ultrapassava 12.000 seguidores, adeptos, empregados, interessados ou em busca de atuar e conhecer rotinas de gestão de pessoas. Um dia destes, navegando pelo grupo, me deparei com um membro que relatava necessitar de um modelo de carta de premiação para anexar a tablets que a área comercial daria aos funcionários que bateram a meta de vendas. Diante deste evento, sem expor a pessoa ou dados que possam identifica-la, comecei a levantar auto – críticas sobre minha própria atuação em RH.

Será que os RHs brasileiros estão ficando tão mecânicos que precisam de modelos de carta para expressar sentimentos intrínsecos e contingentes a seus próprios funcionários? Até que ponto um modelo de carta externo à cultura e clima de uma organização pode ter o mesmo efeito em outra empresa? É claro que os modelos trocados em um processo de benchmarking servem apenas de estímulos, de sugestões e que, portanto, são ou deveriam ser adequados aquele que vai implementar ou multiplica-lo dentro de outra empresa, todavia, não é isso que observamos na prática.

Já cheguei a disponibilizar ao grupo um modelo simples de ficha de cadastro de candidatos que alguns meses depois frente a uma nova solicitação voltou ao próprio grupo com apenas o logo alterado. Sem generalizar a área, mas 12.000 é um número significativo e merece atenção. Supomos que apenas 50% deles achem o modelo de ficha interessante, logo 6.000 pessoas estariam sensíveis a usar o modelo. Suponhamos ainda que apenas 50% desta amostra decida adaptar o modelo às suas necessidades e a outra metade decida copiar, logo 3000 pessoas em contatos de Rh estariam sendo conivente com um processo equivocado de benchmarking, estariam executando o “modelo” como ele aparece nos dicionários, meramente pela cópia.

Com avanços de recursos de internet (google, yahoo, grupos, fóruns, donwloads, outros) ferramentas de RH como roteiros de entrevista, dinâmicas de grupo, gabaritos de testes, modelos e afins tornaram-se materiais de acesso público e comum. Candidatos em processos de recrutamento e seleção, por exemplo, chegam às entrevistas dominando os temas muitas vezes melhores do que os próprios entrevistadores. Diante disso, temos que repensar como este material deve continuar sendo trocado ou meramente exposto. Não faz sentido aplicar uma pergunta de entrevista a um candidato que já se preparou para respondê-la.

Esta carência de conhecimento frente a criação técnica de recursos e frente ao pedido e uso inadequado de modelos entre suas variáveis podem significar: A) má formação do profissional de RH; B) Insegurança, comodidade, preguiça ou inocência do profissional de RH. Independente da causa é importante refletirmos que embora os Rhs brasileiros não tenham a devida atenção de seus empresários, sendo ainda interpretados como centros de custos e não como um business partners, tem gaps que ultrapassam processos (ausência de políticas, por exemplo), gaps em seus executores.
Sendo assim, não seria mais adequado antes de pensar na falta de modelos e processos, pensarmos na falta de capacitação dos nossos profissionais de RH? Ou ainda, na falha da formação destes profissionais?

Confesso a vocês que usar um modelo já confeccionado para partir para uma inovação é mais prático, eu mesmo em minha história profissional tenho empregado modelos em minhas criações, em especial quando a demanda de adequações é voltada para rotinas administrativas ou de departamento pessoal. Agrada-me a criação de projetos voltados a treinamento e desenvolvimento organizacional, onde por sinal, corro dos modelos! Não é a discussão principal deste artigo, mas só a título de conhecimento, o que os profissionais de RH sentem falta é exatamente o espaço para criar, a autonomia para desenvolver e implementar coisas.

Este texto não tem como objetivo dizer o que é certo ou errado. Dizer se devemos ou não usar modelos, mas sim, trazer aos profissionais de RH uma reflexão sobre o comportamento de pedir modelo. Emergencialmente, antes dos modelos de formulários, precisamos que a formação em RH nos ensine modelos de "como fazer", "Porque fazer", "para quem fazer", "como aperfeiçoar", "como rever", "quando rever", "porque rever". Mais importante do que implementar um formulário ou uma política, é saber porque estamos fazendo aquilo.

Na minha graduação de psicologia, tive contato com um professor de analise do comportamento (Roberto Banaco) que em suas palestras me deixou escapar “Quando algum marceneiro despreparado tem apenas um martelo como ferramenta, é natural que tudo a sua frente pareça um prego”.   Esta frase faz uma excelente analogia com nossos profissionais de RH que se sentem inseguros, cômodos ou sem orientação teórica.

