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Amor e Paixão sob a lente da Psicanálise

Os conceitos na Antigüidade: sabemos que esses conceitos eram vistos, desde sempre, como má influência dos fatores afetivos sobre a consciência. Essa interferência deveria e poderia ser removida através da própria razão.

Essa forma de concepção da paixão já está presente em Platão. Assim encontramos em Platão que "a alma é um conjunto de faculdades hierarquisadas em cuja cúpula, está a razão, a qual comandaria as demais instâncias". Tratamos aqui de uma conceituação extremamente interessante, pois a partir de Freud, nos defrontamos com a questão de um critério de "alta", em psicanálise, no qual podemos verificar que "onde havia mais Id, que haja mais Ego".

Encontraremos em Aristóteles que as paixões são estados de alma acompanhados pelas sensações de prazer e de desprazer. Em última instância são sentimentos que têm suas raízes na gratificação ou mesmo na frustração do desejo. Citando Nicola Abbagnano(1970), em seu Dicionário de Filosofia, nos diz que a paixão é o mesmo que afecção, ou mesmo, algo que se experimenta passivamente. Já, Pascal nos dizia que "quando se conhece a paixão de alguém, temos a certeza de agradar-lhe".

Passaremos a citar as considerações de Kant a esse respeito:

Kant possuía uma visão semelhante a de Platão e Sócrates, e afirmava que "a paixão é a inclinação que impede a razão de compará-las às outras inclinações e de efetuar uma escolha entre elas. Assim, a paixão exclui um domínio de si mesmo, ou seja, impede ou torna impossível que a vontade se determine com base em princípios… a paixão é uma doença por intoxicação ou por deformação que precisa de um médico interno ou externo da alma, o qual, todavia, não sabe em geral prescrever uma cura radical…"

É chegada a vez de Hegel, no qual percebemos uma posição quase inversa ao referir-se à paixão, tendo a nos dizer que "a paixão não é boa nem má: a sua forma só exprime que um sujeito pôs em um único conteúdo todo o interesse vivo de seu espírito, o seu engenho, caráter e gozo". E, acrescenta ainda que "nada de grande foi ou mesmo pode ser realizado sem paixão".

Nietzsche: também exaltou a paixão ao afirmar que a paixão dominante era "a forma suprema de saúde porque nela a cordenação dos sistemas internos e o seu trabalho a serviço do mesmo fim são realizados melhor: o que é mais ou menos a definição de saúde".

Na visão psicanalítica: entendemos que esta, está mais próxima de uma visão Kantiana no que se refere à doença, uma vez que o sujeito apaixonado, seja por outro humano, ou pelo dinheiro, pela política, ou mesmo pela religião, está exclusivamente orientado pelo "princípio de prazer", alem de totalmente distanciado da realidade.

Chegamos a Freud: podemos notar em seu trabalho intitulado "Formulações sobre os dois princípios do Funcionamento mental(1911), que chega a afirmar no que tange à neurose, que esta teria como objetivo "arrancar o indivíduo da vida real, alienando-o por achar a realidade insuportável, seja no todo ou em parte, podendo chegar no pólo extremo da psicose alucinatória".

Queremos registrar que Freud em seu trabalho: "Conferências Introdutórias = XXVI, 1917, afirma que o comportamento psicológico de uma pessoa apaixonada é correlato ao de uma pessoa em estado de sono, uma vez que "as catexias de objeto, sejam libidinais, como egoísticas são abandonadas e retiradas para dentro do ego".

Já, no que é referente ao amor, percebemos que Freud afirma em "Os instintos e suas vicissitudes"- 1915, que o "amor adulto" surge quando a fase puramente narcisista, cede o lugar à fase objetal. Aqui, ego e objeto se relacionam no que concerne ao prazer e ao desprazer. Afirma ainda Freud: "Se o objeto se torna uma fonte de sensações agradáveis, fica estabelecida uma ânsia motora que procura trazer o objeto para mais perto do ego, incorporando-o, ou introjetando-o, na linguagem de Ferenczi". Assim, com relação ao amor Freud cita que O objeto está sendo tratado da mesma maneira que o próprio ego, sendo então que, estamos amando uma quantidade considerável de libido narcisista que transborda para o objeto. Em outras palavras, nós amamos o objeto em função das perfeições que nos esforçamos por conseguir para o nosso próprio ego.

Uma frase emblemática para reflexão:

"No amor há fascinação pelo objeto; na paixão há servidão (=do sujeito em relação ao objeto)".

Queremos lembrar que os conceitos de "libido de ego" e "libido de objeto", sempre ocorrem numa razão que é inversamente proporcional. Freud nos dá como exemplo, o estado de enamoramento, onde grande parte da libido é investida no objeto, tornando-se este, a palavra de lei para o sujeito. Em outras palavras: "o ego entrega-se ao objeto". Portanto, tanto a paixão como o amor, estão inseridos no circuito do prazer, muito embora pensemos que a paixão tem a ver exclusivamente com o ego, sendo que o amor tem tudo a ver com o objeto. Diremos ainda de uma outra maneira: "a paixão seria um sentimento ou um estado psíquico regido quase que exclusivamente pelo 'princípio do prazer', ao passo de que no amor, ao se admitir o objeto, levar-se-ia em conta o 'princípio da realidade'".

Foi em "Para Além do Princípio do Prazer", que Freud em 1920, também introduziu a noção de "pulsão de morte". Assim se a paixão seria um estado psíquico quase regido totalmente pelo princípio do prazer, pensamos que se possa considerar que existiria quase que um "esvaziamento libidinal", no que se refere ao ego, ficando a libido investida e represada no objeto.

O apaixonado estaria recalcando quais estímulos desagradáveis ?

Sabemos que estes estímulos não fazem parte tanto da realidade externa, mas sim da organização psíquica interna. Assim, na paixão o outro não é amado, é incorporado, igualado, indiferenciado ao ego. Já quando falamos de amor, podemos notar a existência da "diferença", havendo a ruptura, a qual surge sempre em momentos cruciais como o nascimento, no desmame, na castração ou no Édipo(na diferenciação sexual).

A contribuição de Melanie Klein: a Posição Depressiva (1934)

Nesta posição, "o ego chega à compreensão de seu amor por um objeto bom, total e além disso real, além de um sentimento de culpa para com esse objeto. A identificação com o objeto total, baseada na atração libidinosa, primeiramente para com o seio, depois para com a pessoa toda, vai junto com a sua ansiedade por ele (por sua desintegração), com culpabilidade e remorso, com um sentido de responsabilidade para conservá-lo intacto contra os perseguidores e contra o ID e com tristeza relacionada com a idéia de perda inevitável do mesmo".

A Posição esquizo-paranóide:

Aqui não haveria amor, mas sim necessidade, sendo que o que estaria envolvido seria a "angústia persecutória ao ego". Dessa maneira, no depressivo, a angústia que é sempre persecutória, estaria ligada ao objeto.

Isto posto, pensamos poder concluir esse trabalho, sobre uma temática tão antiga quanto a existência do homem. Contudo, embora saibamos hoje muito a respeito, penso que ainda vale a citação de que "O coração tem razões que a própria razão desconhece".

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