Falando em orientação teórica, penso que o próprio curso de psicologia não dá respaldo suficiente para atuação generalista em RH. Uma solução emergente foi a criação de um curso específico para área denominado como “Tecnólogo em gestão de pessoas” que por sinal, não dá base especialista ao profissional. Especialista ou generalista, psicólogo, gestor de RH ou graduado em outra ciência, o que percebo nos grupos de RH é um certo despreparo teórico frente a demandas de gestão estratégica de pessoas, em especial, quando precisam implementar algo novo à sua rotina já instituída.

Tal despreparo pode ser conivente ou propiciar erros maiores do que a ausência do que ele (a) está tentando copiar. “Modelos disso ou daquilo" como nomeie este artigo podem não mais atingir os objetivos aos quais eles foram propostos (Modelos de testes de conhecimentos gerais de 1997, por exemplo, já não são mais testes de conhecimentos gerais). Modelos de teste de excel 97, já não podem mais ser chamados de testes de excel, modelos de planilha para calcular rescisão em 1999 por exemplo, talvez não tenham os cálculos alinhados com as atualidades da CLT e assim por diante.

Para finalizar, acho que os modelos são necessários para formação teórica dos profissionais, em especial de RH, mas não acredito que sejam propícios a instalação e desenvolvimento de competências no profissional que o emprega sistematicamente. Replicações sistemáticas são bem vindas em pesquisas acadêmicas para identificação de novas hipóteses ou comprovação de resultados. No campo, a coisa muda de figura.  Cada empresa, cada pessoa são únicas em sua totalidade, diante disso, como garantir que modelos padronizados atinjam os objetivos aos quais eles se propuseram a alcançar. A própria seleção por competência (método) pouco contribui quando a empresa que a emprega não tem o mapeamento de competências.

 Uma pessoa que não entende de teoria, por exemplo, pode simplesmente sair aplicando o questionário e achar que está identificando competências funcionais ao quadro de cargos da organização que faz parte, quando na verdade, está aplicando apenas parte do que chamamos de “seleção por competência”. Friso que o que menos importa são os modelos em sim, mas o que vamos fazer com eles, como vamos fazer e porque vamos fazer.

Nosso dia – a – dia em RH é muito corrido e incentiva o dinamismo e em algumas empresas compromete a criatividade. Escolham antes de ceder modelos, “darem” modelos. Eu gostaria que muitos de meus professores e superiores ainda estivessem comigo para darem continuidade ao meu coaching. Mais do que RHs que fazem pelos seus colegas de área, precisamos de mais RHs FORMADORES.

Quem já teve a oportunidade de ser meu subordinado (Priscila de Almeida Nóbrega, Alcimar Nunes Fraga, Felipe Romão de Souza, Camila Fernanda Francisco Pauferro, Erica Soares, Liliane Gazeta Pereira, Cláudia Silva, Tatiane Rosa, Leandro Marinho Furlani, Dislaine Silva, Rodolfo Mascarenhas, Natália Baldi, Natália Acre, outros) sabe que eu sou um gestor que não entrega nada pronto, estou a todo momento antes de ensinar a fazer, experimentando com eles modelos de planilhas, formas de postar anúncios de vagas, formas de escrever comunicados internos, formas de ministrar e confeccionar material de treinamento, enfim, uso uma forma de atuar que não é minha, mas me foi instalada por líderes como Valéria Barreto (Gelre), Gil Afash Cohen (Grupo SBF), Cleuza Zolin (Cultura Inglesa), Patrícia Barbosa (Gelre), Letícia Silveira (Gelre), Alexandra Queiroz (Nube) na época em que atuei nestas empresas e hoje, junto aos meus sócios na HumanitáRH (www.humanitarh.com.br) onde ocupo a cadeira de diretor de operações e recursos humanos.

Minha carreira começou como estagiário há uns 10 anos, sou grato aqueles que cursaram meu caminho e me desenvolveram, sou grato por hoje, querer e poder desenvolver aqueles que andam comigo. Hoje minha visão de Benchmarking é fundamentalmente traduzida pelo ato de promover melhorias (juntos) e não “fazer por alguém”. Quando fazemos por alguém, quando damos algo pronto ou permitimos que ela faça isso, estamos fazendo qualquer coisa, menos um processo de aprendizado e muito menos de troca. Antes de adotar o modelo americano como mais um modismo de RH, sugiro (me incluindo) que pensemos se estamos fazendo isso corretamente.

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